TRABALHO PRECÁRIO, AJUDA, PROGRAMAS SOCIAIS: alternativas de sobrevivência de famílias em situação de pobreza residentes no município de maracanaú-CE Leiriane de Araujo Silva 1 Resumo: A pesquisa partiu do pressuposto de que expulsos das relações de produção e fora dos limites definidos pelo emprego formal, os indivíduos buscam formas de reprodução social enquanto forma de manutenção e sobrevivência material, expressando os rebatimentos dessas mudanças no cotidiano familiar e comunitário. Como resultados o trabalho identificou que os indivíduos vêm organizando sua sobrevivência através de diversas alternativas, que para um melhor entendimento foram agrupadas em três dimensões, quais sejam o trabalho precário, ajuda e programas sociais a mesma também apontou que a falta de uma renda fixa representa para a maioria a principal causa de sua pobreza. Palavras-chave: pobreza, alternativas de sobrevivência, políticas sociais. Abstract: The research left of the presupposition that expelled of the production relationships and out of the defined limits for the formal employment, the individuals look for forms of social reproduction while maintenance form and material survival, expressing the rebut of those changes in the daily family and community. As results the work identified that the individuals are organizing your survival through several alternatives, that for a better understanding they were contained in three dimensions, which are the precarious work, it helps and social programs the same also pointed that the lack of a fixed income represents for most to principal it causes of your poverty. Key words: poverty, survival alternatives, social politics. 1 Mestre. Universidade Estadual do Ceará. E-mail: [email protected]. I. INTRODUÇÃO Na busca de entender a sociedade em que vivemos e as relações dos homens nesta uma inquietação e algumas indagações sempre estiveram presente: como podemos ser tão iguais e ao mesmo tempo tão diferentes? Por que uns tem bem mais do que talvez fosse necessário e outros tão pouco? Como pode uma sociedade conviver com tantas disparidades entre ricos e pobres? Será a construção de outro mundo possível? E pensando numa frase do filme “Os Miseráveis”, em que um ator coloca que morrer é quase nada e que o pior é não viver, norteou-me no interesse em conhecer as mazelas de nossa sociedade e as pessoas que estão privadas do acesso a riqueza socialmente produzida, que contraditoriamente é usufruída individualmente. Diante dessas questões tornava-se necessário ir além das representações aparentes para uma compreensão real sobre a problemática da sociedade contemporânea, e em especial da brasileira, onde a pobreza nas últimas décadas veio ampliando-se tanto por fatores internos como externos, ligadas a forma como a globalização vem se desenvolvendo no mundo. Nessa perspectiva os problemas sociais adquiriram novas modalidades a partir das mudanças ocorridas na relação capital e trabalho, nos processos produtivos, na gestão do Estado, nas políticas sociais e na tão debatida exclusão social expressa nos processos de degradação da sociedade salarial, nas relações de gênero, etnia e diversidade cultural. O resultado é a crise que vem gerando precarização, queda dos salários, aumento do setor informal, subemprego, subcontratação, desemprego e formas atípicas de ocupação, acarretando conseqüentemente o aumento das desigualdades, fazendo emergir o fenômeno da exclusão social, intimamente relacionado ao desemprego e a uma forma de regulação do Estado sobre as problemáticas sociais. Num contexto, onde as pessoas são secundarizadas na repartição dos benefícios do desenvolvimento, em especial na sociedade brasileira, onde desigualdades, pobrezas e exclusões foram historicamente agravadas e acumuladas pelas ações distorcidas do Estado. Nesse processo de metamorfoses, a presente pesquisa partiu do pressuposto de que expulsos das relações de produção e fora dos limites definidos pelo emprego formal, os indivíduos buscam novas formas de reprodução social através de alternativas de sobrevivência, enquanto forma de manutenção e sobrevivência e ao falarem dessa situação produzem efeitos de sentidos e significados, expressando os rebatimentos dessas mudanças na vida cotidiana, haja vista, encontrarem-se fora da relação de assalariamento moderna, que estabeleceu determinados parâmetros de vinculação social. Segundo Martins (2002) o capitalismo ao debitar na conta do trabalhador e dos pobres a redução sem limites dos custos do trabalho aliado a um