HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA ESCOLA DE SAÚDE PÚBLICA DO ESTADO DO CEARÁ RESIDÊNCIA DE ANESTESIOLOGIA VÍTOR TÁRCIO DE QUEIROZ SIMÃO COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS A BLOQUEADORES NEUROMUSCULARES – REVISÃO NARRATIVA FORTALEZA 2016 VÍTOR TÁRCIO DE QUEIROZ SIMÃO COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS A BLOQUEAORES NEUROMUSCULARES – REVISÃO NARRATIVA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como pré-requisito parcial para conclusão de Residência Médica em Anestesiologia do Hospital Geral de Fortaleza, vinculado a Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará Orientador: Prof. Dr. Rogean Rodrigues Nunes FORTALEZA 2016 VÍTOR TÁRCIO DE QUEIROZ SIMÃO COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS A BLOQUEAORES NEUROMUSCULARES – REVISÃO NARRATIVA Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como pré-requisito parcial para conclusão de Residência Médica em Anestesiologia do Hospital Geral de Fortaleza, vinculado a Escola de Saúde Pública do Estado do Ceará. Aprovado em: ___/___/____ BANCA EXAMINADORA _____________________________________ Prof. Dr. Rogean Rodrigues Nunes Corresponsável CET-Hospital Geral de Fortaleza ______________________________________ Prof. Dr. José Carlos Rodrigues Nascimento Coordenador CET-Hospital Geral de Fortaleza ____________________________________ Prof. Dr. David Silveira Marinho Corresponsável CET-Hospital Geral de Fortaleza A Deus, por tornar a vida possível AGRADECIMENTOS Aos meus pais Tereza e Vitor pelo apoio e incentivo desde o início dos meus estudos. Aos meus irmãos Waleska e Alexandre por estarem sempre na torcida para que tudo desse certo. A todos os meus outros familiares e amigos, que de alguma forma contribuíram para minha formação. Ao Dr. José Carlos Rodrigues do Nascimento, por coordenar a residência médica, a preceptoria do primeiro ano e fazer parte da banca examinadora deste TCC. Não deve ser fácil fazer boa parte do trabalho burocrático e cuidar de tantos residentes ao mesmo tempo. À Dra. Nely Marjollie Guanabara Teixeira, pela colaboração nas atividades teóricas no primeiro ano de residência médica. Ao Dr. Germano Pinheiro Medeiros, pela preceptoria do segundo ano de residência e pela coordenação da sessão clínica. Ao Prof. Dr. Rogean Rodrigues Nunes, pela coordenação científica da residência médica, a preceptoria do terceiro ano e por orientar este TCC. À Dra. Cristiane Gurgel Lopes, pela colaboração nas atividades teóricas no terceiro ano de residência médica e pelo empenho na orientação dos temas livres enviados aos congressos. À Dra. Aglais Gonçalves da Silva Leite, pela coordenação do serviço de anestesiologia do Hospital Geral de Fortaleza e pela colaboração com a residência médica. Ao Dr. David Silveira Marinho, por fazer parte da banca examinadora deste TCC e, principalmente, pelos ensinamentos e incentivos nos dados durante a residência. Aos meus amigos de residência, pois sem o apoio de todos, essas palavras não estariam sendo escritas. A todos os preceptores e anestesiologistas dos seis hospitais de ensino (HGF, HGWA, HGCC, HIAS, HM e ICC) que com paciência e confiança contribuíram com ensinamentos fundamentais para nossa formação. Aos pacientes, por terem confiado suas vidas aos que ainda estavam em aprendizado. A toda equipe do centro cirúrgico e em especial à Sra. Antônia, pois sem a participação e empenho de todos nada aconteceria. À Marcinha, nossa ligação com o SEAP, que sempre tão gentil e cordialmente nos acolheu. A SAEC/COOPANEST, por terem sempre prontamente cedido apoio e espaço para que muitas de nossas atividades ocorressem. “Aos meus irmãos Maria Vitânia e Henrique, que ao partirem precocemente, deixaram além de saudades, motivação para escolha da minha profissão. A primeira me fez querer ser médico e o segundo me fez querer ser anestesiologista. Dedico todas as minhas conquistas a vocês. ” In memoriam RESUMO Este artigo de revisão tem como finalidade discorrer sobre as principais complicações associadas ao uso de bloqueadores neuromusculares (BNM). Os BNM tem sido utilizados na prática anestésica com o intuito de facilitar a intubação orotraqueal, minimizando os riscos de lesões das vias aéreas e facilitando algumas etapas em determinados atos operatórios. Contudo sua utilização tem sido associada a uma série de complicações, dentre elas anafilaxia, uso incidental de BNM em pacientes sem hipnose adequada, complicações respiratórias no pós-operatório, dentre outras. Os BNM são divididos em duas classes principais: despolarizantes e adespolarizantes. O suxametônio é o BNM despolarizante disponível e está relacionado a complicações próprias deste fármaco, como fasciculações, aumento das pressões intragástrica, ocular e intracraniana, hipercalemia e hipertermia maligna. Os mecanismos de ação dos diferentes BNM serão abordados, assim como os agentes reversores de seus efeitos. Também serão discutidos os fatores de risco mais associados a complicações, assim como as alternativas para minimizá-los. Os BNM também podem ser considerados como fármacos relacionados