REFLEXÃO SOBRE A GESTÃO COMPARTILHADA NO

Propaganda
REFLEXÃO SOBRE A GESTÃO COMPARTILHADA NO ESTADO DO
PARANÁ
JANE APARECIDA PARAHYBAi
LENI TEREZINHA MARCELO PINZANii
RESUMO - Esse trabalho está vinculado a pesquisa “A democratização da gestão
educacional no processo de redefinição do papel do Estado Brasileiro (1995 - 2002)”
desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa em Gestão Escolar, (Gpge), e teve por objetivo
investigar como foi implantada e implementada a gestão compartilhada nas escolas
públicas do Estado do Paraná durante o governo Lerner. Para tanto realizamos pesquisa
de campo em duas escolas indicadas pelo Núcleo Regional de Ensino (NRE) de
Cascavel, sendo uma considerada de “excelência” e outra de “não excelência”. Através
das entrevistas realizadas nas escolas identificou-se como as mesmas incorporam ou não
na sua prática a Gestão Compartilhada. A implementação dessas políticas visa construir
a excelência junto à comunidade. Enfatizando uma forma de administração empresarial
a fim de diminuir custos. Com esta forma de gestão o Estado desobriga-se de suas
responsabilidades, passando-as para a comunidade. Os resultados evidenciaram que as
escolas têm implementado as políticas do Estado, mostrando desconhecimento do que
fundamenta a atual Gestão Escolar.
PALAVRAS-CHAVE: Política Educacional; Gestão Escolar; Estado.
INTRODUÇÃO
Este trabalho é resultado do projeto de iniciação à pesquisa científica
intitulada “Reflexão sobre a gestão compartilhada no Estado do Paraná”. A finalidade
desta pesquisa foi investigar como vem sendo implantada e implementada a gestão
compartilhada nas escolas públicas no Estado do Paraná. Para tanto, buscamos junto ao
Núcleo Regional de Ensino, que indicasse uma escola considerada de “excelência” e
outra de “não excelência”. No decorrer da pesquisa realizamos entrevistas1 nestas
escolas, buscando compreender se estas implementam uma nova forma de organização
ou apenas referendam e legitimam as velhas formas de administração.
A organização deste texto apresenta a análise das entrevistas fundamentadas
teoricamente em literaturas que conceituam a gestão escolar.
À medida que as análises foram sendo feitas na escola considerada de
excelência, foi sendo evidenciado que nesta escola todos tomam, os termos gestão
compartilhada, gestão democrática e gestão participativa como sinônimos. Buscamos
compreender então, como a gestão compartilhada é concretizada através de seus
representantes escolares.
Nas palavras da diretora da escola de excelência:
Gestão compartilhada é pensar juntos decidir juntos, porque ouvindo
se tem mais possibilidade de maior acerto de delegar poderes, não
abdicar mas delegar. É preciso compartilhar por que o mundo exige
isso, está muito ”competitivo” e não dá mais para se sustentar
isolado. A gestão compartilhada não vive sem a outra, ser
democrático é poder compartilhar, é ter clareza dessa democracia, da
minha participação, da minha competência, da minha
responsabilidade.
Segundo a diretora, para acontecer a gestão compartilhada é necessário
evidenciar as dificuldades do aluno (sociais/aprendizagem) sua apreensão de
conhecimentos, aprendizado, participação, se suas necessidades físicas estão sendo
supridas, se o professor está buscando conhecimentos para ensinar a seus alunos. Ela
concebe a escola não apenas como um campo de apreensão de conhecimentos, mas de
resolução de problemas sociais como a fome e o frio.
A denominação gestão compartilhada e a gestão democrática têm sido utilizadas
como sinônimos, em suas palavras para ser democrático é necessário também ser
competente, para exigir faz-se necessário antes entender dos seus deveres, do que dos
seus direitos. Além disso, considera a proposta de gestão escolar compartilhada
adequada para sua realidade, não só a que ela está inserida, mas para outras escolas
1
Foram entrevistados a equipe pedagógica, e representantes da APM (associação de Pais e Mestres) , representante
dos funcionários, e representantes do conselho escolar. Essas entrevistas foram realizadas no período de 16/05/01 a
27/06/01, pela professora Monica de Souza Zanardini, tendo contribuição das acadêmicas do curso de Pedagogia da
UNIOESTE.
também, todos os outros entrevistados que faziam parte da equipe pedagógica também
confirmaram esta posição.
Segundo o representante dos professores do Conselho Escolar, compartilhar é
fazer parceria com a comunidade, com as APMs, (Associação de Pais e Mestres) com os
pais e com o Estado ao qual cabe maior obrigação. Nesse sentido é fundamental que
pais, professores, alunos, equipe pedagógica, APMs, reflitam, para que haja à gestão
compartilhada é necessário que todos se envolvam.
