GESTÃO DA ESCOLA E QUALIDADE DO ENSINO: DAS CONCEPÇÕES VEICULADAS ÀS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO COTIDIANO ESCOLAR PARRO, Ana Lúcia Garcia1 - UNESP Grupo de Trabalho – Políticas Públicas, Avaliação e Gestão da Educação Agência Financiadora: Não conta com financiamento Resumo Inserindo-se no âmbito das pesquisas que se preocupam com a qualidade da escola pública e com suas finalidades, este trabalho tem por objetivo identificar as concepções veiculadas pela política educacional do governo estadual paulista dos dois últimos governos (2007 a 2010; e 2011 até a atualidade) e as representações sociais dos diferentes integrantes de escolas públicas paulistas a respeito da gestão, qualidade do ensino e avaliação externa em larga escala. Parte-se de um referencial que compreende a escola como produtora de políticas apesar de inserida em um contexto de implementação de programas marcados pela valorização do controle e dos resultados de aprendizagem. Dentre os procedimentos metodológicos, destacam-se a observação de duas escolas públicas com maior e menor índice de desempenho na avaliação externa em larga escala em 2011 e entrevistas semi-estruturadas com diferentes integrantes da escola (pais, alunos, funcionários, professores e equipe gestão) sobre gestão e qualidade de ensino. Além disso, fez-se necessária uma análise documental das propostas oficias da Secretaria da Educação nos últimos mandatos governamentais. A pesquisa em andamento tem apontado que, enquanto as diretrizes e metas propostas oficialmente direcionam o trabalho pedagógico da escola, o cotidiano das instituições está marcado pela construção de regras e acordos próprios de cada grupo e da gestão da escola. Nesse sentido, a partir das relações e contradições entre o que é veiculado pelas diretrizes políticas e o que é concebido e vivenciado no cotidiano escolar, a pesquisa pode contribuir com a discussão das reais possibilidades de a escola vir a desenvolver uma formação de qualidade. Palavras-chave: Gestão Escolar. Qualidade do Ensino. Avaliação Externa em Larga Escala. 1 Doutoranda em Educação na UNESP Marília, mestrado na linha: Política Educacional, Gestão de Sistemas Educativos e Unidades Escolares sob o título: Gestão da Escola, Qualidade do Ensino e Avaliação Externa: desafios na e da escola. Membro do grupo de pesquisas CEPAE (Centro de Estudos e Pesquisas em Administração da Educação) e da equipe de pesquisa do projeto Indicadores de Qualidade e Gestão Democrática desenvolvido na Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, vinculada ao Observatório de Educação CAPES/INEP. E-mail: [email protected] 3281 Introdução O presente trabalho integra-se ao projeto de pesquisa em rede2, intitulado “Indicadores de qualidade e gestão democrática” cuja problemática é discutir a qualidade da escola básica referente aos indicadores de desempenho, gestão democrática e avaliação em larga escala. Os estudos que integram o projeto têm a finalidade de investigar a avaliação institucional e da aprendizagem, os indicadores de desempenho dos sistemas de ensino e determinantes da qualidade do ensino das escolas públicas. Nesse contexto, os objetivos desta pesquisa são desenhados a partir da seguinte questão: quais as concepções veiculadas pelos órgãos e documentos oficiais e quais as concepções vivenciadas na escola acerca da qualidade do ensino e gestão da escola e do sistema de ensino? O problema da pesquisa recai sobre a discussão das reais possibilidades de a escola contribuir com a formação do indivíduo e com a construção de uma outra escola, considerando, sobretudo, que a mesma encontra-se em um contexto de implementação de políticas e programas externos a ela, marcado pela supervalorização do controle por resultados de aprendizagem. Este trabalho apresenta elementos para uma discussão acerca da temática (gestão, qualidade e avaliação externa em larga escala) embora a pesquisa ainda esteja em desenvolvimento. O conteúdo das entrevistas será analisado à luz da teoria das representações sociais (JODELET, 2001; MOSCOVICI, 2001). Esse conteúdo revela conhecimentos e opiniões pessoais mais ou menos elaboradas, impressões de quem está dentro da escola, as concepções vivenciadas pelo cotidiano escolar, as representações sociais do grupo em questão. Ao definir o conceito representações sociais, Jodelet (2001, p.22) destaca o seu reconhecimento e validade enquanto forma de conhecimento. É uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social. Igualmente designada como saber do senso comum ou ainda saber ingênuo, natural, esta forma de conhecimento não é diferenciada, entre outras, do conhecimento científico. Entretanto, é tida como um objeto de estudo tão legítimo quanto este, devido à sua importância na vida social e à elucidação possibilitadora dos processos cognitivos e das interações sociais. 