Análise dos Recursos na Dispensação de Medicamentos na

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Análise dos Recursos na Dispensação
de Medicamentos na Farmácia da
Policlínica Municipal de Saúde – Centro de
Florianópolis
Aluna: Claudia Fabre Branco Scharf1
Orientador: Altamiro Damian Prevé2
Tutora: Juliana Pereira3
Resumo
Abstract
O objetivo deste trabalho foi analisar os
recursos físicos e humanos existentes na
Farmácia da Policlínica Municipal Centro
de Florianópolis, bem como o número de
atendimentos realizados mensalmente no
período de junho de 2010 a junho de 2011,
através de dados existentes em relatórios do
Sistema Informatizado da Secretaria Municipal de Saúde, denominado INFOSAÚDE.
Pela análise feita neste período observou-se
que os recursos disponíveis atualmente, principalmente no que diz respeito aos recursos
humanos são insuficientes se comparados ao
número de atendimentos, gerando significativa insatisfação dos funcionários e dos usuários do Sistema Único de Saúde.
The objective of this study was to analyze
the physical and human resources existing
in the Polyclinic Pharmacy Municipal Center
Florianópolis, as well as the number of visits made monthly from June 2010 to June
2011, using existing data on reports of Computerized System Municipal Health Department, called INFOSAÚDE. For the analysis
in this period it was observed that the resources currently available, particularly with
regard to human resources are insufficient
compared to the number of visits, generating
significant dissatisfaction among employees, as well as the users of the Unified Health
System However, without the availability of
adequate minimum resources, to provide an
excellent service to users of SUS.
Palavras-chave: Dispensação. Atenção Farmacêutica. Assistência Farmacêutica. Uso Key words: Dispensation. Pharmaceutical
Racional.
Care. Rational use.
1
Graduada em Farmácia pela Universidade Federal de Santa Catarina (1997), especialização
em Saúde da Família pela UFSC (1998) e especialização em Gestão pela Universidade Federal
de Santa Catarina (2003). E-mail: [email protected].
2
Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1985). E-mail:
[email protected].
3
Especialista em Gestão de Pessoas nas Organizações e Bacharel em Administração pela
Universidade Federal Santa Catarina (UFSC). E-mail: [email protected].
Análise dos Recursos na Dispensação de Medicamentos na Farmácia da Policlínica Municipal de Saúde – Centro
de Florianópolis
1Introdução
A Lei n. 5.991, de 17 de dezembro de 1973, estabelece que o processo
de dispensação de medicamentos na farmácia está sob a responsabilidade
do profissional farmacêutico (BRASIL, 1973). Com o passar dos anos houve o surgimento de novas definições das atividades farmacêuticas, como, a
Atenção Farmacêutica apresentada por Hepler e Strand (1990), a qual tem
influenciado cada vez mais esses profissionais a assumirem um papel ativo
de promoção da saúde.
A profissão farmacêutica tem passado por profundas transformações,
a fim de atender às novas demandas sociais. Outrora o papel da farmácia
e do próprio farmacêutico resumia‑se em comprar, registrar, armazenar e
fornecer medicamentos, ignorando‑se a amplitude e o alcance da Atenção
Farmacêutica. Segundo Petty (2003), a profissão farmacêutica está mudando
da simples oferta de medicamentos para uma função clínica de fornecimento
de informações.
Nesse contexto, Pepe e Castro (2000) ressaltam que o farmacêutico,
como um profissional capaz de interagir com os prescritores e os pacientes,
deve possuir o quesito informação como alicerce desta relação. A informação
repassada deve ser confiável e baseada em evidências. (CORRER et al., 2004)
O paciente de hoje questiona sua medicação, os efeitos indesejáveis. Ele
deseja saber como deve tomar seu medicamento e informações essenciais sobre
o medicamento que está fazendo uso. E preciso entender que dispensar um
medicamento, principalmente dentro da concepção de Atenção Farmacêutica,
é muito mais que entregar ao paciente. Significa disponibilizar um produto de
qualidade e assegurar o seu uso racional. (PACHECO; MARIZ, 2006)
Alano (2005) demonstra que os farmacêuticos têm diversos desafios
perante a mudança de práticas na farmácia, e entre eles se destacam: a priorização e a exigência do cumprimento de tarefas administrativas no processo
de trabalho, em detrimento das atividades clínicas e da educação em saúde.
Os próprios pacientes reivindicam um profissional farmacêutico que não promova a prestação do serviço somente pensando na entrega do medicamento,
sem nenhuma orientação farmacêutica.
Os cuidados farmacêuticos são necessários para promover a saúde,
prevenir doenças, avaliar, monitorar, iniciar e modificar o uso de medicações
para garantir que a terapêutica farmacológica seja segura e efetiva. Como
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
Claudia Fabre Branco Scharf # Altamiro Damian Prevé # Juliana Pereira
parte do planejamento desses cuidados, os farmacêuticos ajudam a avaliar
as necessidades terapêuticas, prevenir reações adversas a fármacos, desenvolver terapêutica específica para o paciente, administrar a doença crônica e
monitorizar o seguimento, segundo Zubioli (2006).
A realização desse processo na farmácia apresenta limitações, principalmente relacionadas à carga de trabalho dos farmacêuticos, à falta de tempo,
aos recursos humanos disponíveis e à estrutura física dos estabelecimentos.
Neste trabalho foram analisados os recursos físicos e humanos existentes
na Farmácia da Policlínica Municipal Centro de Florianópolis, bem como o
número de atendimentos realizados mensalmente no período de junho de 2010
a junho de 2011. As informações servirão de subsídios para a implantação da
Atenção Farmacêutica e, consequentemente, o uso racional de medicamentos
na farmácia desta Policlínica Municipal de Saúde.
