Sociologia - Videolivraria

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Sociologia
Geral
Noêmia Lazzareschi
2009
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© 2007 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por
escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.
L432
Lazzareschi, Noêmia. / Sociologia Geral. / Noêmia Lazzareschi.
— Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2009.
112 p.
ISBN: 978-85-7638-719-0
1. Ideologia. 2. Sociologia Geral. 3. Sociedades Industriais.
4. Competências Profissionais. I. Título.
CDD 320.5
Todos os direitos reservados.
IESDE Brasil S.A.
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
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Noêmia Lazzareschi
Doutora em Ciências Sociais pela Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). Mestre em
Ciências Sociais do Trabalho pelo Institut Supérieur du Travail da Université Catholique de Louvain (Bélgica). Bacharel e Licenciada em Ciências
Sociais pela Universidade de São Paulo (USP).
Professora do departamento de Sociologia da
Faculdade de Ciências Sociais e do Programa de
Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
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sumário
sumário
A promessa e
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as tarefas das Ciências Sociais
11 | Condições históricas do nascimento das Ciências Sociais
17 | As Ciências Sociais
23
As sociedades industriais capitalistas
23 | Emile Durkheim
25 | Max Weber
26 | Karl Marx
28 | A estrutura das sociedades industriais capitalistas
30 | As empresas
As diferentes formas de
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administração do processo
de trabalho no capitalismo moderno
39 | A acumulação primitiva do capital
40 | A divisão tecnológica do trabalho
41 | Taylorismo e fordismo
45 | Impactos do taylorismo/fordismo sobre o trabalhador
48 | Os Anos Dourados
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A crise econômica mundial,
a globalização da economia 59
e a reestruturação produtiva
61 | A crise da economia mundial
64 | A globalização da economia
69 | A reestruturação produtiva ou a nova lógica organizacional
71 | O desemprego e as novas relações de trabalho
88 | Sindicalismo no Brasil
Novas competências profissionais
97
107
Referências
111
Anotações
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Apresentação
Sociologia Geral
Historicamente situados, o mundo ­empresarial
e o mundo do trabalho repercutem em seu interior as condições econômicas, políticas, ­sociais e
culturais hoje universalmente existentes, ­devendo
ser considerados um microcosmos delas derivado.
Frutos sociais do processo histórico mundial, são,
no entanto, ao mesmo tempo seus produtores,
irradiando universalmente as suas inovações
tecnológicas e organizacionais das quais surgem
novos produtos e serviços que inundam os mercados e determinam, em grande parte, novos
estilos de vida. Processo social universal e mundo
empresarial e do trabalho estão, pois, em relações
recíprocas, constituindo uma só realidade social,
objeto de estudo das Ciências Sociais.
Assim, a disciplina Sociologia Geral tem
como objetivo apresentar os subsídios teóricos
produzidos pelas Ciências Sociais e, em especial,
pela Sociologia, para a compreensão das interrelações entre a sociedade e o mundo empresarial e do trabalho.
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A promessa e as tarefas
das Ciências Sociais
Wright Mills (1965, p. 10), um dos mais conceituados sociólogos norteamericanos do século XX, no livro A Imaginação Sociológica, chama a ­atenção
para o fato de que
[...] raramente [os homens] têm consciência da complexa ligação entre suas vidas e o
curso da história mundial; por isso, os homens comuns não sabem, quase sempre, o que
essa ligação significa para os tipos de ser em que se estão transformando e para o tipo de
evolução histórica de que podem participar. Não dispõem da qualidade intelectual básica
para sentir o jogo que se processa entre os homens e a sociedade, a biografia e a história,
o eu e o mundo.
A qualidade intelectual básica necessária para que os homens compreendam a história, a biografia e as íntimas relações entre elas, dentro da sociedade, é a “imaginação sociológica”. Essa qualidade permite a cada um de
nós se compreender como produto e produtor da vida social e, por isso, se
compreender como ser historicamente condicionado, cujas possibilidades e
limitações na vida são, em grande parte, circunscritas pela estrutura da nossa
sociedade num determinado momento da história mundial.
