Mat. Apoio Sociologia Aplicada

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SOCIOLOGIA APLICADA
MATERIAL DE APOIO
SOBRAL/CE
PROPOSTA PARA A DISCIPLINA
Ementa
Estudo histórico do surgimento da Sociologia. Definição do objeto e métodos sociais. A contribuição
sociológica de Emile Durkheim: divisão do trabalho, fato social e controle social. O Objeto social e o
método Weberiano. A concepção da sociedade na Sociologia marxista: Estado, classes sociais e poder.
Marx e as classes sociais. O capitalismo hoje e a sociedade pós-moderna. Aplicação à Administração.
Objetivos
Contextualizar a sociologia para o pedagogo, abordando o surgimento desta ciência, o processo
de evolução do conhecimento: consciência crítica, consciência filosófica e consciência científica.
O funcionalismo e o positivismo (Émile Durkheim): a organização social capitalista na concepção
histórico-crítica (Karl Marx): o método compreensivo (Max Weber).
Conteúdo Programático
1. A Sociologia
Histórico e surgimento da sociologia como ciência;
Definição e objeto de estudo;
Métodos sociais.
2. Augusto Comte
A filosofia de Augusto Comte
O Positivismo
3. Emile Durkheim
A contribuição sociológica de Emile Durkheim;
Divisão do trabalho;
Fato social e controle social.
4. Método Weberiano
O Objeto social e o método Weberiano;
5. A Sociologia e o Marxismo
A concepção da sociedade na Sociologia marxista: Estado, classes sociais e poder.
6. A Sociologia e a Administração
Teorias Sociológicas
Conhecimentos Sociológicos na Administração
7. O Capitalismo e a Sociedade Pós Moderna
Sociedade de Consumo
Metodologia
Aulas expositivas;
Discussão de textos a partir de leituras individuais e/ou coletivas;
Resolução de exercícios;
Apresentação de seminários;
Produção de trabalhos individuais e/ou grupais.
Avaliação
Pontualidade e assiduidade;
Participação nas discussões e nos trabalhos individuais e grupais;
Entrega das atividades;
Seminários;
Avaliação individual de conhecimentos.
1
Bibliografia
MARX, K. O Capital. 3a edição, Vol. 1, SP, Nova Cultural, 1988.
MARX, Karl e ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. In: LASKI, H. J. O Manifesto Comunista de
Marx e Engels. 2. edição, RJ, Zahar, 1978
VIANA, Nildo. Estado, Democracia e Cidadania. A Dinâmica da Política Institucional no Capitalismo.
Rio de Janeiro, Achiamé, 2003.
VIANA, Nildo. O Capitalismo na Era da Acumulação Integral. São Paulo, Idéias e Letras, 2008.
VIANA, Nildo. O Fim do Marxismo e outros ensaios. São Paulo, Giz, 2007.
YOUNG, Jock. A Sociedade Excludente. Exclusão Social, Criminalidade e Diferença na
Modernidade Recente. Rio de Janeiro, Revan, 2002.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
ALTHUSSER, Louis. Aparelhos Ideológicos do Estado: notas sobre os aparelhos ideológicos
do estado (AIE). 3. ed., Rio de janeiro: Edições Graal, 1983.
ESTABLET, Roger; BAUDELOT, Christian. L’école capitaliste en France. Paris: Maspero, 1971
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SUMÁRIO
1. A SOCIOLOGIA
1.1. A Sociologia Pré-Científica
1.1.1. O Renascimento
1.1.2. Diferentes Visões do Renascimento
1.1.3. A Retomada do Espírito Especulativo
1.1.4. Um novo pensamento social
1.1.5. As Utopias
1.1.6. A visão laica da sociedade e do poder
1. 2. Construção Sociológica da Realidade
EXERCÍCIO 1
2. AUGUSTO COMTE
2.1. A Filosofia de Augusto Comte
2.1.1 O Progresso do Espírito
2.1.2. O Pensamento Positivo
2.2. Características do Positivismo
2.3. Estudo da Estática Social = Ordem
2.4. Estudo da Dinâmica Social = Progresso
EXERCÍCIO 2
3. ÉMILE DURKHEIM
3.1. Método Sociológico de Émile Durkheim
3.2. Características de Durkheim
EXERCÍCIO 3
4. MORFOLOGIA SOCIAL – AS ESPÉCISES SOCIAIS
4.1. Evolução das Sociedades
EXERCÍCIO 4
5. DA SOLIDARIEDADE MECÂNIA Á SOLIDARIEDADE ORGÂNICA
5.1. Solidariedade Mecânica
5.2. Solidariedade Orgânica
EXERCÍCIO 5
6. MAX WEBER
6.1. Ação
6.2. Conhecimento
6.3. Tipo Ideal
6.4. Burocracia
EXERCÍCIO 6
7. KARL MARX
7.1. MANIFESTO COMUNISTA
7.2. Marx e o Materialismo Histórico
EXERCÍCIO 7
8. A SOCIOLOGIA E A ADMINISTRAÇÃO
8.1. Teorias Sociológicas
8.2. Conhecimentos Sociológicos na Administração
EXERCÍCIO 8
9. O CAPITALISMO E A SOCIEDADE PÓS MODERNA
9.1. Sociedade de Consumo
9.2. Modernidade e Pós-Modernidade
EXERCÍCIO 9
EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES
3
1. A SOCIOLOGIA
1.1. A Sociologia Pré-Científica
1.1.1. O Renascimento
O Renascimento, talvez mais do que a maioria dos diversos momentos históricos, suscita
grandes controvérsias. Há quem veja nesse movimento filosófico e artístico o momento de ruptura entre o
mundo medieval - com suas características de sociedade agrária, teocrática e fundiária - e o mundo
moderno urbano, burguês e comercial.
Mudanças significativas ocorrem na Europa a partir de meados do século XV lançando as bases
do que viria a ser, séculos depois, o mundo contemporâneo. A Europa medieval, relativamente estável e
fechada, inicia um processo de abertura e expansão comercial e marítima. A identidade das pessoas, até
então baseada no clã e na propriedade fundiária, vai sendo progressivamente substituída pela identidade
nacional e pelo individualismo. A mentalidade vai se tornando paulatinamente laica - desligada das
questões sagradas e transcendentais -, as preocupações metafísicas vão convivendo com outras mais
imediatistas e materiais, centradas principalmente no homem.
Embora as preocupações metafísicas e filosóficas tenham importado ao homem desde a
Antigüidade, no Renascimento a nova sociedade que emerge exige a distinção entre conhecimento
especulativo e pragmático.
1.1.2. Diferentes Visões do Renascimento
Alguns historiadores têm uma visão otimista do Renascimento, como a tiveram também aqueles
que assim o batizaram, por terem erroneamente considerado a Idade Média como a Idade das Trevas e
do obscurantismo. Para eles as mudanças que ocorreram na Europa, principalmente na Itália, e depois
na Inglaterra e Alemanha, foram essencialmente positivas e responsáveis pelo desenvolvimento do
comércio e da navegação, do contato com outros povos, pela proliferação de obras de arte e de obras
filosóficas. Nessa ótica foi o movimento renascentista que promoveu o renascer da cultura e da erudição,
o gosto pelo saber, além de tê-los, aos poucos, posto à disposição da população em geral.
Mas há também os historiadores mais pessimistas, que conseguem perceber nessa época um período de
grande turbulência social e política. Para essa análise, esses historiadores apoiam-se na falta de unidade
política e religiosa, nos grandes conflitos existentes entre as nações, nas guerras intermináveis, nas
inquisições e perseguições religiosas, no esforço de conservação de um mundo que agonizava,
características mercantes do período. Consideram sintomas de tudo isso os exílios, as condenações e os
longos processos eclesiásticos, os grandes genocídios que a Europa promoveu na América e o
ressurgimento da escravidão como instituição legal.
De fato, um certo clima de fim de mundo perpassa a produção artística do período, expresso na
Divina comédia de Dante Alighieri, no Juízo final de Michelângelo, pintado na Capela Sistina. Um clima de
insegurança e instabilidade perpassa todos nessa época de profunda transição.
1.1.3. A Retomada do Espírito Especulativo
De qualquer maneira, o Renascimento marca uma nova postura do homem ocidental diante da
natureza e do conhecimento. Juntamente com o descrédito na Igreja como instituição e o conseqüente
aparecimento de novos credos e seitas - que conclamavam os fiéis a uma leitura interpretativa das
escrituras -, o homem renascentista retoma a crença no pensamento especulativo. O conhecimento deixa
de ser revelado, como resultado de uma atividade de contemplação e fé, para voltar a ser o que era antes
entre gregos romanos - o resultado de uma bem conduzida atividade mental.
Assim como a ciência, a arte também se volta para a realidade concreta, para o mundo terreno,
numa ânsia por conhecê-lo, descrevendo-o, analisando-o, medindo-o, quer com medidas precisas, quer
por meio de uma perspectiva geométrica e plana.
“O visível é também inteligível", afirmava Leonardo da Vinci, encantado com as possibilidades de
conhecimento pelo do uso dos sentidos.
Por outro lado, a vida terrena adquire cada vez mais importância e com ela a própria história,
que passa a ter uma dimensão eminentemente humana. Estimulado pelo individualismo e liberto dos
valores que o prendiam irremediavelmente à família e ao clã, o homem já concebe seu papel na história
como agente dos acontecimentos. Ele vai aos poucos abandonando a concepção que o tomava por
pecador e decaído, um ser em permanente dívida para com Deus, para se tomar, na nova perspectiva, o
agente da história.
4
Shakespeare evoca constantemente em suas peças a tragédia do homem diante de suas
opções e sentimentos, enquanto Michelângelo faz quase se encontrarem os dedos de Deus e Adão na
cena da Criação. É nesse ambiente de renovação que o pensamento científico tomará novo fôlego e, com
ele, o pensamento acerca da vida social
1.1.4. Um novo pensamento social
Num mundo que se torna cada vez mais laico e livre da tutela da Igreja Católica, o homem se
sente livre para pensar e criticar a realidade que vê e vivencia. Sente-se livre para analisar essa realidade
como algo em si mesmo e não como um castigo que Deus lhe reservou. E, assim como os pintores que
se debruçaram nas minúcias das paisagens, na disposição das figuras numa perspectiva geométrica, os
filósofos também passam a questionar e dissecar a realidade social. A vida dos homens passa a ser fruto
de suas ações e escolhas, e não dos desígnios da justiça divina.
Novas instituições políticas e sociais, estados nacionais, exércitos, levam os homens a repensar
a vida social e a história.
Nessa visão humana e especulativa da vida social está o germe do pensamento social moderno
que vai expressar na literatura, na pintura, na filosofia e, em especial, na literatura utópica de Thomas
Morus (A Utopia), Tommaso Campanella (A cidade do Sol) e Francis Bacon (Nova Atlântida).
1.1.5. As Utopias
Como Platão, os filósofos renascentistas tentaram imaginar uma sociedade perfeita. Assim como
a Atlântida, surge através da pena de Thomas Morus (1478-1535) uma comunidade onde todas as
soluções foram encontradas: a Utopia cujo nome significa “nenhum lugar", onde existe harmonia,
equilíbrio e virtude.
Desse modo, o pensamento social no Renascimento se expressa na ária de mundos ideais que
mostrariam como a realidade deveria ser, sugerindo entretanto que tal sociedade seria construída pelos
homens com sua ação e não pela crença ou pela fé.
Utopia é uma ilha onde reina a igualdade e a concórdia. Todos têm sob as mesmas condições
de vida e executam em rodízio os mesmos trabalhos. A igualdade e os ideais comunitários são garantidos
por uma monarquia constitucional. Cada grupo de 30 famílias escolhe um representante para o conselho
que elege o imperador; este permanece até o fim da vida como soberano, sob o olhar vigilante do
conselho, que opina sobre cada ato real e pode consultar previamente as famílias, quando considerar
necessário.
Além da igualdade quanto ao estilo de vida e ao trabalho, também a distribuição de alimentos se
dá de forma comunitária. Não há necessidade pagar por nada, porque há de tudo em profusão, uma vez
que a vida é simples, sem luxo e todos trabalham.
Em A Utopia, Thomas Morus expressa os ideais de vida moderada, igualitária e laboriosa,
semelhantes aos praticados pelos monges nos mosteiros pré-renascentistas, assim como defende, em
termos políticos, a monarquia absoluta.
Seria A Utopia uma obra sociológica? Não no sentido moderno ou científico do conceito, mas
como expressão das preocupações do filósofo com a vida social e com os problemas de sua época. Toda
a vida ou, como o próprio autor chama, o "regime social" dos utopienses demonstra claramente a
preocupação com o estabelecimento de regras sociais mais justas e humanas como resposta às críticas
que o autor fez em relação à Inglaterra de seu tempo.
Analisar a sociedade em suas contradições e visualizar uma maneira de resolvê-las, acreditar
que da organização das relações políticas, econômicas e sociais derivam a felicidade do homem e seu
bem-estar é, seguramente, o germe do pensamento sociológico.
E, refletindo basicamente os anseios de sua época, Thomas Morus considera esse mundo ideal
possível, graças ao plano sábio de um monarca absoluto: Utopos, fundador da Utopia.
O monarca esclarecido, justo e sábio é o ideal político do Renascimento, organizador das
sociedades perfeitas criadas pela literatura de Thomas Morus e de outros.
1.1.6. A visão laica da sociedade e do poder
Em relação ao desenvolvimento do pensamento sociológico, Maquiavel teve mais êxito do que
Thomas Morus, na medida em que seu objetivo foi conhecer a realidade tal como se lhe apresentava, em
vez de imaginar como ela deveria ser.
De qualquer maneira, nas obras de Thomas Morus e de Maquiavel percebemos como as
relações sociais passam a constituir objeto de estudo dotado de atributos próprios e deixam de ser, como
no passado, conseqüência do acaso ou das qualidades pessoais dos sujeitos. A vida dos homens já
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aparece, nessas obras, como resultado das condições econômicas e políticas e não de sua fé ou de sua
consciência individual.
Além disso, esses filósofos expressam os novos valores burgueses ao colocar os destinos da
sociedade e de sua boa organização nas mãos de um indivíduo que se distingue por características
pessoais. A monarquia proposta no Renascimento não se assenta na legitimidade do sangue ou da
linhagem, na herança ou na tradição, mas na capacidade pessoal do governante e sua sabedoria. A
história, tanto como ciência quanto como conhecimento dos fatos, passa a ter um papel relevante nesse
novo contexto. Desconhecer a história é desconhecer a evolução e as leis que regem a sociedade onde
se vive. Nessa idéia de monarquia se baseia a aliança que a burguesia estabelece com os reis para o
surgimento dos estados nacionais, onde a ordem social será tanto mais atingível quanto mais o soberano
agir como estadista, pondo em marcha as forças econômicas do capitalismo em formação
1. 2. Construção Sociológica da Realidade
Para alguns, a Sociologia representa uma poderosa arma a serviço dos interesses dominantes;
para outros, é a expressão teórica dos movimentos revolucionários. Mas afinal, o que é Sociologia ?
A Sociologia é uma ciência que estuda as sociedades humanas e os processos que interligam
os indivíduos em associações, grupos e instituições.
Enquanto o indivíduo isolado é estudado pela Psicologia, a Sociologia estuda os fenômenos
que ocorrem quando vários indivíduos se encontram em grupos de tamanhos diversos, e interagem no
interior desses grupos.
Pondo-se de lado alguns trabalhos precursores, como os de Maquiavel (Itália em Florença, 1469
- 1527) e Montesquieu (França em Bordéus, 1689 - 1755), o estudo científico dos fatos humanos
somente começou a se constituir em meados do século XIX. Nessa época, assistia-se ao triunfo dos
métodos das ciências naturais.
Diante da comprovação inequívoca da fecundidade do caminho metodológico apontado por
Galileu (Itália em Pisa, 1564 - 1642) e outros, alguns pensadores que procuravam conhecer
cientificamente os fatos humanos passaram a abordá-los segundo as coordenadas das ciências
naturais. Outros, ao contrário, afirmando a peculiaridade do fato humano e a conseqüente necessidade
de uma metodologia própria. Essa metodologia deveria levar em consideração o fato de que o
conhecimento dos fenômenos naturais e um conhecimento de algo externo ao próprio homem, enquanto
nas ciências sociais o que se procura conhecer é a própria experiência humana ( interna ).
De acordo com a distinção entre experiência externa e experiência interna, poder-se-ia distinguir
uma série de contrastes metodológicos entre os dois grupos de ciências. As ciências exatas partiriam da
observação sensível e seriam experimentais, procurando obter dados mensuráveis e regularidades
estatísticas que conduzissem à formulação de leis de caráter matemático.
As ciências humanas, ao contrário, dizendo respeito à própria experiência humana, seriam
introspectivas, utilizando a intuição direta dos fatos, e procurariam atingir não generalidades de caráter
matemático, mas descrições qualitativas de tipos e formas fundamentais da vida do espírito.
Os positivistas (como eram chamados os teóricos da identidade fundamental entre as ciências
exatas e as ciências humanas) tinham suas origens sobretudo na tradição empirista inglesa que remonta
a Francis Bacon (Inglaterra em Londres, 1561 – 1626) e encontrou expressão em David Hume (Escócia
em Edimburgo, 1711 – 1776 ), nos utilitaristas do século XIX e outros. Nessa linha metodológica de
abordagem dos fatos humanos se colocariam Augusto Comte (França, 1798 – 1857) e Émile Durkheim
( França, 1858 – 1917 ), este considerado por muitos como o fundador da sociologia como disciplina
científica. Os antipositivistas, adeptos da distinção entre ciências humanas e ciências naturais, foram
sobretudo os alemães, vinculados ao idealismo dos filósofos da época do Romantismo, principalmente
Hegel ( Alemanha em Esturgarda, 1770 – 1831 ) e Schleiermacher ( Polônia em Breslau, 1768 – 1834 ).
Os principais representantes dessa orientação foram os neokantianos Wilhelm Dilthey ( Alemanha em
Briebrich, Renânia, 1833 – 1911 ), Wilhelm Windelband (Alemanha em Potsdam, 1848-1915) e
Heinrich Rickert ( Alemanha em Danzig, 1863 – 1936 ).
Dilthey estabeleceu uma distinção que fez fortuna: entre explicação (erklären) e compreensão
(verstehen). O modo explicativo seria característico das ciências naturais, que procuram o
relacionamento causal entre os fenômenos. A compreensão seria o modo típico de proceder das ciências
humanas, que não estudam fatos que possam ser explicados propriamente, mas visam aos processos
permanentemente vivos da experiência humana e procuram extrair deles seu sentido.
Os sentidos (ou significados) são dados, segundo Dilthey, na própria experiência do
investigador, e poderiam ser empaticamente apreendidos por outros em interação com ele conforme a
vivência de cada um.
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Dilthey (como Windelband e Rickert), contudo, foi sobretudo filósofo e historiador e não,
propriamente, cientista social, no sentido que a expressão ganharia no século XX. Outros levaram o
método da compreensão ao estudo de fatos humanos particulares, constituindo diversas disciplinas
compreensivas. Na sociologia, a tarefa ficaria reservada a Max Weber.
Levando-se em conta os esforços realizados por tantos pensadores, desde a Antigüidade, para
entender a sociedade e o seu desenvolvimento, a Sociologia poderia ser considerada a mais velha de
todas as ciências, e a mais acolhedora. Tanto que hoje em dia praticamente todo mundo é “sociólogo” —
“porque todos estamos sempre analisando os nossos comportamentos e as nossas experiências
interpessoais”1 —, pois, até por razões emocionais, de alguma forma nos acostumamos a contemplar e a
dar palpite sobre os movimentos da sociedade, as forças que conduzem os seres humanos, as razões
dos conflitos sociais, as origens da família, as relações entre Estado e Direito, o funcionamento dos
sistemas políticos, a função das ideologias e das religiões etc. Segundo esse raciocínio, podem ter sido
sociólogos os veneráveis santos Agostinho (Tagasta, Numídia ao norte da África, 354 – 430 ) e Tomás
de Aquino ( Campânia no sul da Itália, 1225 – 1274 ) e padre Antônio Vieira (Portugal em Lisboa, 1608
- 1697), que interpretavam a realidade social de acordo com os dogmas e interesses da Igreja Católica,
bem como os notáveis lbn Khaldun, historiador islâmico ( Tunísia, 1332 – 1406 ) e Maquiavel, que
criticavam toda interpretação teológica da sociedade.
Ibn Khaldun, é um precursor das ciências sociais e é reconhecido como o historiador principal do
mundo árabe em seu tempo. Mas, o mundo árabe de então dominava também o Mediterrâneo, Espanha
e metade de Europa do leste. É considerado como hispânico-árabe pois sua família foi uma das principais
e mais antigas de Sevilha, embora tivesse nascido na Tunísia e morrido no Cairo. Era diplomata e
estadista, professor nas instituições precursoras do que hoje associamos a idéia de universidade e
magistratura.
Sua obra mestra é “Muqaddimah” ou “introdução à história”, que trata do mundo árabe e
muçulmano. Entretanto, julgou necessário conformar uma teoria da história e do seu método, e ao o fazêlo, produziu um tratado que segundo alguns, como Arnold Toynbee ( Inglaterra, 1889 – 1975 ) ,
«desarrolla una filosofía de la historia que es sin duda lo más grandioso de su tipo jamás escrito, en
cualquier tiempo o lugar». Mais do que um tratado da história ou da sua filosofia, é um exemplo de um
enfoque analítico sobre o fenômeno social que hoje em dia nós chamamos Sociologia. O livro I de sua
história é um tratado geral da Sociologia; o II e o III são sobre a sociologia da política (o que hoje
chamamos de Ciência Política); o IV é sobre economia política e o V versa sobre educação e
conhecimento.
Toda a obra está estruturada em torno de um conceito que chamou “asabiyah”, ou coesão
social. Este é o elemento ordenador do fenômeno social que surge espontaneamente das relações entre
as pessoas e os grupos, que pode ser conformado e institucionalizado pela cultura e a religião, mas que
também pode ser destruído ou debilitado pela decadência.
Ibn Khaldun é um precursor das ciências sociais modernas ao anunciar a existência de
determinada ordem social subjacente ao fenômeno político, econômico, legal e moral.
