Evolução histórica da antropologia QUEM É O HOMEM? Desde Sócrates, o conhecimento de si mesmo é a mais alta meta da indagação filosófica. “conhece-te a ti mesmo”. Embora o termo antropologia como “ciência do homem” esteja em uso desde o século XVI, somente depois do Iluminismo desenvolveu-se uma antropologia filosófica e teológica no sentido restrito. O Homem era compreendido a partir da cosmovisão. MITOS O homem sempre se interrogou sobre si mesmo. As primeiras respostas á pergunta “o que é o homem?” conservam-se nos mitos e lendas dos povos antigos. Antígona de Sófacles (séc. V a.C.) expressa a natureza trágica do homem. No mito e na arte documentam-se respostas que precedem a reflexão científica e a superam em significado e eficiência. Sofistas (séc. V a.C) – a descoberta do homem Deslocam o interesse da filosofia da natureza para o homem e aquilo que concerne à vida do homem como membro de uma sociedade e, portanto centrando seus interesses sobre a ética, a política, a retórica, a arte, a lingua, a religião e a educação, ou seja, sobre aquilo que chamamos a cultura do homem (período humanista da filosofia antiga). Destroem a imagem tradicional de homem. Protágoras de Abdera (nascido entre 491 e 481 a. C.) Foi o fundador do Relativismo ocidental que ele expressou na celebre fórmula “o homem é a medida de todas as coisas”, com isso entendendo que não existe critério absoluto para julgar o verdadeiro e o falso, o bem e o mal, mas que cada homem julga o próprio modo de ver as coisas. Mas está vinculado ao critério do útil; Socrátes (470/469 – 399 a.C) “conhece-te a ti mesmo” Para ele a síntese da filosofia é a pergunta “Quem é o homem?” “Qual é a essência do homem?” “O homem é sua alma”. Por alma ele entendia a razão, a consciência, a personalidade intelectual e moral (hoje diríamos a capacidade de entender e de querer) Conhecer a si mesmo é reconhecer tal verdade. Se o homem é sua alma a virtude do homem se atua com a “cura da alma”. Virtude (areté – a atividade ou modo de ser que aperfeiçoa cada coisa, fazendo-a ser aquilo que deve ser)= conhecimento, ciencia, atividade intelectual, razão. Moral ética: Os verdadeiros valores não são aqueles ligados as coisas exteriores, como a riqueza, o poder, a fama, e tampouco os ligados ao corpo, como a vida, o vigor, a saúde física e a beleza, mas somente os valores da alma, que se resumem todos no conhecimento. Corpo = instrumento da alma e subordinado a ela. Liberdade: entendida como liberdade interior (autodomínio). Uma vez que a alma é racional, ela alcança sua liberdade quando se livra de tudo o que é irracional, ou seja, das paixões e dos instintos. Felicidade (eudaimonia): virtude (a alma feliz= é vituosa = educação espiritual - A felicidade assume valência espiritual e se realiza quando na alma prevalece a ordem. Tal ordem se realiza mediante a virtude. Consequentemente, com essa descoberta, Sócrates criou a tradição moral e intelectual sobre qual a Europa espiritualmente se construiu. Sócrates - o homem é sua alma ALMA A alma é a consciência e a personalidade intelectual e moral, sobretudo razão e conhecimento. O corpo é instrumento da alma. Virtude a virtude da alma (ou seja, aquilo que a torna perfeita) é a ciência e conhecimento; manifesta-se como Autodomínio – domínio da razão sobre as paixões Liberdade – libertação da parte racional (= verdadeiro homem) em relação à passional. Liberdade interior Não violência – a razão se impõe pela convicção e não pela força Vício - o vício é a ignorância, por isso: - ninguém peca voluntariamente (pecado=erro) - As diversas virtudes são recondutíveis à unidade (=ciência do bem e do mal) e, também, o vício (ignorãncia do bem e do mal) Platão (428/427 -347 a.C) É o fundador da metafísica ocidental. A filosofia grega aborda a questão do homem dentro de uma cosmovisão dualista, pois divide a realidade em dois campos radicalmente diferentes: de um lado a dimensão corpórea e, de outro, a dimensão espiritual. Tal visão dualista também se aplicou ao homem. Platão – a concepção do homem – (Zôon logikón = Animal racional) A concepção platônica do homem se inspira em forte dualismo entre alma e corpo; O corpo é entendido como cárcere ou mesmo como túmulo da alma. (“fuga do corpo” “fuga do mundo”) Imortalidade da alma ( destino escatológico da alma) A alma é o verdadeiro homem. Psicologia – a alma é imortal porque é afim às idéias. Na morte o homem migra de corpo de corpo (metempsicose). Tem uma vida ultraterrena. Escolhe seu destino terreno conforme a verdade que possui Antropologia – a alma é o verdadeiro homem, o corpo