à saúde ocupacional. Palavras-chave: Bloqueadores neuromusculares, complicações, anafilaxia, curarização residual, monitorização do bloqueio neuromuscular, testes alérgicos, Anestesiologia. ABSTRACT This review article aims to discuss the main complications associated with the use of neuromuscular blockers (NMB). NMB has been used in the anesthetic practice in order to facilitate tracheal intubation, minimizing the risk of airway injury and facilitating certain steps in many surgical procedures. However, its use has been linked to a number of complications, among them anaphylaxis, incidental use of NMB in patients without adequate hypnosis, respiratory complications after surgery, among others. Neuromuscular blocking agents are divided into two main classes: nondepolarizing and depolarizing. Succinylcholine is the available depolarizing NMB and is related to own complications of this drug, such as muscle spasm, increased intragastric, ocular and intracranial pressure, hyperkalemia and malignant hyperthermia. The mechanisms of action of different NMB will be addressed, as well as the agents reversers from its effects. It will be also discussed the factors associated with increased in risk of complications, as well as the alternatives to minimize them. Neuromuscular blocking agents may also be considered as drug related to occupational health. Keywords: Neuromuscular blockers, complications, neuromuscular blockade, Allergy tests, Anesthesiology. Anaphylaxis, Residual SUMÁRIO 1.INTRODUÇÃO................................................................................................... 12 2. CLASSIFICAÇÃO, ESTRUTURA E MECANISMOS DE AÇÃO DOS BNM….. 12 2.1 BNM despolarizantes……………………………………………………………… 12 2.2 BNM adespolarizantes……………………………………………………………. 13 3. COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS AO SUXAMETÔNIO.....................…........... 13 3.1 Aumento da pressão intracraniana......................…….................................... 13 3.2 Aumento da pressão intragástrica .....…………..………….............................. 14 3.3 Aumento da pressão intraocular.....…….………….......................................... 14 3.4 Fasciculações………………………………………………………………………. 14 3.5 Hipercalemia.................................................………....................................... 15 3.6. Complicações cardiovasculares…………………………………………………. 15 3.7 Hipertermia Maligna.......................……………………..................................... 15 3.8 Anafilaxia……………………………………………………………………………. 16 4. COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS AOS BNM ADESPOLARIZANTES………... 16 4.1. Reações anafiláticas……………………………………………………………… 16 4.2 Curarização residual .............................................…………………………….. 18 4.3 Aplicação incidental............................................................................……...... 19 5. MONITORRIZAÇÃO DO BNM.............….......................................................... 19 6. TESTES ALÉRGICOS ...................................................................................... 20 7. GRUPOS DE RISCO......................................................................……………. 21 7.1 Anestesiologistas alérgicos a BNM................................................................. 21 7.2 Cabeleireiros versus padeiros.....................................................................… 21 7.3 Reação Cruzada com antibióticos….….......................................................... 22 8. REVERSÃO DO BLOQUEIO NEUROMUSCULAR.......................................... 23 8.1 Anticolinesterásicos......................................................……………………….. 23 8.2 Sugammadex..................................................................................………….. 24 8.3 Calabadion................................................................………………………….. 25 9. NOVOS AGENTES PARA O BLOQUEIO NEUROMUSCULAR....................... 25 10. O USO DE BNM NO BRASIL.......................................................................... 25 11. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 26 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 12 1 INTRODUÇÃO A introdução dos BNM na prática anestésica ocorreu em 1940, causando uma revolução no manejo das vias aéreas e de técnicas cirúrgicas. Antes de sua utilização, o relaxamento era realizado através da administração de altas doses de agentes inalatórios, causando importantes repercussões cardiorrespiratórias, algumas vezes fatais. 1 Contudo, apesar das vantagens trazidas, a utilização de BNM tem sido associada a uma série de complicações, dentre elas anafilaxia, uso incidental de BNM em pacientes sem hipnose adequada, complicações respiratórias no pós-operatório, dentre outras. Os BNM são divididos em duas classes principais: despolarizantes e adespolarizantes. O suxametônio é o BNM despolarizante disponível e está relacionado a complicações próprias deste fármaco, como fasciculações, aumento das pressões intragástrica, ocular e intracraniana, hipercalemia e hipertermia maligna. Os mecanismos de ação dos diferentes BNM serão abordados, assim como os agentes reversores de seus efeitos. Também serão discutidos os fatores de risco mais associados a complicações, assim como as alternativas para minimizá-los. Os BNM também podem ser considerados como fármacos relacionados à saúde ocupacional. 