Em suas palavras, ao definir, o que viu como a ciência nova que chamou “im al umran”, ou
ciência da cultura: “Esta ciência tem seu próprio objeto de estudo, ou seja, a sociedade humana, com
seus problemas e suas mudanças que se sucedem conforme essa natureza própria da sociedade”. (
traduzido do artigo original em espanhol )
Porém, a trajetória da Sociologia no Ocidente, só começa a ser delineada com o movimento
político e intelectual conhecido como Iluminismo (Inglaterra, Holanda e França, 1590 - séc XVII e XVIII),
que exerceu enorme influência no século XVIII, propondo reformas no interesse das classes privilegiadas
(elite), conforme leis que regeriam ao mesmo tempo a sociedade, o universo e a natureza e a Revolução
Industrial (Inglaterra, 1750 com introdução da máquina a vapor - séc. XVIII em diante). Em seguida, após
a Revolução Francesa (França, 1789 – 1799) e a queda do Antigo Regime (regime político vigente na
França até a Rev. Francesa), a Sociologia adquiriu os traços que ostenta hoje em dia, aos poucos
destituindo-se da roupagem de ciência ética, de filosofia política ou social, preocupada em determinar
uma ordem justa das relações humanas, para concentrar-se na descrição e interpretação dos elementos
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TURNER, 2000
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— desempenhos, grupos, valores, normas e modelos sociais de conduta — que determinam a integração
dos sistemas sociais.
Esfera de atuação e
Revolução
Século / Ano
impacto
Iluminismo
a partir de 1590, séc. XVII – XVIII
ideológica
Industrial
segunda metade do séc. XVIII ( 1750 )
econômica
Francesa
segunda metade do séc. XVIII ( 1789 )
política
Nesse sentido, a Sociologia é um fenômeno estrito e uma ciência, característica da sociedade
moderna.
O termo Sociologie foi cunhado por Auguste Comte, que esperava unificar todos os estudos
relativos ao homem — inclusive a História, a Psicologia e a Economia. Seu esquema sociológico era
tipicamente positivista, (corrente que teve grande força no século XIX), e ele acreditava que toda a vida
humana tinha atravessado as mesmas fases históricas distintas e que, se a pessoa pudesse
compreender este progresso, poderia prescrever os remédios para os problemas de ordem social.
O surgimento da sociologia ocorreu num momento de grande expansão do capitalismo,
desencadeado pela dupla revolução – a industrial e a francesa. O triunfo da indústria capitalista na
revolução industrial desencadeou uma crescente industrialização e urbanização, o que provocou radicais
modificações nas condições de existência e nas formas habituais de vida de milhões de seres humanos.
Estas situações sociais radicalmente novas, impostas pela sociedade capitalista, fizeram com que a
sociedade passasse a se constituir em "problema". Diante disso, pensadores ingleses da época
procuraram extrair dessas novas situações temas para a análise e a reflexão, no objetivo de agir, tanto
para manter como para reformar ou modificar radicalmente a sociedade de seu tempo. Isto foi
fundamental para a formação e a constituição de um saber sobre a sociedade. Outra circunstância que
também influenciou e contribui para a formação da sociologia se deve às transformações ocorridas nas
formas de pensamento, originadas pelo Iluminismo.
As transformações econômicas que o ocidente europeu presenciou desde o século XVI,
provocaram modificações na forma de conhecer a natureza e a cultura. A partir daí, o pensamento deixa
de ter uma visão sobrenatural para a explicação dos fatos da natureza e passa a ser substituído pelo uso
da razão.
O emprego sistemático da razão representou um avanço para libertar o conhecimento do
controle teológico, da tradição, da revelação e para a formulação de uma nova atitude intelectual diante
dos fenômenos da natureza e da cultura. Essas novas maneiras de produzir e viver, propiciaram um
visível progresso das formas de pensar e contribuíram para afastar interpretações baseadas em
superstições e crenças infundadas, abrindo conseqüentemente um espaço para a constituição de um
saber sobre os fenômenos histórico-sociais.
Esta crescente racionalização da vida social não era um privilégio somente de filósofos e
homens que se dedicavam ao conhecimento, mas também, do homem comum dessa época, que
renunciava cada vez mais os fatos submetidos às forças sobrenaturais, passando a percebê-los como
produtos da atividade humana, passíveis de serem conhecidos e transformados.
A revolução francesa contribuiu para o surgimento da sociologia na medida em que o objetivo
dessa revolução era mudar a estrutura do Estado monárquico e, ao mesmo tempo, abolir radicalmente a
antiga forma de sociedade; promover profundas inovações na economia, na política, na vida cultural, etc;
além de desferir seus golpes contra a Igreja. Tais atitudes ocasionaram profundos impactos, causando
espanto aos pensadores da época e à própria burguesia, já instalada no poder. Diante disso, esses
pensadores se incumbem à tarefa de racionalizar a nova ordem e encontrar soluções para o estado de
"desorganização" então existente. Mas, para estabelecer esta tarefa seria necessário, segundo eles,
conhecer as leis que regem os fatos sociais e instituir uma ciência da sociedade.
Assim, pensadores positivistas da época concluíram que, para restabelecer a organização e o
aperfeiçoamento na sociedade, seria necessário fundar uma nova ciência. Essa nova ciência assumia,
como tarefa intelectual, repensar o problema da ordem social, ressaltando a importância de instituições
como a autoridade, a família, a hierarquia social, destacando a sua importância teórica para o estudo da
sociedade. A oficialização da sociologia foi, portanto, em larga medida, uma criação do positivismo que
procurará realizar a legitimação intelectual do novo regime.
Foram as idéias desenvolvidas por incontáveis homens e mulheres, ao longo da história
humana, que começa na Mesopotâmia e no Egito a mais de quatro mil anos antes do nascimento de
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Cristo, que reunidas, trabalhadas e revistas, formaram o que hoje temos como CONHECIMENTO em
todas as áreas da vida.
A Sociologia foi o resultado da união de inúmeros pensadores, nas diversas partes do mundo.
Alguns se conheciam, muitos outros nunca se viram. Uns complementando outros, até formar o que
conhecemos como ciência sociológica ou ciência da sociedade ou Sociologia. Destes tantos, quatro
pensadores foram responsáveis por estruturar os fundamentos da Sociologia possibilitando criar três
linhas mestras explicativas, fundadas por eles e aos quais iremos estudar com mais profundidade:
1) a Positivista-Funcionalista, tendo como fundador Auguste Comte e seu principal expoente clássico
Émile Durkheim ( França, 1858 – 1917 ), de fundamentação analítica;
2) a Sociologia Compreensiva iniciada por Max Weber ( Alemanha, 1864 – 1920 ), de matriz teóricometodológica hermenêutico-compreensiva; e
3) a Sociologia dialética, iniciada por Karl Marx ( Inglaterra, 1818 – 1883 ) que mesmo não sendo um
sociológo e sequer se pretendendo a tal, deu início a uma profícua linha de explicação sociológica.
TEÓRICO
PRINCÍPIOS TEÓRICOS
AUGUSTE COMTE
Positivismo
ÉMILE DURKHEIM
Fato Social, Consciência coletiva, Anomia
MAX WEBER
Ação Social
KARL MARX
Modo de produção, mais-valia, acumulação primitiva, alienação,
materialismo histórico, ideologia, luta de classes, materialismo
dialético
EXERCÍCIO 1
1. O que é sociologia?
2. Defina sociologia a partir do Renascimento?
3. O que vem a ser pensamento social?
4. Diferencie Utopia de Sonho?
5. Defina: Sociedade e Poder.
6. Através da Sociologia como se constrói a realidade?
7. Que influencias o iluminismo teve na sociologia?
2. AUGUSTO COMTE
O núcleo da filosofia de Comte radica na idéia de que a sociedade só pode ser
convenientemente reorganizada através de uma completa reforma intelectual do homem. Ele achava que
antes da ação prática, seria necessário fornecer aos homens novos hábitos de pensar de acordo com o
estado das ciências de seu tempo. Por essa razão, o sistema comteano estruturou-se em torno de três
temas básicos: em primeiro lugar, uma filosofia da história com o objetivo de mostrar as razões pelas
quais uma certa maneira de pensar (chamada por ele filosofia positiva ou pensamento positivo) deve
imperar entre os homens. Em segundo lugar, uma fundamentação e classificação das ciências baseadas
na filosofia positiva. Finalmente, uma sociologia que, determinando a estrutura e os processos de
modificação da sociedade permitisse a reforma prática das instituições.
A contribuição principal de Comte à filosofia do positivismo foi sua adoção do método
científico como base para a organização política da sociedade industrial moderna.
O estado positivo corresponde à maturidade do espírito humano. O termo positivo designa o
real em oposição ao quimérico, a certeza em oposição à indecisão, o preciso em oposição ao vago. É o
que se opõe as formas teológicas ou metafísicas de explicação do mundo.
Ex: a explicação da queda de um objeto ou corpo: o primitivo explicaria a queda como uma ação dos
deuses; o metafísico Aristóteles explicaria a queda pela essência dos corpos pesados, cuja natureza os
faz tender para baixo, onde seria seu lugar natural; Galileu, espírito positivo, não indagaria o porquê, não
procuraria as causas primeiras e últimas, mas se contentaria em descrever como o fenômeno da queda
ocorre.
9
Não era apenas quanto ao método de investigação que a filosofia positivista se aproximava das
ciências da natureza. A própria sociedade foi concebida como um organismo constituído de partes
integradas e coesas que funcionavam harmonicamente, segundo um modelo físico ou mecânico. Por
isso o positivismo foi chamado também de organicismo.
2.1. A Filosofia de Augusto Comte
O núcleo da filosofia de Comte radica na idéia de que a sociedade só pode ser
convenientemente reorganizada através de uma completa reforma intelectual do homem. Com isso,
distintingue-se de outros filósofos de sua época como Saint-Simon e Fourier, preocupados também com a
reforma das instituições, mas que prescreviam modos mais diretos para efetivá-la. Enquanto esses
pensadores pregavam a ação prática imediata, Comte achava que antes disso seria necessário fornecer
aos homens novos hábitos de pensar de acordo com o estado das ciências de seu tempo. Por essa
razão, o sistema comteano estruturou-se em torno de três temas básicos. Em primeiro lugar, uma filosofia
da história com o objetivo de mostrar as razões pelas quais uma certa maneira de pensar (chamada por
ele filosofia positiva ou pensamento positivo) deve imperar entre os homens. Em segundo lugar, uma
fundamentação e classificação das ciências baseadas na filosofia positiva. Finalmente, uma sociologia
que, determinando a estrutura e os processos de modificação da sociedade permitisse a reforma prática
das instituições. A esse deve-se acrescentar a forma religiosa assumida pelo plano de renovação social,
proposto por Comte nos seus últimos anos de vida.
2.1.1 O Progresso do Espírito
A filosofia da historia – primeiro tema da filosofia de Comte – pode ser sintetizada na sua célebre
lei dos três estados: todas as ciências e o espírito humano como um todo desenvolvem-se através de três
fases distintas: a teológica, a metafísica e a positiva.
No estado teológico, pensa Comte, o número de observações dos fenômenos reduz-se a poucos
casos e, por isso, a imaginação desempenha papel de primeiro plano. Diante da diversidade da natureza,
o homem só consegue explicá-la mediante a crença na intervenção de seres pessoais e sobrenaturais. O
mundo torna-se compreensível somente através das idéias de deuses e espíritos. Segundo Comte, a
mentalidade teológica visa a um tipo de compreensão absoluta; o homem, nesse estágio de desenvolvimento, acredita ter posse absoluta do conhecimento. Para além dos limites dos seres sobrenaturais, o
homem não coloca qualquer problema, sentindo-se satisfeito na medida em que a possibilidade de
recorrer à intervenção das divindades fornece um quadro para compreensão dos fenômenos que ocorrem
ao seu redor.
Paralelamente às funções de explicação da natureza, a mentalidade teológica desempenharia
também relevante papel de coesão social, fundamentando a vida social. Confiando em poderes
imutáveis, fundados na autoridade, essa mentalidade teria como forma política correspondente a
monarquia aliada ao militarismo.
O estado teológico, para Comte, apresenta-se dividido em três períodos sucessivos: o
fetichismo, o politeísmo e o monoteísmo. No fetichismo, uma vida espiritual, semelhante à do homem, é
atribuída aos seres naturais. O politeísmo esvazia os seres naturais de suas vidas anímicas - tal como
concebidos no estágio anterior - e atribui a animação desses seres não a si mesmos, mas a outros seres,
invisíveis e habitantes de um mundo superior. No monoteísmo, a distância entre os seres e seus
princípios explicativos aumenta ainda mais; o homem, nesse estágio, reúne todas as divindades em uma
só.
A fase teológica monoteísta representaria, no desenvolvimento do espírito humano, uma etapa
de transição para o estado metafísico. Este, inicialmente, concebe “forças” para explicar ficar os
diferentes grupos de fenômenos, em substituição às divindades da fase teológica. Fala-se então de uma
“força física”, uma “força química”, uma “força vital”. Num segundo período, a mentalidade metafísica
reuniria todas essas forças numa só, a chamada “natureza”, unidade que equivaleria ao deus único do
monoteísmo.
O estado metafísico tem, segundo Comte, outros pontos de contato com o teológico. Ambos
tendem à procura de soluções absolutas para os problemas do homem; a metafísica, tanto quanto a
teologia, procura explicar a “natureza íntima” das coisas, sua origem e destino últimos, bem como a
maneira pela qual são produzidas. A diferença reside no fato de a metafísica colocar o abstrato no lugar
do concreto e a argumentação no lugar da imaginação. Nessa perspectiva comteana, o estado metafísico
se caracterizaria fundamentalmente pela dissolução do teológico. A argumentação, penetrando nos
domínios das idéias teológicas, traria à luz suas contradições inerentes e substituiria a vontade divina por
"idéias" ou "forças". Com isso, a metafísica destruiria a idéia teológica de subordinação da natureza e do
10
homem ao sobrenatural. Na esfera política, o espírito metafísico corresponderia a uma substituição dos
reis pelos juristas; supondo-se a sociedade como originária de um contrato, tende-se a basear o Estado
na soberania do povo.
2.1.2. O Pensamento Positivo
O estado positivo caracteriza-se, segundo Comte, pela subordinação da imaginação e da
amamentação à observação. Cada proposição enunciada de maneira positiva deve corresponder a um
fato, seja particular, seja universal. Isso não significa, porém, que Comte defenda um empirismo puro, ou
seja, a redução de todo conhecimento à apreensão exclusiva de fatos isolados. A visão positiva dos fatos
abandona a consideração das causas dos fenômenos (procedimento teológico ou metafísico) e torna-se
pesquisa de suas leis, entendidos como relações constantes entre fenômenos observáveis. Quando
procura conhecer fenômenos psicológicos, o espírito positivo deve visar às relações imutáveis presentes
neles - como quando trata de fenômenos físicos, como o movimento ou a massa; só assim conseguiria
realmente explicá-los. Segundo Comte, a procura de leis imutáveis ocorreu pela primeira vez na história
quando os antros gregos criaram a astronomia matemática. Na época moderna, o mesmo procedimento
invento reaparece em Bacon (1561 - 1626), Galileu (1564 - 1642) e René Descartes (1596 - 1650), os
fundadores da filosofia positiva, para Comte.
A filosofia positiva, ao contrário dos estados teológico e metafísico, considera impossível a
redução dos fenômenos naturais a um só princípio (Deus, natureza ou outro experiência equivalente).
Segundo Comte, a experiência nunca mostra mais do que uma limitada interconexão entre determinados
fenômenos. Cada ciência ocupa-se apenas com certo grupo de fenômenos, irredutíveis uns aos outros. A
unidade que o conhecimento pode alcançar seria, assim, inteiramente subjetiva, radicando no fato de
empregar-se um mesmo método, seja qual for o campo em questão: uma idêntica metodologia produz
convergência e homogeneidade de teorias.
Essa unidade do conhecimento não é apenas individual, mas também coletiva; isso faz da
filosofia positiva o fundamento intelectual da fraternidade entre os homens, possibilitando a vida prática
em comum. A união entre a teoria e a prática seria muito mais íntima no estado positivo do que nos
anteriores, pois o conhecimento das relações constantes entre os fenômenos torna possível determinar
seu futuro desenvolvimento. O conhecimento positivo caracteriza-se pela previsibilidade: “ver para prever”
é o lema da ciência positiva. A previsibilidade científica permite o desenvolvimento da técnica e, assim, o
estado positivo corresponde à indústria, no sentido de exploração da natureza pelo homem. Em suma, o
espírito positivo, segundo Comte, instaura as ciências como investigação do real, do certo e indubitável,
do precisamente determinado e do útil. Nos domínios do social e do político, o estágio positivo do espírito
humano marcaria a passagem do poder espiritual para as mãos dos sábios e cientistas e do poder
material para o controle dos industriais.
2.2. Características do Positivismo
A realidade é formada por partes isoladas, de fatos atômicos; a explicação dos fenômenos se dá
através da relação entre eles; não se interessa pelas causas, mas pelas relações entre os fenômenos;
rejeição ao conhecimento metafísico; há somente um método para a investigação dos dados naturais e
sociais. Tanto um quanto outro são regidos por leis invariáveis.
Em sua Lei dos três estados ou estágios do desenvolvimento intelectual, Comte teoriza que o
desenvolvimento intelectual humano havia passado historicamente primeiro por um estágio teológico, em
que o mundo e a humanidade foram explicados nos termos dos deuses e dos espíritos; depois através de
um estágio metafísico transitório, em que as explanações estavam nos termos das essências, de causas
finais, e de outras abstrações; e finalmente para o estágio positivo moderno. Este último estágio se
distinguia por uma consciência das limitações do conhecimento humano.
LEI DOS TRÊS ESTADOS - características
Estado Teológico
- tudo tem origem no
sobrenatural
- época dos sacerdotes e
militares
- domínio da organização militar
Estado Metafísico
- tudo tem origem na razão, na
natureza e em forças
misteriosas|
- época jurídica
- prevalece a organização
jurídica
Estado Positivo
- ciência substitui a razão, natureza e forças
misteriosas
- época industrial
- predomínio do intelectual, principalmente o
sociólogo|- a economia se junta à sociologia
para, juntas, guiarem os destinos da
organização social
11
Comte tentou também uma classificação das ciências; baseada na hipótese que as ciências
tinham se desenvolvido a partir da compreensão de princípios simples e abstratos, para daí chegarem à
compreensão de fenômenos complexos e concretos.
Assim as ciências haviam se desenvolvido a partir da matemática, da astronomia, da física, e da
química para atingir o campo mais complexo da biologia e finalmente da sociologia.
De acordo com Comte, esta última disciplina, a Sociologia, não somente fechava a série mas
também reduziria os fatos sociais a leis científicas, e sintetizaria todo o conhecimento humano, como
ápice de toda a ciência.
Embora não fosse dele o conceito de sociologia ou da sua área de estudo, Comte ampliou seu
campo e sistematizou seu conteúdo. Dividiu a Sociologia em dois campos principais: Estática social, ou
o estudo das forças que mantêm unida a sociedade; e Dinâmica social, ou o estudo das causas das
mudanças sociais.
2.3. Estudo da Estática Social = Ordem
O estudo da estática social deve ser iniciado com o entendimento do Consenso Social, que é a
interdependência social ou interpenetração dos fenômenos sociais. Segundo Comte os fenômenos
sociais só podem ser estudados em conjunto porque eles são fundamentalmente conexos. E é pelo
Consenso Social que pode existir a Harmonia Social.
A sociedade é composta de unidades chamadas de células sociais. Essas células são famílias e
não indivíduos. A família, portanto, é a verdadeira unidade social por ser a associação mais espontânea
que existe. Ela é a fonte espontânea da educação moral e constitui a base natural da organização
política.
A sociedade deve ser organizada com base no "organismo doméstico", que tem como
características principais:
subordinação - subordinação espontânea da mulher ao homem e dos filhos aos pais
união - a família é possível graças a união de seus membros
cooperação - a sociabilidade no meio familiar é possível graças à cooperação
altruísmo - o sentimento familiar desenvolve o prazer de fazer pelo outro e para o outro.
Toda sociedade deve possuir uma ordem, proveniente dos instintos sociais do indivíduo e que se
manifesta através da família. Essa ordem exige, para sua sobrevivência, de uma autoridade. Na família
essa autoridade é o marido e na sociedade é o governo. Não há sociedade sem governo, nem governo
sem sociedade.
O governo deve manter uma intervenção "universal e contínua" na sociedade, de forma material,
intelectual e moral, para evitar que o progresso a inviabilize. Segundo Comte, o progresso enfraquece a
união e a cooperação, fragilizando a ordem. Essa é a intervenção do "conjunto sobre as partes".
As forças sociais que determinam as estruturas sociais são a material, a intelectual e a moral. A
organização social baseia-se na divisão do trabalho social e na combinação de esforços.
2.4. Estudo da Dinâmica Social = Progresso
Todo estado social é uma conseqüência do passado e uma preparação para o futuro. Não há
espaço para quaisquer vontades superiores. As leis que regem o estado social são leis análogas às leis
biológicas. E exatamente por essa analogia conclui-se que a humanidade caminha para a completa
autonomia, o que ocorrerá quando for ultrapassada a sua etapa metafísica.
Mas nada é eterno! A evolução da sociedade, da mesma forma que no indivíduo, leva-a para o
inevitável caminho da decadência final.
No início a humanidade assumiu a fase teológica ou fictícia, que foi uma fase provisória, mas o
ponto de partida necessário para todo o processo cultural.
A segunda fase é a metafísica ou abstrata, que é transitória, onde os agentes sobrenaturais são
substituídos por força abstratas, entendidas como seres do mundo.
A terceira fase é a positiva, científica ou real, que é a fase definitiva da humanidade, quando o
homem descobre a impossibilidade de obter conhecimentos absolutos e desiste de indagar sobre a
origem e a finalidade do universo, assim como sobre as causas íntimas dos fenômenos. O homem passa
a se preocupar apenas em descobrir as leis efetivas que estabelecem as relações invariáveis de
sucessão e semelhança. Estuda-se as leis a abandona-se a pesquisa das causas.