A conscientização política é a expressão primeira, e talvez a mais importante, da “imaginação sociológica”. Quem a possui sabe não poder traçar
livremente o próprio destino, cujo desenho é esboçado pelas condições
sociais existentes, criadas e transmitidas pelas gerações passadas, mas reproduzidas, reformadas ou transformadas por decisões políticas da geração
presente, das quais certamente exigirá participar para poder exercer algum
controle sobre o curso de sua própria vida.
Possibilitar o desenvolvimento da imaginação sociológica é, segundo
Wright Mills, a promessa das Ciências Sociais. Para cumpri-la, investigam,
analisam, explicam – norteadas pelos procedimentos metodológicos e teóricos definidores do conhecimento científico – a estrutura social, demonstrando os princípios que a constituem, os mecanismos de sua manutenção e
mudança e a psicologia de homens e mulheres que dela emerge. A compreensão da estrutura social é condição necessária para situar historicamente o
objeto de estudo de cada uma das Ciências Sociais, por mais específicos que
sejam os problemas e as perspectivas teóricas que definem o eixo de suas
preocupações particulares.
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Sociologia Geral
Representando o consenso entre os mais diferentes autores sobre as tarefas e os objetivos que as Ciências Sociais se auto-impõem, Wright Mills considera como a mais importante tornar claros e transparentes os valores sociais
aceitos, pois que os problemas ou questões sociais resultam de sua transgressão, cuja origem deve ser buscada nas contradições da estrutura social.
Uma questão social é um assunto público: é um valor estimado pelo público que está
ameaçado. [...] A questão, na verdade, envolve quase sempre uma crise nas disposições
institucionais, e com frequência também aquilo que os marxistas chamam de“contradições”
ou “antagonismos”. (WRIGHT MILLS, 1965, p. 15)
São muitas as questões sociais que enfrentamos: a violência urbana, os
conflitos armados, a miséria absoluta de milhões de pessoas, a favela, o
­desemprego, o abandono de crianças, a prostituição infantil, as drogas, o
analfabetismo etc. que ferem os valores centrais das sociedades humanas:
o respeito à vida e à dignidade humana, distanciando-nos da realização do
sonho de instauração de uma sociedade justa, na qual, de fato, possam se
realizar os princípios de Igualdade, Liberdade e Fraternidade, herdados da
Revolução Francesa, e que inauguraram o mundo moderno.
O estudo científico da estrutura social é, pois, o ponto de partida não só
do reconhecimento dos problemas sociais que nos afligem, mas, sobretudo, o ponto de partida da descoberta de suas origens e dos meios disponíveis para solucioná-los, ou pelo menos minorá-los, no contexto do jogo
de interesses de diferentes grupos e classes sociais das decisões políticas.
Mas a imaginação sociológica, que desperta e aprofunda a conscientização
política, torna-se o vetor do processo político democrático, impedindo que
os homens se transformem em simples marionetes da história e objeto do
poder autoritário de alguns.
Para Wright Mills, as Ciências Sociais tornaram-se o denominador comum
de nosso período cultural. De fato, evidencia-se universalmente o reconheci­
mento da importância do desenvolvimento da análise científica da vida
social, pois pudemos constatar, sobretudo a partir da Segunda Guerra
­Mundial, que a utilização política dos conhecimentos produzidos pelas ciências físico-químico-naturais pode gerar mais problemas humanos e sociais
do que realmente contribuir para resolver os já existentes. Não obstante, até
aquele momento, a humanidade acreditou que o conhecimento por elas
produzido era o mais eficaz e eficiente instrumento de que dispunha não só
para melhorar as suas condições de vida, mas também para solucionar todos
os graves e persistentes problemas sociais. Por isso, as ciências naturais receberam especial atenção ao longo de mais de um século no mundo moderno,
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A promessa e as tarefas das Ciências Sociais
sem que se prestasse atenção às prováveis consequências dramáticas do uso
político que delas se pode fazer.
Com efeito, basta lembrar a tragédia provocada pela bomba atômica em
Hiroshima e Nagasaki; a ameaça constante de utilização de armas nucleares;
o sofrimento de milhões de famílias devido à introdução de sofisticadas tecnologias que destroem milhares de postos de trabalho e geram desemprego
em massa; os problemas éticos e morais originários das potencialidades da engenharia genética, a devastação da natureza, a poluição do ar, sonora e visual
etc. para se dar conta da necessidade de se avaliar continuadamente os efeitos
sociais e humanos, éticos e morais, positivos e negativos, construtivos e destrutivos, da utilização do conhecimento produzido por aquelas ciências.