2 CLASSIFICAÇÃO, ESTRUTURA E MECANISMOS DE AÇÃO DOS BNM Desde a introdução da +d-tubocurarina (dTc), vários novos agentes bloqueadores neuromusculares (BNM) foram trazidos para a prática anestésica. A grande estrutura de uma amônia quaternária faz dos BNM fármacos únicos na prática anestésica. Por questões práticas é importante compreender a relação entre suas estruturas e ações. A acetilcolina (Ach) é a substância responsável pela transmissão do impulso na junção neuromuscular. Por ser uma molécula flexível, é capaz de adotar várias conformações sem considerável gasto de energia, tornando-a fisiologicamente multifuncional. 1 A junção neuromuscular consiste de um nervo motor terminal, da fenda sináptica e dos receptores nicotínicos pós-sinápticos da placa motora dos músculos estriados. Os BNM são divididos primariamente em agentes despolarizantes (suxametônio) e adespolarizantes (e.g. atracúrio, cisatracúrio e rocurônio. Os bloqueadores adespolarizantes são divididos em 13 compostos derivados de aminoesteróides e os benzilisoquinolínicos. Também diferem quanto à potência, início de ação e metabolização.1 2.1 BNM despolarizantes O bloqueador despolarizante atualmente disponível (suxametônio) age como um agonista da acetilcolina no receptor nicotínico. Por causar uma despolarização mais prolongada da placa motora, leva a uma insensibilidade dos canais iônicos aos estímulos de mais potenciais de ação, causando, desta forma o bloqueio neuromuscular. 2.2 BNM adespolarizantes Os BNM adespolarizantes, ao contrário do suxametônio, agem como competidores diretos com a acetilcolina pelos sítios de ligação dos receptores nicotínicos, prevenindo a ligação entre o neurotransmissor e o receptor. Os benzilisoquinolínicos consistem de dois grupos de amônia quaternárias ligadas por uma cadeia metil simples. Seus representantes atuais mais utilizados são o cisatracúrio, atracúrio e mivacúrio e doxacúrio. Isso torna-os mais susceptíveis à quebra de suas moléculas. O atracúrio é degradado através de duas vias metabólicas, sendo uma dessas vias a reação de Hofmann, que consiste em uma degradação não enzimática que aumenta tanto com a temperatura corporal quanto com elevação do pH sérico. A segunda via ocorre por hidrólise através de esterases plasmáticas inespecíficas. Os benzilisoquinolínicos causam também liberação de histamina por sua ligação aos receptores em mastócitos, sendo que o cisatracúrio causa menor aumento sérico de histamina, sugerindo menor potencial alergênico. O mivacúrio possui a vantagem de ter menor tempo de ação, podendo ser uma alternativa para procedimentos operatórios de menor duração. Ao contrário de outros benzilisoquinolínicos, ele é degradado colinesterase plasmática, assim como o suxametônio. O Doxacúrio é um BNM de longa duração, que possui meia-vida de eliminação de 1h a 2h e depende da função renal e hepática. Os aminoesteróides, ao contrário, são estruturas mais rígidas, onde um ou dois grupos de amônia quaternária são ligadas por um núcleo esteroide. Seus principais representantes utilizados são rocurônio, pancurônio, vecurônio.1 O Pipecurônio é um agente de longa duração semelhante ao pancurônio, porém causa menos efeitos cardiovascular e liberação 14 de histamina. Essas vantagens fizeram com um estudo recente avaliasse a reversão do efeito do pipecurônio pelo sugammadex, chegando-se à conclusão de que o sugammadex revertia de forma rápida e adequada o bloqueio neuromuscular moderado causado por este agente. Veja abaixo exemplos das estruturas moleculares de alguns BNM (figura1): Figura 1. 1 3 COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS AO SUXAMETÔNIO 3.1 Aumento da pressão intracraniana O suxametônio pode aumentar a pressão intracraniana, sendo que essa resposta pode ser atenuada por uma precurarização. Contudo devemos lembrar que uma laringoscopia sem um plano anestésico adequado pode aumentar a pressão intracraniana até mais que a utilização do suxametônio.2 3.2 Aumento da pressão intragástrica O suxametônio pode também causar aumento da pressão intragástrica, apesar de haver maior aumento da pressão do esfíncter esofagiano inferior. Sendo assim, não parece haver um risco aumentado de aspiração do conteúdo gástrico com o uso do suxametônio na 15 intubação traqueal, a não ser que haja comprometimento funcional do esfíncter esofagiano inferior. Assim como a atenuação do aumento da pressão intracraniana, a precurarização também tem esse efeito na pressão intragástrica.2 3.3 Aumento da pressão intraocular A pressão intraocular pode ser elevada em torno de cinco a 15 mmHg após a injeção de suxametônio e este aumento persiste mesmo após o desprendimento dos músculos extraoculares, sugerindo uma etiologia intraocular para tal aumento da pressão. Ao contrário das pressões intracraniana e intragástrica, parece não haver atenuação do aumento da