Problema fundamental do estado positivo: conciliação da ordem com o progresso, que é a
condição necessária ao aparecimento do verdadeiro sistema político. Toda ordem estabelecida deverá
12
ser compatível com o progresso, assim como todo progresso, para ser realizado, deverá permitir as
consolidação da ordem.
Estado Positivo significa o fracasso da Teologia e da Metafísica. Em seguida virá o domínio do
Positivismo e da Sociologia, fazendo surgir a "Religião da Humanidade", com o predomínio do altruísmo e
da harmonia social.
EXERCÍCIO 2
1. Quem foi August Comte e qual sua influência na sociologia?
2. Qual a linha de pensamento de Augusto Comte?
3. O que vem a ser o Positivismo?
3. ÉMILE DURKHEIM
Durkheim viveu numa época de grandes conflitos sociais entre a classe dos empresários e a
classe dos trabalhadores. É também uma época em que surgem novos problemas sociais como favelas,
suicídios, poluição, desemprego etc. No entanto, o crescente desenvolvimento da indústria e tecnologia
fez com que Durkheim tivesse uma visão otimista sobre o futuro cio capitalismo. Ele pensava que todo o
progresso desencadeado pelo capitalismo traria um aumento generalizado da divisão do trabalho social
e, por conseqüência, da solidariedade orgânica, a ponto do fazer com que a sociedade chegasse a um
estágio sem conflitos e problemas-sociais.
Com isso, Durkheim admitia que o capitalismo é a sociedade perfeita; trata-se apenas de
conhecer os seus problemas e de buscar uma solução cientifica para eles. Em outras palavras, a
sociedade é boa, sendo necessário, apenas, "curar as suas doenças".
Tal forma de pensar o progresso de um jeito positivo fez com que Durkheim concluísse que os
problemas sociais entre empresários e trabalhadores não se resolveriam dentro de uma LUTA POLÍTICA,
e, sim, através da CIENCIA, ou melhor, da SOCIOLOGIA. Esta seria, então, a tarefa da SOCIOLOGIA:
compreender o funcionamento da sociedade capitalista de modo objetivo para observar, compreender e
classificar as leis sociais, descobrir as que são falhas e corrigi-las por outras mais eficientes.
E como está estruturada esta sociedade segundo Durkheim?
A estrutura da sociedade é formada pelas esferas política, econômica e ideológica. Estas
esferas formam a estrutura social responsável pela consolidação do Capitalismo.
Ao refletir sobre a sociedade, Durkheim começou a elaborar algumas questões que orientaram
seu trabalho:
1. O que faz uma sociedade ser sociedade?
2. Qual é a relação entre o indivíduo e a sociedade?
3. Como os indivíduos transformam o social ?
4. O social é a superação do individual. Em que momento os indivíduos constituem uma
sociedade?
Uma outra preocupação de Durkheim, assim como outros pensadores, era a formação de uma
ciência social desvinculada das Ciências Naturais. Além disso na emergência do proletariado, era
preciso encontrar formas de controle de tal forma que o indivíduo se integre à ordem. Este princípio será
aplicado na educação.
A contribuição de Durkheim foi de importância fundamental para que a Sociologia adquirisse o
status de ciência, pois ele estuda a sociedade e separa os fenômenos sociais da Psicologia, construindo
um Objeto e um Método.
Na obra ‘As regras do Método Sociológico’ publicada em 1895, definiu o método a ser usado
pela Sociologia e as definições e parâmetros para a Sociologia tornar-se uma ciência, separada da
Psicologia e Filosofia. Ele formulou o tipo de acontecimentos sobre os quais o sociólogo deveria se
debruçar : os fatos sociais. Estes constituiriam o objeto da Sociologia.
3.1. Método Sociológico de Émile Durkheim
1º Regra do Método: tratar o FATO SOCIAL como Coisa.
FATO SOCIAL
não se reduz ao
individual
Durkheim separa o
social do individual e
do orgânico
É coletivo
É representação
Representação
Coletiva
FATO SOCIAL é diferente do
Fato Individual
Individual /
Emocional
e do
Fato Orgânico
Determinação
13
biológica
Para Émile Durkheim, fatos sociais são maneiras de agir, pensar e sentir exteriores ao indivíduo,
dotadas de um poder coercitivo e compartilhadas coletivamente. Variam de cultura para cultura e tem
como base a moral social, estabelecendo um conjunto de regras e determinando o que é certo ou errado,
permitido ou proibido. Não podem ser confundidos com os fenômenos orgânicos nem com os psíquicos,
constituem uma espécie nova de fatos.
3.2. Características de Durkheim
Trés são as características que Durkheim distingue nos Fatos Sociais :
- é geral – se repete em todos os indivíduos. Tem natureza coletiva.
- é exterior - independe da vontade ou adesão consciente do indivíduo. Ex: leis
- é coercitivo2 - se impõe sobre o indivíduo.
Os fatos sociais deveriam ser encarados como coisas, isto é, objetos que, lhe sendo exteriores,
poderiam ser medidos, observados e comparados independentemente do que os indivíduos pensassem
ou declarassem a seu respeito.
Para se apoderar dos fatos sociais, o cientista deve identificar, dentre os acontecimentos gerais
e repetitivos, aqueles que apresentam características exteriores comuns.
Fato Social
existe ANTES
Fato Social
existe DEPOIS
Indivíduo
Por que considerar o Fato Social como coisa?
Para afastar os pré-conceitos, as pré-noções e o individualismo, ou seja, seus valores e
sentimentos pessoais em relação ao acontecimento a ser estudado.
Como se reconhece um fato social?
Pelo poder de coerção que exerce ou que pode exercer sobre os indivíduos, identificado pelas
sanções ou resistências a alguma atitude individual contrária e quando é exterior a ele. Ex: se um aluno
chega no colégio de roupa de praia, ele estará em desacordo com a regra e sofrerá sanção por isso, seja
voltar para casa ou uma advertência por escrito.
O social é o entre nós. Onde se dá a interação, troca.
Indivíduo
social
entre
Indivíduo
As transformações que se produzem no meio social, sejam quais forem as causas repercutem
em todas as direções do organismo social e não podem deixar de afetar mais ou menos, todas as suas
funções.
Durkheim não aceita a idéia que diz ser o social formado de processos psíquicos. Durkheim
afirma que o social não pertence a nenhum indivíduo mas ao grupo que sofre pressões e sansões sendo
obrigado a aceitá-lo.
Partindo do princípio de que o objetivo máximo da vida social é promover a harmonia da
sociedade consigo mesma e com as demais sociedades, e que essa harmonia é conseguida através do
consenso social, a ‘saúde’ do organismo social se confunde com a generalidade dos acontecimentos e
com a função destes na preservação dessa harmonia, desse acordo coletivo que se expressa sob a
forma de sanções sociais.
Quando um fato põe em risco a harmonia, o acordo, o consenso e, portanto, a adaptação e
evolução da sociedade, estamos diante de um acontecimento de caráter mórbido e de uma sociedade
doente.
Coerção: repressão, restrição de direitos, que limita a liberdade de agir individual.
composto de blusa com logotipo do colégio, calça jeans azul e tênis.
2
Ex: a regra da escola é usar uniforme
14
Portanto, normal é aquele fato que não extrapola os limites dos acontecimentos mais gerais de
uma determinada sociedade e que reflete os valores e as condutas aceitas pela maior parte da
população. Patológico é aquele que se encontra fora dos limites permitidos pela ordem social e pela
moral vigente.
Em As regras do método sociológico, escrito em 1894, Durkheim coloca que:
1º) Devemos afastar sistematicamente todas as idéias pré-concebidas ou prenoções ao se estudar um
fato social:
• Idéia é a representação mental de alguém ou coisa concreta ou abstrata.
• Pré-conceber significa antecipar uma idéia, sem saber ao certo o que é. Ex: naquela escola, dizem,
o ensino é fraco; escola pública é sinônimo de má qualidade no ensino; todo político é corrupto, acho que
Roberto gosta de vinho suave.
•
2º) Os fatos sociais devem ser explorados de acordo com os seus aspectos gerais e comuns, evitando
suas manifestações individuais. Ex: Aspectos gerais da dengue: A dengue é uma doença febril aguda,
causada por vírus, de evolução benigna, na forma clássica, e, grave, quando se apresenta na forma
hemorrágica. A manifestação individual da dengue varia de pessoa para pessoa. Uma pessoa pode ter
dengue hemorrágica enquanto outra pode ter dengue simples.
3º) Para explicar um fenômeno social devemos separar dois estudos: o da sua causa e o da sua função.
Ex: Qual a função do administrador na empresa?
4º) A pesquisa da causa que determina o fato social deve ser feita entre os fatos sociais anteriores e
nunca entre os estados de consciência individual.
Ex: Em dada comunidade, há histórico de violência doméstica. Os relatos anteriores e atuais,
determinaram ser a violência doméstica um fato social naquela comunidade e não somente um caso
isolado ou individual.
5º) Devemos buscar a origem primeira de todo processo social de alguma importância na constituição
do meio social interno.
Meio social interno é a família, grupo da escola, o ambiente em que a pessoa se desenvolve. A
interação entre a pessoa e o meio ambiente representa a dinâmica da vida. É um processo de ação e
reação a estímulos positivos ou não e que serão responsáveis pelo despertar ou bloqueio das
potencialidades da pessoa.
Processo social é qualquer mudança ou interação social em que é possível destacar uma
qualidade ou direção contínua ou constante. Produz aproximação (cooperação, acomodação,
assimilação) ou afastamento (competição, conflito).
O Todo se manifesta numa parte. O Todo é mais do que a soma das partes, porque a
consciência coletiva passa pela individualidade mas vai além desta individualidade.
Em seu livro ‘Da divisão do trabalho social’ de 1893, Durkheim reconhecia a existência de
duas consciências. Segundo ele :
"...em cada uma de nossas consciências há duas consciências: uma, que é conhecida por
todo o nosso grupo e que, por isso, não se confunde com a nossa, mas sim com a sociedade
que vive e atua em nós; a outra, que reflete somente o que temos de pessoal e de distinto, e
que faz de nós um indivíduo. Há aqui duas forças contrárias, uma centrípeta e outra
centrífuga, que não podem crescer ao mesmo tempo".
Para Durkheim, o social é modelado pela Consciência Coletiva3, que é uma realidade social
resultante do contato social. Essa consciência difere da consciência individual4, pertencendo a todos
enquanto integrados e a nenhum em particular. Os fenômenos sociais refletem a estrutura do grupo
social que os produz (idéia da Sociologia Moderna).
3
consciência coletiva : conjunto das maneiras de agir, pensar e agir, característica de determinado grupo ou sociedade.
Impõe-se à consciência individual. É a forma moral vigente na sociedade. Ela aparece como regras estabelecidas que delimitam
o valor atribuído aos atos individuais. Ela define o que, numa sociedade, é considerado ‘imoral’, ‘reprovável’ ou ‘criminoso’. A
punição é o meio de voltar a consciência coletiva.
4 consciência Individual : traços de caráter ou temperamento e acúmulo de experiências pesoais que permite relativa
autonomia no uso e adaptação das maneiras de agir, pensar e sentir.
15
Se a sociedade é o corpo, o Estado é o seu cérebro e por isso tem a função de organizar essa
sociedade, reelaborando aspectos da consciência coletiva.
Vimos que a sociedade capitalista esta cheia de problemas.
Durkheim admitia que o Estado é uma instituição que tem o dever do elaborar leis que corrijam
os casos patológicos da sociedade.
Em resumo: Se cabe a Sociologia observar, entender e classificar os casos patológicos,
procurando criar uma nova moral social, cabe ao Estado colocar em pratica os princípios dessa nova
moral.
Neste contexto, a Sociologia e o Estado complementam-se na organização da sociedade para,
na prática, evitarem os problemas sociais. Isso levou Durkheim a acreditar que os sociólogos devessem
ter uma participação direta dentro do Estado.
Para Durkheim, a Sociologia deveria ter ainda por objetivo comparar as diversas sociedades.
Constituiu assim o campo da morfologia social, ou seja, a classificação das espécies sociais.
EXERCÍCIO 3
1. Quem foi Durkheim e qual sua influência na sociologia?
2. O que faz uma sociedade ser sociedade?
3. Qual é a relação entre o indivíduo e a sociedade?
4. Como os indivíduos transformam o social?
5. Qual o método sociológico defendido por Durkheim?
6. O que vem a ser fato social?
7. Defina: Consciência individual e consciência coletiva.
8 Qual a contribuição de Durkheim para a Administração?
4. MORFOLOGIA SOCIAL – AS ESPÉCISES SOCIAIS
⇒ Morfologia: estudo das formas
⇒ Morfologia social: estudo das estruturas ou das formas de vida social; para Durkheim: classificação
das “espécies” sociais (inspiração na biologia)
4.1. Evolução das sociedades
• Ponto de partida: a horda (agrupamento social primitivo, em que todos os membros usufruíam de
condições iguais)
• Evolução: combinações várias, de que resultaram outras “espécies” sociais, identificáveis no passado
e no presente (clãs, tribos, castas etc)
• Trabalho científico de classificação das sociedades:
- procedimento: observação experimental
- resultado: “descoberta” de que o motor de transformação de toda e qualquer sociedade seria a
passagem da solidariedade mecânica para a solidariedade orgânica
Obs. No conceito durkheimiano, o termo solidariedade não tem os significados usuais de fraternidade, ajuda,
assistência, filantropia e outros.
SOLIDARIEDADE → o que liga as pessoas
Basta uma rápida observação do contexto histórico do século XIX, para se perceber que as
instituições sociais se encontravam enfraquecidas, havia muito questionamento, valores tradicionais eram
rompidos e novos surgiam, muita gente vivendo em condições miseráveis, desempregados, doentes e
marginalizados.
Ora, numa sociedade integrada essa gente não podia ser ignorada, de uma forma ou de outra,
toda a sociedade estava ou iria sofrer as consequências.
Durkheim acreditava que a sociedade, funcionando através de leis e regras já determinadas,
faria com que os problemas sociais não tivessem sua origem na economia ( forma pela qual as pessoas
trabalham ), mas sim numa crise moral, Isto é, num estado social em que várias regras de conduta não
estão funcionando. Por exemplo: se a criminalidade aumenta a cada dia é porque as leis que
regulamentam o combate ao crime estão falhando, por serem mal formuladas. A este estado de crise
social onde as leis não estão funcionando, Durkheim denomina patologia social. Por outro lado, os
problemas sociais podem ter sua origem também na ausência de regras, o que por sua vez se
caracterizaria como anomia.
16
Frente a patologia social (regras sociais falhas), cabe à Sociologia captar suas causas,
procurando evitar a anomia (crise total), através da criação de uma nova moral social que supere a velha
moral deficiente.
Na tentativa de “curar” a sociedade da anomia, Durkheim escreve em seu livro “Da divisão do
trabalho social”, sobre a necessidade de se estabelecer uma solidariedade orgânica entre os membros
da sociedade. A solução estaria em, seguindo o exemplo de um organismo biológico, onde cada orgão
tem uma função e depende dos outros para sobreviver, cada membro da sociedade exercer uma função
na divisão do trabalho.
Cada indivíduo ou cidadão será obrigado, através de um sistema de direitos e deveres, e
também sentirá a necessidade, de se manter coeso e solidário aos outros. O importante para ele é que o
indivíduo realmente se sinta parte de um todo, que realmente precise da sociedade de forma orgânica,
interiorizada e não meramente mecânica.
Durkheim através do estudo da solidariedade – apoiando-se em Heráclito ( Grécia em Éfeso
na Jônia, 540 a.C. - 470 a.C. ) e Aristóteles ( Grécia em Estagira, 384–322 a.C.) – vai dizer que há
sempre um processo em direção ao consenso – onde não há conflito.
Durkheim se preocupa com a função do direito e como é trabalhado o consenso e a
solidariedade.
Quando a consciência coletiva é abalada, a punição deve ser aplicada. O indivíduo deve seguir
a consciência coletiva, as regras.
Nas sociedades simples, os indivíduos são a extensão do coletivo, da coletividade. A
consciência individual se dilui, se perde na coletividade. E isso se dá naturalmente.
Nas sociedades complexas, o consenso se dá através do contrato, da contratualidade e tem a
ver com a especialização.
A solidariedade neutraliza uma possível barbárie na civilização.
Como resultado da divisão do trabalho social a sociedade obtém:
1) aumento da força produtiva
2) aumento da habilidade do trabalho
3) permite o rápido desenvolvimento intelectual e material das sociedades
4) integra e estrutura a sociedade mantendo a coesão social e tornando seus membros interdependentes
5) traz equilíbrio, harmonia e ordem devido a necessidade de união pela semelhança e pela diversidade
6) provoca a solidariedade social
-
Durkheim mostra em seu livro que :
a solidariedade é o fundamento da civilização, pois ela interliga as pessoas ;
o trabalho não existe sem solidariedade ;
solidariedade significa função, união, independente de ser boa ou má ;
existem dois tipos de solidariedade : mecânica e orgânica.
EXERCÍCIO 4
1. Como se dá a evolução da sociedade?
2. O que vem a ser a divisão do trabalho?
3. Através da divisão do trabalho como podemos caracterizar a sociedade?
5. DA SOLIDARIEDADE MECÂNIA Á SOLIDARIEDADE ORGÂNICA
5.1. Solidariedade Mecânica: é a solidariedade por semelhança.
Predominante nas sociedades pré-capitalistas (primitivas, antigas, asiáticas, feudais):
- influência marcante do peso coercitivo da consciência coletiva, que moldava os
indivíduos através da família, da religião, da tradição e dos costumes;
- maior independência e autonomia individual em relação à divisão do trabalho social
Os membros da sociedade em que domina a Solidariedade Mecânica estão unidos por laços de
parentesco.
O meio natural e necessário a essa sociedade é o meio natal, onde o lugar de cada um é
estabelecido pela consangüinidade e a estrutura dessa sociedade é simples.
O indivíduo, nessa sociedade, é socializado porque, não tendo individualidade própria, se
confunde com seus semelhantes no seio de um mesmo tipo coletivo.
Na solidariedade mecânica, o direito é repressivo (Penal). Crime é tudo aquilo que diz respeito a
consciência coletiva, ao consenso. O crime é, o rompimento de uma solidariedade social. Todo ato
17
criminoso é criminoso porque fere a consciência comum, que determina as formas de solidariedade
necessárias ao grupo social.
Não reprovamos uma coisa porque é crime, mas sim é crime porque a reprovamos. A
solidariedade social representada pelo Direito Penal é a mais elementar, espontânea e forte.
5.2. Solidariedade Orgânica: é a solidariedade por dessemelhança.
Típica das sociedades capitalistas:
- grande interdependência entre os indivíduos, como resultado da acelerada divisão do trabalho.
Essa interdependência é o principal elo de união social, ao invés das tradições, dos costumes e dos
laços sociais mais estreitos → tendência a uma maior autonomia individual, pela especialização de
atividades
- influência menor da consciência coletiva, portanto.
É fruto das diferenças sociais, já que são essas diferenças que unem os indivíduos pela
necessidade de troca de serviços e pela sua interdependência. Os membros da sociedade onde
predomina a Solidariedade Orgânica estão unidos em virtude da divisão do trabalho social.
O meio natural e necessário a essa sociedade é o meio profissional, onde o lugar de cada um
é estabelecido pela função que desempenha e a estrutura dessa sociedade é complexa. O indivíduo,
nessa sociedade é socializado porque, embora tenha sua individualidade profissional, depende dos
demais e por conseguinte, da sociedade resultante dessa união.
Na solidariedade orgânica, o direito é restitutivo, cooperativo. O Direito Restitutivo cooperativo é
preventivo. Evita, previne a repressão, a dor. O contrato é uma forma de prevenir que a transgressão
seja muito grande. Quanto mais civilizada for uma sociedade, maior o número de contratos dele, que
servirá para prevenir desobediências.
Os costumes são a fonte do direito, mas tudo aquilo que é mais importante para a consicência
coletiva, torna-se direito, regra.
Podemos tornar estes conceitos mais fáceis de serem entendidos a partir de um exemplo:
imaginemos um professor que necessite formar grupos para desenvolver o tema da aula. O professor
pode querer a formação dos grupos a partir de dois critérios: ele pode pedir nos alunos que formem
grupos livremente, a partir da amizade existente entre eles. Uma segunda opção é pedir aos alunos para
formarem grupos de forma que em cada um dos grupos fique uma pessoa que saiba datilografia, uma
outra que saiba desenhar, outra que tenha experiência de redação, e, por fim, uma que domine bem o
conteúdo das aulas que seja o coordenador do grupo.
No primeiro caso, o que uniu os alunos no grupo foi um sentimento, a amizade, de onde
teríamos a solidariedade mecânica. No segundo caso, o que uniu os alunos em grupo foi a
dependência que cada um tinha da atividade do outro: a união foi dada pela especialização das funções,
de onde teríamos a solidariedade orgânica.
Durkheim admite que a solidariedade orgânica é superior à mecânica, pois ao se especializarem
as funções, a individualidade de certo modo, é ressaltada, permitindo maior liberdade de ação.
No grupo formado por amigos, pode acontecer que um elemento discorde muito das opiniões de
outro; este fato pode trazer um conflito que põe em risco a existência do grupo. Nesse caso, os
elementos devem agir do acordo com as idéias comuns do grupo, e não a partir das suas próprias idéias.
Já no grupo onde a união dá-se pela atividade especializada, a individualidade é ressaltada, pois, dentro
da sua atividade, cada um age como bem entende, e aí a divergência de opiniões não põe em causa a
existência do grupo.
EXERCÍCIO 5
1. O que é solidariedade?
2. A partir do pensamento de Durkheim defina solidariedade mecânica e solidariedade orgânica? Qual a
que mais se adequa a sociedade que vivemos?
6. MAX WEBER
Max Weber nasceu e teve sua formação intelectual no período em que as primeiras disputas
sobre a metodologia das ciências sociais começavam a surgir na Europa, sobretudo em seu país, a
Alemanha. Filho de uma família da alta classe média, Weber encontrou em sua casa uma atmosfera
intelectualmente estimulante. Seu pai era um conhecido advogado e desde cedo orientou-o no sentido
18
das humanidades. Weber recebeu excelente educação secundária em línguas, história e literatura
clássica. Em 1882, começou os estudos superiores em Heidelberg; continuando-os em Göttingen e
Berlim, em cujas universidades dedicou-se simultaneamente à economia, à história, à filosofia e ao
direito.