E essa avaliação depende não só da imaginação sociológica, mas da
­produção intelectual dos cientistas sociais, cujas obras podem ser consideradas como a consciência crítica do processo histórico universal, contribuindo
para o desenvolvimento da consciência crítica de toda a humanidade.
São essas as principais tarefas e objetivos das Ciências Sociais, cujos estudos estendem-se inevitavelmente ao mundo das empresas e do trabalho,
ajudando os administradores de empresas a atuarem profissionalmente com
maior clareza e responsabilidade social, sem perder de vista os seus objetivos específicos de promoção da eficiência do processo produtivo e de prestação de serviços.
Condições históricas do nascimento
das Ciências Sociais
A análise científica da vida social data do século XVIII e deve ser considerada como o produto intelectual mais importante das transformações econômicas, políticas, sociais e culturais em curso desde o Renascimento e que
se cristalizaram no Ocidente com a Revolução Industrial e a Revolução Francesa, marcos do surgimento do mundo moderno, isto é, da consolidação da
ordem social capitalista.
a) A Revolução Industrial
A invenção da máquina a vapor na Inglaterra de 1750 significou o início de
uma revolução nas técnicas de produção, o que possibilitou a ­mecanização
do processo de trabalho em muitos ramos da atividade econômica, já na
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Sociologia Geral
­ rimeira metade do século XIX, tendo significado também uma revolução
p
na organização da produção que, a partir de então, passou a ser realizada no
interior de empresas com caráter permanente e racional.
Ao propiciar o aumento da produtividade do trabalho, a redução dos
custos de produção e, como decorrência, o barateamento das mercadorias,
a Revolução Industrial permitia vislumbrar o nascimento de uma sociedade
de abundância e mais justa, graças às possibilidades econômicas de uma
distribuição mais igualitária da renda.
Rapidamente irradiada para o continente, a Revolução Industrial, contrariamente a todas as expectativas, gerou problemas sociais de extrema gravidade que se alastraram, também rapidamente, por toda a Europa.
Em primeiro lugar, provocou o êxodo rural de enormes contingentes de
trabalhadores entusiasmados com as perspectivas de melhoria de suas condições de vida. A conseqüência inevitável, porém, foi o desenvolvimento acelerado da urbanização não planejada, cujo resultado se expressava nas péssimas
condições habitacionais dos trabalhadores, na imundície das cidades industrializadas, na falta de fornecimento de água, nas epidemias de cólera e de tifo
que se espalharam por todo o continente, dizimando milhares de pessoas.
Segundo Eric J. Hobsbawm (1977, p. 225), o mais renomado historiador
do século XX:
só depois de 1848, quando as novas epidemias nascidas nos cortiços começaram a
matar também os ricos, e as massas desesperadas que aí cresciam tinham assustado os
poderosos com a revolução social, foram tomadas providências para um aperfeiçoamento
e uma reconstrução urbana sistemática.
Em segundo lugar, os baixos salários e o desemprego de milhares de
traba­lhadores, pois [até a década de 1840]
[...] grandes massas da população continuavam até então sem ser absorvidas pelas novas
indústrias e cidades, como um substrato permanente de pobreza e desespero, e também
as grandes massas eram periodicamente atiradas ao desemprego pelas crises que, até
então, mal eram reconhecidas como temporárias e repetitivas. (HOBSBAWM, 1977, p. 228)
A criminalidade e a violência urbana, o alcoolismo, a prostituição, o suicídio
constituíam o quadro de deterioração da vida social, aprofundado pela enorme
desigualdade social. Ainda nas palavras de Eric J. Hobsbawm, (1977, p. 227)
a época em que a Baronesa de Rothschild usou um milhão e meio de francos em jóias
no baile de máscaras do Duque de Orleans, em 1842, era a mesma em que John Bright
assim descreveu as mulheres de Rochdale: “2 mil mulheres e moças passaram pelas
ruas cantando hinos – um espetáculo surpreendente e singular – chegando às raias do
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A promessa e as tarefas das Ciências Sociais
sublime. Assustadoramente famintas, devoravam uma bisnaga de pão com indescritível
sofreguidão, e se o pedaço de pão estivesse totalmente coberto de lama seria igualmente
devorado com avidez.”