pressão intraocular com a precurarização com bloqueadores neuromusculares adespolarizantes. Por essa razão tem sido um consenso não utilizar suxametônio em casos de trauma com olho aberto. Contudo não se pode negligenciar que plano anestésico inadequado, aumento da pressão arterial sistêmica, bloqueio neuromuscular insuficiente durante a laringoscopia e intubação traqueal pode levar a um maior aumento proporcional da pressão intraocular. Ainda não há evidências de que o uso de suxametônio possa causar cegueira ou extrusão do conteúdo ocular.2 3.4 Fasciculações A prevalência de fasciculações é alta, chegando entre 60% a 90% após a rápida injeção de suxametônio, especialmente em adultos. Apesar de se tratar de um efeito colateral benigno, muitos anestesiologistas preferem prevenir as fasciculações com injeção de baixas doses de BNM adespolarizantes três a cinco minutos antes da aplicação de suxametônio. Quando a droga era disponível, d-tubocurarina 0,05 mg/kg era utilizada com esse propósito. Rocurônio é uma alternativa aceitável na dose de 0,03 a 0,04 mg//kg, cerca de 10% de sua DE 95. Doses maiores podem levar a sintomas como fraqueza muscular, turvação visual, sensação de pálpebras pesadas, alterações na fala, dificuldade de deglutição e dispneia no paciente ainda acordado. Pancurônio, vecurônio, cisatracúrio e mivacúrio não são tão efetivos em diminuir a incidência de fasciculações. Quando é realizada a precurarização, a dose de suxametônio deve ser aumentada, preferencialmente para 2 mg/kg, devido ao antagonismo entre BNM despolarizantes e adespolarizantes. 2 16 3.5 Hipercalemia O potássio sérico eleva-se em cerca de 0,5 mEq/L alguns minutos após a injeção de suxametônio. Este efeito não pode ser prevenido completamente pela precurarização, uma vez que altas doses de BNM adespolarizantes seriam necessárias para evitar a elevação do potássio sérico. Os pacientes com hipercalemia prévia não apresentam maior aumento dos níveis séricos de potássico quando comparados a pacientes sem hipercalemia, porém o valor absoluto pode chegar a nível tóxico. Hipercalemia grave tem sido implicada em parada cardiorrespiratória, principalmente em casos de lesões de desnervação, transecção de medula espinhal, queimaduras extensas e pacientes com imobilidade por longos períodos, provavelmente relacionada à liberação de potássio em decorrência da proliferação de receptores extrajuncionais. Os pacientes que estão acidóticos e hipovolêmicos também estão sob risco aumentado.2 3.6 Complicações cardiovasculares Bradicardia sinusal ou extra-sístoles ventriculares podem ocorrer após administração de suxametônio, especialmente em crianças. Há casos descritos de assistolia tanto em adultos quanto em crianças após a injeção de uma segunda dose de suxametônio. Os mecanismos destes efeitos ainda não estão bem esclarecido, uma vez que o suxametônio possui pouco efeito sobre o sistema autonômico colinérgico. O suxametônio pode causar aumento da liberação de catecolaminas, sendo taquicardia frequentemente observada. 2 3.7 Hipertermia Maligna Hipertermia maligna é uma síndrome aguda, onde há aumento do metabolismo nos músculos esqueléticos e do consumo de oxigênio, formação de lactato, produção de calor e rabdomiólise. O Suxametônio é o BNM que pode desencadear essa síndrome, assim como os anestésicos halogenados. O tratamento consiste no resfriamento do paciente, controle dos distúrbios hidroeletrolíticos, hidratação e uso do Dantrolene sódico (dose de 2,5 mg/kg a 10 mg/kg até controlar os sintomas), um fármaco que é capaz de abolir o acoplamento excitação-contração nas células musculares provavelmente por ação no receptor de rianodina.2,9 17 3.8 Anafilaxia O suxametônio tem sido associado, segundo alguns trabalhos, como desencadeador de reações alérgicas mais do que qualquer outra droga usada em anestesia. A incidência de reações alérgicas ao suxametônio é difícil de ser estabelecida, mas provavelmente está na ordem de 1:5.000 a 1:10.000.2 4 COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS AOS BNM ADESPOLARIZANTES 4.1 Anafilaxia Um estudo francês avaliou durante oito anos (1997 – 2004) as principais causas de anafilaxia em atos anestésicos. Um total de 2516 pacientes foram inclusos na pesquisa. O diagnóstico de reação mediada por IgE foi estabelecido em 1816 casos (72,18%). As causas mais comuns foram a administração de BNM (n = 1067; 58%), látex (n = 361; 12,85%) e antibióticos (236; 12,85%). A incidência anual por milhão de procedimento foi maior no gênero feminino (154,9) que no masculino (55,4). Em crianças a causa mais comum de reação mediada por IgE foi decorrente da exposição ao látex. 