Para a efetivação desse tipo de gestão a escola não só utilizou material vindo da
Secretaria Estadual de Educação (SEED) mas também de livros que versam sobre
gestão compartilhada, vídeos que tratam sobre empreendedorismo, cursos, seminários,
jornais, revistas, dentre outras. A diretora desta escola recebe documentos vindos da
SEED, que representa qual tipo de gestão a escola deve desempenhar. Quando
perguntamos se vinha algo delineado para que tipo de gestão a escola deveria se
encaminhar, a entrevistada respondeu que: “em cima da minha mesa lá tem umas
apostilinhas e uns livros já, minha bíblia lá né”, que fala de gestão compartilhada e
gestão participativa.
A diretora afirma que a SEED tem proporcionado cursos para gestores escolares
em Faxinal do Céu2, não só para diretores, mas para professores, presidentes de APMS
e muitos tem participado freqüentemente. A participação da direção nesses cursos,
também tem sido freqüente, que enfatiza que ao se sentir vazia, vai até Faxinal do Céu
para se abastecer, e volta entusiasmada para transmitir a seus colegas o que ouviu e
assim motivá-los.
Salienta ainda, que cabe então a cada um buscar subsídios, de tal modo que
venha a contribuir para o processo de seu conhecimento, pois o Estado tem se voltado
para essa questão, quanto o aperfeiçoamento dos professores. E que as conquistas que a
sua escola obteve não dependeram somente das instruções de Faxinal do Céu, mas do
trabalho da equipe da qual faz parte.
2
Estabelecida em 1995, à universidade do professor é uma entidade vinculada à secretaria responsável pelo
planejamento e pela execução de ações de capacitação continuada para os profissionais da educação básica do
Paraná. O centro de capacitação da universidade do professor é parte dessa estrutura. Criado em 1996 foi instalado
em Faxinal do Céu, no município de Pinhão, a 350 quilômetros a Sudoeste de Curitiba, antiga Vila dos Trabalhadores
que construíram a usina hidrelétrica de Foz do Areia, a localidade foi remodelada para fazer frente às suas novas
funções. A estrutura comporta cerca de mil visitantes em seus 238 chalés e 35 casas (equipadas com roupas de cama
e banho, cobertores e aquecimento nos quartos). Há dois auditórios grandes, que comportam 500 e 250 pessoas, e
outros seis mini-auditórios para eventos de menor audiência, com capacidade para 92 assistentes.
A SEED realizou quatro seminários de gestão contemplando toda rede, os dois
primeiros ocorreram no ano de 1996, o terceiro em 1997 e o quarto em 1998. Houve
outros seminários de menor proporção, com a participação apenas de parte dos diretores
da rede em cada um. Nesses seminários foram abordados temas que diziam respeito aos
aspectos organizacionais da gestão escolar. SOUZA (2001, p. 90,91,93)
As orientações sobre gestão compartilhada da SEED vêm para a direção, e esta
repassa para os demais funcionários através de reuniões ou através de mural.
Considerando que as análises realizadas das entrevistas, tem demonstrado que as
orientações que vieram de órgãos competentes desse modelo de gestão são
concretizadas através da comunidade, atribuindo autonomia para gerenciar a escola na
busca de recursos, pode-se afirmar que a implementação da proposta de gestão
compartilhada significa a ausência do Estado no que diz respeito aos aspectos
financeiros das escolas.
A ambigüidade dos termos gestão compartilhada e gestão democrática,
expressa na apropriação dos mesmos por parte do Estado, que tem sido um meio de
transferir a manutenção financeira das escolas para a comunidade, e que assim passa a
se responsabilizar por ela.
Essa estratégia de envolvimento da comunidade pode ser considerada
como um passo no processo de privatização do espaço público que
vem sendo implementado pelo Estado do Paraná [...]. Há uma
progressiva desresponsabilização do Estado em relação ao
financiamento da educação e são incentivadas parcerias com setores
da sociedade civil para gerir a escola sem, no entanto, descentralizar
o controle sobre a educação, (ZANARDINI. 2001, p.86).
O discurso do Estado é de que: a participação da comunidade é um meio de
tornar a escola mais democrática, no entanto, esta participação acaba por contribuir para
que se implemente as propostas do mesmo sem que se tenha clareza do seu real
significado.
Esta “partilha” com a comunidade, ou seja, esta divisão do espaço escolar, se
insere numa perspectiva, onde para o Estado à parte que lhe cabe é o controle
administrativo, enquanto que para a comunidade caberia a manutenção financeira e a
autonomia de resolver seus próprios problemas.