Concluído o curso, trabalhou na Universidade de Berlim, na qual idade de livre-docente, ao
mesmo tempo em que servia como assessor do governo. Em 1893, casou-se e; no ano seguinte, tornouse professor de economia na Universidade de Freiburg, da qual se transferiu para a de Heidelberg, em
1896. Dois anos depois, sofreu sérias perturbações nervosas que o levaram a deixar os trabalhos
docentes, só voltando à atividade em 1903, na qualidade de co-editor do Arquivo de Ciências Sociais
(Archiv tür Sozialwissenschatt), publicação extremamente importante no desenvolvimento dos estudos
sociológicas na Alemanha. A partir dessa época, Weber somente deu aulas particulares, salvo em
algumas ocasiões, em que proferiu conferências nas universidades de Viena e Munique, nos anos que
precederam sua morte, em 1920.
A Sociologia weberiana caracteriza-se por um dualismo racionalismo – irracionalismo:
- Racionalismo: rotina social; estabilidade; tradição; legalidade; continuidade; espírito científico e
pragmático do ocidente, sacrificando a espontaneidade da vida aos cálculos e à seleção dos meios, para
serem atingidos fins previamente escolhidos.
- Irracionalismo: crenças; mitos; sentimentos; ação carismática.
6.1. Ação
Para Weber a sociedade não seria algo exterior e superior aos indivíduos, como em Durkheim.
Para ele, a sociedade pode ser compreendida a partir do conjunto das ações individuais reciprocamente
referidas. Por isso, Weber define como objeto da sociologia a ação social.
O que é ação social?
Para Weber ação social é qualquer ação que o indivíduo faz orientando-se pela ação de outros.
Por exemplo um eleitor. Ele define seu voto orientando-se pela ação dos demais eleitores. Ou seja, temos
a ação de um indivíduo, mas essa ação só é compreensível se percebemos que a escolha feita por ele
tem como referência o conjunto dos demais eleitores.
Assim, Weber dirá que toda vez que se estabelecer uma relação significativa, isto é, algum tipo
de sentido entre várias ações sociais, teremos então relações sociais.
A ação social, é a conduta humana dotada de sentido. O sentido motiva a ação individual.
Para Weber, cada sujeito age levado por um motivo que se orienta pela tradição, por interesses
racionais ou pela emotividade.
O objetivo que transparece na ação social permite desvendar o seu sentido, que é social na
medida em que cada indivíduo age levando em conta a resposta ou reação de outros indivíduos.
A ação social gera efeitos sobre a realidade em que ocorre.
É o indivíduo que através dos valores sociais5 e de sua motivação, produz o sentido da ação
social.
A transmissão destes valores comuns de uma geração para outra é chamada socialização, que é
uma forma inconsciente de coerção social. Ex. de valores sociais: respeito, virgindade, honestidade,
solidariedade, etc.
Só existe ação social quando o indivíduo tenta estabelecer algum tipo de comunicação, a partir
de suas ações, com os demais.
A partir dessa definição, Weber afirmará que podemos pensar em diferentes tipos de ação
social, agrupando-as de acordo com o modo pelo qual os indivíduos orientam suas ações. Assim, ele
estabelece tipos de ação social:
1. Ação tradicional: aquela determinada por um costume ou um hábito arraigado.
2. Ação carismática: inova e inobserva tradições. Funda-se na crença de ser seu autor dotado de
poderes sobre-humanos e sobrenaturais que agem, livremente, sem fazer caso de normas
estabelecidas ou de tradições, estabelecendo novas normas e criando tradições.
3. Ação afetiva: orientada pelas emoções e sentimentos.
Valores: níveis de preferência estabelecidos pelo ser humano para objetos, conhecimentos, comportamentos ou sentimentos,
tenham eles origem individual ou coletiva. Mas todos eles geram algum tipo de conduta, isto é, servem de referência para a
ação. É o valor moral, ético. Os valores sociais são aqueles gerados por um grupo e que contribuem para sua manutenção.
Durkheim atribuiu aos valores a característica de coerção social, ou seja, o poder de induzir pessoas a um determinado
comportamento.
5
19
4. Ação social racional: determinada pelo cálculo racional que coloca fins e organiza os meios
necessários.
5. Ação política: a finalidade ideal da ação política é a instituição e a perpetuação do poder. Para a
instituição e a perpetuação do poder a ação política exerce três tipos de dominação que precisam ser
legitimados: carismática, tradicional e legal.
Weber afirma que a Ciência Social que ele pretende exercitar é uma “Ciência da Realidade”,
voltada para a compreensão da significação cultural atual dos fenômenos e para o entendimento de sua
origem histórica.
O método compreensivo, defendido por Weber, consiste em entender o sentido que as ações
de um indivíduo contêm e não apenas o aspecto exterior dessas mesmas ações.
Se, por exemplo, uma pessoa dá a outra um pedaço de papel, esse fato, em si mesmo, é
irrelevante para o cientista social. Somente quando se sabe que a primeira pessoa deu o papel para a
outra como forma de saldar uma dívida (o pedaço de papel é um cheque) é que se está diante de um fato
propriamente humano, ou seja, de uma ação carregada de sentido. O fato em questão não se esgota
em si mesmo e aponta para todo um complexo de significações sociais, na medida em que as duas
pessoas envolvidas atribuem ao pedaço de papel a função do servir como meio de troca ou pagamento;
além disso, essa função é reconhecida por uma comunidade maior de pessoas.
6.2. Conhecimento
‘O conhecimento são os acontecimentos pensados, racionalizados, não apenas vividos’.
O que é conhecimento?
•
O conhecimento é a relação entre uma consciência e um objeto que se quer conhecer.
•
O conhecimento é o saber acumulado pelo homem através das gerações.
•
O conhecimento é produto da ação e do pensamento ( que gerou a ação ).
Ex: Tive a idéia de fazer um bolo. Não qualquer bolo. Escolhi fazer um bolo de chocolate. A massa que
saiu do forno é o produto da idéia que tive. Meus colegas Clóvis e Andréia, que comeram o bolo, não
pensaram, não tiveram a idéia, não racionalizaram criando a receita.
•
•
•
•
•
O conhecimento pode ser:
concreto: sujeito estabelece relação com objeto individual. Ex: conhecimento que temos de alguém
em particular.
abstrato: relação estabelecida com um objeto geral, universal. Ex: conhecimento que temos do ser
humano, como gênero.
Acontecimentos Pensados: são as idéias que temos das coisas: o pensamento
Antes da ação existe a idéia, o pensamento do que se quer fazer.
O pensamento é organizado com o vocabulário aprendido assim como os conceitos e definições.
As ações exemplificam este conteúdo aprendido racionalmente através da língua ( portuguesa ).
As idéias são os pensamentos organizados.
Definição de idéia: representação abstrata de um ser, de um objeto, elaborada pelo pensamento.
Ex: idéia do que seja belo ( ideal de beleza ).
6.3. Tipo Ideal
O tipo ideal é uma construção do pensamento e sua característica principal é não existir na
realidade, mas servir de modelo para a análise de casos concretos, realmente existentes.
As construções de tipo ideal fazem parte do método tipológico criado por Max Weber. Ao
comparar fenômenos sociais complexos o pesquisador cria tipos ou modelos ideais, construídos a partir
de aspectos essenciais dos fenômenos.
TIPOS IDEAIS DE DOMINAÇÃO:
- Dominação carismática: legitimada pela fé e pelas qualidades sobrenaturais do chefe
- Dominação tradicional: legitimada pela crença sacrossanta na tradição
- Dominação legal: legitimada pelas leis a partir dos costumes e tornado possível pela burocracia,
trazendo a especialização e a organização racional e legal das funções.
6.4. Burocracia
20
O estado moderno, com suas inúmeras atribuições, reclama a existência de uma ampla estrutura
organizacional, constituída por funcionários sujeitos à hierarquia e a regulamentos.
Popularmente, o termo burocracia apresenta em geral uma conotação pejorativa, associada à
lentidão com que se cumprem os trâmites administrativos e à existência de estruturas, um tanto
abstratas, que regem as atividades humanas sem levar em conta as circunstâncias concretas e as
necessidades individuais.
Nas ciências sociais, entretanto, a noção de burocracia define, por um lado, a estrutura
organizativa e administrativa das atividades coletivas, no campo público e privado, e, por outro, o grupo
social constituído pelos indivíduos dedicados ao trabalho administrativo, organizado hierarquicamente, de
forma que seu funcionamento seja estritamente regido por rigorosas regras de caráter interno, emanadas
da legislação administrativa geral.
Foi no século XVIII, com a crescente importância assumida pelos organismos administrativos,
que Jean-Claude Marie Vincent, senhor de Gournay, criou a palavra burocracia, a partir do francês
bureau, "escritório", e do grego kratia, "poder". Somente em fins do século XIX, o tema passou a ser
estudado dentro de uma perspectiva geral.
“O domínio legal é caracterizado, do ponto de vista da legitimidade, pela existência de normas
formais. Do ponto de vista do aparelho, pela existência de um staff administrativo burocrático (grupo
qualificado de funcionários pela aptidão e competência, que assiste a um dirigente em entidades públicas
e privadas)”. Weber, portanto, define a burocracia como a estrutura administrativa, de que se serve o tipo
mais puro do domínio legal.
Segundo Weber, são três as características da burocracia:
A estruturação hierárquica;
O papel desempenhado por cada indivíduo dentro da estrutura; e
A existência de normas reguladoras das relações entre as unidades dessa estrutura.
A divisão do trabalho em áreas especializadas é obtida pela definição precisa dos deveres e
responsabilidades de cada pessoa, considerada não individualmente, mas como um "cargo". Essa
definição de cargo delimita determinadas áreas de competência, que não podem ser desrespeitadas em
nenhuma hipótese, de acordo com os regulamentos pertinentes. Em situações extremas ou anômalas,
recorre-se à consulta "por via hierárquica", ao órgão imediatamente superior.
Essa via, segundo Weber, resulta da absoluta compartimentação do trabalho e da estruturação
hierárquica dos diferentes departamentos, de forma racional e impessoal. A legitimação da autoridade
não é pessoal, nem se baseia no respeito primário à tradição, como nas relações tradicionais entre
superiores e inferiores, mas resulta do reconhecimento da racionalidade e da excelência dos processos
estabelecidos. O respeito e a obediência são devidos não à pessoa, nem sequer à instituição, mas sim ao
ordenamento estabelecido.
Para Weber, a característica básica de todo o sistema burocrático é a existência de
determinadas normas gerais e racionais de controle, que regulam o funcionamento do conjunto de acordo
com técnicas determinadas de gestão, visando o maior rendimento possível.
Na realidade, como reconhece Weber, nem todas as organizações administrativas apresentamse com todas essas características, presentes, no entanto, na grande maioria delas.
EXERCÍCIO 6
1. Qual contribuição de Max Weber para a sociologia?
2. Para Weber o que vem a ser ação social?
3. Quais os tipos de ações sociais prescrito por Weber?
4. O que vem a ser conhecimento?
5. O que vem a ser dominação?
6. A burocracia atrapalha o Estado Moderno? Justifique.
7. KARL MARX
As revoluções burguesas do séc. XVIII se encontravam, no início do séc. XIX, ameaçadas pelas
forças conservadoras do feudalismo em decomposição, representadas pela nobreza e pelo clero
desejosas de restituir o absolutismo e excluir a burguesia do poder político.
As forças revolucionárias eram representadas pela burguesia e pelo crescente proletariado,
ambos descontentes com a situação socioeconômica. O embate dessas forças se fez sentir em 1830 e
1848 nos grandes movimentos liberais e nacionais que, iniciados na França, se estenderam pela Bélgica,
Polônia, Alemanha, Itália, Portugal e Espanha.
21
Em uma Alemanha agitada e cheia de problemas, surgiu o marxismo.
Em 1848, Marx e Engels ( 1820 – 1895 ) escrevem o Manifesto Comunista, formulando suas
idéias a partir da realidade social por eles observada: de um lado o avanço técnico, o aumento do poder
do homem sobre a natureza, o enriquecimento e o progresso; de outro e contraditoriamente, a
escravização crescente da classe operária, cada vez mais empobrecida.
O objetivo de Marx não era apenas contribuir para o desenvolvimento da ciência, mas propor
uma ampla transformação política, econômica e social.
A teoria marxista compõe-se de uma teoria científica, o materialismo histórico e de uma
filosofia, o materialismo dialético.
Marx desenvolve o materialismo histórico, a corrente mais revolucionária do pensamento social
nas conseqüências teóricas e na prática social que propõe. Ele faz uma leitura crítica da filosofia de
Hegel (Alemanha, 1770 – 1831), de quem absorveu e aplicou, de modo peculiar, o método dialético.
Para Hegel, o mundo é a manifestação da idéia. Marx e Engels ao contrário, diz que a matéria
é a fonte da consciência e esta é um reflexo da matéria. Marx diz que:
“A contradição é a fonte de toda a vida. Só na medida em que encerra em si uma
contradição é que uma coisa se move, tem vida e atividade. Só o choque entre o positivo e o
negativo permite o processo de desenvolvimento e o eleva a uma fase mais elevada.”
Naturalmente Marx substitui, do pensamento de Hegel, o espírito ou a idéia, que são os
elementos básicos de sua dialética, pelas relações de produção, pelos sistemas econômicos, pelas
classes sociais, ou seja, pelas condições materiais de existência.
Marx contraria também a Declaração Universal dos Direitos Humanos elaborada no período
iluminista que diz que todos os homens são iguais política e juridicamente e que a liberdade e justiça
eram direitos inalienáveis de todo cidadão. Ele proclama que não existe tal igualdade natural e observa
que o Liberalismo vê os homens como átomos, como se estivessem livres das evidentes desigualdades
estabelecidas pela sociedade. Ele discordará de Durkheim sobre o consenso, dizendo que não existe
consenso, mas sim uma eterna luta de classes.
7.1. MANIFESTO COMUNISTA
MARX, Karl e ENGELS, Friedrich, Manifesto do Partido Comunista – 1848
http://www.culturabrasil.pro.br/manifestocomunista.htm )
O Manifesto sugere um curso de ação para uma revolução socialista através da tomada do
poder pelos proletários.
O Manifesto Comunista faz uma dura crítica ao modo de produção capitalista e na forma como a
sociedade se estruturou através desse modo. Busca organizar o proletário como classe social capaz de
reverter sua precária situação e descreve os vários tipos de pensamento comunista, assim como define
o objetivo e os princípios do socialismo científico.
Marx e Engels partem de uma análise histórica, distinguindo as várias formas de opressão
social durante os séculos e situa a burguesia moderna como nova classe opressora. Não deixa, porém,
de citar seu grande papel revolucionário, tendo destruído o poder monárquico e religioso valorizando a
liberdade econômica extremamente competitiva e um aspecto monetário frio em detrimento das relações
pessoais e sociais, assim tratando o operário como uma simples peça de trabalho. Este aspecto
juntamente com os recursos de aceleração de produção (tecnologia e divisão do trabalho) destrói todo
atrativo para o trabalhador, deixando-o completamente desmotivado e contribuindo para a sua
miserabilidade e coisificação. Além disso, analisa o desenvolvimento de novas necessidades tecnológicas
na indústria e de novas necessidades de consumo impostas ao mercado consumidor.
Afirmam sobre o proletariado: "Sua luta contra a burguesia começa com sua própria existência".
O operariado tomando consciência de sua situação tende a se organizar e lutar contra a opressão e ao
tomar conhecimento do contexto social e histórico onde está inserido, especifica seu objetivo de luta. Sua
organização é ainda maior pois toma um caráter transnacional, já que a subjugação ao capital despojou-o
de qualquer nacionalismo. Outro ponto que legitima a justiça na vitória do proletariado seria de que este,
após vencida a luta de classes, não poderia legitimar seu poder sob forma de opressão, pois defende
exatamente o interesse da grande maioria: a abolição da propriedade (“Os proletários nada têm de seu
para salvaguardar”). A exclusividade entre os proletários conscientes, portanto comunistas, segundo Marx
e Engels, é de que visam a abolição da propriedade privada e lutam embasados num conhecimento
histórico da organização social, são portanto revolucionários. Além disso, destaca que o comunismo não
priva o poder de apropriação dos produtos sociais; apenas elimina o poder de subjugar o trabalho alheio
por meio dessa apropriação. Com o desenvolvimento do socialismo a divisão em classes sociais
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desapareceriam e o poder público perderia seu caráter opressor, enfim seria instaurada uma sociedade
comunista.
Analisam e criticam três tipos de socialismo. O socialismo reacionário, que seria uma forma de
a elite conquistar a simpatia do povo, e mesmo tendo analisado as grandes contradições da sociedade,
olhava-as do ponto de vista burguês e procurava manter as relações de produção e de troca; o socialismo
conservador, com seu caráter reformador e anti-revolucionário; e o socialismo utópico, que apesar de
fazer uma análise crítica da situação operária não se apóia em luta política, tornando a sociedade
comunista inatingível. E fecham com as principais idéias do Manifesto, com destaque na questão da
propriedade privada e motivando a união entre os operários. Acentua a união transnacional, em
detrimento do nacionalismo esbanjado pelas nações, como manifestado na célebre frase: “Proletários de
todo o mundo, uni-vos!”
7.2. Marx e o Materialismo Histórico
Relação do trabalhador com o meio de produção
Em 1859, Marx e Engels publicaram o Prefácio da Contribuição à crítica da economia
política. Neste prefácio está a formulação de uma teoria empírica, fundada na observação de condições
reais do capitalismo emergente e definida como materialismo histórico.
Os conceitos desenvolvidos por Marx em sua teoria são: mercadoria, capital, lei da mais-valia,
classes sociais, Estado e ideologia.
Em seu livro mais importante, O Capital, Marx afirmava que a nossa sociedade aparece
inicialmente como um grande depósito de mercadorias.
Por exemplo: relaciono-me com o padeiro, porque compro seu pão; relaciono-me com o
cobrador do ônibus, pois pago a passagem. Tudo acaba sendo mercadoria. O trabalhador vende sua
capacidade de trabalhar em troca de um salário e assim por diante.
Marx diz que a estrutura da sociedade está fundamentada na mercadoria, ou seja, a sociedade
está estruturada na economia.
Segundo o materialismo histórico, a estrutura econômica de uma sociedade depende da forma
como os homens organizam a produção social de bens. Essa estrutura é a verdadeira base da
sociedade. É o alicerce sobre a qual se ergue a superestrutura jurídica e política e ao qual correspondem
formas definidas de consciência social.
A produção social de bens, segundo Marx, engloba dois fatores básicos: as forças produtivas e
as relações de produção.
As forças produtivas e relações de produção constituem o modo de produção e são as
condições naturais e históricas de toda atividade produtiva que ocorre na sociedade.
O modo de produção da vida material condiciona o processo de vida social, política e espiritual
em geral. Para Marx, o estudo do modo de produção é fundamental para se compreender como se
organiza e funciona uma sociedade. As relações de produção, nesse sentido, são consideradas as
mais importantes relações sociais. As formas de família, as leis, a religião, as idéias políticas, os valores
sociais são aspectos cuja explicação depende, em princípio, do estudo do modo de produção.
A história do homem é portanto, a história do desenvolvimento e do colapso de diferentes modos
de produção. Analisando a história , Marx identificou alguns modos de produção específicos: sistema
comunal primitivo, asiático, antigo, germânico, feudal e modo de produção capitalista. Cada qual
representa passos sucessivos no desenvolvimento da propriedade privada e do advento da exploração
do homem pelo homem.
Em cada modo de produção, a desigualdade de propriedade, como
fundamento das relações de produção, cria contradições básicas com o
desenvolvimento das forças produtivas.
23
Ao se desenvolverem, as forças produtivas da sociedade entram em conflito com as relações
de produção existentes. Estas relações tornam-se, então, obstáculos para as forças produtivas,
nascendo, nesse momento uma época de revolução social.
A mudança da base econômica, gerada pela transformação material das condições econômicas
de produção, provocam revoluções jurídicas, políticas, religiosas, artísticas e filosóficas, que são as
formas ideológicas que servem aos homens não só para tomar consciência deste conflito, como também
para explicá-lo.
Por outro lado jamais aparecem novas relações de produção superiores às antigas antes que as
condições materiais de sua existência se tenham desenvolvido completamente no seio da velha
sociedade.
Marx diz que as desigualdades sociais são provocadas pelas relações de produção do
sistema capitalista, as quais dividem os homens em proprietários e não-proprietários dos meios de
produção. As desigualdades são a base da formação das classes sociais.
Ele não acreditava no consenso de Durkheim, mas sim que a história do homem é a história da
luta de classes, uma luta constante entre interesses opostos. Por outro lado, as relações entre as
classes são complementares, pois uma só existe em relação à outra. Só existem proprietários porque há
uma massa de despossuídos cuja única propriedade é sua força de trabalho, que precisam vender para
assegurar a sobrevivência. As classes sociais são, pois, complementares e interdependentes.
EXERCÍCIO 7
1. Qual contribuição de Karl Marx para a sociologia?
2. O que foi o manifesto comunista?
3. O que vem a ser o materialismo histórico de Marx?
8. A SOCIOLOGIA E A ADMINISTRAÇÃO
A sociologia diferente de outras ciências que estudam o comportamento humano da cada
indivíduo preocupa-se com as pessoas dentro do seu mundo social e cultural.
O homem está divido em grupos e classes sociais que influenciam no seu desenvolvimento
familiar, social ou profissional.
9.3. Teorias Sociológicas
Conforme Silva (2008) As principais teorias para analise científica dos problemas sociais são:
a) Teorias Funcionalistas: Vêem as sociedades como demasiadamente bem integradas e organizadas,
ou seja, o funcionamento de cada elemento tem conseqüências sobre o funcionamento do todo.
b) Teorias de Conflito: O Conflito e uma contingência básica da vida social.
c) Teorias Interacionistas: A vida social está mediada por símbolos e gestos e através dos gestos
simbólicos demonstra-se o estado de espírito, intenções e sentido de ação; e contrariamente, pela leitura
dos gestos dos outros, obtemos um sentido do que eles pensam e como eles comportam-se em certas
situações.
d) Teorias Utilitaristas: Os homens são racionais até o ponto em que ele tem objetivos e finalidades, ou
seja, calculam a relação custo e beneficio.