4 Um estudo realizado no oeste da Austrália entre 2002 e 2011 demonstrou que os BNM são a causa mais comum de anafilaxia no intraoperatório. Neste estudo foi observado que o rocurônio foi responsável por 56% dos casos de anafilaxia, suxametônio 21% e vecurônio 11%. Rocurônio apresentou uma taxa maior de anafilaxia mediada por IgE comparado ao vecurônio (8.0 x 2.8 por 100.000 exposições; p = 0,0013). Cisatracúrio apresentou menor prevalência de anafilaxia por reação cruzada a pacientes com histórico prévio de reação alérgica ao rocurônio e vecurônio.5 Reddy et al. confirmaram que as reações alérgicas estavam associadas a níveis mais elevados de triptase. Devido à falta de testes confiáveis para a estimativa de um paciente desenvolver reação alérgica aos BNM antes que os mesmos tenham histórico de alergia, a redução do risco de anafilaxia no período peroperatório deve ser baseada em prevenção secundária. Para dados mais fidedignos seriam adequados mais estudos sobre anafilaxia intraoperatória, definição padrão de anafilaxia, testes cutâneos uniformes, testes específicos 18 para imunoglobulina E, mensuração da triptase e uma revisão conjunta com alergologista e anestesiologista. 6 Há vários fatores que influenciarão na escolha de determinado BNM, a depender da situação clínica, mas o aumento na incidência de reações anafiláticas associada ao uso de suxametônio e rocurônio e o risco relativamente baixo associado ao uso de atracúrio e cisatracúrio pode ser relevante na escolha de qual BNM utilizar. O tratamento da anafilaxia pode ser feito conforme tabela abaixo: Tabela 1.5 MANEJO DA ANAFILAXIA DURANTE ANESTESIA GERAL TERAPIA INICIAL 1. Cessar a administração do fármaco causador 2. Manter vias aéreas e ofertar O2 a 100% 3. Iniciar expansão volêmica (2-4 L de cristaloides/coloides se hipotensão) 4. Epinefrina (5 a 10 μg, IV, em bolos se hipotensão e 0,1 a 1 mg, IV se PCR.) TERAPIA SECUNDÁRIA 1. Anti-histamínico (0,5 -1 mg/kg de difenidramina) 2. Infusão contínua de catecolaminas 3. Broncodilatadores: inalação com albuterol, terbutalina e/ou agentes anticolinérgicos 4. Corticosteroides (0,25 – 1g de hidrocortisona) 5. Bicarbonato de sódio (0,5 - 1 mEq/kg se hipotensão persistente ou acidose) 6.Reavaliação das vias aéreas (antes da extubação) 7. Vasopressina para choque refratário Anesthesiology, 2015; 122:5-7. 19 4.2 Curarização Residual A paralisia residual após o uso de bloqueadores neuromusculares (BNM) sem monitorização neuromuscular continua sendo um problema clínico. Um estudo turco pesquisou a curarização residual pós-operatória e os eventos respiratórios críticos em sala de recuperação, bem como a abordagem clínica da curarização pós-operatória (CRPO) feita pelos anestesiologistas nas instituições pesquisadas. 6,7 Este estudo observacional incluiu 415 pacientes que receberam anestesia geral com BNM de ação intermediária. A manutenção da anestesia foi feita por anestesiologistas não participantes, „„cegos‟‟ para o estudo. A monitorização neuromuscular foi realizada no momento da chegada à sala de recuperação. Um evento foi definido como necessidade de suporte ventilatório, saturação periférica de oxigênio <90% e 90-93%, a despeito de receber 3 L/min de O2 via cânula nasal, frequência respiratória >20 irpm, uso da musculatura acessória, dificuldade de engolir ou falar e necessidade de reintubação. A abordagem clínica dos anestesiologistas, em relação aos agentes de reversão, foi avaliada usando um questionário de oito perguntas logo após o estudo. A incidência de CRPO foi de 43% (n = 179) para a TOF <0 e 15% (n = 61) para a TOF <0,7. A incidência de TOF <0,9 foi significativamente maior em mulheres, pacientes com estado físico ASA III e com anestesia de curta duração (p < 0,05). Além disso, 66% (n = 272) dos 415 pacientes que chegam à sala de recuperação haviam recebido neostigmina. Um TOF <0,9 foi encontrado em 46% (n = 126) dos pacientes que receberam neostigmina. 8, 10 4.3 Aplicação incidental Uma publicação recente no 5º National Adit Project (NAP5) enfatizou a administração equivocada de fármacos durante uma anestesia. Para minimizar tais erros, quatro recomendações foram sugeridas. As duas primeiras focaram nas características das ampolas com intuito de diminuir a chance de aplicação da droga errada, fator que corresponde a apenas cinco a cada 17 erros de administração. A terceira recomendação 20 tratou das características das seringas, contudo sem grande detalhamento, orientando que os anestesiologistas ficassem alerta no momento da injeção de fármacos. A quarta recomendação focou em como manejar as complicações das injeções equivocadas. 11,12,14 A utilização de seringas com êmbolo vermelho para a administração de BNM foi sugerido pela primeira vez na Austrália em 1994 e atualmente é usada neste país e na Nova Zelândia como rotina. Uma seringa com êmbolo vermelho de uso exclusivo para BNM faz com que o anestesiologista associe essa cor a essa droga11,12. Veja na figura 2; Fig. 2 Seringas com êmbolos vermelhos 5 MONITORIZAÇÃO DO BLOQUEIO NEUROMUSCULAR Bloqueio neuromuscular residual é uma situação clínica relativamente comum e está associado a complicações pulmonares, incluindo aspiração, pneumonia, hipóxia e insatisfação dos pacientes. Apesar da recuperação da função neuromuscular adequada ter sido definida como um TOF (Train-of-four) de pelo menos 0,9. Os estimuladores de nervo periférico ainda não são rotineiramente utilizados na prática clínica. Sem seu uso, a dose dos BNM e dos agentes anticolinesterásicos é frequentemente inapropriada e a adequação da função neuromuscular não pode ser garantida após a extubação traqueal. O uso de estimulador de nervo periférico permite ao anestesiologista administrar bloqueado neuromuscular e agentes reversores de maneira mais racional. O uso rotineiro de monitor quantitativo de profundidade do bloqueio neuromuscular é a melhor garantia da recuperação adequada da força muscular no pós-operatório (tabela 2).13 21 Tabela 2. Rotina para o uso de monitores do bloqueio neuromuscular.13 1. A monitorização da profundidade do bloqueio neuromuscular deve ser feita sempre que um BNM é administrado ao paciente. 