Anais V CIPSI - Congresso Internacional de Psicologia Psicologia: de onde viemos, para onde vamos? Universidade Estadual de Maringá ISSN 1679-558X ___________________________________________________________________________ A UTILIZAÇÃO DO MÉTODO PROGRESSIVO-REGRESSIVO PARA SUPERAÇÃO DO EMBATE DE GERAÇÕES NA EDUCAÇÃO Rose Ani Jaroszuk Sylvia Mara Pires de Freitas “De onde viemos; Quem somos; Para onde vamos” foi o título dado pelo pintor francês Paul Gauguin a uma de suas obras que nos desenha a trajetória do ciclo de uma vida: em um extremo da tela está uma criança, ao centro uma pessoa adulta e no outro extremo uma pessoa velha, uma representação simples e efêmera como a nossa condição humana. Baseados na perspectiva sartriana, temos que essas três unidades temporais, passado, presente, futuro sintetizam-se na temporalidade, sendo esta estruturada pela consciência. Este trajeto, o princípio e o fim da existência, o vivenciamos individualmente em um mundo concreto juntamente com outras pessoas que também experimentam a vida, de uma forma singular, desde o lugar e o tempo em que se encontram no processo da própria biografia. Para Sartre (2002) o homem é um ser dialético, histórico e social, e sua vida, consequentemente da humanidade, “desenrola-se em espirais; volta a passar sempre pelos mesmos pontos, mas em níveis diferentes de integração e complexidade” (Sartre, 2002, p. 86). Nesse sentido, e através da dialética estabelecida entre o subjetivo e objetivo, vamos nos constituindo como produtos e produtores da realidade, considerando toda a complexidade de fatores circundantes e globalizantes da mesma. Assim, o objetivo deste trabalho é apresentar uma das atividades realizadas pelo Grupo de Apoio Psicológico (Gap) 1 junto com Coordenadores de curso, professores e acadêmicos da Universidade Paranaense (Unipar, Unidade Campus Umuarama/Paraná), intitulado Espaço da Palavra. O Gap é um projeto de estágio curricular do curso de Psicologia desta Universidade, executado por alguns acadêmicos do 5 o ano de Psicologia, orientados na Ênfase de Psicologia e Processos Clínicos. Vinculando suas atividades ao Programa de Aperfeiçoamento ao Magistério Superior (Promagister) e ao Programa Institucional de 1 Ana Carolina de Souza Alves, Fabíula Marques Almeida, Ludmila M. da Cruz, Mayara Turquino Reina, Raphael Barbosa, Rose Ani Jaroszuk, Thaís Serafim dos Santos. Acadêmicos do 5º ano do curso de Psicologia da Universidade Paranaense-UNIPAR/Umuarama-PR. Anais V CIPSI - Congresso Internacional de Psicologia Psicologia: de onde viemos, para onde vamos? Universidade Estadual de Maringá ISSN 1679-558X ___________________________________________________________________________ Atenção ao Estudante (Piae) desta IES, o Gap empreende suas ações na mediação de impasses nas relações institucionais que permeiam o contexto de ensino-aprendizagem. Fundamentando seus saberes no Existencialismo sartriano e seus fazeres no método progressivo-regressivo, busca auxiliar na criação de projetos coletivos. A demanda trabalhada neste ano letivo é o embate de gerações na Educação. Compreendendo-a como uma crise assim desvelada por apresentar por um lado gestores e professores e por outro lado acadêmicos, que tendem a fundar, respectivamente, seus projetos em Eras distintas, a saber: a Industrial e a do Conhecimento e, inclusive, por nesta última o ciberespaço ser consolidado como um espaço real, que implica uma revisão no sentido da Educação. Diante tal demanda, o Gap, a princípio, buscou elucidar as contradições tanto no nível do que constitui a realidade humana para Sartre: a materialidade, a temporalidade, o corpo e o Outro, quanto estas no nível antropológico em que as relações entre as gerações constituem o cenário da crise. Tal projeto foi concretizado, em um primeiro momento, por intervenções com grupos de gestores e educadores e com acadêmicos, utilizando-se de vídeos-palestras de profissionais com concepções críticas sobre as temáticas de Educação, Ciberespaço e Família; seguindo-se, a cada vídeo, discussões que visaram à desconstrução de paradigmas absolutistas. Uma vez conscientes dos valores que fundam suas verdades e das possibilidades de superação das mesmas, passou-se para a segunda etapa de intervenções mediadoras que objetivam alternativas de projetos em comuns que considerem as diferenças e ambiguidades nas relações de produção do conhecimento. Desta forma, por um lado se estabeleceu uma escuta aos coordenadores e professores dos diferentes cursos da instituição em um encontro mensal no Espaço da Palavra, buscando levantar e compreender temas relacionados ao ato e a experiência de ensinar, bem como a relação com seus alunos e, ao mesmo tempo pelo