9.4. Conhecimentos Sociológicos na Administração
O homem desde os primórdios da humanidade sempre viveu em associação, pois na
antiguidade para obter melhores resultados na caça já se dividia em grupos como: os que assustavam os
animais, os que corriam para as armadilhas e finalmente os que matavam os animais.
Mas, à medida que a sociedade humana desenvolvia-se houve a necessidade do esforço em
grupo para atingir objetivo criando-se assim organizações muito simples, mas com o passar dos tempos e
com os desenvolvimentos progressivos, irregulares e desiguais foi surgindo a necessidades de
organizações mais complexas e bem administradas.
Hoje as organizações modernas são o fruto de longa experiência e de estudo cientifico, onde
se aprendeu a unir a habilidade e o entusiasmo dos indivíduos em grupos, dirigir as empresas interferir na
capacidade criadora da pessoa, adaptar e estruturar a corporação para as mudanças e crescimento
animando e inspirando confiança nos membros da organização com seus lideres.
Conclui-se que a sociologia desde as grandes revoluções até os dias de hoje vem mostrandose como essencial para o entendimento da sociedade mundial.
24
O homem é um ser social e precisa encontrar harmonia dentro do seu grupo seja ele familiar,
social, político ou profissional.
As organizações através de seus lideres precisam cada vez mais considerar e respeitar os
desejos e apelos de seus grupos de trabalho para obter melhores resultados em seu desenvolvimento e a
satisfação de todos.
EXERCÍCIOS 9
1. Como podemos ver a Sociologia dentro da Administração?
2. Quais são as teorias sociológicas da administração?
3. A partir dos conhecimentos sociológicos, defina o que é ser líder de uma empresa?
10. O CAPITALISMO E A SOCIEDADE PÓS MODERNA
10.1. Sociedade de Consumo
“Pós-modernidade” é até hoje um conceito pouco aceito ou compreendido. Algumas das
resistências a ele podem ser atribuídas à falta de familiaridade com as obras que abrange e que são
encontráveis em todas as artes: a poesia de John Ashbery, por exemplo, mas também a poesia
conversacional, muito mais simples, lançada nos anos 60 como reação à ironia e complexidade do
modernismo acadêmico; a reação à arquitetura moderna e, em particular, aos monumentais edifícios do
International Style, bem como as construções pop e os tetos de vidro decorado elogiados por Robert
Venturi em seu manifesto Aprendendo com Las Vegas, Andy Warhol e a pop art mas também os mais
recente Hiper-realismo; em música, o apogeu de John Cage, assim como a posterior síntese dos estilos
clássico e “popular” de compositores como Philp Glass e Terry Riley ou, ainda, o rock new wave e punk
de grupos tais como Clash, Talking, Heads e Gang ou Four; no cinema, tudo o que deriva de Godard –
filme e vídeo contemporâneos de vanguarda – além de um novo estilo de filmes comerciais ou ficcionais,
cujo equivalente no romance contemporâneo são as obras de William Burroughs, Thomas Pynchon e
Ishmael Reed, de um lado, e o nouveau roman francês, de outro, que merecem ser citados como
variedades do que se pode chamar pós-modernismo.
Uma lista como esta esclarece duas coisas ao mesmo tempo: primeiro, os casos de pósmodernismo citados acima aparecem, na sua maioria, como reações específicas a formas canônicas da
modernidade, opondo-se a seu predomínio na Universidade, nos museus, no circuito das galerias de arte
e nas fundações. Estes estilos, que no passado foram agressivos e subversivos – o Expressionismo
Abstrato, a grande poesia de Pound, Eliot e Wallace Stevens, o International Style (Lê Corbusier, Frank
Lloyd Wright, Mies), Stravinsky, Joyce, Proust e Thomas Mann -, que escandalarizaram e chocaram
nossos avós, são agora, para a geração que entrou em cena com os anos 60, precisamente o sistema e
o inimigo: mortos, constrangedores, consagrados, são monumentos reificados que precisam ser
destruídos para que algo novo venha a surgir. Isto quer dizer que serão tantas as formas de pósmodernismo quantas foram as formas modernas, uma vez que as primeiras não passam, pelo menos de
início, de reações específicas e locais contra os seus modelos. Obviamente isto não facilita em nada a
discussão da pós –modernidade como algo coerente, porque a unidade deste novo impulso – se é que
tem alguma – não se funda em si mesma mas em relação ao próprio modernismo contra o qual ela
investe.
O segundo traço desta linha do pós-modernismo é a dissolução de algumas fronteiras e
divisões fundamentais, notadamente o desgaste da velha distinção entre cultural erudita e cultura popular
(a dita cultura de massa). Possivelmente esta é, entre todas, a mais desalentadora manifestação da pósmodernidade, sob o ponto de vista universitário – o qual tem tradicionalmente interesses declarados tanto
na preservação de um domínio de cultura qualificada e de elite contra o cerco de filistinismos, do kitsch,
da porcaria, da cultura de Seleções ou dos seriados de TV, quanto na transmissão de técnicas de leitura,
audição e modos de ver difíceis e complexos a seus iniciados. Porém, muitos dos mais recentes pósmodernismos têm se deslumbrado precisamente com todo esse universo da propaganda e dos motéis,
dos luminosos de Las Vegas, do espetáculo noturno e do filme classe B de Hollywwod, da chamada
paraliteratura, como seus vários gêneros padronizados de livros de bolso (terror, romance sentimental,
biografia popular, mistério policial, ficção científica ou visionária). Os autores pós-modernos não “citam”
mais tais “textos” como um Joyce ou um Mahler fariam, mas os incorporam a ponto de ficar cada vez
mais difícil discernir a linha entre arte erudita e formas comerciais.
Outro indício completamente diverso da dissolução dessas velhas categorias de gênero e
linguagem pode se encontrar naquilo que, às vezes, se denomina teoria contemporânea. Na geração
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passada ainda existia o rigor de linguagem da filosofia profissional – os grandes sistemas de Sartre, ou
dos fenomenólogos, a obra de Wittgenstein, a filosofia analítica ou a filosofia da linguagem -, ao lado da
qual se podia distinguir o discurso inteiramente diferente das demais disciplinas universitárias – da ciência
política, por exemplo, da sociologia ou da crítica literária. Hoje, se pratica mais e mais uma espécie de
escrita simplesmente denominada “teoria” que, ao mesmo tempo, é todas e nenhum dessas matérias.
Esta nova espécie de linguagem, associada em geral à teoria francesa, tem se difundido amplamente,
marcando o fim da filosofia como tal. Como, por exemplo, deve ser chamada a obra de Michel Foucault –
filosofia, história, teoria social ou ciência política? É “indecidível”, como se diz nos nossos dias; o que
estou insinuando é que esse tal “discurso teórico” pode perfeitamente ser incluído entre as manifestações
da pós-modernidade.
Cabem aqui algumas palavras sobre o emprego apropriado deste conceito: ele não é apenas
mais um termo para a descrição de determinado estilo. É também, pelo menos no emprego que faço
dele, um conceito de periodização cuja principal função é correlacionar a emergência de novos traços
formais na vida cultural com a emergência de um novo tipo de vida social e de uma nova ordem
econômica – chamada, freqüente e eufemisticamente, modernização, sociedade pós-industrial ou
sociedade de consumo, sociedade dos mídia ou do espetáculo, ou capitalismo multinacional. Podemos
datar esta nova fase do capitalismo a partir do crescimento econômico do pós-guerra nos Estados
Unidos, no final dos anos 40 e começo dos 50, ou então, na França, a partir da instituição da Quinta
República, em 1958. A década de 50, sob muitos aspectos, é o período chave de transição, um período
em que a nova ordem internacional (neocolonialismo, a Revolução Verde, a informatização e a mídia
eletrônica) não só se funda como, simultaneamente, se conturba e é abalada por suas próprias
contradições internas e pela oposição externa. Gostaria de esboçar aqui alguns modos pelos quais a pósmodernidade nova expressa a verdade interior desta ordem social emergente do capitalismo tardio. Vou
limitar a descrição a somente dois de seus traços mais significativos, os quais passo a denominar
pastiche e esquizofrenia; eles oferecem ocasião pra sentirmos a especificidade da experiência pósmoderna do espaço e do tempo, respectivamente.
Uma das práticas ou traços mais importantes da pós-modernidade de hoje é o pastiche.
Preciso primeiro explicar este termo que as pessoas tendem em geral a confundir ou a assimilar ao
fenômeno verbal afim que é a paródia. Tanto pastiche quanto paródia envolvem imitação ou, melhor
ainda, o mimetismo de outros estilos, particularmente dos maneirismos e tiques estilísticos de outros
estilos. É óbvio que a literatura moderna em geral oferece campo especial fértil para a paródia, visto que
os grandes escritores modernos têm em sua totalidade se sobressaído pela invenção ou produção de
estilos preferencialmente singulares: cite-se a frase longa faulkneriana ou o conjunto de imagens da
natureza tão característico de D. H. Lawrence; cite-se o modo peculiar de Wallace Stevens empregar
abstrações; citem-se também os maneirismos dos filósofos, de Heidegger, por exemplo, ou Sartre; citemse os estilos musicais de Mahler ou Prokofiev. Estes estilos todos diferem um do outro, e contudo, são
comparáveis nisto: cada um é absolutamente inconfundível; uma vez identificado provavelmente não se
deixa mais confundir com qualquer outro.
Assim sendo, a paródia se aproveita da singularidade destes estilos para incorporar suas
idiossincrasias e singularidades e criar uma imitação que simula o original. Não estou querendo dizer que
o impulso satírico seja deliberado em todas as formas de paródia. De qualquer maneira, um bom
parodista precisa ter uma certa simpatia tácita pelo original, tal como um excelente mímico precisa ter a
capacidade de se colocar na pessoa imitada. Todavia, o efeito geral da paródia é – quer simpática quer
maledicente – ridicularizar a natureza privada destes maneirismos estilísticos bem como seu exagero e
sua excentricidade em relação ao modo como as pessoas normalmente falam e escrevem. Assim, subjaz
à paródia o sentimento de que existe uma norma lingüística, pro oposição à qual os estilos dos grandes
modernistas podem ser arremedados.
Porém, o que aconteceria se ninguém mais acreditasse na linguagem normal, na fala comum,
na norma lingüística (uma espécie de precisão e de força comunicativas elogiadas por Orwell em seu
famoso ensaio)? Podemos considerar esta situação da seguinte maneira: talvez a imensa fragmentação e
privatização da literatura moderna – sua explosão em um bando de estilos privados e maneirismos
distintos – prefigurem tendências mais gerais e profundas da vida social como um todo. Suponhamos que
realmente a arte moderna e o modernismo – longe de serem uma curiosa especialização estética –
tenham antecipado desenvolvimentos sociais nesta direção; e que nas décadas que se seguiram à
emergência dos grandes estilos modernos a sociedade tenha começado a se fragmentar neste sentido –
cada grupo passando a falar uma curiosa linguagem privada própria, cada profissão passando a
desenvolver seu idioleto ou código privado e, por fim, cada indivíduo passando a ser uma espécie de ilha
lingüística, cindido dos demais. Se este for o caso, a própria possibilidade de uma norma lingüística por
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meio da qual pudéssemos escarnecer as linguagens privadas e os estilos idiossincráticos teria sumido, e
só disporíamos então da diversidade e da heterogeneidade estilísticas.
É este o momento em que o pastiche aparece e a paródia se torna impossível. O pastiche é,
como a paródia, a imitação de um estilo singular ou exclusivo, a utilização de uma máscara estilística,
uma fala em língua morta: mas a sua prática desse mimetismo é neutra, se as motivações ocultas da
paródia, sem o impulso satírico, sem a graça, sem aquele sentimento ainda latente de que existe uma
norma, em comparação com a qual aquilo que está sendo imitado é, sobretudo, cômico O pastiche é
paródia lacunar, paródia que perdeu seu senso de humor: o pastiche está para a paródia assim como
aquela coisa curiosa, a prática moderna de uma espécie de ironia branca, está para o que Wayne Booth
chama as ironias cômicas e estáveis, isto é, as ironias do século XVIII.
Agora, porém, convém introduzir uma nova peça neste quebra-cabeça que pode nos auxiliar a
explicar por que a modernidade clássica é coisa do passado e por que a pós-modernidade ocuparia seu
lugar. Este componente novo é o que geralmente se costuma chamar a “morte do sujeito” ou, em
expressão mais tradicional, o fim do individualismo como tal. Os grandes modernismos estavam, como
dissemos, ligados à invenção de um estilo pessoal e privado, tão inconfundível como a nossa impressão
digital, tão incomparável como nosso próprio corpo. Porém, isso significa que a estética da modernidade
estava, de certo, organicamente vinculada à concepção de um eu singular e de uma identidade privada,
uma personalidade e uma individualidade únicas, das quais se podia esperar o engendramento de sua
visão singular de mundo, forjada em seu próprio estilo, singular e inconfundível.
Contudo, hoje, a partir das mais distintas perspectivas, os teóricos sociais, os psicanalistas,
mesmo os lingüistas, para não mencionar aqueles que como nós trabalham na área da cultura e das
mudanças formais e culturais, estão todos investigando a hipótese de que esse tipo de individualismo e
de identidade pessoal é coisa do passado; de que o antigo indivíduo ou o sujeito individualista está
“morto”; de que podemos considerar o conceito de indivíduo singular e a própria base teórica do
individualismo como ideológica. De fato, existem duas posições sobre esta questão, uma mais radical que
a outra. A primeira se contenta em afirmar: sim, em tempos idos, na era clássica do capitalismo
competitivo, no apogeu da família nuclear e na ascensão da burguesia como classe social hegemônica,
existia isso que se chama individualismo, existiam sujeitos individuais. Mas hoje, na era do capitalismo
corporativo, do assim chamado homem da organização, das burocracias empresariais e estatais, da
explosão demográfica – hoje não mais existe o velho sujeito individual burguês.
Há também uma segunda posição, a mais radical, que pode ser considerada a posição pósestruturalista. Acrescenta: o sujeito individual burguês não é somente coisa do passado como também
não passa de um mito, antes de mais nada ele nunca existiu realmente; nunca existiram sujeitos
autônomos desse tipo. Este construto não passaria, mais precisamente, de uma mistificação filosófica e
cultural que procurava persuadir as pessoas de que elas “tinham” sujeitos individuais e possuíam tal
identidade pessoal singular.
Para nossos propósitos, não é particularmente importante decidir qual dessas posições é a
correta (ou melhor, qual delas é mais produtiva e interessante). Ao invés, o que precisamos reter é um
dilema estético: se está esgotada a experiência e a ideologia do eu singular, um experiência e uma
ideologia que sustentavam a prática estilística da modernidade clássica, já fica claro o que artistas e
escritores do período atual afinal estariam fazendo. Fica claro, contudo, que os modelos mais antigos –
Picasso, Proust, T. S. Eliot – não funcionam mais ( ou são propriamente nocivos), visto que ninguém mais
possui essa espécie de mundo privado e único, nem um estilo para expressa-lo. E isto talvez não seja
uma questão apenas “psicológica”: temos também de levar em conta o peso imenso de setenta ou oitenta
anos da própria modernidade clássica. Há mais uma razão pela qual os artistas e os escritores do
presente não conseguirão mais inventar novos estilos e mundos – é que todos estes já foram inventados;
o número de combinações possíveis é restrito; os estilos mais singulares já foram concebidos. Assim, a
influência da tradição estética de modernidade – agora morta – “pesa como um pesadelo sobre o cérebro
dos vivos”, como dizia Marx em contexto diferente.
Daí, repetimos, o pastiche: no mundo em que a inovação estilística não é mais possível, tudo o
que restou é imitar estilos mortos, falar através de máscaras e com as vozes dos estilos do museu
imaginário. Mas isto significa que a arte pós-moderna ou contemporânea deverá ser arte sobre arte de
um novo modo; mais ainda, isto significa que uma de suas mensagens essenciais implicará
necessariamente a falência da estética e da arte, a falência do novo, o encarceramento no passado.
Como isto talvez pareça muito abstrato, desejo apresentar alguns exemplos, um dos quais é
tão presente que, raramente, ocorreria relacioná-lo ás várias manifestações da arte erudita aqui discutida.
Esta prática específica do pastiche não é “culta”, mas existe no próprio interior da cultura de massa e é
genericamente conhecida como o “filme de nostalgia” (o que os franceses com precisão denominam la
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mode rétro). Temos de imaginar esta categoria da maneira mais ampla possível: não há dúvida que, em
termos estritos, ela consiste tão somente de filmes sobre o passado e sobre momentos geracionais deste
passado. Assim, um dos filmes que inauguraram este novo “gênero” (se chegar a tanto) foi American
Graffiti, de George Lucas, que, em 1973, procurou resgatar toda a atmosfera e as singularidades
estilísticas dos anos 50 nos Estados Unidos, dos Estados Unidos da era de Eisenhower. Chinatown, o
conhecido filme de Polanski, procede da mesma maneira em relação aos anos 30, assim como faz O
conformista de Bertolucci para o contexto italiano e europeu da mesma época – a era fascista na Itália –
etc. Poderíamos passar horas enumerando estes filmes: por que chamá-los pastiche? Não seriam antes
obras pertencentes a um gênero mais tradicional, conhecido como filme histórico – obras que talvez
pudessem ser mais facilmente analisadas pela ampliação, desta outra forma bastante conhecida que é a
do romance histórico?
Temos razões em julgar que precisamos de novas categorias para tais filmes. Permitam-me,
antes, cometer um disparate: digamos que eu seja de opinião que Guerra nas Estrelas é também um
filme de nostalgia. O que significaria isto? Presumo que possamos estar de acordo quanto ao fato de que
ele não é um filme histórico sobre nosso próprio passado intergaláctico. Permitam-me colocá-lo de modo
um pouco diferente: numa das experiências culturais mais importantes para as gerações que cresceram
entre os anos 30 e 50 era o seria da vesperal de sábado tipo Buck Rogers – vilões de mundos
desconhecidos, verdadeiros heróis americanos, heroínas em apuros, o raio da morte ou a caixa do fim do
mundo, e a atribulação à beira do abismo, no instante final, cujo miraculoso desenlace haveria de ser
visto no sábado seguinte. Guerra nas Estrelas reinventa esta experiência sob a forma do pastiche: isto é,
não mais existe qualquer motivação para uma paródia de tais seriados, pois eles acabaram há muito
tempo. Guerra nas Estrelas, ao contrário de uma sátira insossa dessas formas já mortas, satisfaz um
anseio profundo (talvez dissesse mesmo reprimido) de vivê-las novamente: é um objeto complexo através
do qual, em um plano primeiro, crianças e adolescentes podem fruir plenamente as aventuras, enquanto
o público adulto pode saciar um desejo mais profundo e propriamente nostálgico de retornar àquele
período antigo, de viver uma vez mais suas estranhas engenhocas estéticas do passado. Este é, pois,
metonimicamente, um filme histórico: não reinventa, diferentemente de American Graffiti, uma imagem do
passado em sua totalidade vivida; ao contrário, ele reinventa a sensação e a forma dos objetos de arte
característicos de uma época passada (os seriados), procurando despertar um sentido do passado que
se associa a tais objetos. Por sua vez, Caçadores da Arca Perdida ocupa uma posição intermediária: em
certa medida é sobre os nos 30 e 40, mas na verdade também concebe metonimicamente esse período,
mediante suas mais características estórias de aventura (que não são mais as nossas).
Permitam-me, agora, discutir mais uma interessante anomalia que pode nos levar adiante
nesta compreensão do filme de nostalgia em particular e do pastiche em geral. Nesta anomalia inclui-se
um filme recente chamado Corpos Ardentes (Body Heat), o qual, como foi bastante assinado pelos
críticos, é uma espécie de refilmagem remota de O Destino Bate à Porta (The Postman Always Rings
Twice) ou Pacto de Sangue (Double Indemnity) (a cópia alusiva e factícia de velhas tramas não passa de
outro traço de pastiche). Além disso, Corpos Ardentes não é, rigorosamente, um filme de nostalgia, uma
vez que se passa em cenário contemporâneo, numa pequena cidade da Flórida, perto de Miami. Por
outro lado, sua contemporaneidade no detalhe específico é, no fundo, ainda mais ambígua: os créditos –
sempre nossa primeira pista – estão desenhados com letras em estilo art déco dos anos 30, o que não
pode senão estimular reações nostálgicas (primeiramente a Chinatown, sem dúvida, mas também a
alguma referência histórica além do filme). Afinal, o próprio estilo do herói é ambíguo: William Hurt é um
novo astro, mas que não tem nada do inconfundível estilo da geração precedente de superestrelas (Steve
McQueen ou mesmo Jack Nicholson), melhor ainda, sua máscara aqui é uma espécie de mescla de
características desses últimos com o papel mais antigo de um tipo em geral associado a Clark Gable.
Há, portanto, uma tênue sensação de arcaísmo em relação a tudo. O espectador começa a se
perguntar por que esta estória, que poderia se passar em qualquer parte, ambienta-se em uma
cidadezinha da Flórida, a despeito de suas referências contemporâneas. Após um certo tempo, começase a perceber que o cenário interiorano tem uma função estratégica crucial: permitir que o filme prescinda
da maioria dos sinais e referências que pudessem ser associados ao mundo contemporâneo, à
sociedade de consumo – utensílios, artefatos, especulações, o mundo material do capitalismo avançado.
Em termos precisos, então, seus objetos (carros, por exemplo) são produtos dos anos 80, mas tudo no
filme conspira pra borrar essa referência imediata e contemporânea, possibilitando sua aceitação, como
uma obra de nostalgia também – como uma ambientação da narrativa em algum passado nostálgico
indefinível, uma década de 30 eterna, digamos, fora da história. Parece-me extremamente sintomático
constar que o estilo dos filmes de nostalgia esteja invadindo e colonizando até mesmo os filmes atuais
que têm cenários contemporâneos: Como se, por alguma razão, fôssemos hoje incapazes de focalizar
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nosso próprio presente, como se tivéssemos nos tornando inaptos para elaborar representações estéticas
de nossa própria experiência corrente. Se for este o caso, trata-se de uma terrível incriminação à própria
sociedade capitalista de consumo – ou, quando menos, de um sintoma alarmante e patológico de uma
sociedade que se tornou incapaz de se relacionar com o tempo e a história.
Voltemos, assim, à questão: por que o filme de nostalgia ou o pastiche precisam ser
distinguidos do filme ou romance histórico antigo? (O melhor exemplo literário para toda essa discussão,
a meu ver, os romances de E. L. Doctorow – Ragtime , com sua atmosfera de passagem de século, e
Loon Lake, cuja maior parte transcorre nos anos 30. Mas estes, a meu ver, não são romances históricos
senão pela aparência. Doctorow é um artista sério e um dos poucos romancistas radicais, genuinamente
de esquerda, em ação hoje em dia. Não é nenhum desserviço a ele, contudo, sugerir que suas narrativas
representam menos o nosso passado histórico do que as nossas idéias ou estereótipos culturais sobre
esse mesmo passado.) A produção cultural foi empurrada para o interior da mente, para dentro do sujeito
monádico: já não mais fita diretamente, com seus próprios olhos, o mundo real à procura do referente;
como na caverna de Platão, ela é forçada a buscar as suas imagens mentais do mundo nas paredes de
seu confinamento. O realismo que nos resta é um “realismo” que decorre da captação – chocante – deste
confinamento e da consciência viva de que, por razões especiais de algum tipo, nos vemos condenados a
buscar o passado histórico através de nossas imagens pop e de nossos estereótipos a seu respeito,
sendo que o próprio passado permanece, para sempre fora de alcance.
Desejo agora retornar ao que considero o segundo traço básico da pós-modernidade, a saber,
sua específica relação com o tempo – o que se poderia chamar “textualidade” ou écriture – mas que eu
prefiro discutir em termos das teorias correntes da esquizofrenia. Antecipadamente quero refutar
possíveis equívocos quanto ao emprego feito aqui desta palavra: sua intenção é descritiva, e não
diagnóstica. Nunca me ocorreu que alguns dos artistas pós-modernos mais significativos – John Cage,
John Ashberry, Philippe Solers, Robert Wilson, Andy Warhol, Ishmael Reed, Michael Snow e mesmo o
próprio Samuel Beckett – sejam de alguma maneira esquizofrênicos. Nem se trata de um diagnóstico do
tipo cultura e personalidade de nossa sociedade de sua arte: obviamente há coisas mais
comprometedoras a dizer contra o nosso sistema social do que permite o uso de uma psicologia de
almanaque. Nem estou seguro de que a teoria da esquizofrenia que vou esboçar – uma teoria
amplamente desenvolvida na obra do psicanalista francês Jacques Lacan – é clinicamente precisa; o que
pouco importa aos meus propósitos.
A originalidade do pensamento de Lacan neste campo está no fato de haver considerado a
esquizofrenia substancialmente como uma desordem de linguagem, associando-a a toda uma teoria da
aquisição da linguagem como o elo esquecido da concepção freudiana da formação do psiquismo adulto.
Para tanto, ele nos dá uma versão lingüística do complexo de Édipo, segundo a qual a rivalidade edipiana
é interpretada não em temos do indivíduo biológico, o rival das atenções maternas, mas em termos
daquilo que ele chama Nome do Pai, a autoridade paterna agora considerada como função lingüística. O
que precisamos extrair disso é a idéia de que a psicose e, mais particularmente, a esquizofrenia a partir
da deficiência infantil em aceder plenamente ao domínio da fala e da linguagem.
Quanto à linguagem, o modelo lacaniano é um modelo estruturalista ortodoxo, baseado em
uma concepção do signo lingüístico dotada de dois (ou talvez três ) componentes. Um signo, uma
palavra, um texto são aqui modelizados conforme o relacionamento de um significante – uma
materialidade, o som de uma palavra, a escrita de um texto – com um significado, o sentido da
materialidade da palavra ou do texto. O terceiro componente seria o assim chamado “referente”, o objeto
“real” do mundo “real” ao qual o signo remete – o gato real em oposição ao conceito de gato ou ao som
“gato”. Ocorre porém que existe em geral no estruturalismo uma tendência de tratar esta referência como
uma espécie de mito, de tal modo que ninguém possa mais falar sobre o “real” de forma objetiva e
exterior. Assim, o que nos resta é o próprio signo e seus dois componentes. Ao mesmo tempo, o
estruturalismo trata de refutar a velha concepção da linguagem como nomeação (e.g. Deus deu a
linguagem a Adão com a finalidade nomear os animais e as plantas do Éden), a qual envolve uma
correspondência termo a termo de cada significante com cada significado. Ao adotar uma visão estrutural,
com razão anotamos que frases não funcionam desse modo: não traduzimos uma a uma as palavras ou
significantes em termos de seu significado. Pelo contrário, o que lemos é a frase inteira, e é do interrelacionamento de suas palavras ou significantes que se deduz uma significação mais global –
denominada agora um “efeito de sentido”. O significado – talvez mesmo a ilusão ou a miragem do
significado e do sentido em geral, é um efeito produzido pelo inter-relacionamento das materialidades
significantes.
Tudo isso nos coloca em condições de compreender a esquizofrenia como um distúrbio do
relacionamento entre significantes. Para Lacan, a experiência da temporalidade, da temporalidade
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humana (passado, presente e memória), a persistência da identidade pessoal através de meses e anos, a
própria sensação vivida e existencial do tempo, são também um efeito de linguagem. Porque a linguagem
possui um passado e um futuro, porque a frase se instala no tempo, é que nós podemos adquirir aquilo
que nos dá a impressão de uma experiência vivida e concreta do tempo. Mas já o esquizofrênico não
chega a conhecer dessa maneira a articulação da linguagem, nem consegue ter a nossa experiência de
continuidade temporal tampouco, estando condenado, portanto, a viver em um presente perpétuo, com o
qual os diversos momentos de seu passado apresentam pouca conexão e no qual não se vislumbra
nenhum futuro no horizonte. Em outras palavras, a experiência da materialidade significante isolada,
desconecta e descontínua, eu não consegue encadear-se em uma seqüência coerente. O esquizofrênico
não consegue desse modo reconhecer sua identidade pessoal no referido sentido, visto que o sentimento
de identidade depende de nossa sensação da persistência do “eu” e de “mim” através do tempo.
Por outro lado, o esquizofrênico vivencia mais do que nós, e com nitidez, uma experiência
muito mais intensa de um definido instante do mundo, pois nosso próprio presente é sempre parte de
algum conjunto mais amplo de projetos, o que nos obriga a focalizar e a selecionar nossas percepções.
Em outras palavras, não receptamos o mundo exterior globalmente como uma visão indiferenciada:
estamos sempre empenhados em utilizá-lo, sempre enveredamos por ele, sempre atentamos neste ou
naquele objeto ou pessoa que nele está. Contudo, o esquizofrênico não só é “ninguém” por não ter uma
identidade pessoal, como seu desempenho é nulo, pois ter projeto significa estar apto a se envolver com
alguma continuidade futura. O esquizofrênico está sujeito desse modo a uma visão indiferenciada do
mundo no presente, uma experiência que não é de modo algum agradável:
Eu me lembro muito bem o dia em que aconteceu. Passávamos uma temporada no campo e
eu tinha ido sozinha passear como sempre fazia. De repente, ao passar pela escola, ouvi uma
canção alemã, as crianças estavam tendo uma aula de canto. Fiquei escutando parada e
naquele instante um estranho sentimento me percorreu, um sentimento difícil de precisar mas
parecido com aquilo eu depois eu haveria de conhecer muito bem – uma desnorteante
sensação de irrealidade. Eu me sentia como se nunca tivesse visto a escola, ela se tornara tão
grande quanto um quartel; as crianças que cantavam eram prisioneiros, forçados a cantar. Era
como se a escola e a canção das crianças estivessem separadas do resto do mundo. Ao
mesmo tempo meu olhar se deparou com um trigal cujos limites não dava para discernir. A
vastidão amarela, ofuscando ao sol, juntamente com a cantiga das crianças aprisionadas no
quartel-escola de pedra lisa encheram-me de tal angústia que desatei a chorar. Voltei correndo
para nosso jardim e comecei a brincar de “transformar as coisas naquilo que elas são”, brincar
de voltar à realidade, em suma. Foi a primeira manifestação daqueles elementos que viriam
sempre a estar presentes em posteriores sensações de irrealidade: vastidão sem limites, luz
brilhante, superfície lisa e cintilante das coisas. (Renee Sechebaye, Autobiografia de uma
Moça Esquizofrênica.)
Notem com as continuidades temporais são quebradas, a experiência do presente torna-se
assoberbante e poderosamente vívida e “material”: o mundo surge ante o esquizofrênico com alta
intensidade, contendo uma misteriosa sobrecarga afetiva, resplandecendo de energia alucinatória.
Porém, o que parecia uma experiência das mais desejáveis – um aumento de nossas percepções, uma
intensificação libidinal ou alucinógena de nosso ramerrão normal e de nossas situações comuns – é
sentido aqui como perda, como “irrealidade”.
O que desejo sublinhar, contudo, é precisamente o modo pelo qual o significane isolado se
torna sempre mais material – ou, melhor ainda literal -, sempre mas vívido em termos sensórios, quer a
nossa experiência seja atraente quer atemorizante. A mesma coisa pode ser demonstrada no domínio da
linguagem: o que o distúrbio esquizofrênico da linguagem faz a cada palavra remanescente é reorientar o
sujeito ou o falante a dirigir uma atenção ainda mais literalizante para cada uma delas. Ao passado que,
na fala normal, procuramos penetrar a materialidade das palavras (suas estranhas sonoridades, sua
aparência impressa, meu timbre de voz e especial acento, e assim por diante) em direção ao seu sentido.
Ultrapassado o sentido, a materialidade das palavras se torna obsessiva, como ocorre quando crianças
repetem sem cessar uma mesma palavra até seu sentido desaparecer e ela adquirir um fascínio
ininteligível. Para retomar nossa descrição anterior um significante que perdeu seu significado se
transforma com isso em imagem.
Esta longa digressão sobre esquizofrenia nos permite acrescentar agora um dado que não
podia ser tratado em nossa exposição anterior, a saber, a própria temporalidade. Para tanto, devemos
desviar nossa discussão da pós-modernidade das artes visuais para as artes temporais para música,
poesia e certas modalidades de textos narrativos como os de Beckett. Alguém que já ouviu a música de
John Cage pode perfeitamente ter vivenciado uma experiência similar àquelas que acabamos de evocar:
frustração e desespero a audição de um único acorde ou nota seguidos de um silêncio tão longo que a
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memória não pode mais reter aquilo que acabou de ouvir; enfim, um silêncio condenado ao esquecimento
a cada novo e estranho presente sonoro, o qual também vai desaparecer. Esta experiência podia ser
ilustrada com muitos tipos de produção cultural contemporânea. Selecionei um texto de um poeta mais
jovem, em parte porque seu “grupo” ou “escola”, conhecido como Poetas da Linguagem, tem feito
experimentos de várias naturezas com a descontinuidade temporal (aqui descrita em termos da
linguagem esquizofrênica), o que é fundamental tanto para sua experimentação lingüística quanto para
aquilo que eles gostam de chamar “Frase Nova”. É um poema de Bob Perelman intitulado “China”
(incluído na sua recente antologia Primer , publicada por This Press, de Berkeley, Califórnia):
Vivemos no terceiro mundo a contar do
sol. Número três. Ninguém manda em nós.
As pessoas que nos ensinaram a contar
estavam sendo muito bondosas.
Sempre é hora de cair fora.
Em caso de chuva, você tem ou não tem
o guarda-chuva.
O vento leva embora seu chapéu.
O sol também se levanta.
Preferia que as estrelas não nos
descrevessem uma às outras, preferia
que a gente fizesse isto por nossa conta.
Corra na frente de sua sombra.
Uma irmã eu aponta para o céu pelo
menos uma vez a cada década é uma boa irmã.
Paisagem motorizada.
O trem te leva aonde ele for.
Pontes no meio da água.
Gente se arrastando ao longo de
vastas áreas de concreto, caminhando para o avião.
Não esqueça o estado em que o seus
sapatos e chapéu ficarão quando você não estiver por perto.
Até as palavras flutuando no ar têm sombras azuis.
Comemos se for gostoso.
As folhas caindo. Olhe as coisas ali.
Perceba o lance.
Sabe o que aconteceu? O que? Aprendi a falar. Ótimo.
Uma pessoa com a cabeça cortada caiu no choro.
Após cair, o que é que a boneca podia fazer? Nada.
Vá dormir.
Você está demais de short. E a bandeira
Também está demais.
Todo mundo vibrou com as explosões.
Hora de acordar.
Melhor é se acostumar aos sonhos.
Naturalmente é possível objetar que isto não é uma escrita esquizofrênica no sentido clínico,
parece inexato afirma que estas frases sejam materialidades significantes pairando livremente, cujos
significados tenham evaporado. Realmente, existe aqui um sentido global. Na verdade, na medida em
que este é, de um jeito velado e estranho, um poema político, parece mesmo captar algo da emoção da
imensa e inacabada experiência social da nova China, sem paralelo na história mundial: o surgimento
imprevisto, entre as duas superpotências, do “número três”; a novidade de um mundo material
completamente nov, produzido por seres humanos com pleno domínio de seu próprio destino coletivo; a
experiência marcante de uma coletividade que, acima de tudo, se tornou um novo “sujeito da história” e
que, após longa sujeição ao feudalismo e ao imperialismo, fala em seu próprio nome, por si mesma, pela
primeira vez (“Sabe o que aconteceu?... Aprendi a falar”). Contudo, tal significado paira sobre ou sob o
texto. Não se consegue, creio, ler este texto segundo qualquer uma das velhas categorias da Nova
Crítica, nem encontrar as complexas relações internas e texturas que caracterizavam o “universal
concreto” dos modernismos clássicos como o de Wallace Stevens.
A obra de Perelman ( e a Poesia da Linguagem em geral) deve alguma coisa a Gertrude Stein
e, além dela, a certos aspectos de Flaubert. Assim, não é descabido neta altura introduzir uma velha
opinião de Sartre, sobre as frases flaubertianas, que comunica uma impressão vívida do movimento de
tais frases:
Sua frase cerca o objeto, agarra-o, imobiliza-o e aniquila-o, enreda-se nele, transforma-se em
pedra e petrifica-o consigo mesma. É cega e surda, sem sangue, sem um sopro de vida; um
silêncio profundo a separa da frase seguinte; ela cai no vazio, eternamente, e arrasta sua
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presa nessa queda infinita. Toda realidade, uma vez descrita, é riscada da lista. (Jean-Paul
Sartre, O que é Literatural?)
A descrição é hostil e a vivacidade de Perelman é historicamente bem diversa da prática
homicida de Flaubert. (Para Mallarmé, observou Barthes há tempos, em chave semelhante, a frase, a
palavra são modos de assassinar o mundo exterior.) Ademais esta última exprime um pouco do mistério
de frases eu caem no vazio de um silêncio tão grande que, momentaneamente, a gente se pergunta se
alguma frase nova teria ainda condições de aflorar para tomar o lugar das anteriores.
Passemos, no entanto, ao segredo deste poema. É um pouco o Hiper-realismo que parecia um
retorno à representação, depois das abstrações anti-figuras do expressionismo Abstrato, até que as
pessoas começassem a se dar conta de que estas pinturas não são exatamente realistas, porque o que
elas representam não é o mundo exterior mas, tão-somente, uma fotografia do mundo exterior ou, em
outras palavras, uma imagem deste mundo. Falsos realismos, eles são, na verdade, arte sobre arte,
imagens de imagens. No nosso caso, o objeto representado de fato não é, apesar de tudo, a China:
aconteceu a Perelman encontrar em uma papelaria de Chinatown um livro de fotos, um livro cujas
legendas e caracteres não passavam obviamente de letra morta para ele (ou deveríamos dizer
materialidades significantes?). As frases do poema as suas legendas para tais fotos. Suas referências
são outras imagens, um outro texto, e a “unidade” do poema não existe absolutamente no texto nas fora
dele, na unidade fechada de um livro ausente.
Para concluir, devo agora tentar caracterizar ligeiramente o relacionamento da produção
cultural deste tipo com a vida social nos Estados Unidos hoje. Chego o momento também de responder à
principal objeção a conceitos de pós-modernidade, como esse aqui esboçado: a saber, que todos os
traços que enumeramos não são de maneira alguma novos, caracterizaram abundantemente a
modernidade propriamente dita ou aquilo que chamamos modernismo canônico. Afinal de contas, não é
sabido o interesse de Thomas Mann pelo pastiche, e não são certos capítulos de Ulysses a sua mais
cabal ilustração? Não mencionamos Flaubert, Mallarmé e Gertrude Stein neste balanço da experiência da
temporalidade pós-moderna: Afinal, o que é novo nisso tudo: Precisaríamos realmente de um conceito de
pós-modernidade?
Responder a esta pergunta é trazer à tona toda uma discussão sobre periodização, sobre
como um historiador (literário ou não) postula uma ruptura radical entre dois períodos a partir de certo
momento distintos. Devo me limitar a sugerir que as rupturas radicais entre períodos não envolvem em
geral mudanças completas de conteúdo, mas sobretudo a reestruturação de um certo número de
elementos anteriormente existentes: traços que, em período ou sistema anterior, era secundários se
tornam agora dominantes, e traços que eram dominantes se tornam, por sua vez, secundários. Neste
sentido, tudo o que foi descrito aqui é encontrável em períodos anteriores e, de modo evidente, na própria
modernidade: meu palpite é que até o momento atual esses elementos não passavam de traços menores
ou secundários da arte moderna, marginais ao invés de centrais, e que passamos a ter algo novo no
instante em que eles se tornam os traços centrais da produção cultural.
Posso, não obstante, apresentar este argumento de forma mais concreta, voltando ao
relacionamento entre produção cultural e a generalidade da vida social. A modernidade clássica ou mais
antiga era uma arte do contra. Ela despontou dentro da sociedade comercial da época dourada ao
mesmo tempo com escândalo e insulto para o público burguês – feia dissonante, boêmia, sexualmente
chocante. Era objeto de zombaria (quando a polícia não era requisitada para apreender os livros e fechar
as exposições): um insulto ao bom gosto e ao senso comum ou, como Freud ou Marcuse colocariam, um
provocador desafio aos princípios de realidade e desempenho reinantes na sociedade burguesa do
começo do século XX. A modernidade em geral não se dá nada bem com os tabus morais vitorianos,
nem com seu mobiliário carregado, tampouco com as etiquetas da sociedade elegante. Quer dizer, seja
qual for o conteúdo político explícito do modernismo, este sempre foi, de um modo mais ou menos
implícito, perigoso, explosivo e subversivo em relação à ordem estabelecida.
Se, agora, voltarmos repentinamente ao momento atual, podemos medir o enorme alcance das
mudanças. Joyce e Picasso não somente deixaram de ser esquisitos e repulsivos como se tornaram
clássicos e adquiriram agora para nós uma aparência de realistas. Ao passo que muito pouca coisa
restou da arte contemporânea, em forma ou conteúdo, que pareça intolerável e escandaloso à sociedade
de nosso tempo. As formas mais agressivas desta arte – punk rock, digamos, ou o chamado material
sexual explícito – são consumidas com voracidade pela sociedade e comercializadas com êxito, ao
contrário das produções da anterior modernidade. O que significa que, mesmo eu a arte contemporânea
ainda apresente os mesmos traços formais do antigo modernismo, a sua posição dentro de nossa cultura
está basicamente alterada. Por um lado, a produção de mercadorias, em particular nosso vestuário,
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mobiliário, moradia e outros artefatos, está agora intimamente associada às mudanças do styling que
decorreram da experimentação artística: nossa propaganda, por exemplo, se alimenta da pósmodernidade em todas as artes e não pode mais dispensá-la. Por outro lado, os clássicos da
modernidade anterior são agora parte do assim chamado cânon, e são ensinados em escolas e
universidades – o que, por sua vez, os esvazia de todo seu velho potencial subversivo. De fato, um modo
de marcar a ruptura entre os períodos e datar o surgimento da pós modernidade pode se encontrar
precisamente aí: na época (parece que início dos anos 60) em que a posição do modernismo radical e
sua estética dominante se institucionalizaram na Universidade, quando passaram a ser considerados
acadêmicos por toda uma geração de poetas, pintores e músicos.
Pode-se também chegar à ruptura por um outro caminho, para descrevê-la em termos de
períodos da atual vida social. Como venho sugerindo, marxistas e não-marxistas confluíram para um
sentimento comum de que a certa altura, após a II Guerra Mundial, uma nova espécie de sociedade
começava a se formar (variadamente descrita como sociedade pós-industrial, capitalismo multinacional,
sociedade de consumo, sociedade dos mídia e assim por diante). Novos tipos de consumo,
obsolescência programada, um ritmo ainda mais rápido de mudanças na moda e no styling, a penetração
da propaganda, da televisão e dos meios de comunicação em grau até agora sem precedentes e
permeando a sociedade inteira, a substituição do velho conflito cidade e campo, centro e província, pela
terciarização e pela padronização universal, o crescimento das grandes redes de auto-estradas e o
advento da cultura do automóvel – são vários dos traços que pareciam demarcar uma ruptura radical com
aquela sociedade antiquada de antes da guerra, na qual o modernismo era ainda uma força clandestina.
Acredito que a emergência da pós-modernidade está estritamente relacionada à emergência
desta nova fase do capitalismo avançado, multinacional e de consumo. Acredito também que seus traços
formais expressam de muitas maneiras a lógica mais profunda do próprio sistema social. No entanto, vou
limitar-me a indicar esta relação a propósito de um só de seus temas capitais: o desaparecimento do
sentido da história, o modo pelo qual o sistema social contemporâneo como um todo demonstra que
começou, pouco a pouco, a perder a sua capacidade de preservar o próprio passado e começou a viver
em um presente perpétuo, em uma perpétua mudança que apaga aquelas tradições que as formações
sociais anteriores, de uma maneira ou de outra, tiveram de preservar. Basta mencionar a saturação
informacional gerada pelos meios de comunicação: como Nixon e, ainda mais, Kennedy, são figuras de
um passado agora distante. Sinto-me tentado a afirmar que a própria função dos meios de comunicação
é de relegar ao passado tais experiências históricas recentes, isto o mais rapidamente possível. A função
informativa dos meios seria, desse modo, a de ajudar a esquecer, a de servir de verdadeiro instrumento e
agente de nossa amnésia histórica.