é túmulo da alma. A filosofia enquanto se dirige a alma é exercício de morte (habitua a separar a alma do corpo), e por isso é purificação ALMA Concupiscível – Irascível – racional Aristóteles (384 – 322 a.C.) O homem = zôon politikón (animal social). o homem é um ser social que, pela razão e pela linguagem, é capaz de orientar-se, na convivência com os outros, em princípios éticos para manter justiça e ordem no Estado (pólis). Fim ultimo do homem (bem supremo) = felicidade O homem, enquanto ser racional, tem como fim a realização desta sua natureza específica, e exatamente na realização desta sua natureza de ser racional consiste sua felicidade. No homem têm notável importância, além da razão, os apetites e os instintos ligados a alma sensitiva. Tais apetites se opõem em si à razão, mas podem ser regulados e dominados pela própria razão. A submissão da alma sensitiva à razão ocorre por meio das virtudes éticas. (justa medida) O ideal do homem é viver na dimensão do divino “Se, portanto, o intelecto é algo de divino em confronto com o homem, também a vida segundo o intelecto será vida divina em confronto com a vida humana. Não convém, portanto, seguir a exortação daqueles que dizem que deve atender as coisas humanas quem tem natureza humana e a coisas mortais quem é mortal. Ao contrário: convém, o quanto possível, torna-se imortal e fazer de tudo para viver segundo a parte que em nós e mais excelente [...]” (Aristóteles, Ética a Nicômaco) ERA HELENÍSTICA (334 A.C – ALEXANDRE MAGNO ) A descoberta do indivíduo (Classico = cidadãos; helenismo = individuos. Cinismo (séc. III a.C.) – a autarquia, o bastar a si mesmo e a apatia e a indiferença diante de tudo. Desprezo do prazer. (riqueza e fama = males; pobreza e obscuridade = bens) Epicurismo (307 a.C) – felicidade = prazer (Jardim de Epicuro). O bem é o prazer Estoiscismo – homem = animal comunitário – (igualitalismo X escravidão). Ideal ético = apatia (não sentimento), os males nascem da paixão. Ceticismo: não existe verdade certa – o homem deve permanecer: indiferente, sem opnião (afasia) e sem exprimir julgamentos. O ideal é “a vida mais igual” (ausência de perturbação, quietude interior, serenidade). - Procura-se não a essência do homem, mas sua salvação. - O pensamento cristão coloca o problema do homem á luz da revelação. - Fontes da concepção cristã-medieval do homem: a tradição bíblica e a tradição filosófica grega. (filosofia submissa à teologia) Escola de Alexandria: o homem é feito a imagem de Deus (não a carne mais o espírito (alma intelectual). Libertar-se pela ascese dos limites que essa existência nos impõe, para alcançar aquela “semelhança com Deus. Homem três dimensões: corpo; alma-intelecto; espírito proveniente de Deus. 1)Dimensão física puramente animal (corpo); 2)Dimensão racional (alma e intelecto); 3)A dimensão superior, divina e transcendente do Espírito Em si mesma mortal, a alma-intelecto torna-se imortal à medida que Deus lhe dá seu Espírito Escola de Antioquia: o homem é a um tempo feito de barro e criado à imagem de Deus. (encarnação revela tanto a verdade do homem quanto a verdade de Deus). Insiste na realidade terrena do homem (saído da costela de adão). Ocidente: antropologia se inspira no platonismo. Na escolástica medieval ainda predomina, em grande parte, o pensamento grego. Agostinho (Platão) - Tomás (Aristóteles) Não propõe o problema do homem em abstrato, ou seja, o problema da essência do homem em geral: o que ele propõe é o problema mais concreto do eu, do homem como indivíduo irrepetível, como pessoa (personalidade). “Confissões” A essência do homem é o amor – quando o amor do homem volta-se para Deus (amando os homens e as coisas em função de Deus), é charitas. O homem é pessoa,isto é, indivíduo irrepetível. É imagem das três pessoas da trindade e, com efeito, é (ser), conhece e ama. Tem em si uma faculdade da vontade que é diferente da razão. A vontade é livre é a que escolhe o bem superior em vez do inferior, isto é, vive para Deus. • O conjunto dos homens que vive para Deus forma a cidade celeste, o conjunto dos maus forma a cidade terrena. • O mal não tem estatuto ontológico, mas nasce da confusão de um bem inferior com um bem superior. • O homem encontra sobretudo em si a prova da existência de Deus que se manifesta como verdade. Representante máximo da escolástica. O objeto primário de suas reflexões é Deus,não o homem ou o mundo, porque somente no contexto da revelação é que se torna possível raciocinar sobre o homem e o mundo. A razão está a serviço da fé (filosofia submissa á teologia). (“A graça