Segundo Nunes, há distinção nesse sentido entre gestão compartilhada e gestão
democrática: “compartilhar no sentido de repartir, participar ou tomar parte em”,
neste sentido supõe-se alguém como proprietário da gestão (o governo ou o diretor) que
magnanimente reparte aquilo que é seu (uma vez que só se reparte aquilo que se tem):
no segundo caso “controlar a quem dirige, entendendo que aquele que ocupa um cargo
de direção só o faz a serviço dos que o elegeram” (ao menos nos regimes
democráticos) é, portanto um movimento de periferia para o centro, de baixo para cima,
ao contrário de gestão compartilhada que é outorgada de cima para baixo.(1997, p.1).
Para democratizar a escola é essencial que haja a participação efetiva da
comunidade, nas decisões e planejamento dos rumos da escola, a sua participação
apenas em angariar meios para sua manutenção, não contribui para que ela seja um
espaço democrático. É preciso estar atento para o fato de que:
A definição de descentralização, participação e autonomia são
fundamentais para a gestão democrática, tendo em vista que tais
categorias têm revelado uma ambigüidade que desconstrói totalmente
os princípios de gestão democrática na perspectiva de transformação
social (VIRIATO, et al 2001, p.175).
A proposta Estadual para a reforma da Educação tem como questão central à
descentralização, a gestão da qualidade do sistema e das escolas, o sistema de avaliação,
um sistema de ensino eficiente e qualitativo, a prioridade ao ensino básico, a
modernização e flexibilização dos currículos e das práticas de ensino, os princípios da
qualidade total na gestão das escolas e um sistema público não estatal de ensino básico
(SILVA, 1998). Numa perspectiva de Estado Mínimo essas propostas viabilizam em
muito a sua desresponsabilização e a gestão do sistema educacional passa a ser um dos
focos de mudanças empreendidas pelas reformas educacionais em curso.
Pode-se dizer que, os projetos e programas implantados pela SEED, sob o
Governo de Jaime Lerner, caminham ao encontro da “globalização” acentuada em nossa
sociedade, bem como das políticas neoliberais. As escolas inseridas nesse contexto
partem em busca da "Qualidade Total”, para em conjunto com a comunidade atingir o
objetivo de tornar os estabelecimentos de ensino em centros de eficácia e excelência, já
que a comunidade começa assumir as responsabilidades de manter a escola física e
financeiramente através das instituições auxiliares da escola - IAEs - (Associação de
Pais e Mestres, Grêmio Estudantil e Conselho Escolar).
Com as IAEs responsabilizando-se pelo financiamento da escola, verifica-se
que cada vez mais o Estado se exime de sua função perante a educação pública
deixando a cargo da comunidade o que deveria ser sua responsabilidade, desta forma vai
criando-se um consenso entre a comunidade escolar de que se querem educação de
qualidade para seus filhos devem pagar por isso. Segundo NUNES - 1999 - “a diferença
entre as escolas que oferecem “ensino de boa qualidade” e as escolas que “enfrentam
problemas” não está na quantidade de recursos recebidos do “estado” e sim na
“participação da comunidade”. Para tanto é necessário criar condições para a
efetivação dessa participação, nesse prisma a idéia de descentralização como sinônimo
de desconcentração e o princípio da autonomia (financeira), o que é primordial para que
a implementação da gestão compartilhada se efetive com sucesso. A integração da
escola com a comunidade é um aspecto fundamental na concepção de Gestão
Compartilhada, porém está integração diz respeito ao financiamento da escola por parte
da comunidade e não de outro tipo de participação política.
Quanto à proposta de gestão compartilhada nas escolas consideradas de “não
excelência”, os entrevistados tinham compreensão que era algo a ser dividido com a
comunidade escolar, funcionários, equipe, alunos, sociedade.
Segundo a entrevistada as propostas que vinham do Estado, chegavam
delineadas, não apresentavam mudanças para a realidade da escola. Nada era discutido,
e sim imposto, tudo era generalizado, não se procurava ver quais eram as estruturas de
cada escola. Quando a proposta vinha, chegava para ser imediatamente aplicada,
independente de qual seria a realidade da escola.
Nesta escola foi possível evidenciar que os entrevistados pouco conheciam a
respeito de gestão compartilhada, embora falassem que dizia respeito a todos os
aspectos da escola, enfatizavam o aspecto administrativo.
As orientações da SEED sobre gestão compartilhada quase não chegavam a
orientação, supervisão, quem dirá a professores. Após as entrevistas, alguns
entrevistados apontaram ainda que o NRE e a SEED demoravam em responder as
necessidades, mas quando eram decisões que diziam respeito ao NRE ou a SEED
chegavam na escola de um dia para outro.
O desconhecimento da diretora a respeito das orientações da SEED sobre gestão
compartilhada foi evidenciado quando ela mostrava o documento da educação inclusiva
dizendo que ele estabelecia o porte da escola.