Neste caso, os dois traços da pós-modernidade sobre os quais muito me alonguei a
transformação da realidade em imagens, a fragmentação do tempo em uma série de presentes perpétuos
são ambos extraordinariamente consentâneos com este processo. Minha conclusão aqui deve tomar a
forma de uma pergunta sobre o valor crítico da novíssima arte. Há uma certa concordância de que a
modernidade velha funcionou em oposição à sociedade, de modos variadamente descritos como
negativo, crítico, contestante, subversivo, oposicionista etc. Pode-se dizer algo no gênero sobre a pósmodernidade e a sua situação social? Vimos que existe um modo pelo qual a pós-modernidade repercute
e reproduz reiterando a lógica do capitalismo da sociedade de consumo. A questão mais importante é
saber se também existe uma forma de resistência a essa lógica. Tal questão devemos, todavia, deixar em
aberto.
9.2. Modernidade e Pós-Modernidade
O mundo moderno é palco de um confronto de ideologias, opções políticas e concepções que
são derivadas das lutas de classes. Tal confronto se encontra também no que se refere ao significado
dos conceitos e palavras. A palavra modernidade não escapa a esta condição e se presta a muitos
equívocos e definições. O presente texto tem como objetivo, partindo da concepção marxista, analisar os
significados dos termos modernidade e pós modernidade.
Ao moderno se contrapõe o arcaico, o tradicional, o atrasado. Na verdade, em termos
marxistas, todas as concepções do que é arcaico remete este às sociedades pré-capitalistas ou nãocapitalistas, identificando, portanto, modernidade e capitalismo. A concepção marxista de modernidade
também aponta para esta conclusão, sem, contudo, contrapor tal termo a outros (arcaico, tradicional,
atrasado) na busca ideológica de provar a “superioridade” do modo de produção capitalista em relação
aos demais modos de produção, tal como o faz as ideologias burguesas.
O que caracteriza a modernidade? Podemos dizer que é a mercadoria, tal como é produzida
em nossa sociedade. A produção capitalista de mercadorias revela uma relação de exploração e
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dominação de uma classe social por outra. O processo capitalista de produção de mercadorias é um
processo de produção de mais-valor, tal como Marx o demonstrou (Marx, 1988). O capitalista compra a
força do trabalho e a utiliza no processo de produção. A força de trabalho acrescenta valor às
mercadorias e apenas uma parte desse valor acrescido retorna as suas mãos, sob a forma de salário,
que é o preço da força de trabalho pago pelo capitalista. Como o trabalhador produziu mais do que
recebeu e o capitalista ficou com este mais-valor acrescido a mercadoria e não recebido pelo trabalhador,
aí reside a exploração capitalista. Tal exploração é proporcionada pela dominação que a classe
capitalista exerce sobre a classe operária no processo de produção.
Há, na relação entre capitalistas e trabalhadores, uma incessante produção de mais-valor. Este
mais valor se realiza no mercado através do consumo das mercadorias pela população. Este é o
fundamento da modernidade. É deste fundamento que deriva todas as outras características da
modernidade. Basta observar que o processo de produção capitalista exige a grande indústria que é
instalada na cidade, o desenvolvimento tecnológico (devido à competição dos capitais individuais, a
necessidade de ampliação constante do mercado consumidor e a tendência a queda da taxa de lucro
médio), a necessidade de controlar e administrar minuciosamente o processo de trabalho. Aqui se
revelam várias características secundárias da modernidade e que podem ser expressas por termos
bastante utilizados pelas ciências humanas: industrialização, urbanização, desenvolvimento tecnológico
acelerado, racionalização, burocratização.
Mas a modernidade possui outras características, que também são derivadas das relações de
produção capitalistas. A dominação e exploração da classe trabalhadora provocam a resistência desta e
a classes. A classe capitalista busca manter sua dominação através da repressão, da ideologia, do
imaginário, da criação de instituições que buscam integrar o proletariado na sociedade burguesa. A partir
disto observamos novas características da modernidade: ideologização, institucionalização, estatização,
violência, luta de classes entre burguesia e proletariado em todas as esferas da vida social.
Novamente se vê aí outras raízes do fenômeno da burocratização que se expande para a
sociedade civil. A mercadoria é vendida no mercado, onde se realiza o mais-valor e isto cria a
necessidade do consumo e a transformação de tudo em mercadoria. Torna-se necessário, devido à
tendência da queda da taxa de lucro médio e a competição entre empresas capitalistas, a incessante
reprodução ampliada do mercado consumidor. Isto faz com que do meio-ambiente seja extraído cada vez
mais matéria-prima, criando uma devastação ambiental sem limites. Estes fatos nos apresentam mais
algumas características da modernidade: mercantilização, consumismo, modas sucessivas, destruição
ambiental em escala nunca vista antes na história da humanidade.
Muitas outras características da modernidade, tal como o cientificismo, a especialização, etc.,
que são derivadas das relações de produção capitalistas poderiam ser acrescentadas, mas nos
limitaremos a estas. Além disso, e como elemento fundamental da modernidade, está a luta de classes,
que é o seu fundamento – a produção de mais-valor é expressão da luta de classes e gera a luta de
classes na produção, que se dá em torno do mais-valor – e se generaliza e espalha por toda a sociedade,
envolvendo as classes fundamentais (burguesia e proletariado) e demais classes (burocracia,
intelectualidade, campesinato, etc.) e frações de classes. Enfim, a modernidade pode ser compreendida
como o período histórico marcado pelo predomínio do modo de produção capitalista e a modernização
como o processo de desenvolvimento da modernidade.
Neste sentido, o processo de modernização significaria tão-somente a implantação do modo de
produção capitalista e das demais relações sociais que lhe acompanham e seu desenvolvimento, o que
significa o aprofundamento, intensificação, de elementos já presentes na essência do capitalismo. A
modernização é este processo de aprofundamento e intensificação da modernidade, com suas
contradições e crises.
O que significa falar de modernidade nos dias atuais? Significa observar a atual configuração
do capitalismo mundial e suas contradições. A modernidade atual é a atual fase de desenvolvimento do
capitalismo, ou seja, a contemporaneidade. O desenvolvimento capitalista é marcado por lutas de classes
que geram formas determinadas em cada uma de suas fases, o que repercute em todas as instâncias
sociais. Porém, há um elemento fundamental no processo de desenvolvimento capitalista, que é a luta
em torno do mais-valor e a acumulação capitalista. A luta em torno do mais-valor é cotidiana, constante, e
se dá no espaço concreto das relações de produção, da unidade de produção, na fábrica, na construção
civil, ou seja, em todos os lugares onde ocorre extração de mais-valor. Ela acaba se solidificando em
determinada correlação de forças, instaurando determinadas formas de extração de mais-valor,
concretizadas em formas de organização do trabalho, tal como se vê no taylorismo, fordismo, toyotismo.
Além da produção de mais-valor é necessário sua realização, sua repartição, etc., o que
produz a necessidade de controle e regularização e, desta forma, determinada correlação de forças no
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processo de produção, aliada com determinada correlação de forças em geral na sociedade civil, temos
uma formação estatal e relações internacionais estabelecida, que constituem um determinado regime de
acumulação (Viana, 2008; Viana, 2003). A história da modernidade, ou seja, do capitalismo, é a história
da sucessão de regimes de acumulação, ou seja, formas consolidadas e relativamente estabilizadas das
lutas de classes.
Até aqui nos limitamos a discutir o conceito de modernidade. Nosso objetivo, no entanto, é
discutir o outro termo, o de pós-modernidade. Cabe, então, esclarecer o significado da expressão “pósmodernidade” e o que este fenômeno representa. A partir do reconhecimento da identidade entre
capitalismo e modernidade e da constatação óbvia de que o capitalismo ainda não foi superado,
observamos que as sociedades contemporâneas não são “pós-modernas” e sim modernas. Não é difícil
reconhecer que a produção de mais-valor continua, bem como a sociedade continua comandada pela
produção industrial, continua urbana, mercantil, burocrática, racionalizada, consumista, etc.
Mas resta explicar, então, o que significa a ideologia pós-moderna. Existe um rompimento real
entre a ideologia moderna (burguesa) e a ideologia pós-moderna? Para responder a esta questão
teríamos que tratar de outros aspectos da modernidade e após isto voltar ao nebuloso mundo das
ideologias.
Algumas características da modernidade, tais como o desenvolvimento tecnológico acelerado,
a constante criação e recriação do mercado consumidor, entre outras, deixam entrever uma das mais
importantes facetas deste período histórico e que pode ser resumida da seguinte forma: “a burguesia não
pode existir sem revolucionar constantemente os meios de produção e, por conseguinte, as relações de
produção e, com elas, todas as relações sociais. (...). A revolução contínua da produção, o abalo
constante de todas as condições sociais, a eterna agitação e incerteza distinguem a época burguesa de
todas precedentes. Suprimem-se todas as relações fixas, cristalizadas, com seu cortejo de preconceitos e
idéias antiquadas e veneradas; antes mesmo de se consolidar. Tudo o que era sólido se evapora no ar,
tudo que era sagrado é profanado, e por fim o homem é obrigado a encarar com serenidade suas
verdadeiras condições de vida e suas relações com a espécie” (Marx e Engels, 1978, p. 96-97).
A idéia de tempo e de mudança se une com a idéia de velocidade. O desenvolvimento histórico
sob o capitalismo é tão veloz que dá a impressão de que as sociedades pré-capitalistas são estáticas,
“sem história”, tal como na ilusão da maioria dos antropólogos sobre as sociedades indígenas. Nesse
torvelinho se vê, ao mesmo tempo, continuidade e descontinuidade, mudanças e permanências.
O que significa isto? Significa que as mudanças que ocorrem no capitalismo são mudanças em
sua forma e expressam os seus períodos de desenvolvimento histórico. O seu conteúdo, ao contrário,
permanece o mesmo. Qual é este conteúdo? A produção de mais-valor pelo proletariado e sua
apropriação pela burguesia, ou seja, a luta entre estas duas classes sociais. As mudanças que ocorrem
no mundo moderno são mudanças no interior do modo de produção capitalista e apontam, devido suas
contradições, para uma transformação radical de seu próprio conteúdo, isto é, para a abolição do
capitalismo.
Tal tendência histórica brota de suas próprias contradições, ou seja, da luta da classe
capitalista e da classe trabalhadora e de todos os conflitos sociais derivados desta luta. Disto tudo se
conclui que as mudanças no capitalismo representam períodos históricos deste, o que significa uma
manifestação simultânea da continuidade (do modo de produção capitalista) e da descontinuidade (no
modo de produção capitalista), que se manifesta nos regimes de acumulação1. Além disso, percebe-se,
conseqüentemente, que as principais mudanças ocorrem nas relações de produção e distribuição e daí
se espalham para as demais esferas da vida social.
O que vem ocorrendo no que diz respeito ao modo de produção capitalista? Nos meios
acadêmicos, políticos e até mesmo nos meios oligopolistas de comunicação se usa termos como
“globalização”, “reestruturação produtiva”, “terceirização”, “neoliberalismo”, “fim do socialismo”, “fim do
estado-nação”, “sociedade pós-industrial”, “pós-modernidade”, “pós-fordismo”, etc. Comecemos pela
chamada “reestruturação produtiva”. O termo “re-estruturação” é um tanto quanto exagerado, pois a
estrutura produtiva não foi alterada em sua estrutura. No que se refere às relações de trabalho, existe
uma tendência em se falar de “crise do fordismo” e em “pós-taylorismo” e “pós-fordismo” e assim postular
uma mudança radical no processo de trabalho. Tal tese se sustenta numa análise superficial das formas
de organização do trabalho.
O taylorismo se caracteriza por ser a forma de organização do trabalho criada pela burguesia a
partir de um estágio superior de seu desenvolvimento capitalista. Que estágio é este? É o estágio onde a
luta operária impôs a estabilização da jornada de trabalho e desta forma impediu o aumento de extração
de mais valor absoluto. A partir desse momento, a classe capitalista forjou a “organização científica do
trabalho” (taylorismo), com o objetivo de aumentar a produção no interior de um mesmo período de tempo
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(a jornada de trabalho estabelecida), ou seja, de aumentar a produtividade, o que é equivalente ao
aumento de extração de mais-valor relativo. Isto significou a passagem do regime de acumulação
extensivo para o regime de acumulação intensivo.
Um conjunto de processos organizativos foi criado para realizar tal façanha. A gerência
científica significa a criação de uma camada de especialistas (os gerentes) voltados para o controle, a
vigilância e a organização do processo de trabalho buscando evitar desperdício de tempo, maior
rendimento, etc.
Cria-se, assim, uma racionalização do processo de trabalho. Em síntese, o taylorismo, tal como
o concebemos, se caracteriza por ser um processo de controle da força de trabalho através da
racionalização e dos gerentes especializados em planejar minuciosamente a execução das tarefas e
aplicar tal racionalização (que se caracteriza por medir, calcular, normatizar, o processo de trabalho)
objetivando o aumento de produtividade.
As formas de organização do trabalho posteriores são apenas aplicações do taylorismo às
novas necessidades do modo de produção capitalista, ou seja, não existe nenhum “pós-taylorismo”. O
fordismo, por exemplo, é apenas uma adaptação do taylorismo à produção em massa, o que provoca
algumas alterações formais, mas não muda a essência do taylorismo. Ele é instaurado em outro contexto
histórico, marcado por nova correlação de forças entre as classes sociais, ou seja, em um novo regime de
acumulação, o intensivo-extensivo, e que é acompanhado por uma nova organização estatal, o estado
integracionista e novas relações internacionais, o imperialismo oligopolista transnacional.
O toyotismo, por sua vez, realiza uma adaptação do taylorismo à nova situação histórica. Que
situação é essa? Trata-se de uma situação onde a luta de classes ganha contornos novos, onde há uma
ofensiva da classe capitalista provocada pela queda da taxa de lucro médio e pela competição
oligopolista internacional. O Japão pós-segunda guerra mundial precisou fazer um esforço gigantesco,
caracterizado pela super exploração da força de trabalho, para reerguer a produção nacional. Foi desta
forma que o Japão se tornou uma “superpotência” no interior da competição internacional. O “modelo
japonês” implementado a partir do pós-guerra passa a ser aplicado nos demais países devido à situação
atual marcada pela taxa declinante de lucro e pela competição oligopolista internacional, onde o Japão
assume uma posição privilegiada e graças ao seu êxito começa a ser copiado por diversos outros países.
A tendência a queda da taxa de lucro médio provoca, juntamente com outros fatores, uma
corrida pelo desenvolvimento tecnológico, uma aumento da taxa de exploração do trabalhador, um busca
incessante de reprodução ampliada do mercado consumidor, uma ofensiva da classe capitalista em
várias frentes ao mesmo tempo. Tais características surgem, inicialmente, nos países capitalistas super
desenvolvidos (EUA, Japão, Europa Ocidental) e se espalha pelo resto do mundo, atingindo, assim, os
países capitalistas subordinados.
Este fenômeno de difusão mundial ocorre a partir da ascensão do modo de produção
capitalista, onde o “centro” impõe as relações de produção capitalistas e seus derivados e, uma vez isto
estando concretizado, irradia para o resto do mundo também as suas alterações formais. Desta forma,
podemos dizer que após este período de consolidação mundial do capitalismo surge um processo de
irradiação das transformações do capital e de suas formas de regularização para o resto do mundo, o que
significa que o capitalismo muda de forma inicialmente nos países super desenvolvidos e depois “exporta”
estas mudanças para os países subordinados. Isto gera uma maior uniformização do capitalismo mundial.
Há muitas décadas o modo de produção capitalista se tornou o modo de produção dominante
em todos os países do mundo e daí se observa que o que se chama hoje de “globalização” não passa de
uma continuidade da expansão do capitalismo dos seus centros mais desenvolvidos para as regiões
menos desenvolvidas. Entretanto, ao contrário do que pretendem os ideólogos da burguesia, trata-se de
uma expansão marcada pelo signo da subordinação e exploração, tal como sempre foi. Neste sentido, a
afirmação de Marx segundo a qual o país mais avançado mostra o caminho que será seguido pelos
países mais atrasados é perfeitamente correta (Marx e Engels, 1978). O que podemos observar é que o
termo “globalização” ofusca o caráter capitalista da atual expansão mundial e, conseqüentemente, as
suas contradições e conseqüências (Viana, 2008). Tal expansão expressa uma nova fase da luta de
classes, marcada pela ofensiva capitalista e pela ameaça proletária de radicalização, ou seja,
caracterizada por uma situação de pré-crise2. Trata-se de um deslocamento de determinados aspectos
da luta de classes que até então eram específicas do capitalismo super desenvolvido para o capitalismo
subordinado e vice-versa, já que há um aumento da exploração, o que não ocorre sem contradições,
tendo em vista o significado disto para os últimos.
O neoliberalismo e a ideologia do fim do estado-nação são expressões ideológicas de uma
realidade pouco compreendida. O neoliberalismo é uma ideologia que faz parte da ofensiva do capital e
que não se concretiza totalmente na realidade, mas apenas parcialmente. A política neoliberal é
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expressão do predomínio dos interesses do capital oligopolista (transnacional e nacional) no estado
capitalista e mantém uma unidade com outras estratégias ofensivas do capital, tal como o toyotismo, e
facilita a sua ação destruidora. O fim do estado-nação, por sua vez, não passa de uma ficção. O capital
precisa do estado-nação, por diversos motivos, entre os quais a sua necessidade de repressão dos
movimentos de contestação, de produção de ideologia, de assegurar os interesses do capital nacional,
entre outros (Viana, 2003). O que ocorre é, na verdade, um peso maior nas decisões a nível nacional e
mundial por parte do capital transnacional de acordo com a lógica complementar da necessidade de
aumento geral da exploração (aumento de extração de mais-valor, absoluto e relativo), inclusive a nível
internacional, no qual os países de origem do capital transnacional buscam aumentar a exploração
interna e externa, gerando o neo-imperialismo hegemonizado pelos Estados Unidos. Assim, a
modernidade atual, a contemporaneidade, é marcada pela instauração de um novo regime de
acumulação, que marca uma renovação do processo de valorização com a busca de aumento da
extração de mais-valor absoluto e relativo, pela nova forma estatal que é o estado neoliberal e por novas
relações internacionais, caracterizada pelo neo-imperialismo (Viana, 2008).
Inúmeras outras ideologias políticas se espalham pelo mundo e como não é possível, neste
espaço, tratar de todas, nos limitaremos a tratar de apenas mais uma, que é a tese do fim do socialismo.
A derrocada dos países do Leste Europeu e da URSS fornece o fundamento para a tese do fim do
socialismo. Em primeiro lugar, dificilmente se poderia sustentar, da perspectiva do proletariado, que estes
países eram socialistas. Podemos dizer que, tal como muitos críticos da sociedade soviética vêem
colocando desde a década de 1920, o regime existente na Rússia (e, posteriormente, Leste Europeu,
China, Cuba, etc.) é, na verdade, capitalista. Portanto, se algo chegou ao fim não foi o socialismo e sim o
capitalismo de estado.
Em segundo lugar, as razões da crise do capitalismo estatal se encontram na sua
incapacidade de acompanhar o desenvolvimento tecnológico acelerado dos países capitalistas super
desenvolvidos e sua impossibilidade de conseguir incentivar os trabalhadores a aumentarem o seu
rendimento no processo de trabalho e isto tudo provoca uma impossibilidade de aumentar a produtividade
(extração de mais-valor relativo) no mesmo ritmo que os países capitalistas super desenvolvidos. Daí a
crise do capitalismo estatal e deste modelo burocrático e ditatorial de pseudo-socialismo.
Estas são algumas das principais características da modernidade em sua atual fase. Outros
aspectos, tais como a revolução tecnológica, a expansão do processo de mercantilização e
burocratização das relações sociais, o consumismo, as modas sucessivas, complementam este quadro.
O aumento gigantesco da produção de bens de consumo e a expansão de empresas e instituições que
mercantilizam serviços sociais são possibilitados tanto pela revolução tecnológica quanto pela
necessidade do capitalismo de desviar os investimentos aplicados em meios de produção para meios de
consumo, como forma de evitar um crescimento da composição orgânica do capital e de conseguir
manter a reprodução ampliada do capital através da reprodução ampliada do mercado consumidor.
A produção de necessidades fabricadas é uma estratégia do capital para ampliar o mercado
consumidor e assim garantir sua reprodução ampliada. Entre estas necessidades fabricadas se encontra
a obsolescência planejada das mercadorias (lâmpadas, eletrodomésticos, etc., que têm o seu tempo de
vida útil diminuído), os produtos descartáveis, os produtos tecnológicos de consumo tanto pessoal quanto
industrial, que são em pouco tempo superados por outros mais sofisticados (computadores, programas
de computadores, aparelhagem eletrônica em geral) e as modas sucessivas (roupas, músicas, etc.). O
que diferencia o regime de acumulação anterior – intensivo-extensivo – para o atual – integral – é que isto
é intensificado, ampliado. A cultura mercantil se torna ainda mais mercantilizada, a sucessão das modas
culturais se torna mais veloz, criando um mundo de cultura descartável, cada vez mais superficial,
consumível, etc. E isto não apenas no que os elitistas chamam de “cultura de massas”, mais em todas as
esferas culturais, incluindo aí a cultura acadêmica, científica, filosófica. As modas acadêmicas, mesmo
sendo apenas sub modas, já que o pensamento científico, filosófico, etc., não possui um repertório e nem
os ideólogos e reprodutores de ideologias possuem criatividade o suficiente para realizar mudanças mais
drásticas, mas apenas remendos, mudanças formais (a mais comum é mudar as palavras e manter quase
que intacto o conteúdo), misturas ecléticas, etc.
Isto é a modernidade nos dias de hoje. Como se pode notar, continuamos submetidos ao reino
da mercadoria. A modernidade é marcada por um período difícil e isto provoca a ofensiva do capital que,
por sua vez, tende a radicalizar as lutas de classes. Assim, caminhamos para uma crise da modernidade,
ou seja, para uma crise do modo de produção capitalista. Isto abre amplas perspectivas para a revolução
e a instauração da autogestão social.