2. Nem todos os monitores são iguais e qualquer monitor que for utilizado deve ser capaz de prover o estímulo TOF em uma corrente e duração de pulso adequadas, tendo uma saída maior que 60 mA na presença de 2000 Ω de impedância entre os eletrodos e disparar a corrente desejada. 3. Os BNM devem ser titulados para manter pelo menos uma resposta à estimulação do TOF. Os BNM não devem ser utilizados para compensar um plano anestésico inadequado. 4. A administração de anticolinesterásicos deve ser baseada na resposta ao estímulo neuromuscular. Pacientes sem resposta ao estímulo não devem recebe anticolinesterásicos e pacientes com TOF maior que 0,9 não devem receber a dose máxima de anticolinesterásicos. 5. Há crescente evidência de que com o uso de monitores quantitativos do bloqueio neuromuscular, menos pacientes serão admitidos na sala de recuperação pósanestésica com curarização residual. Curr Opin Anesthesiol, 2014; 27:616–622. 6 TESTES ALÉRGICOS Uma história clínica detalhada, a realização de testes e a procura por IgE anticorpos específicos permitem um diagnóstico etiológico e a redução do risco em cirurgias futuras. A determinação de determinado IgE pode não ser compatível com o BNM que causou a alergia no paciente. Os testes cutâneos são adequados para o diagnóstico de alergia a determinado BNM, tendo alta sensibilidade. Contudo, ainda não está claro o valor do teste cutâneo quanto ao valor preditivo negativo. Desta forma, dado o potencial de gravidade da reação é recomendado evitar nova exposição a BNM, uma vez que reações cruzadas são comuns entre os BNM. Os testes cutâneos ainda não são, portanto, recomendados para a população geral que se submeterá a uma anestesia geral.15,16,17,18 22 7 GRUPOS DE RISCO 7.1 Anestesiologista com alergia a BNM Os anestesiologistas enfrentam uma série de riscos ocupacionais diariamente. Estes incluem exposição a hemocomponentes, lesões musculoesqueléticas, alergia ao látex, exposição à radiação e inalação de agentes anestésicos. Além dos riscos citados anteriormente, surge um novo tipo de exposição ocupacional, que demonstraremos através de um relato de caso de um anestesiologista que desenvolveu reação alérgica a diversos BNM. Trata-se de um residente de 30 anos em seu último ano de treinamento. O mesmo apresentou reação alérgica ao administrar suxametônio e tiopental. Ele tinha diagnóstico prévio de atopia e asma (necessitando de salbutamol inalatório uma a duas vezes ao ano e uso de antihistamínico). No momento de aplicar suxametônio em um paciente a ser anestesiado, algumas gotas tiveram contato com suas mãos. Em cinco minutos ele desenvolveu sensação de queimação e prurido facial, evoluindo para um rash eritematoso, edema nos lábios e na língua e notou desconforto em sua garganta. Acesso venoso foi puncionado e seus sinais vitais permaneceram normais. Prometazina intramuscular foi administrada e em 15 minutos os sintomas cederam. A triptase sérica dosada uma hora após o evento estava normal (5 μg/L). Teste cutâneo foi realizado três dias após o evento com injeção intradérmica de suxametônio e tiopental. O residente apresentou reação sistêmica grave caracterizada por hipotensão (77/59 mmHg), taquicardia (140 bpm), queda da SpO2 para 93% e rash disseminado. O teste foi positivo para suxametônio e negativo para tiopental. O residente não usava luvas para o manuseio de medicamentos rotineiramente. Este relato de caso sugere que uma exposição contínua a fármacos como os BNM possa levar a uma sensibilização ao longo do tempo. 19 7.2 Cabeleireiros versus padeiros A ocorrência de reações alérgicas aos BNM é verificada muitas vezes sem o uso prévio de determinado bloqueador neuromuscular, o que sugere que a exposição a antígenos do ambiente possa estar relacionada com maior risco de anafilaxia com o uso de BNM. Um estudo investigou a prevalência de IgE específica para o íon amônia quaternária, 23 responsável pelas reações alérgicas relacionadas aos BNM. Neste estudo dois grupos de profissionais que são expostos a este íon foram investigados: cabeleireiros e padeiros. 