compartilhar, encontrar na voz do outro eco de suas próprias questões. Esse grupo sabia que, simultaneamente, estava sendo realizado um trabalho com os acadêmicos para escutar destes as experiências relacionadas à aprendizagem e a relação com os professores, implicando consequentemente o próprio curso. Ficou esclarecido que haveria uma devolutiva dos pontos relevantes das intervenções com os alunos Anais V CIPSI - Congresso Internacional de Psicologia Psicologia: de onde viemos, para onde vamos? Universidade Estadual de Maringá ISSN 1679-558X ___________________________________________________________________________ em um dos encontros no Espaço da Palavra, sem expor nenhum acadêmico, nem professor ou curso, mas com o objetivo de evidenciar a tese percebida na relação do ensino e da aprendizagem por parte dos acadêmicos. Por outro lado, quanto às intervenções com os alunos, também se estabeleceu um espaço de escuta em comum com, pelo menos, um aluno de cada série do curso. As questões disparadoras para as entrevistas foram: Quanto ao processo da aprendizagem, o quê você destacaria como qualitativamente bom? Quais seriam suas reclamações referentes a esse processo? Quais suas sugestões para melhoria das desconformidades e reclamações? Terminada as intervenções com os alunos e de posse de suas demandas, conformidades e sugestões, o Gap sintetizou os conteúdos corroborados e apresentou-os ao grupo do Espaço da Palavra, para buscar a superação dos impasses entre coordenadores, professores e alunos que dificultam o processo de produção do conhecimento. Enfim, o Gap buscou através do método progressivo-regressivo, conhecer as problemáticas que atravessam esta realidade pelo relato de seus agentes, dando ênfase no futuro como imperativo sobre o passado, visto que este último é iluminado e compreendido a partir de sua nadificação projetada no futuro enquanto expectativas outras que não as já construídas, e assim estabelecer uma mediação dos conflitos experienciados e percebidos no contexto educacional. Pelo viés sartriano, toda ação humana é intencional, assim como o é a consciência (Para-si) e ambas desvelam o nada. É através da consciência que o homem tem a capacidade de colocar-se a distancia das coisas para então observá-las, fazendo-as presentes por um ato reflexivo. Sendo o homem um ser livre em situação, podemos então entendê-lo como possibilidade, pois como o afirma Sartre (2001) ele é uma totalização inacabada, sempre em curso. Por outro lado, se a consciência se resume à sua situação, haja vista que ela não aparece com um fim pré-determinado, mas se forma ao fazer a situação, então o “ser-em-situação define a realidade-humana, dando conta de seu (...) ser que é sempre Para-além de seu ser-aí” (Sartre, 2001, p.673). Portanto, temos que situação é, com efeito, concretude, materialidade em constante totalização. Anais V CIPSI - Congresso Internacional de Psicologia Psicologia: de onde viemos, para onde vamos? Universidade Estadual de Maringá ISSN 1679-558X ___________________________________________________________________________ Assim, a situação, espaço real do mundo, também o campo de ação e percepção, modifica-se no movimento do homem em direção ao futuro e evidencia em sua história mudanças dialeticamente construídas. Referindo-se à crise na Educação, Arendt (1961) enfatiza que a crise abre uma oportunidade de investigação ao que ficou à mostra no centro do problema, pois na ausência de pressupostos perderam-se as respostas a questões, sendo preciso um retorno às mesmas, e buscar respostas novas, não com ideias feitas, pois do contrário perdemos “a experiência da realidade e a oportunidade de reflexão que a crise proporciona” (p.2). Relacionando o acima exposto, Bauman (2002) nos diz que a aprendizagem e a educação ao longo da história manifesta grandes mudanças: antes o ensino tinha como fim perdurar no tempo, baseado em um mundo sólido, durável, em que a memória era um ativo, ou seja, tinha um valor protagonista; em contraposição, no contexto atual da modernidade líquida, volátil e fluida, os conceitos mudaram e o que era qualidade a ser ensinada e preservada, hoje pode se configurar como obstáculo, o valor está na mutabilidade, na flexibilidade, a memória é armazenada em bytes, inclusive vínculos e compromissos têm utilidade temporária, o que atualmente caracteriza o mercado do conhecimento. Contudo na falta de modelos precedentes e caminhos conhecidos e confiáveis, instaura-se respostas baseadas na tentativa e erro como forma de preparo para situações ainda mais duvidosas e incertas que poderão vir. Portanto, o título de Gauguin nos é oportuno para ilustrar que “De onde viemos; Quem somos; Para onde vamos”, comparado