não suplanta mas aperfeiçoa a natureza”) Tudo o que existe é ente e, portanto, também Deus e o mundo. Todavia, Deus e o mundo são entes de modo diverso: o ser se predica deles por analogia: Deus é o ser, o mundo tem o ser. (o homem pode conhecer Deus por meio (analogia) do mundo). Homem – dotado de razão e de livre arbítrio – conhece a lei divina, a lei eterna e lei humana e peca quando infringe as duas primeiras. (livre-arbítrio) - Pessoa como individualidade. - Acentua-se o valor e a dignidade do indivíduo, sua singularidade individual, sua decisão livre diante do destino eterno. - No contexto cristão formula-se o conceito de pessoa, cuja origem é teológica. - Idade média: o homem como mediador entre Deus e sua criação. Homem = corpo e alma. Corpo (vida terrena), alma (vida espiritual). Dualismo grego (cidadão de dois mundos). Humanismo e Renascimento (sec. XIV) Humanismo – conjunto de preposições que atribui ao ser humano uma posição especial no esquema das coisas. Discerne, nos humanos capacidades únicas a serem cultivadas e celebradas por si mesmas. o humanismo era apresentado como libertação do homem das trevas medievais conduzindo-o para iluminação moderna (“o homem é a medida de todas as coisas”). Concepção de homem - Um ser que participa tanto do mundo espiritual como do material enquanto corpo formam uma unidade única. - Afirmação do valor e da dignidade da pessoa humana. - Livre indagação da natureza física pelo homem, sem os limites impostos pela autoridade. - não mais se fundamenta a dignidade humana na “imagem e semelhança de Deus”, mas deriva-se sua especificidade da própria natureza humana. No contexto do iluminismo, a antropologia centra-se, em primeiro lugar, na questão da polaridade entre espírito e corpo, entre pensamento e sentimento, entre cabeça e coração. Antropologia racionalista (animal racional) René Descartes (1596-1650) – realidade = Res cogitans (coisa pensante) e res extensa (coisa extensa) = dualismo antropologia dualista – corpo e alma. - John Locke (1632 – 1704) – racionalismo empirista. - Concebe a imagem do homem liberal – otimismo naturalista; forte crença na razão. (prevalece XVIII e XIX). - Homem nasce como uma tábula rasa (folha em branco); conhecimento é adquirido pelos sentidos. - Primazia ao indivíduo que servirá de inspiração ao pensamento liberal. (liberdade e tolerância) - Razão universal (Newton – mecanicismo) Tenta uma síntese para conservar a liberdade e a dignidade do homem frente as correntes materialistas. Visão dualista do homem = razão e natureza animal – razão de afirmar-se sobre a natureza animal. Homem racional - deve ser guiado pela razão. No século XIX e começo do século XX, a pesquisa antropológica voltou-se para o estudo das condições físicas, mudando o objeto. Não mais interessava a questão da autorreflexão sobre a essência humana, mas a pesquisa da constituição corpórea, suas condições naturais e sua formação histórico natural • Atitude antifilosófica e antirreligiosa. • seperação entre antropologia física e antropologia filosófica-teológica • Concentrava-se na pesquisa da Physis humana. • No séc. XX é instituída a antropologia como disciplina científica. • A antropologia física busca as origens e a natureza biológica do homem na perspectiva da ciência empírica. Consenso – deve-se buscar o diálogo com as antropologias do momento para estabelecer uma relação entre elas. No século XX nasce uma antropologia da relação transformadora da filosofia para com as outras ciências. Seu grande mérito foi mostrar que a antropologia transcende os limites do método científico. a questão da antropologia extrapola as ciências singulares e, por isso, migrou para a filosofia e a teologia. Antropologia biológica (homem = animal); antropologia filosófica (homem animal). • Os animais estão vinculados ao seu ambiente enquanto o homem é aberto ao mundo. • Com inteligência o homem compensa suas carências biológicas. • Sua conduta é marcada profundamente por tradições e instituições culturais e menos por instintos herdados. • O homem é o único vivente que indaga sobre sua própria natureza, que se torna um problema para si mesmo. • Somente ele é consciente de si. • Autoconsciência – compreendemo-nos de, uma lado, como sujeitos que experienciam o mundo e, de outro, permanecemos parte do mundo. • O homem tem além da dimensão biológica, também a dimensão religiosa e filosófica. • Referencias: ZILLES, Urbano. Antropologia Teológica. São Paulo: Paulus, 2011. (Coleção Estudos Antropológicos) REALE, Giovanni. História da filosofia. São Paulo: Paulus, 2003. (vol. 1 a 7)