Giselli Renata Gonçalves, Luciano Diniz, Olavo Carvalho e Wollney

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MITOLOGIA E PATERNIDADE
Contribuições das narrativas gregas para a ilustração de
padrões de paternidade contemporâneos
Giselli Renata Gonçalves
Luciano Diniz de Oliveira
Olavo Virgílio de Carvalho
Wolney Martini1
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Giselli Renata Gonçalves
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Olavo Virgílio de Carvalho
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e-mail: [email protected]
Currículo:
Giselli Renata Gonçalves – CRP 08/14437.
Graduou-se em História e em Psicologia pela Universidade Estadual de Londrina. É
mestranda vinculada Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, junto ao Núcleo de Estudos
Junguianos.
Olavo Virgílio de Carvalho
Graduado em Psicologia pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB). É
mestrando vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, junto ao Núcleo de Estudos
Junguianos.
Luciano Diniz de Oliveira – CRP 06/86127.
Possui graduação em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
PUC/SP. É mestrando vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia
Clínica na mesma universidade, junto ao Núcleo de Estudos Junguianos. Especialista
em Cinesiologia Psicológica pelo Instituto Sedes Sapientiae.
Wolney Martini – CRP 06/92151.
Possui graduação em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo –
PUC/SP. É mestrando vinculado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia
Clínica na mesma universidade, junto ao Núcleo de Estudos Junguianos.
1
Os autores são mestrandos no Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clínica (Núcleo de
Estudos Junguianos) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, Brasil.
Resumo: Este estudo visa ilustrar, de forma sucinta, como o conhecimento das
narrativas míticas pode colaborar para o entendimento de padrões de comportamento
contemporâneos. Sugerimos que, a partir da utilização da mitologia grega como pano de
fundo, seja possível amplificar as imagens dos deuses gregos, relacionando-as a padrões
comportamentais associados à masculinidade, em geral, e à paternidade, em específico.
A partir dessas noções, podemos tomar os deuses como personificações de
determinados aspectos do arquétipo paterno ou de potenciais psíquicos que podem estar
presentes tanto em homens como e mulheres.
Desde os primórdios de suas elaborações teóricas, Jung reconhece e explicita a
importância do conhecimento dos grandes símbolos coletivos, como os mitos, para a
compreensão da natureza dos conteúdos psíquicos inconscientes. Isto porque, conforme
nos lembra Boechat (s. d.), enquanto o ego se caracteriza pelo pensamento apolíneo de
adaptação à realidade externa, que funciona pelo mecanismo de associação de idéias
racionais, o inconsciente opera pelo mecanismo associativo de imagens mitológicas. Ou
seja, a natureza fundamental dos conteúdos mais arcaicos e primevos da psique é mítica.
Objetivamos, com o presente trabalho, evidenciar como o conhecimento das narrativas
míticas pode contribuir para a compreensão da psique contemporânea.
O mito pode ser entendido como uma manifestação do confronto da consciência
coletiva com o inconsciente coletivo. Enquanto função primordial, ele atua como
organizador e norteador da vida humana, na medida em que aponta para o que é
realmente significativo para a alma, inserindo o indivíduo em um contexto de sentido.
Na clinica, a utilização do material mítico tem a mesma função do mito em si, ou seja,
nortear e o terapeuta e o paciente em um contexto maior, facilitando a compreensão
daquilo que está sendo vivenciado.
Nossa proposta, com este breve estudo, é ilustrar como as imagens dos deuses
gregos podem ser amplificadas e associadas a padrões comportamentais relativos à
masculinidade, em geral, e à paternidade, em específico. A utilização da mitologia grega
como pano de fundo para o estudo de diversas questões já foi explorada por inúmeros
autores junguianos, como Bolen (2002; 2003) e Cavalcanti (1996), em cujo trabalho nos
baseamos para discernir alguns padrões aqui apresentados.
Ao discorrer sobre o papel da cultura no desenvolvimento dos modelos de
paternidade, Faria (2003) propõe que esta deva ser compreendida numa dimensão
ampla, que abrange o conjunto de idéias e valores que sinalizam o que é ser pai num
determinado contexto sócio-histórico. O modelo cultural determina o que será esperado
de alguém que vivencie o papel paterno, o que influenciará a construção de sua persona.
Os mitos nos informam sobre como, culturalmente, foi construída a imagem do pai e da
paternidade que observamos historicamente.
Nessa perspectiva, as histórias dos deuses olímpicos podem ser concebidas como
ilustrações de uma espécie de “história de família”, nas palavras de Bolen (2002), que
lançam luz sobre nossa genealogia patriarcal. Essas histórias, que representam atitudes e
valores transmitidos desde os gregos exercem, sobre nossas vidas pessoais, uma
influência de grandes proporções.
Faria (2003) relembra, ainda, que a dimensão arquetípica está presente em todos
os relacionamentos e, portanto, também na dimensão pai-filho, a qual desperta formas
míticas de relação fundadas na experiência ancestral. Tais formas, quando não
percebidas e discriminadas do relacionamento pessoal, podem invadir o vínculo,
produzindo efeitos deletérios. Entretanto, seu esclarecimento evitaria a repetição mítica
e, além disso, apontaria para uma nova direção para o relacionamento.