Para isso, uma estrutura minimamente adequada deve prover (BRASIL,
1999): profissionais capacitados, ambiente limpo e organizado, mobiliário e
equipamentos adequados às atividades realizadas.
O processo da dispensação tem como objetivos: assegurar a integralidade da prescrição, disponibilizar medicamentos com qualidade assegurada
e distribuí-los com precisão, além de aconselhar pacientes sobre o seu uso.
Na busca de alcançar esses objetivos, a dispensação pode ser compreendida como um processo que envolve as seguintes etapas principais
(WHO/INRUD/BU, 2000): recebimento da prescrição, certificando-se da sua
integralidade, antes de preparar ou autorizar a distribuição do medicamento;
interpretação da prescrição, verificando sua adequação ao paciente; aviamento
dos medicamentos, segundo procedimentos e normas, visando a manter a
precisão do perfil farmacoterapêutico do paciente e, quando necessário, preparando os medicamentos por meio de técnicas apropriadas; distribuição dos
medicamentos segundo normas e procedimentos estabelecidos, garantindo,
dessa forma, a diminuição de erros referentes ao processo de medicação;
comunicação com o paciente, fornecendo informações básicas sobre o uso
racional dos medicamentos prescritos para este; e registro do atendimento,
segundo normas e procedimentos estabelecidos, visando a documentar as
atividades de dispensação de medicamentos, tendo em vista necessidades
administrativas, técnicas e éticas.
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de Florianópolis
2 Exposição do Tema
2.1Assistência Farmacêutica
A Organização Mundial da Saúde (OMS), criada em 1948, com o
objetivo de apoiar os países membros no desenvolvimento de programas
que melhorassem a saúde de suas comunidades, durante a 30ª Assembleia
Mundial, em 1977, aprovou a meta “saúde para todos no ano 2000” e recomendou a realização de uma Conferência Mundial para o intercâmbio de
experiências em matéria de desenvolvimento de cuidados primários de saúde.
(OMS/UNICEF, 1978)
Essa decisão foi concretizada com a realização da Conferência Mundial
sobre Atenção Primária em Saúde, realizada em Alma-Ata, URSS, em 1978,
com a participação do United Nations Children’s Fund (UNICEF), onde se
ratificou a meta de “Saúde para todos” e a atenção primária como uma estratégia fundamental para alcançar essa meta, fato que tem uma repercussão
muito importante no desenvolvimento da Assistência Farmacêutica no mundo.
Com relação à Assistência Farmacêutica, os aspectos mais importantes
da reunião de Alma-Ata foram: considerar o abastecimento dos medicamentos essenciais como um dos oito elementos básicos da atenção primária em
saúde; recomendar que os governos formulem políticas e normas nacionais de
importação, produção local, venda e distribuição de medicamentos e produtos
biológicos de modo a assegurar, pelo menor custo possível, a disponibilidade
de medicamentos essenciais nos diferentes níveis dos cuidados primários de
saúde; que adotem medidas específicas para prevenir a excessiva utilização de
medicamentos; que incorporem medicamentos tradicionais de eficácia comprovada; e que estabeleçam sistemas eficientes de administração e fornecimento.
Vinte anos depois da criação do programa, foram observados alguns
progressos nos países, principalmente no desenvolvimento de instrumentos
de racionalização do uso de medicamentos, como as listas de medicamentos
essenciais, os formulários terapêuticos e os guias-padrão (protocolos) de tratamento, assim como a melhoria da cobertura da população em relação aos
medicamentos essenciais. Não obstante, encontrou-se, também, a existência
de problemas de acesso e uso racional, que foram apresentados pela Diretora
Geral da OMS e se resumem em Brundtland (1999).
Com relação ao acesso: mais de um terço da população do mundo carece
de acesso regular aos medicamentos essenciais. A situação é ainda pior nos
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
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países mais pobres da África e da Ásia, onde mais da metade da população
não tem acesso aos medicamentos essenciais; 50 a 90% dos medicamentos nos
países em desenvolvimento são pagos pelo próprio usuário. Em 1997, a OMS
estimou que 50 milhões de pessoas morreriam e, desse total, 40 milhões nos
países em desenvolvimento; e que, na maioria, essas mortes seriam devidas
à: pneumonia, malária, tuberculose e a outras doenças para as quais existem
medicamentos e vacinas efetivas e de baixo custo.
Com relação ao uso racional: até 75% dos antibióticos são prescritos
inapropriadamente; mundialmente, somente uma média de 50% dos pacientes toma seus medicamentos corretamente; a resistência antimicrobiana está
crescendo na maioria das doenças infecciosas.
Agravando a situação do acesso e do uso racional, os países em desenvolvimento apresentam, ainda, graves problemas quanto ao gerenciamento
da Assistência Farmacêutica, tais como: ausência de mecanismos eficientes
e equitativos de financiamento para aquisição dos medicamentos; ausência
de sistema público eficiente de suprimento de medicamentos estratégicos;
necessidade de ações de regulação quanto à garantia da qualidade e eficácia
dos medicamentos. Dados internacionais indicam que 10 a 20% das amostras
de medicamentos falham nas provas de controle de qualidade em muitos
países em desenvolvimento; perdas decorrentes de condições inadequadas
de transporte e armazenamento.