11 Neste estudo um grupo de aprendizes foram seguidos por dois anos, divididos em cabeleireiros (n =128), padeiros (108) e um grupo de controle não exposto (n = 379). Foi observada uma frequência 4,6 maior positividade de IgE conta o íon de amônia quaternária no grupo de cabeleireiros comparados tanto a padeiros quanto ao grupo controle (p < 0,001). A IgE específica para o íon amônia quaternária reconheceu dois compostos usados amplamente por cabeleireiros: cloreto de benzalcônio e poliquatérnio-10. Desta forma podemos inferir que fatores ocupacionais dos cabeleireiros aumentam a sensibilização aos bloqueadores neuromusculares. Apesar da hipótese da folcodina estar relacionada e essa sensibilização, o estudo sugere que repedidas exposições ao íon amônio quaternário em substâncias usadas por cabeleireiros é um fator de risco para sensibilização aos bloqueadores neuromusculares.11 7.3 Reação Cruzada com antibióticos Um estudo japonês avaliou 392 testes cutâneos realizados em indivíduos com história positiva de hipersensibilidade a antibióticos. O teste cutâneo foi positivo em 65 dos pacientes (16,58%) contra 23 testes positivos do grupo controle de 288 (7,98%). As duas incidências apresentaram diferenças estatisticamente significantes (p = 0,0011). O risco relativo de apresentar um teste cutâneo positivo para BNM foi de 1,77 (1,15 – 2,76) maior no grupo com teste cutâneo positivo para antibiótico. O estudo sugere que pacientes com história prévia de hipersensibilidade a antibióticos podem representar um grupo de maior risco para o desenvolvimento de anafilaxia no intraoperatório quando comparados à população geral. 21,23 8 REVERSÃO DO BLOQUEIO NEUROMUSCULAR A escolha do antagonismo do bloqueio neuromuscular residual varia baseado na prática de cada país, tipo da anestesia e preferência do anestesiologista. Essa variação na conduta deve-se em parte aos efeitos colaterais, como náuseas e arritmias resultantes da administração de anticolinesterásicos, assim como na incerteza de detectar se há de fato 24 bloqueio residual. A avaliação clínica não é capaz de diferenciar um TOF de 0,6 ou 0,9, o que seria fundamental para decisão do momento correto de reverter ou não o bloqueio neuromuscular. A administração, por exemplo, de um anticolinesterásico com TOF acima de 0,9 pode exacerbar a fraqueza muscular.21 A profundidade do bloqueio neuromuscular depende do balanço de BNM e acetilcolina na junção neuromuscular. A recuperação da força muscular depende do aumento da concentração de acetilcolina em relação ao BNM. Há duas formas para que esse aumento da concentração de acetilcolina nos receptores nicotínicos ocorra: eliminação do BNM do plasma ou inibição da acetilcolinesterase com a administração de um anticolinesterásico, como a neostigmina.21 8.1 Anticolinesterásicos A neostigmina é o anticolinesterásico mais utilizado em nosso meio. Contudo o potencial de reverter rapidamente 100% do bloqueio neuromuscular é limitado, uma vez que o pico de seu efeito ocorre em cerca de 10 minutos. A administração de um anticolinesterásico não elimina o BNM da placa motora e sua administração não está livre de efeitos adversos. A neostigmina bloqueia diretamente os canais de acetilcolina e o excesso de acetilcolina pode causar bloqueio despolarizante. A potenciação do bloqueio neuromuscular foi demonstrada quando uma dose de 40 μg/kg foi administrada após a recuperação de um bloqueio para um TOF de 0,9, após a administração de vecurônio 0,1 mg/kg a cada duas, três ou quatro horas antes. Quando o TOF se encontra em 0,4, o aumento da dose de neostigmina de 10 μg/kg para 30 μg/kg diminui a recuperação de um TOF de 0,4 para 0,9. Contudo, quando a neostigmina é administrada quando o TOF se encontra em 0,6, a dose não parece interferir no tempo de recuperação. Quando 30 μg/kg de neostigmina é administrada com um TOF de 0.6 o tempo de recuperação é de 7 min para um TOF de 1,0 e de 6 min para um TOF de 0,9. Com essa mesma dose administrada quando se tem um TOF de 0,4, o tempo de recuperação para um TOF de 0,9 também é de 6 minutos, mas para atingir um TOF de 1,0 o tempo é de 11 minutos. Todos esses dados foram pesquisados em pacientes que estevam em uso de óxido nitroso na anestesia, agente que pode retardar a recuperação do bloqueio neuromuscular. 21,24 25 Um estudo prospectivo acompanhou 3.000 pacientes que se submeteram à anestesia geral onde foram administrados BNM adespolarizantes e neostigmina. Na unidade de recuperação pós-anestésica foram documentados o TOF e a razão entre saturação periférica de oxigênio (SpO2) e a FiO2 administrada. A administração de neostigmina não melhorou a razão SpO2/FiO2 (164 [95% IC, 162 a 164] vs. 164 [161 a 164]) e foi associada a um aumento na incidência de atelectasia (8.8% vs. 4.5%; odds ratio, 1.67 [1.07 a 2.59]). Verificou-se também que a aplicação de altas doses de neostigmina estava associada a maior permanência na unidade de recuperação pós-anestésica (176 min [165 a 188] vs. 157 min [153 a160]).21,24 8.2 Sugammadex O Sugammadex restabelece a função neuromuscular normal sem interferir com acetilcolina, receptor nicotínico ou acetilcolinesterase, mas sim ligando seletivamente ao rocurônio e em menor extensão ao vecurônio e pancurônio. A dose de 3,6 mg de sugammadex é necessário para ligar-se a1 mg de rocurônio. Se, por exemplo, uma dose de 2 mg/ kg de sugammadex é administrada com o TOF em T2, o retorno para um TOF de 0,9 ocorre em 2 a 4 minutos. Quando a contagem pós-tetânica de 2 está presente a dose requerida é de 4mg/kg.22,25,26 Um estudo relatou 13 casos de anafilaxia