Moacir Natercio Ferreira Junior (PPGL - UnB) & Heloísa Maria Moreira Lima Salles (PPGL - UnB). PROPRIEDADES MORFOSSINTÁTICAS E SEMÂNTICAS DE SENTENÇAS IMPERATIVAS NO PORTUGUÊS BRASILEIRO Este trabalho investiga aspectos relacionados à estrutura sintática das sentenças imperativas no português brasileiro (PB), na comparação com o português europeu (PE). A tradição gramatical classifica o PE como língua de imperativo verdadeiro, por possuir morfologia verbal própria ao modo imperativo. Além da morfologia própria (1), entre as particularidades do imperativo verdadeiro, constam (i) a impossibilidade de realização de sujeito pré-verbal (2), (ii) a impossibilidade de negar a forma do imperativo verdadeiro, sendo utilizada, nesse caso, a forma 'supletiva', advinda do subjuntivo ((1) Entra! (2p)/ Entre! (3p.gramatical); (2) *Tu entra/ *Você entra!/ (3) *Não entra!/ Não entres (2p)/ Não entre! (3p.gramatical)) – características também encontradas em línguas próximas, como o espanhol (MATEUS et alii. 2004; RIVERO 1994). Já o PB apresenta duas formas verbais em variação (oriundas, por hipótese, do imperativo verdadeiro e supletivo), cuja distribuição não apresenta restrições ao uso da negação, a qual pode ocorrer em três configurações – em posição pré-verbal, em posição pré-verbal e pós-verbal, em posição pós-verbal –, além de manifestar uma forma reduzida na posição pré-verbal (Não/Num faz/faça isso; Não/Num faz/faça isso não; Faz/Faça isso não). Outra característica do imperativo no PB é a possibilidade de realização do sujeito em posição pré-verbal e pós-verbal ((4) Você entra/entre aqui!; Entra/Entre você aqui!). Seguindo Scherre (2003) e Scherre et al. (2010), assumimos que o modo imperativo no PB, sendo realizado por formas variantes sem restrição de distribuição no que se refere à presença da negação, não manifesta o chamado imperativo verdadeiro, fazendo uso de um paradigma supletivo para expressar o modo imperativo – tanto em relação às formas do indicativo, quanto em relação às formas do subjuntivo. Assumindo-se que o desenvolvimento do paradigma supletivo associado ao indicativo (em variação com as formas associadas ao subjuntivo) relaciona-se à reanálise do sistema pronominal e ao sincretismo morfológico decorrente dessa reanálise (conforme CARDOSO 2009), propõe-se que a força ilocucionária imperativa no PB ocorre em uma configuração em que o núcleo da categoria C é marcado para o traço optativo, o qual, segundo Rivero (1994), é característico da subordinação. Conforme proposto em Ferreira Junior (2011) e Ferreira Junior & Salles (2014), uma característica do traço optativo em C é que seu licenciamento não exige o movimento do verbo para C, o que interage com a possibilidade de o verbo ocorrer na série supletiva do indicativo e do subjuntivo, em virtude da neutralização da oposição indicativo vs subjuntivo no sistema verbal no PB, em configurações de complementação com verbos volitivos (Quero que você/ele entre/ entra aqui). Essa configuração não restringe a ocorrência de marcadores negativos, além de licenciar a ocorrência de sujeito pré-verbal e pós-verbal. Além disso, a configuração com o traço optativo em C admite o sujeito de 3ª pessoa, como em Deus seja louvado! O amor seja eterno! (além da 2ª pessoa), distinguindo-se da estrutura com o verbo no imperativo verdadeiro, que se restringe à 2ª pessoa. Diferentemente da configuração com o imperativo verdadeiro, em que a negação é bloqueada (cf. (1)), a possibilidade de realizar a negação com ambas as formas verbais supletivas está, portanto, associada à presença do traço ‘optativo’ em C. Quanto ao licenciamento do sujeito em sentenças imperativas no PB em posição préverbal ou pós-verbal (cf. (4)), nossa proposta é a de que, na oração com sujeito préverbal, o verbo permanece em T, enquanto na oração com sujeito pós-verbal o verbo se move para C – a opcionalidade na ordem SV/VS indica a opcionalidade do movimento, não havendo contraste semântico. Considerando-se que o PB é uma língua de ordem VS restrita (cf. Pilati 2006), a ausência de restrição à ocorrência da sentença imperativa com ordem VS é atribuída à codificação da força ilucucionária imperativa com a lexicalização do traço formal optativo em C pelo movimento do verbo. Quanto às sentenças imperativas com ordem SV, nossa hipótese é a de que existe diferença em relação à sentença declarativa com ordem SV, a qual é resolvida como a seguir: (i) sendo a forma verbal supletiva oriunda do subjuntivo, não há ambiguidade, e o traço optativo em C é verificado na sintaxe fechada pelo verbo em T ([CP COPT [TP Você entre aqui]]); (ii) sendo a forma verbal supletiva oriunda do indicativo, a força ilocucionária imperativa será deduzida do contraste com a interpretação não habitual/ genérica de T. Assume-se, portanto, a presença de um operador genérico em T, que permite distinguir Você entra aqui (todos os dias), de Você entra aqui!, com leitura episódica. Nesse sentido, a diferença entre sentenças imperativas e declarativas no PB é analisada em termos da presença de um traço optativo em C, e das propriedades associadas à sintaxe do sujeito. PALAVRAS-CHAVE: imperativo; forma supletiva; traço optativo; ordem SV/VS.