A Política Nacional de Medicamentos (PNM), aprovada em outubro de
1998, pela portaria GM n. 3.916/1998 apresentou uma reorientação do modelo
de Assistência Farmacêutica no Brasil. A partir da implementação da PNM,
em maio de 2004 foi aprovada, por meio da Resolução n. 338 do Conselho
Nacional de Saúde (CNS), a Política Nacional de Assistência Farmacêutica
(PNAF), que deve garantir a manutenção de serviços de assistência farmacêutica na rede pública de saúde, nos diferentes níveis de atenção, considerando
a necessária articulação e a observância das prioridades regionais definidas
nas instâncias gestoras do SUS. (BRASIL, 2004)
A PNAF define Assistência Farmacêutica como o conjunto de ações
voltadas à promoção, proteção e recuperação da saúde, tanto individuais
como coletivas, tendo o medicamento como insumo essencial e visando ao
seu acesso e uso racional. Esse conjunto envolve a pesquisa, o desenvolvimento e a produção de medicamentos e insumos, bem como a sua seleção,
programação, aquisição, distribuição, dispensação, garantia da qualidade
dos produtos e serviços, acompanhamento e avaliação de sua utilização, na
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perspectiva da obtenção de resultados concretos e da melhoria da qualidade
de vida da população. (BRASIL, 2004)
No Encontro sobre a Política Nacional de Medicamentos, em 1988, foi
discutida a Assistência Farmacêutica, sendo definida como:
[...] grupo de atividades relacionadas com o medicamento,
destinada a apoiar as ações de saúde demandadas por uma
comunidade. Envolve o abastecimento de medicamentos em
todas e em cada uma de suas etapas constitutivas, a conservação
e controle de qualidade, a segurança e a eficácia terapêutica dos
medicamentos,o acompanhamento e avaliação da utilização, a
obtenção e a difusão de informação sobre medicamentos e a
educação permanente dos profissionais de saúde, do paciente e
da comunidade para assegurar o uso racional de medicamentos.
(SCHRAIBER; NEMES; MENDES-GONÇALVES, 1996, p. 605)
De acordo com essa definição, pode-se compreender que a Assistência
Farmacêutica é ampla; portanto a prática da Atenção Farmacêutica encontra-se
inserida no contexto da Assistência Farmacêutica. Essa visualização torna-se
mais evidente quando se observa o seu ciclo.
Para que a Assistência Farmacêutica seja de qualidade, além de recursos disponíveis e planejamento adequado, devem-se seguir corretamente as
etapas do ciclo, tais como: seleção dos medicamentos e sua programação,
aquisição, armazenamento, distribuição, prescrição, dispensação e utilização.
Dessa forma, pode-se evidenciar que a Atenção Farmacêutica está
presente na etapa final da Assistência Farmacêutica, ou seja, no momento
da dispensação e utilização dos medicamentos. Na análise conjuntural da
Assistência Farmacêutica, podem-se distinguir duas áreas imbricadas, porém
distintas: a) tecnologia de gestão, que tem como objetivo central garantir o
abastecimento e o acesso aos medicamentos; e b) a tecnologia do uso do
medicamento, cujo objetivo final é o seu uso correto e efetivo. A execução
desta depende da primeira, uma vez que a disponibilidade do medicamento
é fruto da gestão. (ARAÚJO; UETA; FREITAS, 2005)
Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, busca-se uma Assistência
Farmacêutica plena e de qualidade, garantindo principalmente o acesso da
população aos medicamentos da atenção primária, pois com o fortalecimento da Assistência Farmacêutica será possível aprofundar as discussões para
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a implantação e implementação de uma Atenção Farmacêutica sólida em
nosso país.
2.2Dispensação de Medicamentos
O procedimento de dispensação deve assegurar que o medicamento de
boa qualidade seja entregue ao paciente certo, na dose prescrita, na quantidade
adequada; que sejam fornecidas as informações suficientes para o seu uso
correto; e que ele seja embalado de forma a preservar a sua qualidade (MSH,
1997). Trata-se do atendimento de um paciente específico e que, portanto, terá
necessidades e características também específicas, as quais devem ser levadas
em conta no momento do atendimento. É uma das últimas oportunidades
de, ainda dentro do sistema de saúde, identificar, corrigir ou reduzir possíveis
riscos associados à terapêutica medicamentosa.
A dispensação é o ato farmacêutico de distribuir um ou mais medicamentos a um paciente, geralmente como resposta à apresentação de uma
prescrição elaborada por um profissional autorizado. Nesse ato, o farmacêutico
informa e orienta o paciente sobre o uso adequado do medicamento. São
elementos importantes desta orientação, entre outros, a ênfase no cumprimento do regime de dosificação, a influência dos alimentos, a interação com
outros medicamentos, o reconhecimento de reações adversas potenciais, e as
condições de conservação do produto. (ARIAS, 1999, p. 74)
Nesse momento, são estabelecidas oportunidades ímpares para a contribuição do farmacêutico ao uso racional de medicamentos. Isso ocorre por
meio de vários procedimentos, nem sempre adequadamente valorizados:
fornecendo a quantidade correta de medicamento de boa qualidade e em
adequadas condições de armazenamento; verificando a integralidade técnica
e legal da prescrição; orientando adequadamente o paciente quanto ao uso
e cuidado corretos do medicamento, bem como promovendo a adesão à
terapêutica prescrita, para o que será necessário estabelecer interação suficiente a fim de individualizar o atendimento de acordo com as necessidades
do usuário, monitorando o uso de medicamentos, o que inclui o registro de
reações adversas.