progresso sem ética, nem princípios acaba privatizando ganhos e socializando perdas, crises e problemas sociais. Diante dessa breve contextualização para situar os processos onde a pesquisa encontra-se inserida, o presente estudo buscou analisar as alternativas de sobrevivência acionadas pela população em situação de pobreza residentes no Município de Maracanaú. Sendo necessário esclarecer que embora a pesquisa aponte para uma análise das ausências, pretende-se demonstrar também as presenças, pois os seres humanos não estão acabados em suas misérias, e se estes possuem um leque de carências possuem também um leque de possibilidades. Para analise do objeto estudado, as categorias analíticas utilizadas no processo investigativo e na análise foram: pobreza, trabalho precário, política social, articuladas ao processo histórico, enquanto fio condutor que lhe confere sentido e significado na contemporaneidade, o capitalismo e as mutações que vem sofrendo, em escala mundial, tanto no nível de estrutura produtiva, quanto ao universo de seus ideários e valores, entendido como um sistema que mercantiliza as relações de trabalho e as relações entre as pessoas. Esse cenário é o pano de fundo para buscar entender como essas categorias ganham vida, se materializam na realidade. De início partirmos do entendimento de que a pobreza não possui somente uma dimensão material (econômica) e política, mais também simbólica (perda de laços de pertencimento, sentimento de abandono, segregação falta de perspectiva e autonomia). Na tentativa de romper com as percepções redutoras da pobreza a insuficiência de renda, buscou-se uma leitura complexa em consonância com a realidade da pobreza e de como esta é vivida pelos que estão inseridos nessa condição. Articulada a essa concepção de pobreza, a categoria trabalho partiu do entendimento do significado do trabalho, do desmantelamento das relações de produção fordista- keynesiano e da adoção da reestruturação produtiva e das políticas de cunho neoliberal, cujas conseqüências sociais são danosas atingindo as esferas material, psíquica e sóciopolítica da massa trabalhadora, que em contrapartida vem criando estratégias de sobrevivência, que embora garantam a manutenção da vida, não os conduzem a uma vida dotada de sentido, pois estão fora não somente do mercado, mais também dos espaços de decisão política da sociedade. Desta forma, as políticas sociais não devem ser compreendidas apenas como instrumento para suprir necessidades mínimas em caso de deficiências, mais um dever que preside a criação de um sistema de proteção social público, que combata a pobreza compreendendo-a como um produto do funcionamento do sistema, cujo quadro só poderá ser mudado, se a sociedade se voltar para a satisfação das necessidades humanas dos indivíduos. Não se trata de entender políticas sociais subordinadas aos ajustes econômicos e as regras de mercado, como historicamente foi concebida na sociedade brasileira, acarretando um alto grau de seletividade e focalização nos mais pobres dentro os pobres, abrindo espaço para ação humanitária e/ou solidária da sociedade, do que o seu provimento por parte do Estado. II. Metodologia Compreendendo a metodologia como um conjunto de métodos e técnicas a serem utilizados na pesquisa, associados a um referencial teórico, norteador dos procedimentos investigativos a pesquisa desenvolvida caracterizou-se como de cunho qualitativa, realizada através de pesquisa bibliográfica e de campo, tendo a preocupação de compreender o universo de sentido, significado, representações, valores e comportamentos, respondendo a um espaço ampliado das relações, dos processos e dos fenômenos, não podendo ser reduzido a operacionalização de variáveis (Minayo, 1994). Embora a pesquisa seja de cunho qualitativa, acrescentou-se a qualidade das informações, alguns dados quantitativos, compreendendo que ambos não se opõem, ao contrário, complementam-se. Desta forma, a pesquisa bibliográfica foi utilizada para o diálogo com autores que discutem a temática e a pesquisa de campo permitiu captar o significado, o discurso e a representação presente nas narrativas dos sujeitos entrevistados. Assim, definiu-se como amostragem 12 (doze) entrevistados, obedecendo aos seguintes critérios: a) 04 pessoas que utilizassem como única fonte de sobrevivência algum tipo de trabalho informal; 04 que tivessem como única fonte de sobrevivência a doação seja da família ou da comunidade; e 04 cuja sobrevivência viesse exclusivamente de algum programa de transferência