Em terceiro lugar, o rígido controle e disciplina impostos pelos patrões
que tornavam infernal a vida dos trabalhadores das fábricas, submetidos a
jornadas de trabalho de 16 horas e a todo tipo de castigos e multas.
A Revolução Industrial não foi, portanto, apenas uma revolução econômica, que se tornou um marco na história da humanidade ao abrir as portas
do crescimento e desenvolvimento econômicos por suas inovações tecnológicas e organizacionais. Foi, também, responsável pelo aparecimento de
novos e contundentes problemas humanos e sociais, além de ter dado início
ao fim do antigo regime, com a entrada definitiva de novos personagens no
cenário social: o empresário capitalista e o trabalhador proletário que passaram a constituir as duas grandes classes sociais da moderna sociedade capitalista nascente, permanentemente em conflito de interesses por ocuparem
posições diferentes no processo de produção da riqueza. O capitalista é o
proprietário dos meios de produção, isto é, do capital, da riqueza que gera
mais riqueza – terra, tecnologia e trabalho concentrados na empresa por ele
administrada – e o proletário é proprietário apenas de força de trabalho, isto
é, de capacidade para trabalhar, produzir e reproduzir em escala ampliada
o capital, obrigando-se a vender a sua única propriedade no mercado de
­trabalho em troca de um salário com o qual deverá sustentar sua prole.
Por essa razão, a Revolução Industrial não pode ser lembrada apenas
como revolução econômica, devendo ser considerada uma verdadeira revolução da estrutura social que precipitou as transformações políticas, jurídicas
e ideológicas consumadas pela Revolução Francesa.
b) A Revolução Francesa
A Revolução Francesa de 1789 foi o acontecimento de maior repercussão
no Ocidente por ter destruído definitivamente o antigo regime absolutista
e a supremacia de uma aristocracia decadente e por ter criado as condições
necessárias e suficientes para o surgimento do Estado Moderno e a consolidação do regime capitalista de produção.
Foi uma revolução conduzida pela burguesia enriquecida, inconformada
com os consideráveis privilégios e honrarias sociais concedidos aos nobres e
ao clero, e sequiosa de poder para, sobretudo, pôr fim aos altos impostos e
às rígidas regulamentações da política mercantilista vigente que lhe restrinEsse material é parte integrante do Aulas Particulares do IESDE BRASIL S/A, 13
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Sociologia Geral
giam a liberdade econômica. E pôde contar com o apoio imediato dos camponeses exasperados com o pagamento de um conjunto de obrigações existentes desde a época feudal que lhes limitavam sobremaneira os ganhos.
Grupos de interesses econômicos contrariados encontraram nas idéias
dos filósofos iluministas e dos economistas o arsenal intelectual para defla­
grar uma revolução que atingiu mortalmente as instituições políticas e
­jurídicas vigentes pela força da nova ideologia, inspirada principalmente nas
obras de: Locke (1632-1704), Voltaire (1694-1778), Montesquieu (1689-1755),
os grandes críticos da monarquia absolutista e pais da teoria política liberal,
e Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), fundador da teoria política democrática moderna, obras que se constituíram no fundamento teórico no qual se
assenta o Estado Moderno.1
1
As obras mais importantes de John Locke são: Tratados sobre o Governo; Cartas
sobre a Tolerância; e Tratado
sobre a Racionalidade do
Cristianismo. As de FrançoisMarie Arouet Voltaire são:
Cartas ­Filosóficas; Candido;
Ensaio sobre os Cos­tumes. A
principal obra de Charles
de Secondat, barão de Montesquieu é Espírito das Leis.
As de Jean-Jacques Rousseau são: O Contrato Social;
­Discurso Sobre as Ciências
e as Artes; Discurso Sobre a
Origem e os Fundamentos
da Desigualdade Entre os
Homens; e Emílio.
Os economistas contribuíram com a crítica ao mercantilismo que impunha severas restrições à atividade econômica com sua política de amplo controle estatal sobre o comércio, favorecendo as exportações e restringindo as
importações para manter uma balança comercial que garantisse o enriquecimento do tesouro do país, e amplo controle da produção doméstica, com
leis que regulamentavam os salários, as condições de emprego, a qualidade
dos produtos etc.
