PROTOCOLO DE FASCEÍTE NECROTIZANTE – HUOP Gustavo Elias Leichtweis, MD Fernando Spencer Netto, MD PhD Fasceíte necrotizante (FN) é uma infecção bacteriana destrutiva e rapidamente progressiva do tecido subcutâneo e fáscia superficial, associada a altos índices de morbimortalidade. Em seu estágio inicial, a FN pode apresentar-se como uma infecção mais superficial de partes moles, como celulite ou erisipela, e com outras semelhanças quanto à etiologia e aos fatores predisponentes. Devido à alta frequência, à relativa facilidade no diagnóstico e a boa resposta ao tratamento dessas infecções mais superficiais, pode-se incorrer em falhas terapêuticas nos casos mais graves, que evoluem com comprometimento da fáscia superficial e do tecido subcutâneo, com elevado potencial para complicações graves. O Streptococcus hemolítico do grupo A e o Staphylococcus aureus, isoladamente ou em sinergismo, são com frequência os agentes iniciadores da FN. No entanto, outros patógenos aeróbios e anaeróbios podem estar presentes, incluindo Bacteroides, Clostridium, Peptostreptococcus, Enterobacteriaceae, coliformes, Proteus, Pseudomonas e Klebsiella. A FN é classificada em tipo I e tipo II. A do tipo I é caracterizada pelo isolamento de pelo menos uma espécie de anaeróbio obrigatório, como o Bacteroides e Peptostreptococcus, em combinação com um ou mais organismos anaeróbios facultativos, como o Enterobacter e os estreptococos não pertencentes ao grupo A. Esta é mais comum após cirurgias, em pacientes com diabetes ou doença vascular periférica. O tipo II, ou gangrena estreptocócica, é caracterizado pelo isolamento do Streptococcus do grupo A isolado ou associado ao Staphylococcus aureus. Ocorre tipicamente após ferimentos penetrantes, procedimentos cirúrgicos, queimaduras e traumas. No entanto, a história de trauma prévio pode não estar presente em todos os casos. A FN inicia como área eritematosa, dolorosa e localizada, que aumenta em horas ou dias, associada a edema tecidual importante. Em seguida, ocorre cianose local e formação de bolhas de conteúdo amarelado ou avermelhado escuro. A área envolvida torna-se rapidamente demarcada, circundada por borda eritematosa e recoberta por tecido necrótico. Nesse momento, desenvolve-se anestesia da pele que recobre a lesão devido à destruição do tecido subcutâneo subjacente e trombose dos vasos nutrientes, causando necrose das fibras nervosas. A pele é inicialmente poupada, mas, com a extensão do processo necrótico, torna-se comprometida. Comumente, o edema pode ser observado antes de outros sinais cutâneos aparecerem. A dor muito intensa e desproporcional, mesmo após o início do tratamento é um indício importante de FN. Devido a estas características, nem sempre o exame clínico isoladamente permite o diagnóstico. A necrose da fáscia é tipicamente mais extensa do que sugere o aspecto clínico. Com o acometimento de planos mais profundos, pode ocorrer formação de crostas necróticas extensas. Sem tratamento, é possível haver envolvimento secundário da camada muscular, resultando em miosite ou mionecrose. A tomografia computadorizada (TC) proporciona visualização da presença e extensão do gás anormal, além de evidenciar necrose com espessamento assimétrico da fáscia. Infecções de partes moles, incluindo celulites, miosites e fasceíte, são mais bem avaliadas pela TC e RM devido à resolução anatômica e ao contraste dos tecidos. O diagnóstico definitivo é feito pela exploração cirúrgica na presença de necrose da fáscia. Aproximadamente a metade dos pacientes com FN apresenta a síndrome do choque tóxico estreptocócico, que é uma condição aguda, fulminante com choque, trombocitopenia, coagulação intravascular disseminada e/ou falência de múltiplos órgãos. Os achados laboratoriais incluem a leucocitose ou leucopenia, com desvio à esquerda. Há elevação de marcadores de infecção e inflamação (proteína C reativa, prócalcitonina) e outras alterações relacionadas à sepse. A mortalidade é de 30 a 60% dos pacientes em prazo que varia de 72 a 96 horas, relacionadas a insuficiência de múltiplos órgãos e sistemas (IMOS). O tratamento envolve o diagnóstico precoce, debridamento cirúrgico radical de todo o tecido necrótico, antibioticoterapia parenteral de amplo espectro e medidas de suporte agressivas. O objetivo da intervenção cirúrgica é debridamento agressivo de todos os tecidos necróticos, até encontrar tecido viável e sangramento saudável. Devem ser colhidas amostras de tecido para a coloração de Gram e cultura. A ferida é então coberta e o paciente deve ser levado de volta ao centro cirúrgico após 24 horas para reavaliação e posterior debridamento, se necessário. Antibióticos de amplo espectro deve ser iniciado imediatamente para incluir a cobertura de bactérias gram-positivas, gram-negativas e anaeróbios. O regime inicial deve cobrir flora microbiana, sendo sugerido o esquema de: carbapenêmico ou betalactâmico + clindamicina. Caso o paciente esteja grave, deve ser adicionado vancomicina. Este esquema deve ser redirecionado com cultutras. O uso de terapia hiperbárica é controverso. FASCEÍTE NECROTISANTE ANAMNESE EXAME FÍSICO ESTÁVEL TC / RNM INSTÁVEL SUPORTE HEMODINÂMICO / UTI ABORDAGEM MULDISCIPLINAR CULTURAS GRAM ABORDAGEM CIRURGICA ANTIBIOTICOTERAPIA CLINDAMICINA VANCOMICINA MEROPENEM