de renda do governo federal. Essa classificação das formas de sobrevivência mais comuns (trabalho informal, ajuda e programas sociais) foi identificada a partir de pesquisas exploratórias realizadas com essas famílias Daí decidiu-se organizar nesses três eixos norteadores as principais alternativas de sobrevivência dessa população. Como forma de captar o objeto estudado, foram utilizados os seguintes instrumentos e técnicas de coleta de dados: levantamento bibliográfico: pesquisa em livros, revistas, artigos de jornais, matérias televisivas e textos que abordaram a temática; entrevista semiestruturada gravada: realizada com 12 pessoas o que permitiu a estruturação do trabalho de campo;observação simples: através do contato com os indivíduos, direcionando o olhar para a representação individual na vida social, percebendo no interior das falas, do comportamento, do modo de vida a realidade social e coletiva. Nesse sentido, as categorias utilizadas no processo investigativo e na análise foram: Trabalho, Pobreza e Proteção Social. A categoria trabalho assumiu historicamente diversos significados deste as sociedades antigas até a moderna, sendo o tema de discussão de alguns filósofos e cientistas sociais tais como: Friedman & Naville (1973); Casey (1995); Weber (2002); Marx (1983); Arendt (2000); Offe (1989); Gorz (1995), Antunes (1997), Frigotto (1995) e Mattoso (1995). Em relação à análise da pobreza, compreendido como um fenômeno global, muitos são os analistas que investigam e discutem as múltiplas faces desta. Para tanto, tem-se como referência central Robert Castel (1998), principalmente pela utilização da categoria desfiliação para designar o fenômeno da exclusão, entendido como dissociação de vínculos não somente relacionado ao trabalho, mais a outras dimensões da vida social. No entanto, outros teóricos também foram utilizados tais como: Pierre Rosanvallon (1998) -nova pobreza; Cristóvão Buarque (1994)- apartação social; Nascimento (1994) -nova exclusão social; Martins (2002) e Sposati (1999).Para uma análise da Proteção Social foram utilizados Draibe (1990), Pierre Rosanvallon (1997) e Pereira (2000), buscando subsídios para entender a organização dos sistemas de proteção na sociedade moderna. III. RESULTADOS E DISCUSSÕES Como principais resultados o trabalho identificou que os indivíduos vêm organizando sua sobrevivência através de diversas alternativas, que para um melhor entendimento foram agrupadas em três dimensões, quais sejam o trabalho precário (biscates, carregador, vendedor de produtos diversos, reciclagem, pequenos negócios), ajuda (família, vizinhos, igreja) e programas sociais (Beneficio de Prestação Continuada-BPC, Programas de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI, Programa Bolsa Família – PBF e outros benefícios socioassistenciais), a mesma também apontou que a falta de uma renda fixa representa para a maioria a principal causa de sua pobreza, aliada a falta de estudo, de qualificação e de oportunidades, evidenciando também que com relação à perspectiva de futuro, esses colocam que não possuem mais esperanças neles próprio, mas gostariam que os filhos tivessem um futuro diferente dos deles, entretanto, não se identifica alternativas concreta que possam levar esses filhos a romperem o ciclo intergeracional da pobreza, outro dado importante é a concepção de pobreza dos mesmos, sempre colocando como uma questão individualizada, quando não, atribuindo a vontade divina a não satisfação de suas necessidades humanas básicas. Com relação ao trabalho um dado bastante significativo é que em algumas situações de ocupações não são consideradas trabalho, pois no imaginário dos entrevistados eles confundem esse com emprego, então para os mesmos, aquele consiste em uma renda fixa que se tem todo mês para satisfazer as necessidades de alimentação, água, luz, gás, e outras despesas. IV- CONCLUSÃO A pesquisa realizada apontou para a vulnerabilidade das famílias pesquisadas, vivendo no limite da sobrevivência, utilizando-se de várias formas de trabalhos precários e alternativas para conseguirem o mínimo necessário para a sua reprodução social e manutenção da própria vida, recorrendo a dimensão do ter trabalho como forma de se sentir incluído individualmente e socialmente na sociedade, como condição para saírem da situação em que vivem, tornando um imperativo nas narrativas o trabalho como constitutivo da identidade social dessa população pobre. Referências ANTUNES, Ricardo. 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