ao rocurônio onde o sugammadex foi utilizado com a intenção de reverter a reação imunológica dos 13 casos, 8 (62%) foram confirmados como reação de hipersensibilidade ao rocurônio, 3 casos (23%) a antibióticos e 2 casos (15%) foram reações não imunológicas. Após a análise dos dados concluiu-se que o sugammadex não modifica o curso clínico em casos suspeitos de reação de hipersensibilidade. Apesar de o sugammadex possui poucos efeitos cardiovasculares, há um relato de caso de bradicardia persistente após a administração deste fármaco.27 8.3 Calabadion Calabadion 1 é um novo agente com o propósito de reverter o bloqueio neuromuscular tanto de BNM adespolarizantes da família dos aminoesteróides quanto dos benzilisoquinolínicos. O Calabadion 1 em altas doses causa rápida e completa reversão dos efeitos do cisatracúrio 26 e rocurônio e o tempo de recuperação é dependente da dose. Não apresenta mudanças significativas na frequência cardíaca, pressão arterial e parâmetros da gasometria. Recurarização não foi observada com monitorização de nervo periférico até após 60 minutos da administração da droga. Um estudo demonstrou que o Calabadion 2 reverte o bloqueio neuromuscular de forma mais rápida e efetiva que o sugammadex, além de reverter também o efeito completo do vecurônio e do cisatracúrio.27,28 9 NOVOS AGENTES PARA O BLOQUEIO NEUROMUSCULAR O desenvolvimento de novos agentes para bloqueio neuromuscular, principalmente, os de rápido início de ação e de curta duração tem sido alvo de intensas pesquisas. Enquanto o rocurônio preenche parte dessa necessidade, tendo rápido início de ação, a necessidade de altas doses para este efeito tem sido associada a um aumento de curarização residual. Dois novos BNM adespolarizantes da família dos fumaratos (gantacúrio e CW 002) tem demonstrado rápido efeito de ação e pode ser revertido a qualquer momento pela administração de cisteína, o que reduziria significantemente o risco de curarização residual.29 10 O USO DE BNM NO BRASIL Um estudo brasileiro realizou uma pesquisa para avaliar como os anestesiologistas brasileiros estão usando os bloqueadores neuromusculares (BNM), com foco na forma de estabelecer o diagnóstico de curarização residual pós-operatória e a incidência de complicações atribuídas ao uso de BNM. Um questionário foi enviado a anestesiologistas convidando-os a participar da pesquisa. A coleta online de dados permaneceu aberta de marco de 2012 a junho de 2013. Durante o período de estudo foram coletadas 1.296 respostas. Rocurônio, atracúrio e cisatracúrio foram os principais bloqueadores neuromusculares usados em casos de cirurgia eletiva. Suxametônio e rocurônio foram os principais BNM utilizados em casos de cirurgia de emergência. Menos de 15% dos anestesiologistas referiram que usam frequentemente monitores da função neuromuscular. Apenas 18% dos envolvidos no estudo referiram que todos os locais de trabalho têm tal 27 monitor. A maioria dos entrevistados afirmou que usa somente o critério clínico para avaliar se o paciente está recuperado do bloqueio neuromuscular e que também sempre usa algum tipo de reversão de bloqueio neuromuscular. As principais complicações atribuídas aos BNM foram curarização residual e bloqueio prolongado. Houve relato por 18 anestesiologistas de óbito atribuído a BNM. O bloqueio residual ou prolongado se registra, possivelmente, como consequência do alto índice do uso de critérios clínicos para diagnosticar se o paciente está recuperado ou não do bloqueio motor e, como um corolário, o baixo uso de monitores da transmissão neuromuscular na prática diária.30 11 CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar da importância do uso de bloqueadores neuromusculares, seus efeitos adversos alertam para uma maior precaução em sua utilização. A monitorização por estimulação de nervo periférico demonstrou ser mais eficaz que parâmetros clínicos no diagnóstico precoce de curarização residual. O anestesiologista deve estar capacitado para conduzir os efeitos no intraoperatório como anafilaxia, aplicação inadvertida e as complicações próprias do suxametônio. Novos BNM e reversores estão em desenvolvimento, o que poderá futuramente aumentar a segurança dos pacientes em situações específicas como em casos de intubação em sequência rápida ou reação anafilática prévia a bloqueadores neuromusculares. REFERÊNCIAS 1. Farooq K, Hunter JM, Neuromuscular blocking agents and reversal agents. Anesthesia and intensive care medicine, 2011; 12(6): 266-270. 2. Martínez TM, Santos IG, Cerón RA, Prevalencia de contraindicaciones a succinilcolina en unidades de cuidados intensivos. Med Intensiva, 2015;39(2):90-96 . 3. Mertes PM, Alla F, Trechot P, Auroy Y, Jougla E, et al. Anaphylaxis during anesthesia in France: An 8-year national survey. J Allergy Clin Immunol 2011;128:366-73. 4. Sadleir PHM, Clarke RC, Bunning DL, Platt PR. Anaphylaxis to neuromuscular blocking drugs: incidence and cross-reactivity in Western Australia from 2002 to 2011. British Journal of Anaesthesia, 2013; 110 (6): 981–7. 5. Mertes PM, Volcheck GW. 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