2.3 Atenção Farmacêutica
A OMS, tomando por base os estudos de Hepler e Strand, definiu
Atenção Farmacêutica como:
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[...] um conjunto de atitudes, comportamentos, compromissos,
inquietações, valores éticos, funções, conhecimentos, responsabilidades e destrezas do farmacêutico na prestação da farmacoterapia,
com o objetivo de alcançar resultados terapêuticos definidos na
saúde e na qualidade de vida do individuo. (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 1999, p. 240)
Em 1990, Hepler e Strand utilizaram pela primeira vez na literatura
científica o termo “Pharmaceutical Care”, que foi traduzido em nosso país para
Atenção Farmacêutica. Neste artigo, foi sugerido que Atenção Farmacêutica é a
provisão responsável do tratamento farmacológico com o objetivo de alcançar
resultados satisfatórios na saúde, melhorando a qualidade de vida do paciente.
Esse conceito foi discutido, aceito e ampliado, na reunião de peritos da Organização Mundial de Saúde (OMS), realizada em Tóquio. Nessa reunião, foi
definido o papel-chave do farmacêutico: estender o caráter de beneficiário da
Atenção Farmacêutica ao público, em seu conjunto, e reconhecer, desse modo,
o farmacêutico como dispensador da atenção sanitária que pode participar,
ativamente, na prevenção das doenças e da promoção da saúde, junto com
outros membros da equipe sanitária. (OMS, 1994)
O termo Atenção Farmacêutica foi adotado e oficializado no Brasil,
a partir de discussões lideradas pela Organização Pan-Americana de Saúde
(OPAS), OMS, Ministério da Saúde (MS), entre outros. Nesse encontro, foi
definido o conceito de Atenção Farmacêutica:
[...] um modelo de prática farmacêutica, desenvolvida no
contexto da Assistência Farmacêutica. Compreende atitudes,
valores éticos, comportamentos, habilidades, compromissos e
co-responsabilidades na prevenção de doenças, promoção e
recuperação da saúde, de forma integrada à equipe de saúde. É
a interação direta do farmacêutico com o usuário, visando uma
farmacoterapia racional e a obtenção de resultados definidos e
mensuráveis, voltados para a melhoria da qualidade de vida. Esta
interação também deve envolver as concepções dos seus sujeitos,
respeitadas as suas especificidades bio-psico-sociais, sob a ótica
da integralidade das ações de saúde. (CONSENSO BRASILEIRO
DE ATENÇÃO FARMACÊUTICA, 2002, p. 602)
Além do conceito de Atenção Farmacêutica, foram definidos nesse mesmo encontro os macros componentes da prática profissional para o exercício
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da Atenção Farmacêutica, tais como: educação em saúde (promoção do uso
racional de medicamentos), orientação farmacêutica, dispensação de medicamentos, atendimento farmacêutico, acompanhamento farmacoterapêutico e
registro sistemático das atividades. (CONSENSO BRASILEIRO DE ATENÇÃO
FARMACÊUTICA, 2002)
Desse modo, Atenção Farmacêutica é uma atividade de acompanhamento ao paciente, de forma prospectiva com a finalidade de realizar
[...] promoção da saúde, prevenção das doenças, primeiros
socorros, manipulação, dispensação e informação, seleção individualizada de terapias com medicamentos, seguimento farmacoterapêutico, recompilar e interpretar informação referente ao
paciente, elaboração do perfil farmacoterapêuticos, identificação
e valoração de potencias reações medicamentosas, avaliação de
terapias individuais, farmacovigilância e inter-relação com outros
profissionais. (MEINERS, 2001, p. 16)
A prática do exercício da farmácia pública revela que Atenção Farmacêutica é fundamental para o sucesso do tratamento prescrito pelo médico.
Esta Atenção preconiza o acompanhamento ao paciente no controle do uso
seguro e racional do medicamento, a aderência ao tratamento pelo paciente,
enfim, medidas que visam à eficácia, não só do uso de medicamento, mas
também à supervisão individual, paciente a paciente, pelo farmacêutico. O
farmacêutico não se limita à aquisição e distribuição de medicamentos.
A PNM também trata da dispensação, deixando claro que o ato profissional do farmacêutico é o de proporcionar um ou mais medicamentos a um
paciente, geralmente como resposta à apresentação de uma receita elaborada
por um profissional autorizado. Nesse ato, o farmacêutico informa e orienta
sobre o uso adequado do medicamento, considerando que este profissional
é importante na orientação do uso dos medicamentos, dando ênfase ao
cumprimento da dosagem, à influência dos alimentos, à interação com outros medicamentos, ao reconhecimento de reações adversas potenciais e às
condições de conservação dos produtos.
Entretanto, o conceito de Atenção Farmacêutica mais aceito e citado
atualmente pelos pesquisadores continua a ser o elaborado por Hepler e Strand
(1990), no qual ela é apresentada como a parte da prática farmacêutica que
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permite a interação do farmacêutico com o paciente, objetivando o atendimento das suas necessidades relacionadas aos medicamentos.
Enfim, é um conceito de prática profissional em que o usuário do medicamento é o mais importante beneficiário das ações do farmacêutico, o centro
de sua atenção. A Atenção Farmacêutica mais pró-ativa rejeita a terapêutica
de sistemas, busca a qualidade de vida e demanda que o farmacêutico seja
um generalista. Trata-se de pacto social pelo atendimento e necessita de base
filosófica sedimentada. O exercício profissional do farmacêutico hoje busca a
concepção clínica de sua atividade, além da integração e colaboração com os
membros da equipe de saúde, cuidando diretamente do paciente. (PERETTA,
CICCIA, 1998)
2.4 Uso Racional de Medicamentos
A promoção do Uso Racional de Medicamentos é um componente muito
importante de uma política nacional de medicamentos. Por exemplo, dado o
fato de que o SUS registrou, em 1996, 318 milhões de consultas médicas e
12 milhões de internações hospitalares e, do momento que o medicamento
é importante ferramenta terapêutica e muitas vezes resultante do processo de
prescrição, pode-se inferir a importância dos medicamentos nesse processo
(BRASIL, 1998). Os medicamentos ocupam um papel importante no sistema
de saúde, pois salvam vidas e melhoram a saúde.