Podemos, agora, retornar à questão da pós-modernidade. As sociedades atuais são modernas
e não pós-modernas. A própria ideologia pós-moderna é um produto da produção mercantil. Ela faz parte
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das ondas sucessivas de consumo cultural produzidas pelo capitalismo, ou seja, é mais uma moda
cultural que sustenta o mercado editorial e artístico e, desta forma, enriquece ainda mais certas frações
da classe capitalista, do que qualquer outra coisa. Desta forma se vê o quão moderno são os nossos
“pós-modernos”!
A razão de ser desta ideologia, que na verdade somente em sua auto-imagem ilusória poderia
ser chamada “pós-moderna” (Viana, 2008) – pois é moderna e uma conceituação mais adequada seria,
na esfera artística, pós-vanguardismo, e, na esfera científica, “pós-estruturalismo” – não é apenas
mercantil.
Os meios oligopolistas de comunicação incentivam e reproduzem estas ideologias e seus
subprodutos, mas além de cultura descartável e mercantil, as ideologias pós-estruturalistas e a arte “pósvanguardista” também possuem um caráter político. Em muitos casos ela é abertamente uma apologia da
sociedade capitalista4, do qual os pós-estruturalistas retiram o seu sustento e o seu conforto em troca de
migalhas.
Troca-se ideologias e seus subprodutos por dinheiro. Individualismo, hedonismo, consumismo,
são algumas palavras que caem como uma luva no pós-moderno. Porém, além de ser uma expressão da
cultura mercantil, as ideologias pós-estruturalistas são produtos das lutas de classes mais diretamente,
consistindo numa contra-revolução cultural preventiva.
O pós-estruturalismo retoma, isolando e despolitizando, os temas das lutas operárias e
estudantis do final da década de 60, quando houve uma ascensão das lutas sociais e das concepções
revolucionárias que se opuseram ao conservadorismo, reformismo e crítica resignada existente. Assim, a
crítica do cotidiano de Debord, Lefebvre e outros se transformou em apologia ou descrição dele; a sua
inserção no interior da sociedade capitalista e seu papel político é ocultado e esquecido, produzindo seu
isolamento e despolitização (Viana, 2008). A crítica da razão instrumental realizada pela Escola de
Frankfurt se transforma no irracionalismo e abandono da razão em geral; a contestação estudantil e
operária de partidos, sindicatos, estruturas burocráticas se transforma em recusa da organização em
geral; o questionamento das vanguardas e da representação se transforma em individualismo
desmobilizador, em isolamento das lutas e da auto-representação de grupos isolados.
Mas, no final das contas, onde a ideologia pós-estruturalista rompe com a ideologia moderna?
Podemos dizer que é no descaramento e cinismo aberto dos pós-estruturalistas em relação ao
recato da maioria dos modernos. Mas isto é apenas uma questão superficial e que não retrata mais que
aspectos formais, embora revele por detrás de si uma ofensiva ideológica da burguesia e não seja
comum a todos os pós-estruturalistas, que podem ser divididos em tendências diferentes (Viana, 2008).
O rompimento com a modernidade por parte dos ideólogos pós-estruturalistas consiste em
criar um modernismo que seria homogêneo e um substituto também homogêneo, no qual o primeiro seria
a “idade das trevas” e o segundo uma “idade das luzes”, mas sem “iluminismo”. Alguns ideólogos
sustentam que a grande ruptura com a modernidade ocorre na epistemologia. Aí surge a oposição entre
holismo e individualismo metodológico, racionalismo e irracionalismo, iluminismo e romantismo. Isto,
entretanto, não se sustenta diante de uma análise histórica, pois basta conhecer a obra de vários autores
“modernos”, tal como Max Weber, Georg Simmel, F. Nietzsche, Wilfredo Pareto, entre outros, para se
observar que a “metodologia pós-estruturalista” já existe há alguns séculos e é tão moderna quanto o
positivismo naturalista clássico, com sua busca de neutralidade axiológica, que sob nova forma reaparece
no pós-estruturalismo: o relativismo (Viana, 2000).
Na verdade, o pós-modernismo significa apenas uma outra ideologia moderna, isto é,
burguesa.
Ela resgata posições modernas, embora marginais, antigas, e inventa novas ideologias. O pósestruturalismo possui uma diversidade de ideologias no seu interior, tal como os supermercados possuem
suas prateleiras cheias do mesmo produto, mas com marcas diferentes. A marca é o diferencial que
ocorre na competição no mercado capitalista de ideologias. Uma grande diversidade de teses e
linguagens, para diversos nichos de consumidores. Existem os pós-estruturalistas críticos (Foucault,
Deleuze, Guatari); os ecléticos (Antonio Negri, Lazzaratto) e os conservadores (Rorty, Baudrillard,
Maffesolli). O que há de comum em todos eles é o seu discurso (falso) de superação das idéias
modernas (que, como já dissemos, se torna um todo homogêneo, o que serve para incluir o marxismo,
seu principal alvo no final das contas) e, em alguns casos, da sociedade moderna. A idéia de sociedade
pós-industrial, pós-moderna, de modo de produção pós-fordista (o que não quer dizer nada, pois resta
saber o que veio depois do fordismo...) – identificado com pós-capitalismo, tal como no caso de Negri
(Viana, 2008). A superação do estruturalismo, do marxismo, do freudismo e do existencialismo5 é a
chave para se compreender o processo da ideologia pós-estruturalista que parte para uma concepção
que recusa as concepções fundadas na totalidade ou no racionalismo. O ecletismo assume papel
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importante e tudo passa a ser válido, tal como na luta inter-capitalista e nos ringues de luta livre: vale
tudo. Em uma de suas tendências, o ecletismo se torna o elemento principal. Assim, o que unifica todas
as diversas tendências pós-estruturalistas é sua negação do “modernismo”, ou seja, do marxismo
(fundamentalmente), do freudismo, do estruturalismo e do existencialismo, ou seja, das concepções que
tinham força no regime de acumulação anterior, e todas as outras. Esta negação, no entanto, é relativa,
pois qualquer um podem recuperar qualquer coisa destas concepções, o que não pode é aceitá-las na
totalidade. E embora existam os que fazem isto, eles não são pós-estruturalistas e nem são bem vistos
por estes.
Logo, modernidade e pós-modernidade são construtos da ideologia pós-estruturalista ou de
outras ideologias e por isso não são vistas como o que realmente são: expressões da sociedade
burguesa. Na perspectiva marxista, a modernidade é o capitalismo e a pós-modernidade não existe. O
modernismo, em ciências humanas, é algo inexistente, e o pós-modernismo também. Restam ideologias
que surgem na modernidade atual, ou “modernidade recente” (Young, 2002), que se autonomeiam como
querem e iludem os desavisados. Estas ideologias, entre elas o pós-estruturalismo (pois não se pode
esquecer que apesar do discurso pós-estruturalista, o marxismo, o positivismo naturalista, entre outras
concepções que eles rotulam de “modernas” continuam a existir e renovar).
E o marxismo? Ora, não é difícil perceber que o marxismo é uma crítica da sociedade
burguesa e, por conseguinte, da modernidade. Ele é uma crítica do capitalismo e de suas ideologias,
sejam elas iluministas, românticas, racionalistas, irracionalistas, individualistas, holistas, etc. Disto se
conclui que, se existe hoje uma concepção pós-moderna, esta só pode ser o marxismo. Neste sentido, o
marxismo é uma crítica da modernidade e por isso ele pode reconhecer suas contradições e apontar para
um mundo realmente pós-moderno, que é a sociedade autogerida.
A real oposição não se encontra entre modernidade e pós-modernidade (no sentido corrente
destes termos) e sim entre classe capitalista e classe operária, que no plano das idéias se manifesta
como oposição entre ideologias burguesas (modernas e “pós-modernas”) e o marxismo, entre diversas
outras formas de manifestação da cultura burguesa e da cultura proletária.
A teoria marxista pode reconhecer a tendência histórica da superação do capitalismo e
observar a aproximação de uma crise da modernidade. A modernidade, ou seja, a sociedade burguesa se
encontra num período de pré-crise, o que significa que há uma forte tendência ao desencadeamento de
uma nova grande crise do capital, e alguns sintomas começam a se manifestar. Usar o termo “crise do
capital” hoje seria banalizar o conceito e lhe retirar o significado. Preferimos caracterizar o atual período
de pré-crise da modernidade (capitalismo), o que significa que se caminha para uma crise e esta se
caracteriza não só pelas dificuldades de reprodução do capital mas, principalmente, que ela se tornará
cada vez maior e isto expressa a possibilidade de revolução através da ação revolucionária do
proletariado em conjunto com as demais forças revolucionárias existentes no interior desta sociedade no
sentido de instaurar a autogestão social.
EXERCÍCIO 10
1. Qual a influência do capitalismo na sociedade pós-moderna?
2. O que vem a ser a sociedade de consumo?
3. Defina com suas palavras a sociedade pós-moderna? O que a caracteriza?
4. Diferencie a Modernidade da pós-modernidade?
EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES
1. Em termos sociológicos, assinale o que for correto sobre o conceito de classes sociais.
a) Sua utilização visa explicar as formas pelas quais as desigualdades se estruturam e se reproduzem
nas sociedades.
b) De acordo com Karl Marx, as relações entre as classes sociais transformam-se ao longo da história
conforme a dinâmica dos modos de produção.
c) As classes sociais, para Marx, definem-se, sobretudo, pelas relações de cooperação que se
desenvolvem entre os diversos grupos envolvidos no sistema produtivo.
d) A formação de uma classe social, como os proletários, só se realiza na sua relação com a classe
opositora, no caso do exemplo, a burguesia.
e) A afirmação “a história da humanidade é a história das lutas de classes” expressa a idéia de que as
transformações sociais estão profundamente associadas às contradições existentes entre as classes.
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2. “Três grandes dimensões fundamentam o vínculo social. Primeiro, a complementaridade e a troca: a
divisão do trabalho social cria diferenças com base na complementaridade, o que permite aumentar as
trocas. Em segundo lugar, o sentimento de pertença à humanidade que nos leva a reforçar nossos
vínculos com os outros seres humanos: força da linhagem, do vínculo sexual e familiar; afirmação de um
destino comum da humanidade por grandes sistemas religiosos e metafísicos. Por fim, o fato de viver
junto, de partilhar uma mesma cotidianeidade; a proximidade surge então como produtora do vínculo
social e o camponês sedentário como o ser social por excelência.” (BOURDIN, Alain. A questão local. Rio
de Janeiro: DP&A, 2001 p. 28.) Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é correto afirmar:
a) A divisão do trabalho social na sociedade contemporânea desagrega os vínculos sociais.
b) Os sistemas religiosos e metafísicos são fatores de isolamento social, por resultarem de criações
subjetivas dos indivíduos.
c) O cotidiano das pequenas cidades e do mundo campesino favorece a criação de vínculos sociais.
d) Pela ausência da cotidianeidade, as grandes metrópoles deixaram de ser lugares de
complementaridade e de trocas.
e) O forte sentimento de pertencer à humanidade desmantela a noção de comunidade e minimiza o papel
da afetividade nas relações sociais.
3. Um jovem que havia ingressado recentemente na universidade foi convidado para uma festa de
recepção de calouros. No convite distribuído pelos veteranos não havia informação sobre o traje
apropriado para a festa. O calouro, imaginando que a festa seria formal, compareceu vestido com traje
social. Ao entrar na festa, em que todos estavam trajando roupas esportivas, causou estranheza,
provocando risos, cochichos com comentários maldosos, olhares de espanto e de admiração. O calouro
não estava vestido de acordo com o grupo e sentiu as represálias sobre o seu comportamento. As regras
que regem o comportamento e as maneiras de se conduzir em sociedade podem ser denominadas,
segundo Émile Durkheim (1858-1917), como fato social.
Considere as afirmativas abaixo sobre as características do fato social para Émile Durkheim.
I. O fato social é todo fenômeno que ocorre ocasionalmente na sociedade.
II. O fato social caracteriza-se por exercer um poder de coerção sobre as consciências individuais.
III. O fato social é exterior ao indivíduo e apresenta-se generalizado na coletividade.
IV. O fato social expressa o predomínio do ser individual sobre o ser social.
Assinale a alternativa correta.
a) Apenas as afirmativas I e II são corretas.
b) Apenas as afirmativas I e IV são corretas.
c) Apenas as afirmativas II e III são corretas.
d) Apenas as afirmativas I, III e IV são corretas.
e) Apenas as afirmativas I, II e IV são corretas.
4. “Na raiz de nossos julgamentos existe um certo número de noções essenciais que dominam toda a
vida intelectual; são aquelas que os filósofos chamam de categorias do entendimento: noções de tempo,
de espaço, de gênero, de número, de causa, de substância, de personalidade etc. [...] Mas, se, como
pensamos, as categorias são representações essencialmente coletivas, traduzem antes de tudo estados
da coletividade: elas dependem da maneira pela qual esta é constituída e organizada, de sua morfologia,
de suas instituições religiosas, morais, econômicas etc.” (DURKHEIM, Émile. Sociologia. São Paulo:
Ática, 1981. p. 154-157.)
Com base no texto e nos conhecimentos sobre o tema, é correto afirmar que a noção de categorias do
entendimento compreende:
a) Os estados emocionais fugazes dos indivíduos de distintas sociedades.
b) Aquelas representações cuja formação é exterior às instituições religiosas, morais e econômicas.
c) O modo como a sociedade vê a si mesma nos modos de agir e pensar coletivos.
d) A tradução de estados mentais dos indivíduos portadores de distintas visões de mundo.
e) As noções incomuns à vida intelectual de uma sociedade que deturpa os julgamentos dos sujeitos.
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5. Leia os depoimentos a seguir:
• Sou um ser livre, penso apenas com minhas idéias, da minha cabeça, faço só o que desejo, sou único,
independente, autônomo. Não sigo o que me obrigam e pronto! Acredito que com a força dos meus
pensamentos poderei realizar todos os meus sonhos, e o meu esforço ajuda a sociedade a progredir.
(Jovem estudante e trabalhadora em uma loja de shopping).
• Sou um ser social, o que penso veio da minha família, dos meus amigos e parentes, gostaria de fazer o
que desejo, mas é difícil! Às vezes faço o que quero, mas na maioria das vezes sigo meu grupo, meus
amigos, minha religião, minha família, a escola, sei lá... Sinto que dependo disso tudo e gostaria muito de
ser livre, mas não sou! (Jovem estudante em uma escola pública que trabalha em empregos
temporários).
• Sinto que às vezes consigo fazer as coisas que desejo, como ir a raves, mesmo que minha mãe não
permita ou concorde. Em outros momentos faço o que me mandam e acho que deve ser assim mesmo. É
legal a gente viver segundo as regras e ao mesmo tempo poder mudá-las. Nas raves existem regras,
muita gente não percebe, mas há toda uma estrutura, seguranças, taxas, etc. Então, sinto que sou livre,
posso escolher coisas, mas com alguns limites. (Jovem estudante e Office boy).
Assinale a alternativa que expressa, respectivamente, as explicações sociológicas sobre a relação entre
indivíduo e sociedade presentes nas falas.
a) Solidariedade mecânica, fundada no funcionalismo de E. Durkheim; individualismo metodológico,
fundado na teoria política liberal; teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx.
b) Teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx; sociologia compreensiva, fundada no conceito
de ação social e suas tipologias de M. Weber; teoria organicista de Spencer.
c) Individualismo, fundado no liberalismo de vários autores dos séculos XVIII a XX; funcionalismo,
fundado no conceito de consciência coletiva de E. Durkheim; sociologia compreensiva, fundada no
conceito de ação social e suas tipologias de M. Weber.
d) Sociologia compreensiva, fundada no conceito de ação social e suas tipologias de M. Weber; teoria da
consciência de classe, fundada em K. Marx; funcionalismo, fundado no conceito dos três estados de
Augusto Comte.
e) Corporativismo positivista, fundado em Augusto Comte; individualismo, fundado no liberalismo de
vários autores dos séculos XVIII a XX; teoria da consciência de classe, fundada em K. Marx.
6. De acordo com Max Weber, a Sociologia significa: “uma ciência que pretende compreender
interpretativamente a ação social e assim explicá-la casualmente em seu curso e em seus efeitos.” Por
ação social entende-se as ações que: “quanto ao seu sentido visado pelo agente, se refere ao
comportamento dos outros, orientando-se por este em seu curso.”
(WEBER, M. Economia e sociedade. Traduzido por Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa.
vol. I. Brasília: Editora UnB, 2000. p. 3) Com base no texto, considere as afirmativas a seguir:
I. “Mesmo entre gente humilde, porém, funcionava o sistema de obrigações recíprocas. O nonagentário
Nhô Samuel lembrava com saudade o dia em que o pai, sitiante perto de Tatuí, lhe disse que era tempo
de irem buscar a novilha dada pelo padrinho... Diz que era costume, se o pai morria, o padrinho ajudar a
comadre até ‘arranjar a vida’. Hoje, diz Nhô Roque, a gente paga o batismo e, quando o afilhado
cresce,nem vem dar louvado (pedir a benção).”
(CANDIDO, A. Os Parceiros do Rio Bonito. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1982. p. 247.
II. “O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do
litoral. A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica
impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das organizações atléticas.”
(CUNHA, E. Os Sertões. São Paulo : Círculo do Livro, 1989. p. 95.)
III. “Não há assim por que considerar que as formas anacrônicas e remanescentes do escravismo, ainda
presentes nas relações de trabalho rural brasileiro, [...], dando com isso origem a relações semi-feudais
que implicariam uma situação de ‘latifúndios de tipo senhorial a explorarem camponeses ainda envolvidos
em restrições da servidão da gleba’. Isso tudo não tem sentido na estrutura social brasileira.”
(PRADO Jr., C. A Revolução Brasileira. São Paulo : Brasiliense, 1987. p. 106.)
IV. “O coronel, antes de ser um líder político, é um líder econômico, não necessariamente, como se diz
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sempre, o fazendeiro que manda nos seus agregados, empregados ou dependentes. O vínculo não
obedece a linhas tão simples, que se traduziriam no mero prolongamento do poder privado na ordem na
ordem pública [...] Ocorre que o coronel não manda porque tem riqueza, mas manda porque se lhe
reconhece esse poder, num pacto não escrito.”
(FAORO, R. Os donos do poder. v. 2. Porto Alegre: Editora Globo, 1973. p. 622.)
Correspondem ao conceito de ação social citado anteriormente somente as afirmativas
a) I e IV.
b) II e III.
c) II e IV.
d) I, II e III.
e) II, III e IV.
6. Como as sociedades se estruturam?
7. Quais os seus componentes essenciais?
8. Como esses componentes se relacionam?
9. Quais as diferenças que existem entre as várias sociedades?
10. Como as sociedades se modificam?
11. Qual a influência do Positivismo de Comte para a sociedade moderna?
12. Como podemos definir moral e valor na sociedade me que vivemos?
13. O que vem a ser as relações sociais?
14. Qual a influência de Marx na sociedade moderna?
15. Por que é tão importante levar em consideração a sociologia na hora de definir administração?
16. Explique a relação entre os elementos da produção e o conceito de classe social.
17. Qual a relação entre aspectos econômicos e aspectos da vida das sociedades?
18. Qual a empresa dos nossos sonhos? O que falta para que ela aconteça?
19. Defina: Sociedade e indivíduo.
20. Sobre o pensamento de Comte em relação a sociologia enquanto uma ciência de análise da
sociedade, é correto afirmar:
a) Para Comte a sociologia procura manter uma ordem estabelecida sem compromisso de organizador.
b) Para Comte a sociologia procura estudar e compreender a sociedade para organizá-la e reformá-la.
c) Para Comte a sociologia é o sentido da ação humana individual.
d) Para Comte os objetivos da sociologia são os fatos sociais que devem ser estudados como coisas.
e) Para Comte o ser humano só se humaniza pela socialização.
21. Sobre Durkheim, quem é considerado o pai da sociologia moderna, é correto afirmar:
a) Deu a sociologia um objeto de estudo “os fatos sociais”, os quais devem ser estudados como coisas.
b) Deu a sociologia um objeto de estudo a “fatos sociais” citado numa obra “curso de filosofia positiva”.
c) É considerado o fundador da escola funcionalista de antropologia.
d) É considerado um dos mais importantes pensadores modernos, fundou a sociologia da religião.
f) É o principal idealizador do socialismo e do comunismo revolucionário.
22. A teoria positivista funcionalista acredita que a realidade é o que está aí, que a realidade é o que está
colocado a nossa frente, esta afirmação está diretamente relacionada a que pressuposto:
a) Essa tória afirma que a sociologia possui várias contradições e desigualdades, e devem ser mudadas.
b) Esta teoria afirma que as contradições da sociedade são fatores culturais, e que devem ser mudadas
com outra forma de análise.
c) De que tudo está equilibrado, esta teoria não aceita as mudanças ou transformações sociais.
d) Acredita que a realidade nem sempre é aquela que se apresenta a nossa frente.
e) Esta teoria não aceita qualquer forma de mudança violenta, e sim mudanças gradativas e
conseqüentes
23. Sobre a introdução da sociologia no Brasil é correto afirmar:
a) A sociologia penetrou no Brasil por Benjamin Constante, influenciado pelas teorias de Émile Durkheim.
b) A sociologia penetrou no Brasil através das obras de Gilberto Freire, influenciado pela teoria positivista.
c) A sociologia chegou no Brasil através de Benjamin Constante, admirador do positivismo de Augusto
Comte.
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d) Florestan Fernandes foi o grande sociólogo brasileiro que influenciou a chegada da sociologia no Brasil
através da sua obra “O Capital”.
e) Benjamin Constante influenciado pelas obras de Max Weber sobre o sentido da ação humana.
24. O que vem a ser o manifesto comunista de Karl Marx?
25. O que é o tipo ideal de uma sociedade?
26. O que são tipos de ação social?
27. Como a sociologia weberiana caracteriza-se por um dualismo racionalismo – irracionalismo?
28. O que vem a ser um novo pensamento social?
29. Como se constrói uma sociedade?
30. Diferencie pensamento positivo do positivismo de Comte?
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