A crítica à política mercantilista encontrou na obra de Adam Smith, A
­Riqueza das Nações, de 1776, a sua expressão mais contundente e qualificou
o autor como o pai do liberalismo econômico. A teoria por ele ­elaborada
defendia o livre mercado por sua fundamentação na competição entre os
produtores que, movidos pelo desejo egoísta de obter sempre mais lucros,
garantiriam não só a produção do demandado pelos ­consumidores, como
também o aprimoramento da qualidade dos produtos, a busca da eficácia e
eficiência do processo produtivo para a redução dos custos e o ­barateamento
das mercadorias, assegurando, dessa maneira, o desenvol­vimento eco­
nômico continuado.
Assim, intelectualmente fundamentados, os revolucionários de 1789
elaboraram a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em setembro
daquele ano, reunindo nesse documento as idéias que comandaram a transformação da sociedade francesa e mais tarde de todo o mundo ocidental.
Nas palavras de Eric J. Hobsbawm (1977, p. 77), “esse documento é um
­manifesto contra a sociedade hierárquica de privilégios nobres, mas não
um manifesto a favor de uma sociedade democrática e igualitária”, porque,
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A promessa e as tarefas das Ciências Sociais
apesar de seu primeiro artigo declarar que “os homens nascem e vivem
livres e iguais perante as leis”, prevê a existência de distinções sociais, ainda
que “­somente no terreno da utilidade comum”. Mas, mesmo assim, não se
pode deixar de considerar a importância social, política, econômica e cultural desse documento porque, de fato, ele inaugura o início do processo
de resgate do conceito grego de cidadão, reformulando-o e ampliando-o,
condição ­necessária para o surgimento do Estado Moderno, isto é, do Estado
­Racional, fundado no Direito Racional e na autoridade legal-racional, administrado burocraticamente e, segundo Max Weber (1864-1920), um dos
clássicos da Sociologia, “único terreno em que o capitalismo moderno pode
prosperar” (WEBER, 1980, p.160).
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em seus demais artigos,
foi decisiva para o advento das instituições políticas, jurídicas e econômicas
necessárias e suficientes para o desenvolvimento do regime capitalista de
produção e do Estado democrático, ao declarar a propriedade privada um
direito natural, sagrado, inalienável e inviolável, como também a liberdade
de expressão, a tolerância religiosa e a liberdade de imprensa, ao mesmo
tempo que determinava ser o povo a fonte de toda soberania. A partir dessa
declaração, o povo foi conquistando aos poucos o direito de se organizar
politicamente, quer em partidos políticos, quer em movimentos sociais, não
só para eleger seus representantes, mas também para contestar e reivindicar
melhores condições de vida, ponto de partida para a efetivação de mudanças na estrutura social.
Não obstante a importância desses acontecimentos, cumpre ressaltar que
tanto a Revolução Industrial quanto a Revolução Francesa, como também as
Ciências Sociais, são filhas do processo de racionalização da cultura ocidental, iniciado dois séculos antes, e cujas expressões mais significativas são a
própria ciência e a filosofia iluminista.
c) O Racionalismo
O Racionalismo tem origem na chamada revolução copernicana do século
XVI que, além de Copérnico (1473-1543), é obra também de Kepler (15711630) e Galileu (1564-1642), cujas idéias, investigações e estudos sobre o
universo se constituíram nas primeiras e mais contundentes contes­tações
à autoridade da Igreja Católica Apostólica Romana como fonte única do conhecimento oficialmente aceito, até então considerado sagrado, absoluto,
incontestável. Fizeram nascer a convicção de que os homens, ­dotados de
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Sociologia Geral
razão e de sentidos pela graça de Deus, são capazes de desvendar os mistérios de Sua criação e explicá-los corretamente.
No século XVII, René Descartes (1596-1650), matemático e físico, tornouse o maior expoente do racionalismo, ao considerar a razão como a única
fonte segura de conhecimento. No Discurso do Método, afirmava ser necessário não só duvidar da veracidade dos conhecimentos existentes, como
também das impressões sensoriais, pois nada garante que os nossos sentidos sejam confiáveis.