O uso racional ocorre quando o paciente recebe o medicamento
apropriado à sua necessidade clínica, na dose e posologia corretas, por um
período de tempo adequado e ao menor custo para si e para a comunidade
(MSH, 1997). Dessa forma, o uso racional de medicamentos inclui: escolha
terapêutica adequada (é necessário o uso de terapêutica medicamentosa);
indicação apropriada, ou seja, a razão para prescrever está baseada em evidências clínicas; medicamento apropriado, considerando eficácia, segurança,
conveniência para o paciente e custo; dose, administração e duração do
tratamento apropriado; paciente apropriado, isto é, inexistência de contraindicação e mínima probabilidade de reações adversas; dispensação correta,
incluindo informação apropriada sobre os medicamentos prescritos; adesão
ao tratamento pelo paciente; seguimento dos efeitos desejados e de possíveis
eventos adversos consequentes do tratamento.
O Uso Racional de Medicamentos envolve dois atores de forma fundamental: o prescritor e o paciente (individual ou coletivo). Esses atores intera-
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gem de forma dinâmica. O prescritor tem papel determinante na conduta do
paciente, mas o paciente também, com suas expectativas, hábitos culturais etc.
poderá influenciar os hábitos prescritivos. A relação do prescritor e paciente
está permeada por uma série de questões que envolvem a capacidade de
definição e implementação de uma política de medicamentos, as relações do
mercado farmacêutico, particularmente no que se refere à propaganda médica, à organização da rede de serviços, em nível de educação da sociedade, a
fatores culturais de um modo geral, e ao arcabouço legal. Outro ator também
de grande importância é o dispensador, pois muitas interferências positivas
ou negativas estão ligadas à forma como a dispensação acontece.
Os esforços mais organizados para a promoção do uso racional tiveram
início nos anos de 1970, com a introdução do conceito de medicamentos
essenciais pela OMS, que tinha como intenção principal tanto a promoção
do uso racional como a garantia do acesso. Apesar de atualmente cerca de
160 países contarem com listas de medicamentos essenciais, ainda é bastante
grande a parcela da população mundial à margem de acesso universal aos
medicamentos.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) propõe que, para o uso racional
de medicamentos, é preciso, em primeiro lugar, estabelecer a necessidade do
uso do medicamento; a seguir, que se receite o medicamento apropriado, a
melhor escolha, de acordo com os ditames de eficácia e segurança comprovados e aceitáveis. Além disso, é necessário que o medicamento seja prescrito
adequadamente, na forma farmacêutica, doses e período de duração do
tratamento; que esteja disponível de modo oportuno, e que responda sempre
aos critérios de qualidade exigidos; que se dispense em condições adequadas,
com a necessária orientação e responsabilidade; e, finalmente, que se cumpra
o regime terapêutico já prescrito, da melhor maneira possível.
Todavia, o que tem sido observado no Brasil se contrapõe à proposta
da OMS. Segundo Barros, pelo menos 35% dos medicamentos adquiridos
no Brasil são feitos através de automedicação. Entretanto, se o brasileiro
tende a se automedicar, é também porque não encontra disponibilidade dos
serviços de saúde mais acessíveis, precisa ficar horas em uma fila e, às vezes,
esperar dias e até meses para ser atendido por um médico. O baixo poder
aquisitivo da população e a precariedade dos serviços de saúde contrastam
com a facilidade de se obter medicamentos, sem pagamento de consulta e sem
receita médica em qualquer farmácia, onde, não raro, se encontra o estímulo
do balconista interessado em ganhar uma comissão pela venda; embora o
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alto consumo e o consumo de medicamentos de forma inadequada tenham
sido observados também entre as camadas mais privilegiadas da sociedade,
uma vez que essa prática se dá pela herança cultural, de forma instintiva sem
qualquer base racional, pela facilidade de acesso, dentre outros.
Além disso, os médicos, muitas vezes, não têm acesso a informações
completas a respeito da segurança dos fármacos. Parte deles sequer conhece
o conjunto dos possíveis efeitos nocivos do que prescreve, ou não sabe identificar nem prevenir corretamente combinações perigosas entre as substâncias
farmacológicas. Por outro lado, alguns pacientes ignoram os perigos de se
misturar medicamentos e não declaram se já estão usando outros. Há também
aqueles acompanhados por vários médicos, sem que haja intercomunicações
entre eles.
Os dados acerca do uso irracional de medicamentos no Brasil são
alarmantes. Aproximadamente um terço das internações ocorridas no país
tem como origem o uso incorreto de medicamentos. Estatísticas do Sistema
Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) da Fundação
Oswaldo Cruz (Fiocruz) revelam que os medicamentos respondem por 27%
das intoxicações no Brasil, e 16% dos casos de morte por intoxicações são
causados por medicamentos.
Contudo, o uso irracional de medicamentos não é uma prática exclusiva
do Brasil, sendo, portanto, prática mundial. A seguir, seguem informações da
(OMS, 1999) sobre esse hábito que ocorre em muitos países: 25 a 70% do
gasto em saúde, nos países em desenvolvimento, correspondem a medicamentos, em comparação a menos de 15% nos países desenvolvidos; 50 a
70% das consultas médicas geram prescrição medicamentosa; 50% de todos
os medicamentos são prescritos, dispensados ou usados inadequadamente;
75% das prescrições com antibióticos são errôneas; 2/3 dos antibióticos são
usados sem prescrição médica em muitos países; 50% dos consumidores
compram medicamentos para um dia de tratamento; cresce constantemente
a resistência da maioria dos microorganismos causadores de enfermidades
infecciosas prevalentes; 53% de todas as prescrições de antibióticos nos Estados Unidos são feitas para crianças de 0 a 4 anos; os hospitais gastam de
15 a 20% de seus orçamentos para lidar com as complicações causadas pelo
mau uso de medicamentos.
Diante do exposto, a OMS estabeleceu como seu grande desafio para a
próxima década a melhoria na racionalidade do uso de medicamentos, havendo necessidade de promover a avaliação desse uso e vigiar o seu consumo.
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Claudia Fabre Branco Scharf # Altamiro Damian Prevé # Juliana Pereira
Preocupado com este grave problema de saúde pública, o Ministério da
Saúde do Brasil criou o Comitê Nacional para a Promoção do Uso Racional
de Medicamentos por meio da Portaria n. 427/2007, o que vem a atender
uma recomendação da OMS. O Comitê desenvolverá ações estratégicas para
ampliar o acesso da população à assistência farmacêutica e para melhorar a
qualidade e segurança na utilização dos medicamentos.
De maneira geral, as soluções propostas para reverter ou minimizar este
quadro devem passar pela educação e informação da população, maior controle
na dispensação com e sem prescrição médica, melhor acesso aos serviços de
saúde, adoção de critérios éticos para a promoção de medicamentos, retirada
do mercado de numerosas especialidades farmacêuticas carentes de eficácia
ou de segurança e incentivo à adoção de terapêuticas não medicamentosas.
3 Metodologia
O presente trabalho foi desenvolvido através da análise dos recursos
físicos e humanos, existentes na Farmácia da Policlínica Municipal Centro de
Florianópolis, localizada na Avenida Rio Branco, n. 90, bairro Centro, além
do levantamento do número de atendimentos disponibilizados nos relatórios
INFOSAUDE – Sistema de informatização da Secretaria Municipal de Saúde
e SICLOM – Sistema de controle logístico de medicamentos antirretrovirais. A
análise deste levantamento foi feite mensalmente no período compreendido
entre junho de 2010 a junho de 2012 considerando as diferentes classes de
medicamentos: medicamentos da rede básica, medicamentos controlados ou
psicotrópicos e medicamentos antirretrovirais.
A Farmácia Policlínica Centro atende em média 4.100 pacientes/mês,
sendo 2.000 pacientes do programa DST-AIDS (antirretrovirais) e 2.100 pacientes da Atenção Básica (básicos e psicotrópicos).
Atualmente, a Farmácia possui três farmacêuticos e três técnicas de enfermagem, sendo que os farmacêuticos cumprem a carga horário de 30 horas
semanais. O horário de atendimento é de segunda a sexta-feira, das 8h às
16h45, sendo a única referência na Ilha para encaminhamento de pacientes
que fazem uso de medicamentos antirretrovirais.
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Análise dos Recursos na Dispensação de Medicamentos na Farmácia da Policlínica Municipal de Saúde – Centro
de Florianópolis
4 Análise e Resultados
A Farmácia Policlínica Centro (FPC) foi inaugurada em agosto de 2007,
no mesmo ano em que o município de Florianópolis assinou o Pacto de Gestão,
municipalizando os serviços de Média e Alta Complexidade.
A adoção da Gestão Plena levou o município a assumir a distribuição de
Medicamentos Excepcionais e Medicamentos Estratégicos. Como a Policlínica
Centro ofereceria consultas especializadas em Infectologia, ficou determinado
que os medicamentos Estratégicos, aqueles utilizados para o tratamento de
alguns agravos específicos, como DST-AIDS, Tuberculose, Hanseníase e endemias, seriam de responsabilidade da FPC, a qual seria referência para todo o
Município de Florianópolis. Além disso, essa farmácia também disponibilizaria
os medicamentos da atenção Básica aos pacientes que fossem consultados nas
especialidades médicas no dia do seu atendimento, independente do bairro de
origem destes, e a todos os pacientes pertencentes ao Centro de Saúde Centro
(CS Centro), por este funcionar no mesmo prédio da Policlínica Municipal
Centro, por não haver outro local para montar uma farmácia específica para
esta instituição e também pela falta de recursos humanos.
Em virtude do exposto acima, gerou-se um grande número de pacientes
atendidos na Farmácia Policlínica Centro, e, por esse motivo, em março de
2010 foi descentralizada a dispensação dos medicamentos HIV-AIDS, sendo
inaugurada outra Unidade Dispensadora de medicamentos Antirretrovirais
na Farmácia Policlínica Continente. O objetivo dessa medida seria diminuir
o número de pacientes atendidos na FPC, facilitando o acesso dos usuários
que moram no Continente e oferecendo um melhor atendimento, visto que
a FPC não comportava esta alta demanda.
Porém, devido a dificuldades de deslocamento dos pacientes da região
central até a Farmácia Básica de Referência Distrital do Centro, localizada na
Trindade, a FPC passou a ser referência na dispensação de medicamentos
psicotrópicos e outros sujeitos a controle especial da Portaria 344/ANVISA
para os Centros de Saúde Prainha, Mont Serrat e Centro, além de cobrir faltas de medicamentos para todos os pacientes que residem em Florianópolis.