Os entrevistados naquele momento compreendiam que para haver uma gestão
democrática, seria necessário buscar saber quais são os anseios da comunidade escolar,
e sempre estar dialogando com os alunos e funcionários. O desejo de cada um não
deveria prevalecer, e sim o desejo de todos. Gestão democrática é uma gestão, onde
todos possam opinar, participar.
CONCLUSÕES
Os resultados evidenciaram que as escolas têm implementado as políticas do
Estado, mostrando desconhecimento do que fundamenta a atual Gestão Escolar. Embora
os entrevistados tenham noção de que o Estado se ausentava de suas responsabilidades
quanto à manutenção da escola, entendiam ainda que a comunidade não poderia se
eximir de mantê-la financeiramente, o que causava um afastamento cada vez maior do
Estado em relação às suas responsabilidades. Vários entrevistados viviam esse conflito,
quanto a responsabilidade da manutenção escolar.
A escola de excelência aceitava a proposta de gestão compartilhada, através das
políticas públicas educacionais do Paraná, a SEED mandava informações sobre gestão
compartilhada e gestão participativa, e como deveria ser desempenhado. Nesse sentido,
é possível constatar que a mesma concretizava as propostas de gestão compartilhada.
Esta análise a respeito da participação, é fundamental para esclarecer
que a idéia de “democracia” presente na perspectiva de compartilhar
a gestão da escola com a comunidade, assume o caráter
mercadológico neoliberal, para o qual o direito à competição e de
escolha é fundamental para garantir a liberdade individual de
conquistas no plano social (LIMA, 2002).
Segundo Souza a designação de gestão compartilhada, não é usada somente pelo
governo do Estado do Paraná. Este termo é utilizado também por outras pessoas,
instituições e governos. A participação, que vem acompanhada da manutenção escolar,
é atribuída a comunidade escolar em nome da democracia. (2001 p.199).
A participação da comunidade escolar é garantia do exercício de sua cidadania
em uma sociedade democrática. Assim sendo, a participação compreende o âmbito
social, econômico e cultural. Por gestão democrática entende-se a participação no
processo de decisões da comunidade escolar: professores, funcionários e alunos, pais e
representantes da sociedade civil atreladas à escola.
Na “escola de excelência” e na escola considerada de “não excelência”, os
recursos que provem das APMS são através de contribuições voluntárias, xerox, festas,
bingos, bailes, etc. necessários para suprir as necessidades da escola. Necessidades estas
que vão desde alimentação escolar a materiais didáticos, e que há muito tempo passam
por dificuldades financeiras, gerando seus próprios recursos, enquanto isso o Estado
tem se empenhado em promover cursos para capacitar novos gestores para a escola.
É necessário, portanto, aprofundar os estudos sobre a escola, sobre seus
membros, seu contexto social. Mas não é possível afirmar que a escola para nada serve,
ela é ainda, o local de socialização de crianças, portanto de aprender a viver
socialmente, de uma forma autoritária ou democrático-participativa.
REFERÊNCIAS
LIMA, Antonio Bosco de. Aula sobre o tema “Descentralização, Participação e
Autonomia: significados e perspectivas” 04 de julho de 2001. Cascavel, Pr:
UNIOESTE, 2002.
NUNES, Andrea Caldas. Gestão Democrática ou Compartilhada: uma (não) tão
simples questão de semântica. In: Caderno Pedagógico n 2, Curitiba, APP: março de
1999.
SEED-Secretaria de Estado da Educação - Gestão 1999-2002 - Janeiro de 2001
Documento Base - Programas de Capacitação Continuada para os Profissionais da
Educação Pública do Paraná.
SOUZA, Silvana Ap. de. Gestão Escolar Compartilhada: democracia ou
descompromisso? São Paulo: Xamã, 2001.
VIRIATO, Edaguimar Orquizas. A “Gestão Democrática” Educacional na
Redefinição do papel do Estado. In: NOGUEIRA, Francis Mary Guimarães (org.).
Estado e Políticas Sociais no Brasil. Cascavel, Pr: EDUNIOESTE, 2001.
ZANARDINI, Isaura Monica Souza. A Gestão Compartilhada Implementada no
Estado do Paraná e as Orientações do Banco Mundial (1995 - 2000). Dissertação
(Mestrado em Educação) - Universidade Estadual de Maringá, Paraná.
i
Acadêmica do quarto ano do Curso de Pedagogia do Campus de Cascavel/UNIOESTE. Colaboradora do
Grupo de Pesquisa em Gestão Escolar (Gpge) e do Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais (Gpps). Email: [email protected]
ii
Acadêmica do quarto ano do Curso de Pedagogia do Campus de Cascavel/UNIOESTE. Colaboradora
do Grupo de Pesquisa em Gestão Escolar (Gpge) e do Grupo de Pesquisa em Políticas Sociais (Gpps).
E-mail: [email protected]
Download