Para ele, a reflexão filosófica deve partir de verdades ou axiomas simples
e evidentes por si mesmos, como “Penso, logo existo”, e, por dedução matemática, como na geometria, chegar a um conjunto perfeitamente lógico de
conhecimentos sobre indagações específicas.
Com Descartes, o processo de secularização da cultura ganha fôlego
porque o método racionalista por ele elaborado foi o passo decisivo para o
desenvolvimento da crítica racional às verdades que sustentavam a ordem
estabelecida. Os resultados da aceitação desse método como instrumento
único para a construção do conhecimento se expressaram na emancipação
do pensamento das verdades religiosas, na renúncia a uma visão sobrenatural para explicar os fatos e na contestação dos fundamentos da sociedade
feudal, suas instituições e costumes. Em outras palavras: o resultado do racionalismo foi a consagração do livre pensamento, livre da visão de mundo dominante até então, livre para ensaiar novas e revolucionárias construções.
O Iluminismo ou Filosofia das Luzes, cuja manifestação suprema se deu
na França do século XVIII, foi o ponto culminante dessa revolução intelectual em curso que abalou definitivamente os alicerces culturais da sociedade
medieval européia.
A crítica feroz que seus principais representantes desfecharam contra a
sociedade medieval também se assentava na convicção de que os procedimentos intelectuais que possibilitaram o desenvolvimento das ciências
naturais deveriam ser aplicados na explicação da realidade social como fundamento racional para a sua rejeição. E esses procedimentos não se limitavam à aplicação do método dedutivo de investigação legado por Descartes,
mas também do método empirista desenvolvido por Francis Bacon (15611626, cuja obra principal é Novum Organum), baseado na observação e na
experimentação para a descoberta das leis universais invariáveis que regem
a ordem natural e a ordem social.
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A promessa e as tarefas das Ciências Sociais
Pode-se afirmar que da conjugação do método racionalista e do método
empirista advém a concepção moderna de ciência, hoje universalmente
aceita como o caminho para a busca da verdade e, portanto, um dos valores
centrais das sociedades ocidentais. E dessa conjugação surgiram trabalhos
extraordinários no campo das ciências físico-químico-naturais ainda nos séculos XVII e XVIII. Basta registrar os nomes de Isaac Newton (1643-1727) e
Leibniz (1646-1716), no campo da Física e da Matemática; de Boyle (16271691) e de Lavoisier (1743-1794), no campo da Química; e de Lineu (17071778) e de Buffon (1707-1788), no campo da Biologia, para compreender as
origens das convicções dos iluministas de que a Razão e a Ciência poderiam
permitir o exercício de um certo controle humano sobre o mundo e, fundamentalmente, sobre a realidade social, agora compreendida como construção humana e não mais como realização da vontade divina e, portanto,
passível de crítica, de contestação e de transformação.
Preparava-se, assim, o caminho para o processo revolucionário de instauração do mundo moderno e para o desenvolvimento das Ciências Sociais.
As Ciências Sociais
Não há fronteiras rígidas entre as Ciências Sociais, pois todas, como vimos,
têm por objeto de estudo o comportamento social determinado pelo processo histórico universal. No entanto, cada uma delas focaliza um aspecto específico desse comportamento, analisando-o de uma perspectiva própria, em
torno de conceitos particulares que definem a sua construção teórica. Mas
todas as Ciências Sociais se beneficiam dos conhecimentos produzidos pelos
autores de cada uma, num íntimo entrelaçamento que permite o enriquecimento e aprofundamento da compreensão da vida social. Embora se possa
distinguir a especificidade da produção de cada uma das Ciências Sociais,
nela se identifica a contribuição do trabalho das demais, pelo menos no que
diz respeito à utilização dos principais conceitos que indicam o seu campo
de estudo particular e os problemas fundamentais de que se ocupam.
A Economia Política, cuja origem é a Escola Clássica da Inglaterra com a
publicação das obras de Adam Smith, Ricardo (1772-1823, autor de Princípios de Economia Política) e Malthus (1766-1834, autor de Ensaio Sobre a População), estuda as ações sociais voltadas à produção, circulação, distribuição e consumo de bens e serviços em seu contexto institucional nacional e,
hoje, internacional.
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Sociologia Geral
A Ciência Política analisa as instituições políticas que regulamentam a
distribuição do poder, as diferentes formas de governo, a administração do
Estado, a luta pelo poder, o comportamento político em suas diferentes manifestações: político-partidário e eleitoral, as atitudes populares diante das
questões políticas, a participação em movimentos sociais, enfim, o processo
político em geral, inclusive no seio das organizações e empresas.
A História é a ciência que estuda o processo de produção da vida (isto
é, das condições materiais de existência e da consciência, expressa no
­conjunto de crenças, valores, padrões de comportamento), na expectativa
de ­apreendê-lo em suas diferentes manifestações e especificidades ao longo
do tempo. Detém-se sobretudo na análise daqueles acontecimentos que
decisi­vamente contribuíram para a sua transformação com o surgimento de
novas instituições sociais.
A Psicologia Social investiga as relações recíprocas entre personalidade e
estrutura social, demonstrando a influência do ambiente social na formação
da personalidade e, como, em contextos grupais, os processos sociais são
por ela influenciados, como, por exemplo, na ação da multidão, tal como tumultos ou linchamentos, nos estudos de opinião pública, nos movimentos
sociais, nas atitudes grupais em relação aos preconceitos de qualquer natureza etc., ou seja, como as reações coletivas alteram a conduta individual e
interferem na vida social.
A Antropologia focaliza seus estudos na construção da cultura, ou seja,
no mundo dos significados e dos valores sociais predominantes nas mais
diferentes sociedades, inclusive nas sociedades ágrafas, ou sem grafia, analisando-as em todos os seus aspectos, como conjuntos. Por isso, as fronteiras
entre a Antropologia e a Sociologia são muito tênues.
A Sociologia, ciência que subsidia o curso Sociologia Geral, investiga,
analisa, explica e interpreta a estrutura social como um todo, levando em
consideração todos os aspectos que a constituem, o econômico, o político, o
cultural, o histórico, o psicológico, como também os demais fenômenos que
interferem na configuração da vida social, como a demografia, a ocupação
do espaço físico etc. É a ciência das relações sociais norteadas pelas instituições, ou padrões de comportamento, que expressam os valores, crenças,
idéias, sentimentos, compartilhados pelos membros de uma sociedade, e
princípios sobre os quais se assenta a organização da vida social em todas
as suas dimensões: econômica, política, social, cultural, determinando-lhe a
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A promessa e as tarefas das Ciências Sociais
estrutura e assegurando-lhe uma ordem. Por isso, muitos autores se referem à Sociologia como a ciência que procura descobrir, descrever, explicar
e compreender a ordem que caracteriza a vida social, ou seja, os padrões
de comportamento que a caracterizam e que “permitem a corrente rotineira
da vida social” (INKELES, 1964, p. 47), permitindo, portanto, prever-se o seu
curso e, ao mesmo tempo, indicar as manifestações de desordem, de conflito
e de mudança, pois a realidade social é processo.
Ampliando seus conhecimentos
Estudando Sociologia
(GIDDENS, 2005)
A imaginação sociológica nos permite ver que muitos eventos que parecem dizer respeito somente ao indivíduo, na verdade, refletem questões mais
amplas. O divórcio, por exemplo, pode ser um processo muito difícil para
alguém que passa por ele – o que Mills chama de “problema pessoal.” Mas
o divórcio, assinala Mills, é também um problema público numa sociedade
como a atual Grã-Bretanha, onde mais de um terço de todos os casamentos
termina dentro de dez anos. O desemprego, para usar outro exemplo, pode
ser uma tragédia pessoal para alguém despedido de um emprego e inapto
para encontrar outro. Mesmo assim, isso vai bem além de uma questão geradora de aflição pessoal, se considerarmos que milhões de pessoas numa sociedade estão na mesma situação: é um assunto público, expressando amplas
tendências sociais.
Tente aplicar esse tipo de perspectiva à sua própria vida. Não é necessário
pensar apenas em acontecimentos preocupantes. Considere, por exemplo,
por que você está virando as páginas deste livro – por que você decidiu estudar Sociologia. Você pode ser um estudante de Sociologia relutante, fazendo
o curso somente para preencher créditos exigidos. Ou você pode estar entusiasmado para descobrir mais sobre o assunto. Quaisquer que sejam as suas
motivações, você provavelmente tem muito em comum, sem saber necessariamente, com outros que estudam Sociologia. Sua decisão individual reflete
sua posição numa sociedade mais vasta.