Com isso, apesar da descentralização da dispensação dos medicamentos HIV-AIDS para a Farmácia Policlínica Continente, não houve qualquer
diminuição no número de atendimentos.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
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Para agravar a situação, com a abertura da unidade dispensadora de
medicamentos no Continente, foi exigida a transferência de um farmacêutico
para a implantação dessa unidade. Concluindo, a descentralização, além de
não diminuir o número de atendimentos na FPC, ainda implicou na diminuição de recursos humanos.
Os resultados e discussões estão apresentados de acordo com os indicadores avaliados nos gráficos a seguir.
Total de pacientes que retiraram medicamentos
da rede básica
600
500
400
300
Número de pacientes que
retiraram medicamentos da
rede básica
200
100
0
Gráfico 1: Total de pacientes que retiraram medicamentos da rede básica (essenciais) de
outubro/2010 a junho/2012
Fonte: Dados primários (2012)
Total de pacientes que retiraram medicamentos
controlados
2000
1800
1600
1400
1200
1000
800
600
400
200
0
Total de pacientes que
retiraram medicamentos
controlados
Gráfico 2: Total de pacientes que retiraram medicamentos psicotrópicos de outubro/2010 a
junho/2012
Fonte: Dados primários (2012)
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
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Análise dos Recursos na Dispensação de Medicamentos na Farmácia da Policlínica Municipal de Saúde – Centro
de Florianópolis
Na saúde, os medicamentos representam um instrumento essencial
para a capacidade resolutiva dos serviços prestados, representando o segundo
maior gasto dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), perdendo apenas para
os recursos humanos. (CARLOS, 1997)
No intuito de racionalizar os recursos da saúde e garantir acesso aos
medicamentos, os países elaboram suas políticas de medicamentos. No Brasil, a política de medicamentos tem como propósito garantir a segurança, a
eficácia e a qualidade dos medicamentos, a promoção do seu uso racional
e o acesso àqueles considerados essenciais. Medicamentos essenciais são os
básicos e indispensáveis para atender à maioria dos problemas de saúde da
população. Esses medicamentos devem estar disponíveis continuamente aos
que deles necessitem, nas formas farmacêuticas apropriadas. (BRASIL, 1998)
Porém, os medicamentos essenciais devem ser acompanhados de
serviços farmacêuticos de qualidade, pois, a partir da dificuldade no entendimento da terapêutica prescrita, os pacientes passam a conviver com retornos
precoces aos consultórios, realização de novos exames, agravamento de
quadros e possíveis sequelas, aumentando a demanda de atendimentos nos
consultórios médicos, e gerando um gargalo no atendimento, pois o número
de profissionais geralmente é bem reduzido. Essa é a realidade da Policlínica
Municipal Centro de Florianópolis.
Não diferente do que acontece com a classe médica, os farmacêuticos
padecem de um sério desequilíbrio consistente no grande número de pacientes
que necessitam retirar a medicação para dar continuidade ao seu tratamento, em detrimento da estrutura disponível, especialmente material humano,
em descompasso com os parâmetros preconizados pela Política Nacional de
Medicamentos.
Nessas condições, a atuação dos profissionais de saúde é reduzida à
mera categoria de “entregadores” de medicamentos, sem se poder cumprir
com os procedimentos e as reais responsabilidades, cujo ideal seria prestar uma
Atenção Farmacêutica eficaz e de qualidade, para que que não verificassem
efeitos negativos. Consequentemente, atingiria-se o tão perseguido uso racional de medicamentos, não somente para a redução de aplicação de recursos
financeiros para o Estado, mas diminuir a quantidade de medicamentos que
cada paciente consome, diminuindo suas reações adversas. Essa realidade
pode ser observada nos Gráficos 1 e 2, em que o aumento no número de
atendimentos é cada vez maior e o número de Recursos Humanos diminuiu
em relação ao início do período estudado.
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
Claudia Fabre Branco Scharf # Altamiro Damian Prevé # Juliana Pereira
A questão dos recursos humanos é fundamental quando se mira na
melhoria das condições de saúde da população. Contudo, ao operar a dispensação Farmacêutica com número escasso de funcionários, como se verifica
na Farmácia Policlínica Municipal – Centro, sem atender às recomendações
e procedimentos já destacados, ter-se-á indesejável aumento de pacientes
doentes por falta de informação sobre o uso da medicação e aquilo que está
prescrito, como a posologia.
É certo que o paciente, uma vez ingerindo este fármaco fora dos procedimentos apropriados, estará afetando gravemente sua saúde, revertendo
o objetivo da medicação em triste desfecho: o que se fez e ministrou para
alcançar a cura estará repercutindo em uma nova consulta, quiçá uma internação hospitalar, e, certamente, nova medicação.
A qualidade e quantidade do consumo de medicamentos estão sob
ação direta da prescrição, sendo que esta sofre inúmeras influências, que vão
desde a oferta de produtos e as expectativas dos pacientes até a propaganda
das indústrias produtoras.
Para que os profissionais farmacêuticos consigam realizar essa prática
de Atenção Farmacêutica, é preciso que haja tempo suficiente para que sejam
prestadas as devidas orientações, primando para que não ocorram distorções
nem carências. Assim, a administração pública deve oferecer todos os recursos
minimamente necessários para que o farmacêutico possa de fato cumprir com
seu verdadeiro papel, que não é somente uma simples entrega de medicamentos, mas a Atenção Farmacêutica necessária para um bom resultado final
do tratamento ministrado ao paciente.