A partir dessas noções, podemos tomar os deuses gregos como imagens que se
relacionam a determinados aspectos do arquétipo paterno ou que personificam
potenciais psíquicos e padrões de personalidade que podem estar presentes tanto em
homens como em mulheres2. É necessário esclarecer que as amplificações que aqui
fazemos devem ser concebidas como metáforas para certos dinamismos presentes na
paternidade e não como tipologias estáticas que visam catalogar os indivíduos.
Desta forma, podemos utilizar a imagem dos irmãos Zeus, Posêidon e Hades
como personificações da figura do Pai. Situado no topo do Olimpo e legislando sobre a
vida dos outros deuses e dos mortais, a figura de Zeus relaciona-se à autoridade que se
faz presente mesmo à distância (BOLEN, 2002). A objetividade de Zeus impede,
entretanto, o contato com as próprias emoções, o que o transforma num pai justo, porém
inconsciente das necessidades afetivas dos filhos. Posêidon, deus do mar, da intuição e
do instinto, traria em si a imagem de um pai diferenciado. Embora sua emotividade se
manifeste, muitas vezes, com violência, o deus do mar é o pai desvelado em defesa da
prole. Quando um de seus filhos, Ciclope, foi cego por Ulisses, Posêidon tomou para si
a ofensa, buscando retaliar o Odisseu a qualquer custo. Hades, deus do mundo
subterrâneo, das almas e do inconsciente, pode significar tanto o pai recluso e
identificado com aspectos sombrios da paternidade, como pode também ser associado à
figura de outros deuses ctônicos, relacionados aos aspectos nutridores e cuidadores da
paternidade, o que nos permitiria considerá-lo um possível “pai-terra”, mais próximo
emocionalmente dos filhos, nas palavras de Colman (1990).
Amplificações similares podem ser feitas a partir da imagem dos deuses-filhos,
gerados por Zeus, que representam padrões de personalidade bastante distintos.
Relacionado aos domínios do intelecto, da vontade e da mente, Apolo é, nas
palavras de Bolen (2002), a personificação da força masculina que rege à distância. Ao
reunir inúmeros atributos “solares”, Apolo é o fruto do patriarcado, o “representante do
Pai”. É, por isso, o filho preferido de Zeus, vencedor das forças caóticas ctônicas e dos
impulsos regressivos. Com relação à paternidade, o homem identificado com os traços
psíquicos personificados na figura de Apolo estaria predisposto a ser criteriosamente
justo com os filhos, mas teria dificuldade de contato emocional, devido à intrínseca
objetividade apolínea. Tal como Zeus, Apolo é o pai do comedimento, que exerce sua
autoridade legítima e imparcial.
2
Esclarecemos que a utilização, no corpo do texto, dos termos no gênero masculino, se deve ao fato de
ser este um trabalho relacionado ao homem, em geral, e à paternidade, em específico.
Ao contrário de Apolo, seu irmão Dioniso é um deus mais próximo das emoções
corporais, da natureza e do feminino. Deus de múltiplas formas, místico, nômade,
amante, relacionado ao vinho (BOLEN, 2002), portador de uma natureza contraditória e
irracional, Dioniso personifica, para Cavalcanti (1996), a energia criativa que irrompe
do descanso inconsciente e chega à consciência, portadora do novo e do desconhecido.
Ligado à figura do puer, o homem identificado com Dioniso tenderia a permanecer
jovial e próximo à sua criança interior. Assim, como pai, representaria o oposto do pai
apolíneo, podendo ser associado à imagem do pai-terra doméstico, instintivamente
próximo dos filhos e das próprias emoções, retomando Colman (1990).
Apolo e Dioniso representam um par de opostos complementares e são, segundo
Cavalcanti (1996), grandes aliados psíquicos. Para a autora, Zeus representaria a
manifestação da vontade do princípio criativo do Self e estes seus dois filhos, como seus
desdobramentos, buscariam a realização da totalidade do pai. Assim, em benefício da
totalidade psíquica, o “pai apolíneo” necessitaria desenvolver, em si, os atributos
relacionados a Dioniso, ao passo que o “pai dionisíaco” necessitaria, igualmente,
cultivar as características associadas ao irmão Apolo, para atingir uma possível
inteireza.
A partir dessas metáforas, buscamos exemplificar como as narrativas míticas nos
fornecem orientações atuais sobre a necessidade de desenvolvimento dos traços
psíquicos complementares, que nossa personalidade normalmente relega à sombra, o
que aqui ilustramos dentro do domínio específico da paternidade.
Bibliografia
BOECHAT, Walter. O mito na teoria e na prática da psicologia analítica. (sem data
conhecida). Disponível em:
<www.fw2.com.br/clientes/.../mitologia/Mito_Teoria_Pratica.pdf>. Acesso em: 28 abr.
2010.
BOLEN, Jean Shinoda. As deusas e a mulher: uma nova psicologia das mulheres. São
Paulo: Paulus, 2003.
BOLEN, Jean Shinoda. Os deuses e o homem: uma nova psicologia da vida e dos
amores masculinos. São Paulo: Paulus, 2002.
CAVALCANTI, Raïssa. O mundo do pai: mitos, símbolos e arquétipos. São Paulo:
Cultrix, 1996.
COLMAN, Arthur; COLMAN, Libby. O pai: mitologia e papéis em mutação. São
Paulo: Cultrix, 1990.
FARIA, Durval Luiz de. O pai possível: conflitos da paternidade contemporânea. São
Paulo: EDUC / FAPESP, 2003.
Observação: Excluída a bibliografia, o texto conta com 1132 caracteres.
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