2 Destaca-se que o Projeto em Rede é financiado pela CAPES/INEP (Edital nº 38/2010) e, integram-se a ele a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), a Universidade Estadual Paulista (UNESP), a Universidade de Passo Fundo (UPF) e a Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). 3282 Já as concepções veiculadas pelo governo paulista dos últimos governos serão contempladas a partir da análise de conteúdo dos “Cadernos do gestor” e do material de planejamento encaminhado para as escolas públicas do estado de São Paulo a partir de 2007 e com a criação do Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo – IDESP (BARDIN, 1977). Assim, será feita a análise dos modelos de gestão veiculados oficialmente e as representações sociais de gestão, qualidade e avaliação externa em larga escala. Este trabalho está organizado em quatro partes: a primeira delas destaca a escola enquanto sujeito e produtora de regras; na segunda, aponta-se para os pressupostos teóricos da gestão e qualidade do ensino e seus desdobramentos na prática educativa; a terceira traz as contribuições dos estudos sobre a escola e seu cotidiano e da política em ciclo; por fim, tratase da avaliação externa em larga escala que pretende indicar a qualidade do ensino e são tecidas algumas conclusões. A escola como sujeito, produtora de regras Uma das considerações iniciais é que a escola se constitui não somente como objeto, mas também como sujeito das ações e das pesquisas. Justifica-se, portanto, a necessidade de compreender o que pensam e como agem os atores do processo educativo na escola, sendo eles, os integrantes dos diferentes segmentos. Uma das contribuições que se destaca nesse sentido é a de Mainardes (2006) que, tendo como referência os estudos de Ball e Bowe (1992), enfatiza a importância de articular os olhares macro e micro sobre a realidade nas pesquisas em educação. Esse caminho constitui uma possibilidade de compreensão crítica das políticas e programas educacionais ao analisá-los desde sua formulação, influências, até sua implementação no contexto da prática, da escola e seus efeitos e/ou resultados. Tratam-se dos contextos abordados por Ball e Bowe (1992) no ciclo de políticas. A proposta dessa abordagem reconhece um papel ativo da escola. Acredita-se na necessidade de as políticas não serem analisadas apenas no âmbito da formulação, da análise documental, mas reconhecer que essas sofrem influências e, ao serem vivenciadas nas e pelas escolas, podem ocorrer alterações, ou seja, não serem traduzidas na prática tal como foram planejadas a priori. Sobre esse aspecto, Mainardes (2006, p. 53) aponta O contexto da prática é onde a política está sujeita a interpretação e recriação e onde a política produz efeitos e consequências que podem representar mudanças e transformações significativas na política original. (...) O ponto-chave é que as 3283 políticas não são simplesmente implementadas dentro desta arena (contexto da prática) mas estão sujeitas à interpretação e, então, a serem recriadas. Ao se subsidiar neste autor, não se concebe a escola como aquela que vai reproduzir as diretrizes da política educacional ou adapta-las ao seu contexto local, mais do que isto, considera-se a escola como propositora de políticas educacionais. A contribuição dessa abordagem está no reconhecimento do papel ativo da escola por meio da análise do ciclo de políticas e, ao colocar a escola como objeto e sujeito de estudo, o processo político passa a ser entendido como multifacetado e dialético, necessitando da articulação das perspectivas macro e micro, do sistema e da escola. A Gestão e a Qualidade do Ensino Para investigar a gestão, a qualidade da educação e suas relações é importante optar por um referencial que compartilhe com a ideia inicial da escola enquanto produtora e não apenas reprodutora das políticas construídas de “cima para baixo”. Assim, é fundamental explicitar o que se entende por gestão e qualidade da escola. Com relação à gestão, importa destacar que, neste projeto, gestão e administração escolar são termos utilizados como sinônimos, embora se reconheça estudos que apontam a diferença do significado dos termos, como em Silva Jr (2002). A gestão escolar tem sua origem nos moldes da Teoria Geral de Administração (TGA). No entanto, alguns autores, (PARO, 1986; RUSSO, 2005; SILVA JR, 2002), defendem que a administração deve considerar a especificidade do processo pedagógico escolar para organizar-se, desse modo, recusam o paradigma da administração empresarial como referência para a gestão escolar. De acordo com Paro (1986, p. 136), “a Administração Escolar precisa saber buscar na natureza própria da escola e dos objetivos que ela persegue os