Exma. Senhora Presidente da Assembleia Municipal de Montijo; SENHORES AUTARCAS . Minhas Senhoras e meus Senhores: O título desta conferência, «A ÉTICA NA POLÍTICA», diz-nos que a nossa reflexão se deve prender com a visão de que a ética deve transbordar para a política, deve envolvê-la, tornar-se a sua pele, de tal modo que se não possa invocar a POLÍTICA sem que de imediato se associe a palavra ÉTICA. POLÍTICA e ÉTICA devem ser, então, as duas faces da mesma moeda. E, assim o entendemos, porque defendemos que o Homem é a medida da Política e a Política alcançará sempre a dimensão dos homens e das mulheres que a sirvam – ou que dela se sirvam. No primeiro caso, teremos a Política como causa nobre, a nobre arte de servir o Povo; no segundo, a promiscuidade entre interesses privados e públicos em que estes são colocados ao serviço daqueles em prejuízo dos interesses das populações. A qualidade da política dependerá então da qualidade ética dos homens e das mulheres que a servirem. Depois da queda do Muro de Berlim, houve quem tivesse anunciado, talvez com algum exagero, o fim das ideologias, sacrificando o domínio dos princípios e dos valores aos interesses materiais, despindo o homem do sonho e da vontade de alcançar sempre a liberdade de definir o seu próprio percurso. É certo que este paradigma tem feito o seu caminho encontrando-se, hoje, o Homem confrontado, por um lado, com uma sociedade que endeusou o aspeto material da vida, ignorando meios para atingir os fins materiais que persegue, e, por outro, com a necessidade de reencontrar os valores e os princípios que o possam conduzir à construção de uma sociedade que busque o bem-estar social como fim a alcançar para todos. Nos últimos 100 anos, registamos duas guerras mundiais; assistimos à ascensão do nazismo e do fascismo; com horror, tomámos conhecimento do holocausto; Hiroxima e Nagasáqui despertaram-nos para o terror nuclear; a Guerra Fria fez-nos acreditar que havia bons e maus, dependendo do lado do Muro em que nos colocávamos. Mais recentemente, assistimos aos ataques às Torres Gémeas, nos Estados Unidos, e a duas guerras deflagradas a partir daquele acontecimento, referimo-nos às guerras no Afeganistão e no Iraque. Se a guerra enquanto expressão de domínio e de supressão de liberdades é, em si, a negação da ética, transformando o «homem em lobo do próprio homem», não deixa de ser o homem o lobo do próprio homem num sistema que revela quotidianamente a sua faceta antiética quando permite a exploração do homem pelo homem. Sofremos, no nosso País, cerca de 40 anos de Fascismo, com a supressão das Liberdades e uma exploração extrema do povo trabalhador. Alimentamos, em Abril, a esperança redentora de construirmos um novo País, em que dia a dia estivesse presente o primeiro artigo da Constituição da República que nos garante que «Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.» «Dignidade da pessoa humana» qualidade que a política não pode ignorar sob pena de se ter afastado da Ética e, afastando-se desta, originar o repúdio da política por parte da vontade popular. O termo Política, sem a outra face que é a Ética, assume então um carácter pejorativo, aceite porque imprescindível, mas nem por isso desejável. Dizia-se outrora:«A minha política é o trabalho e não me dou nada mal com ela»; diz-se hoje: «São todos iguais» retratando-se, assim, o distanciamento dos cidadãos de uma conceção Política que se despiu da Ética, mas que se aliou à corrupção. De ética temos vindo a falar nesta conferência. Mas o que é a Ética? No sentido corrente do termo, Ética é a «parte da Filosofia que estuda os valores morais e os princípios ideais da conduta humana» e do ponto de vista social «Ética é parte prática da filosofia social, que indica as normas a que devem ajustar-se as relações entre os diversos membros da sociedade.» Assim, o que aqui nos move é o debate sobre os princípios que devem orientar a conduta humana e as normas a que devem ajustar-se as relações entre os diversos membros da sociedade. Esta definição obriga-nos a refletir sobre os problemas concretos que o País enfrenta na hora presente sem nos esquecermos que o conceito em causa não é alheio aos interesses de classe, aos interesses dos sectores económicos e políticos do nosso País, de tal modo que a Ética se poderá transformar num coletes-de-forças para as populações, a quem se exige um comportamento Ético irrepreensível, e um alívio para quem detém as rédeas do poder, seja económico, político ou social. No quadro da grave crise em que fomos lançados, acusaram-nos de “estarmos a viver acima das nossas possibilidades”, o que é eticamente reprovável; mas deixa de ser “eticamente reprovável” o desvio de milhões de euros para os paraísos fiscais. É eticamente reprovável fugir ao pagamento de impostos; mas é aceitável que se transfiram para o estrangeiro as sedes das grandes empresas para pagarem menos impostos. Dizem-nos que é eticamente reprovável exigir o aumento do salário mínimo, porque a economia não suporta tal encargo; mas, depois, logo nos dizem que é uma exigência ética que os cidadãos suportem os prejuízos da banca, sem que se apurem os culpados por má gestão ou gestão danosa. Asseguram-nos que se devem cortar as pensões, que se devem aplicar mais impostos e taxas sobre as pensões, já de si baixas; mas aceita-se como ético o pagamento de pensões chorudas. Dizem-nos que a ética da Estado obriga a reduzir as despesas no Serviço Nacional de Saúde, e querem, depois, que aceitemos como ético que se morra nos hospitais sem assistência ou por falta de medicamentos. Da educação ao serviço social mais exemplos se poderiam apontar sobre as duas faces da ética – a que nos exigem e aquela que os políticos que têm governado o País não praticam, dando à Ética também dois pesos e duas medidas, o que é reprovável. A ética é, hoje, um farol que se acende, e que queremos que brilhe fortemente, porque a corrupção está a minar perigosamente os alicerces da nossa Democracia. Em nome da ética, é necessário agir de modo transparente, diria, de modo honesto e justo, para que os cidadãos se voltem a reconciliar com a Política e com os seus agentes. Por outro lado, é necessário criar legislação que permita o combate sem quartel à corrupção. Neste sentido, o Bloco de Esquerda apresentará um conjunto de propostas na Assembleia da República. PELO BLOCO DE ESQUERDA CIPRIANO PISCO