As seguintes características se aplicam a você? Você é jovem? Branco? Você
vem de um background profissional ou de colarinho-branco? Você já teve,
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Sociologia Geral
ou ainda tem, um trabalho de meio-turno para aumentar seus ganhos? Você
quer encontrar um bom trabalho quando terminar sua educação, mas não
está especialmente empenhado em estudar? Você não sabe realmente o que
é sociologia mas acha que tem algo a ver com como as pessoas se comportam
em grupo? Mais de três quartos de vocês responderão “sim” a tais questões.
Estudantes universitários não são o típico da população como um todo, mas
tendem a ser provenientes de ambientes mais favorecidos. E suas atitudes geralmente refletem aquelas sustentadas por amigos e conhecidos. Os ambientes sociais dos quais viemos têm muito a ver com os tipos de decisões que
achamos apropriadas.
Mas suponha que você respondeu “não” a uma ou mais dessas questões. Você
pode ter vindo de um grupo minoritário ou de um passado de pobreza. Você
pode ser alguém de meia-idade ou mais velho. Mesmo assim, outras conclusões ­provavelmente se seguem. Você provavelmente teve de se esforçar para
chegar onde está; talvez você tenha tido de superar reações hostis de amigos e
de outros quando contou a eles que estava pretendendo ir à faculdade; ou talvez
você esteja combinando Ensino Superior com paternidade em tempo integral.
Embora sejamos influenciados pelos contextos sociais em que nos encontramos, nenhum de nós está simplesmente determinado em nosso comportamento por aqueles contextos. Possuímos e criamos nossa própria individualidade. É trabalho da Sociologia investigar as conexões entre o que a sociedade
faz de nós e o que fazemos de nós mesmos. Nossas atividades tanto estruturam – modelam – o mundo social ao nosso redor como, ao mesmo tempo, são
estruturadas por esse mundo social.
O conceito de estrutura social é importante na Sociologia. Ele se refere ao
fato de que os contextos sociais de nossas vidas não consistem apenas em conjuntos aleatórios de eventos ou ações; eles são estruturados ou padronizados
de formas distintas. Há regularidades nos modos como nos comportamos e
nos relacionamentos que temos uns com os outros. Mas a estrutura social não
é como uma estrutura física, como um edifício que existe independentemente das ações humanas. As sociedades humanas estão sempre em processo de
estruturação. Elas são reestruturadas a todo o momento pelos próprios “blocos
de construção” que as compõem – os seres humanos como você e eu.
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A promessa e as tarefas das Ciências Sociais
Atividades de aplicação
1. O filme O Nome da Rosa, encontrado nas prateleiras de filmes de ação
ou de suspense das locadoras de dvds, foi inspirado no livro de mesmo nome de autoria do italiano Umberto Ecco. O livro apresenta, de
maneira romanceada, o início do processo de secularização, intelectualização e/ou racionalização da cultura ocidental. Indique os indícios
desse processo referindo-se ao conjunto das cenas ou a cenas específicas do filme.
2. Explique a seguinte afirmação: “a imaginação sociológica capacita
seu possuidor a compreender o cenário histórico mais amplo, em termos de seu significado para a vida íntima e para a carreira exterior de
­numerosos indivíduos. Permite-lhe levar em conta como os ­indivíduos,
na agitação de sua experiência diária, adquirem freqüentemente uma
consciência falsa de suas posições sociais. Dentro dessa agitação, busca-se a estrutura da sociedade moderna, e dentro dessa estrutura são
formuladas as psicologias de diferentes homens e mulheres. Através
disso, a ansiedade pessoal dos indivíduos é focalizada sobre fatos explícitos e a indiferença do público se transforma em participação nas
questões públicas”. (MILLS, 1965, p. 11-12)
3. Apresente, explicando, as condições históricas que permitiram o surgimento das Ciências Sociais.
4. Qual o objeto de estudo das diferentes Ciências Sociais? É possível
­delimitar fronteiras entre elas? Se sim, por quê? Se não, por quê?
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