princíp ios, métodos e técnicas adequados ao incremento de sua racionalidade”. Em defesa de uma administração escolar diferente dos moldes empresariais, Russo (2005) assinala uma mudança dos paradigmas que foram dominantes para a administração escolar até meados da década de 1980, quando se passou a questionar a transposição mecânica dos princípios e métodos da TGA para a escola. Para o autor, essa mudança de paradigmas justifica-se pela incompatibilidade entre o fundamento capitalista da teoria geral de administração produzida para mediar o sistema de exploração da força de trabalho e maximizar a 3284 extração da mais-valia e a natureza e método de atualização cultural das novas gerações que, em última instância, representa a produção e continuidade da humanidade (RUSSO, 2005, p.29). Ao buscar sua especificidade na natureza do trabalho produzido, a gestão escolar aponta para a necessidade de caminhar na reelaboração de seu campo teórico. Com essa perspectiva, para uma reflexão teórica da administração escolar, estudos que se façam no interior das escolas ganham relevância ao investigarem as reais possibilidades de ação. Diante do exposto, é preciso esclarecer, então, o significado atribuído ao termo gestão ou administração escolar. Em seu estudo sobre a administração escolar, Paro (1986) a defini e reafirma em estudos posteriores (Paro, 2008), “como a utilização racional de recursos para a realização de fins determinados”. Se a administração é a utilização de meios, então, pode-se afirmar, com Russo (2005), que a gestão é mediação entre os recursos (meios) e os resultados (fins). A especificidade da administração escolar, a mudança de paradigmas, ocorre justamente porque a administração enquanto mediação não é um fim em si mesma, seus objetivos são os objetivos do que é administrado e, no caso, a administração deve organizar-se em torno de suas finalidades, os objetivos da escola. Nas palavras de Russo (2005, p. 37), a educação, como prática humana de formação de sujeitos históricos, “exige formas de organização do trabalho que priorizem as relações solidárias e cooperativas, fundadas nos princípios do diálogo e da persuasão, isto é, de relações entre iguais”. Ora se a gestão é mediação, vale destacar quais são os meios e os fins da educação. Nesse ponto, assinala-se que os fins da escola não são apenas diferentes dos fins de uma empresa, mas opostos. Dessa maneira, não é possível aceitar que essa gestão, a escolar, ocorra da mesma forma que em uma empresa porque “uma administração que não discute o sentido público ou moral das finalidades a que se volta, limitando-se a buscar os meios necessários à sua realização, pode até ser eficaz, mas, certamente, não será educacional”. (SILVA Jr, 2002, p. 204). Caminhando nessa perspectiva, Paro (1986) reserva à educação dois papéis fundamentais: transmitir o saber historicamente acumulado e desenvolver uma consciência crítica da realidade. É importante assinalar que, assim como Paro (1986), Saviani (2008), ressalvadas suas especificidades, enfatiza a necessidade de transmitir o saber historicamente acumulado na escola. Reconhecer a existência de um conhecimento que precisa ser socializado não anula a atividade do aluno, a importância da construção de novos saberes 3285 além do que fora historicamente produzido. Para Duarte (2007, p.49), “não há produção do novo sem a reprodução do que já foi construído historicamente”. É possível considerar que a formação do indivíduo para-si defendida por Duarte (2007) caminha ao encontro dos pressupostos da pedagogia histórico-crítica de Saviani (2008). Ao aceitar a transmissão dos conhecimentos acumulados e desenvolvimento de uma consciência crítica por meio de uma formação do indivíduo para-si como finalidade da educação, conclui-se que o processo do trabalho educativo organizado por meio da gestão escolar será de qualidade se atingir sua finalidade. Vale ressaltar que, dessa forma, a qualidade da educação não está diretamente relacionada a uma medida que pode ser verificada externamente ou a metas estabelecidas de cima para baixo. Uma formação para-si está além de conhecimentos quantificáveis, envolve valores e atitudes, relações pedagógicas humanas e democráticas. Nesse ponto, cabe ressalvar a importância da avaliação externa para o sistema de ensino, para avaliar, para conhecer e servir de parâmetro para reorganizar o ensino, embora sejam reconhecidas suas limitações em qualificar o que não pode ser quantificado. Os estudos sobre a escola A investigação das concepções vivenciadas na escola acerca da qualidade e gestão escolar faz sentido ao entender a escola enquanto espaço de produção de saberes, práticas e regras. As concepções veiculadas oficialmente são determinantes no cotidiano escolar, no entanto, destaca-se um referencial que enfatiza que a escola faz política. Além da reprodução, a escola produz ações, concepções e toma decisões. Nesse sentido, autores como Lima (2003), Canário (1996), Nóvoa (1995), Derouet (1996) contribuem com seus estudos sobre a escola ao valorizá-la como espaço de produção, enquanto sujeito na organização do trabalho e oferecem subsídios para a realização de novas pesquisas. Por meio de uma análise sobre a realização de pesquisas que estudem a escola como objeto científico, esses autores apontam para a necessidade dessas pesquisas na construção do conhecimento em educação. Segundo Nóvoa (1995), esse tipo de investigação transcende às tradicionais visões macro e micro e privilegiam um nível meso de compreensão e de intervenção. Apesar de conterem visões parcelares da realidade, é evidente que tanto as teorias macroscópicas como os estudos microscópicos produziram um conhecimento útil e 3286 pertinente do ponto de vista do pensamento e da acção pedagógica. Hoje, emerge no universo das Ciências da Educação uma meso abordagem, que procura colmatar certas lacunas das investigações precedentes (NÓVOA, 1995, p.20). Embora escrito na década de 1990, essa abordagem continua defendida já que possibilita uma compreensão da organização escolar como espaço no qual decisões são tomadas. Ao analisar a organização educativa em Portugal, Lima (2003) afirma que a escola está formalmente organizada em um contexto imposto para todo o país de maneira uniforme, mas os estudos das e nas escolas mostram a diferença entre a administração central e o funcionamento concreto das escolas. A esse contexto, o autor atribui a expressão “infidelidade normativa”, uma oposição ao conformismo normativo-burocrático, reconhecendo na escola um espaço de (auto) organização para a produção de regras. Desse modo, estudar a cotidianidade da escola só faz sentido ao entendê-la, além das determinações das políticas e normas oficiais. Em seu estudo sobre a escola cotidiana no México, Rockwell (1986) aponta que a norma educativa oficial não é incorporada pelas escolas tal como foram formuladas originalmente, “Las políticas gubernamentales y las normas educativas infuyen en el processo, pero no lo determinan em su conjunto” (ROCKWELL, 1986, p. 14). Mais adiante, a autora defende a realização de estudos qualitativos, os quais podem contribuir com a análise da escola e das dimensões que interferem no processo educativo, além das documentações oficiais. Ao estudar a concretização das reformas na realidade da prática escolar brasileira, Silva Jr e Ferretti (2004) trazem à tona três faces da instituição escolar as quais refletem sua especificidade e síntese: o institucional, a organização e a cultura. Por esse viés, os autores se propõem a entender e pesquisar a contribuição da escola para a construção do pacto social vigente. Os autores apontam, igualmente, que a escola não é uma agência reprodutora que, por meio de suas três faces, no momento de implantação das reformas se torna possível a contra hegemonia. Ao acreditar na possibilidade de uma margem de autonomia das escolas diante das reformas, tanto Silva Jr e Ferretti (2004) como Ball e Bowe (1992) ressaltam a importância de estudar as escolas. A ideia do ciclo de políticas de Ball e Bowe (1992) é construída a partir do cruzamento dos olhares macro e micro para a escola. Traduzir as políticas em práticas é um processo complexo e esta análise sugere que se leve em consideração nesse processo cinco contextos. O primeiro deles indica a influência nas disputas pela formulação da política; o 3287 contexto da prática no qual a política está sujeita à recriação e interpretação; a produção de texto, resultado das disputas e acordos; os resultados e efeitos; e, a estratégia política para identificar as desigualdades criadas ou reproduzidas pela política. Esses contextos indicam um caminho para se pensar as políticas e entender como são feitas na escola. Considerações Finais A gestão e a qualidade do ensino estão diretamente relacionadas com a política de avaliação externa que tem sido objeto de discussão entre pesquisadores e professores principalmente a partir da década de 1990. Nesse período, a prática de avaliação externa em larga escala conquista espaço hegemônico no interior da escola como proposição e condução de políticas públicas para a educação. Em 2007, foi criado em âmbito nacional, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), mecanismo criado para “fotografar a situação das escolas e sistemas de ensino, tendo em vista uma tentativa de articulação entre desempenho acadêmico em provas nacionais e taxas de reprovação e evasão com metas de melhoria” (ADRIÃO e BORGHI, 2008, p.81). No estado de São Paulo, foi criado o Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (IDESP) que apresenta um indicador de qualidade para cada unidade escolar, objeto desta pesquisa. O principal objetivo do índice é fornecer um diagnóstico da qualidade do ensino oferecido, apontando o que precisa ser melhorado a cada ano. É um diagnóstico para direcionar e encaminhar ações visando à melhoria da qualidade da educação. Para isso, metas são criadas e estabelecidas pela Secretaria da Educação para as escolas da rede estadual. Essas metas devem ser superadas a cada ano e, assim, pretende-se atingir até 2030 os seguintes índices: 7 para o ciclo de 1ª a 4ª série; 6 para o ciclo de 5ª a 8ª série; e 5 para o Ensino Médio3. Inseridos neste contexto, materiais são construídos e encaminhados às escolas com a finalidade de que estas consigam atingir as metas estabelecidas. Nesse ponto, é preciso introduzir algumas considerações referentes ao procedimento de avaliação em larga escala que tem sido realizado. Diferentes autores abordam a avaliação 3 A esse respeito ver a Resolução – 74, de 6-11-2008, a qual institui o Programa de Qualidade da Escola (PQE) e o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDESP). 3288 externa, seus resultados e/ou efeitos para as escolas e questionam certos aspectos. Sobre os problemas atrelados à avaliação externa, Martins (2002, p.163) destaca que É inegável que realizar a avaliação em larga escala sobre os resultados obtidos pela escola constitui um importante indicador para que os gestores do sistema de ensino possam corrigir os problemas do fluxo escolar e reorientar as decisões e medidas legais. No entanto, esses mecanismos podem limitar sobremaneira as possibilidades para a ampliação do exercício da autonomia da escola, caso continuem desconsiderando o incentivo à auto-avaliação, bem como a possibilidade de gestão de seus recursos. Essa mesma autora enfatiza ainda que a avaliação tal como é realizada “não parece captar a complexidade da dinâmica intra-muros escolares e tampouco suas características qualitativas, isto é, sua cultura, seus valores, a interação e os conflitos entre os pares e entre estes e a comunidade” (MARTINS, 2002, p. 136). Tendo em vista que os resultados obtidos são indicadores do desempenho dos alunos, é preciso compreender que a avaliação em larga escala não é ruim ou prejudicial em si mesma. Em outra pesquisa (GARCIA, 2010) foi apontado que as críticas relacionadas a essa avaliação residem na utilização equivocada desses parâmetros, tanto pela escola como pelo Estado, o que provoca a disputa no interior e entre as escolas via criação de rankings educacionais e incentivos financeiros. O que poderia se constituir em um referencial para melhorar e aglutinar esforços visando à melhoria da qualidade termina por responsabilizar, culpando ou punindo quando metas não são atingidas. Diante das críticas apontadas ao desenvolvimento da avaliação em larga escala, Souza e Oliveira (2003, p.883) adotam um posicionamento mais ponderado. Não se pretende, com as considerações aqui esboçadas, desprezar o valor da avaliação externa, onde se situa a apreciação do trabalho escolar pelas instâncias administrativas do sistema, a qual, no entanto, não deve se traduzir na aplicação de testes de rendimento escolar. Potencializar a dimensão educativa/formativa da avaliação certamente supõe a promoção da autonomia pedagógica e didática da escola e não a sua conformação, que se realiza quando se delimita que conhecimento deverá ser legitimado pela escola, cujo cumprimento é condição para sua premiação. Ainda sobre a avaliação em larga escala, Werle (2010) faz uma comparação interessante. Para a autora, a avaliação tem por objetivo apresentar parâmetros da floresta, ou seja, da rede; e não destacar as laranjeiras, se floriram ou não, que representam as escolas. É na especificidade da unidade escolar que se torna possível dar sentido e significado aos índices e ver, consequentemente, as laranjeiras. 3289 Diante do exposto, importa reafirmar que a escola é espaço de produção de regras, de política, pode vivenciar uma “infidelidade normativa” (LIMA, 2003), na contribuição com uma formação crítica e consciente de sua realidade (PARO, 1986) e que leve em consideração uma formação do indivíduo para-si (SILVA JR e FERRETTI, 2004) voltada para a emancipação social num processo de apropriação e objetivação do gênero humano. Nesse caminho, a gestão da escola é embalada (MACHADO, 1998) para construir a qualidade negociada, na qual os fins não estão determinados previamente, mas construídos pelo coletivo da escola. REFERÊNCIAS: ADRIÃO, T.; BORGHI, R. Organização do trabalho escolar e exclusão educacional: caminhos, desafios e possibilidades. In: CORREA, B. C.; GARCIA, T. O. (orgs). Políticas Educacionais e Organização do Trabalho na Escola. 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