Assim, a principal ferramenta que se necessita para fazer cumprir essa
salutar prática farmacêutica é ter material humano em número bastante; do
contrário, esse profissional, sobrecarregado, fragiliza-se ante a forte pressão
dos próprios pacientes em receber rapidamente a medicação, de modo que
não é capaz de sequer informar como administrar corretamente a medicação,
nem mesmo outras informações tão importantes, que irão refletir na adesão
do tratamento e evitar possíveis reações adversas da medicação.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
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Análise dos Recursos na Dispensação de Medicamentos na Farmácia da Policlínica Municipal de Saúde – Centro
de Florianópolis
Total de pacientes que retitraram medicamentos
antiretrovirais
2500
2000
1500
1000
500
Total de pacientes que
retitraram medicamentos
antiretrovirais
0
Gráfico 3: Total de pacientes que retiraram medicamentos antirretrovirais de outubro/2010
a junho/2012
Fonte: Dados primários (2012)
O Programa Nacional de HIV/AIDS foi implantado em Florianópolis
em 2007, no mesmo ano que o Município assinou o Pacto de Gestão, municipalizando serviços de média e alta complexidade. A adoção da Gestão
Plena implicou em o Município assumir a distribuição de Medicamentos
Estratégicos a fim de cumprir a Lei n. 9.313, de 13 de novembro de 1996, a
qual determina que todos os cidadãos possuem direito de acesso universal
aos medicamentos da TARV (BRASIL, 1996). Desde sua implantação até o
ano de 2009, a dispensação era realizada por apenas uma Unidade Dispensadora de Medicamentos (UDM), localizada na Policlínica Municipal Centro.
Em março de 2011 foi criada a UDM localizada na Policlínica do Continente
e no mês seguinte, em abril de 2011, a maioria dos pacientes que residem no
Continente passou a retirar esses medicamentos nesta nova UDM, reduzindo
em 18% o número de pacientes atendidos na farmácia da Policlínica Centro,
conforme mostra o Gráfico 3. Essa observação é um indicativo de que a
descentralização dos medicamentos e serviços da atenção farmacêutica leva
a uma diminuição da demanda, gerando uma melhoria no serviço prestado.
5 Considerações Finais
São várias as propostas de melhoria no atendimento e na prestação de
serviços na Farmácia da Policlínica Municipal Centro. Todavia, os principais
aspectos negativos a serem considerados e superados são: a) considerando
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Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
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que a Farmácia dispensa medicamentos de dois programas distintos, quais
sejam, os medicamentos da Atenção Básica e os medicamentos Estratégicos,
não sendo específica para o atendimento de medicamentos antirretrovirais,
que é a sua maior demanda, o ideal é que a dispensação fosse feita em locais
diferentes; b) falta de espaço físico para o armazenamento de medicamentos;
c) falta de capacitação para os profissionais; d) falta de recursos humanos,
acarretando aumento de reclamações pelos usuários em face da demora no
atendimento; e) consequentemente, Assistência Farmacêutica inadequada
ante a falta de tempo suficiente para desempenhar as funções essenciais; f)
alta rotatividade de técnicos.
Como reflexo desse processo há um aumento no estresse emocional e
físico para os profissionais da farmácia e para a direção da Policlínica, como
também para os usuários.
Uma proposta de adequação seria desvincular a farmácia da Policlínica
Municipal Centro em duas Farmácias em locais e estruturas distintas, visto
que a dispensação de medicamentos antirretrovirais exige extrema cautela
e parcimônia em relação ao sigilo, sendo que a especialização, em qualquer
setor, e não é diferente na saúde, sempre demonstrou resultados favoráveis.
De outro lado, a indicada descentralização diminuiria a demanda de pacientes,
podendo-se concentrar na qualidade da prestação do atendimento.
Outras propostas seriam: a) aumentar o número de profissionais atuantes no setor; b) qualificar esses profissionais; c) incrementar a orientação
dos usuários quanto ao uso dos medicamentos relativamente à sua indicação,
posologia, tempo do tratamento, conservação, efeitos colaterais e interações
medicamentosas, mediante instrumentos ilustrativos, tais como folders, vídeos
em sala de espera, etc. Enfim, tudo que favoreça um ambiente de trabalho
mais humano e profícuo, refletindo, consequentemente, na eficiência e ao
alcance dos elevados e indispensáveis fins do Sistema Único de Saúde.
Não se desconhece, tampouco deve ser minorado, as relevantes conquistas já alcançadas. Ao revés, e justamente para fomentar que se ultrapasse
ainda mais esses pontos positivos, convém registrá-los até mesmo a fim de
que se mantenham como meta permanente do serviço de saúde.
Nesse sentido, apesar das ressabidas carências nos diversos segmentos em que o Estado atua prioritariamente, notadamente saúde, educação,
segurança e moradia, é bem verdade, como se disse, que nos últimos anos
é possível elencar melhorias significativas, considerada, para esta análise, a
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 2
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Análise dos Recursos na Dispensação de Medicamentos na Farmácia da Policlínica Municipal de Saúde – Centro
de Florianópolis
unidade Policlínica-Centro, como: ambiente limpo e com iluminação adequada;
colaboradores em sua maioria dedicados e comprometidos com a Instituição;
existe o controle do estoque físico das medicações; é feita sempre que necessária
a programação de medicamentos de acordo com a necessidade para que o
usuário possa dar continuidade ao seu tratamento; o atendimento ao público
é feito de forma humanizada, sempre utilizando o bom senso e com ética; bem
como se faz o cumprimento de todas as normas estabelecidas pela instituição.
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