às diferentes realidades contextuais que Bauman, expõe, é fácil deduzir que a relação professor e aluno pode ser um campo de conflitos intergeracionais quando não se tem uma consciência reflexiva sobre as questões implicadas neste contexto que em sua base é relacional. Porém ressalta Bauman (2002): O problema é que pouco ou quase nada pode ser feito tão-somente pela reforma, mesmo que engenhosa e completa, das estratégias educacionais. A responsabilidade sobre a difícil situação (...) não pode ser atribuída aos educadores, jogando sobre eles a culpa ou negligência. Foi o mundo do lado de fora da escola que cresceu muito diferente do tipo de mundo para o qual as escolas (...) costumavam preparar seus alunos. Neste novo mundo, Anais V CIPSI - Congresso Internacional de Psicologia Psicologia: de onde viemos, para onde vamos? Universidade Estadual de Maringá ISSN 1679-558X ___________________________________________________________________________ espera-se dos humanos que eles procurem soluções privadas para os problemas gerados pela sociedade, e não que eles procurem soluções sociais para os problemas de origem privada. (p. 52-53). Queremos neste ponto destacar a importância do método usado para a compreensão da realidade de intervenção do Gap, uma vez que para apreender as aparições do fenômeno, que não são isoladas no seu conjunto e contexto, foi preciso sintetizá-las através de uma compreensão progressivo-regressivo. Esse método concebe o homem como corpo e consciência, sem dissociá-los, em um mundo objetivo, material, histórico, cultural, social, que o faz enquanto ser concreto, mas também, e de modo simultâneo, subjetivo e sua subjetividade se constrói no processo dialético com a objetividade, interiorizando o exterior evidenciando que ela não é uma estrutura do psíquico, mas construída no processo objetivo e sua subjetividade se objetiva através de condutas, ações, pensamentos e emoções. Segundo Sartre (2002) o método progressivo-regressivo é o movimento dinâmico e constante entre o objetivo/subjetivo, o singular/universal no qual o homem, apropriando-se particularmente da dialética estabelecida, se faz e é feito pela história. Na perspectiva dialética a intersubjetividade humana, relacional, é vivenciada e oportunizada através do diálogo, do encontro, os homens contemplam e experimentam um mundo em comum, porém significando-o singularmente, ao mesmo tempo em que se afastam dele, com ele coincidem, põem-se e contrapõem-se. Para preservar o mundo contra a mortalidade dos seus criadores e habitantes, é necessário constantemente restabelecê-lo de novo. (...) A nossa esperança reside sempre na novidade que cada nova geração traz consigo. Mas, precisamente porque só nisso podemos basear a nossa esperança, destruímos tudo se tentarmos controlar o novo que nós, os velhos, pretendemos desse modo decidir como deverá ser. É justamente para preservar o que é novo e revolucionário em cada criança que a educação deve ser conservadora. Ela deve proteger a novidade e introduzi-la como uma coisa nova num mundo velho, mundo que, por mais revolucionárias que sejam as suas ações, do ponto de vista da geração seguinte, é sempre demasiado velho e está sempre demasiado próximo da destruição. (Arendt, 1961, p.12) Anais V CIPSI - Congresso Internacional de Psicologia Psicologia: de onde viemos, para onde vamos? Universidade Estadual de Maringá ISSN 1679-558X ___________________________________________________________________________ Podemos dizer que através do diálogo, como característica humana existencial, se possibilita a expressão, elaboração e colaboração, pois por meio dele se reconhece o outro, e si mesmo no outro. Assim através do engajamento com a existência humana, vamos nos humanizando e ao mesmo tempo humanizando o mundo. Enfim, através deste trabalho podemos mostrar a validade do método progressivoregressivo para além do contexto psicoterápico e de um fazer clínico que irrompe qualquer preconceito que o limite a este contexto. Referências Arendt, H. (1961). A crise na Educação. Recuperado em 10 de março, 2012, de http://redesocial.unifreire.org/pedagogia-noturno/arquivos/hanna-arendt-a-crise-na-educacao. pdf. Bauman, Z. (2002). Desafios educacionais na modernidade líquida. Revista Tempo Brasileiro, Rio de Janeiro, n. 148, 41-58. Sartre, J. P. (2001). O Ser o Nada: ensaio de ontologia fenomenológica. (Paulo Perdigão, Trad.). Petrópolis, RJ: Vozes. (Trabalho original Publicado em 1943). Sartre, J. P. (2002). Critica da razão dialética: precedido por Questões de Método. (Guilherme J. F. Teixeira, Trad.). Rio de Janeiro: DP&A. (Trabalho original Publicado em 1960). EIXO TEMÁTICO: PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO