Prata Colonial - AMÉRICA II - Historia.Da.America

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América II - Maria Cristina
O PRATA COLONIAL
Ao contrário de outras áreas do Império Espanhol na América - zonas ditas de povoamento
nuclear - , os territórios da Bacia Platina não apresentavam grande densidade populacional ou
populações submetidas a regimes de tributação. Os grupos caçadores-coletores mostraram-se,
muitas vezes, refratários à presença branca, tendo-se aí constituído uma fronteira que separava
os territórios do colonizador daqueles ocupados pelos povos "selvagens".[1] Por sua vez, os
atrativos oferecidos aos colonizadores ibéricos eram menores que os encontrados nas regiões
mineradoras, o que fez com que a ocupação e exploração econômica destas terras ocorresse de
forma mais lenta.
Durante grande parte do século XVI, o espaço platino permaneceu pouco explorado.
Ocasionalmente, e expedições de reconhecimento ou exploradoras chegaram às costas da
América Meridional[2] e, a partir daí, fundaram fortes ou núcleos de povoamento. Nesta prática
coube aos os espanhóis a fixação inaugural dos colonizadores com a primeira fundação de
Buenos Aires em 1536. As adversidades climáticas e a ação bélica das parcialidades indígenas
que circundavam as imediações determinou que a cidade fosse abandonada por seus
fundadores, que se deslocaram seguindo o Rio Paraguai onde criaram (1537) a cidade de
Nuestra Senõra de la Asunción. Com os Guarani, grupo que praticava a agricultura e era
relativamente sedentário, as relações serão menos conflituosas, estabelecendo-se uma
situação que já foi chamada de "aliança hispano-guarani": enquanto os espanhóis valiam-se
dos índios como batedores e aliados, estes incluíram aos brancos em suas tradicionais relações
de parentesco. A transformação deste panorama ocorrerá a partir da implantação formal do
sistema de encomiendas na região em 1556, ao que os Guarani responderão através de
movimentos de rebelião. A partir daí, a pacificação do território será confiada aos religiosos e
seu sistema de "reduciones", primeiro com os franciscanos e, depois com os jesuítas.
A radicação definitiva, com o aparecimento de outros núcleos de povoamento branco, deuse apenas no final do XVI com o surgimento de Santa Fé (1573) e novamente Buenos Aires
(1580). Por quase todo o século seguinte, porém, a colonização espanhola fixou-se em áreas
próximas aos rios e foi essencialmente urbana. As propriedades rurais distribuídas por Juan de
Garay, fundador da cidade, ficaram abandonadas diante da hostilidade manifesta pelos nativos.
Aproveitando-se das grandes distâncias entre os núcleos de povoamento e estâncias, eles
assaltavam a estas últimas, assim como as estradas, em busca de cavalos[3] ou outras
mercadorias introduzidas pelos brancos. Assim como os cavalos, também o gado - outrora por
eles desconhecido - passou a ser objeto de interesse, em parte por causa de sua carne e do
couro (vestimentas, instrumentos como a boleadeira, etc.), em parte por servir de instrumento de
troca para obterem-se outros objetos europeus (facas e aguardente, por exemplo).
Todavia, os conflitos que tivessem por base a disputa pelos rebanhos não foi comum
durante o XVII, pois o gado selvagem (descendente das primeiras cabeças introduzidas pelos
espanhóis) crescera em enormes rebanhos nos campos e era considerado patrimônio
comum, explorado por espanhóis e portugueses, jesuítas e índios. Esta exploração dava-se
através do sistema de vacarias: incursões pelo campo para caça dos animais. Foi apenas ao
longo do século XVIII que, com a diminuição dos rebanhos ocorrido paralelamente à sua
valorização no mercado internacional, que os colonizadores passaram a criar e reproduzir o gado
em estâncias . Necessitou-se, então, ocupar definitivamente a terra, intensificando-se os conflitos
entre brancos e índios.
Para Reichel e Gutfreind os europeus obrigaram-se aí, a revisar a sua política de fronteira
com os índios: cada investida destes invadindo estâncias para apropriar-se dos animais ou
aprisionar o pouco que restava das manadas selvagens, passou a ser respondida com métodos
contra ofensivos. "Com isso, as planícies da Banda Oriental (Uruguai), do atual RS e de parte do
litoral argentino foram parcialmente esvaziados da presença indígena". (Reichel &
Gutfreind, 1995: 13) Foram as terras localizadas ao sul de Buenos Aires as mais atingidas pelos
atritos desta fronteira que opunha espanhóis e nativos, sendo que as nações indígenas que aí
viviam (pampa, araucanos, neuquém) resistiram por mais tempo e mais intensamente à
dominação européia. A necessidade de proteger a "fronteira" fez com que os europeus, até o
final do período colonial, organizassem milícias e procurassem por em prática políticas de
povoamento que garantissem a ocupação efetiva da área.
Ao final do período colonial, a definição de uma linha de fronteira pelos europeus buscou
primordialmente defender o território que já vinha sendo explorado, embora de forma ainda
compartida com os indígenas. Desta forma, as medidas adotadas não tinham por finalidade a
incorporação de novas terras, mas a ocupação e a exploração das já conquistadas. À
independência do Vice-Reino do Prata (1810) e às guerras internas e externas do começo do
século XIX, sucedeu-se um período de diminuição dos rebanhos, e de início de uma nova etapa
de expansão das fronteiras de colonização européia. Agora em busca de novos espaços de
ocupação, ela dirigiu-se especialmente para o sul, ocupando terras dos pampas, dos neuquém
e de outros grupos. Até a década de 1830 ela teve um caráter gradual e sistemático, partir daí
acelerou-se com a realização de duas campanhas militares (Campanhas do Deserto: 1833 e
1878)
Contudo, além desta entre o mundo indígena e o mundo ocidental, a região platina
recortava uma outra: fronteira: àquela estabelecida entre os impérios coloniais luso e espanhol.
O Tratado de Tordesilhas (1494) - delimitando o espaço português até a altura de Laguna
instituía a área do Prata como espaço espanhol - não impediu que os portugueses
manifestassem permanente interesse em estender sua atenção em direção a ela, via de acesso
ao centro minerador de Potosí. Tal atitude encontrava base legal nas dúvidas acerca da posição
exata do meridiano de Tordesilhas, que era vaga e imprecisa. O mesmo ano da segunda
fundação de Buenos Aires (1580) assistiu o início da “União Ibérica” provocada pela ascenção
ao trono português do monarca espanhol Felipe II e o “embaralhamento” da fronteira em questão.
Durante o século XVII intensificou-se a ocupação do espaço platino. Desde 1609 os
jesuítas iniciarão o processo de fundação de “reduciones”, aldeando índios das parcialidades
guarani em povoados que chegaram a ser em número de 30[4]: os 30 Povos das Missões. A
concentração de índios agricultores nas aldeias foi um atrativo para os bandeirantes que,
provenientes de São Paulo, realizavam incursões ao seu território apresando índios para serem
vendidos como escravos, muitas vezes sob a conivência das autoridades espanholas.
Finda a União das Coroas (1640) as disputas territoriais intensificaram-se. Em 1676
Portugal obteve uma Bula Papal que estabelecia a jurisdição do Bispado do Rio de Janeiro até
o Prata; em 1680 os portugueses fundam a Colônia de Sacramento na margem direita do Rio da
Prata, em frente a Buenos Aires. Por sua vez, os espanhóis estimulam a fundação de novos
aldeamentos jesuíticos na margem esquerda do rio: os 7 Povos das Missões.
A presença portuguesa em Sacramento foi fator de acirramento das disputas entre as
nações ibéricas pelo espaço platino e elas não giravam apenas em torno da posse da cidadela:
disputava-se também o controle integral da margem setentrional do Rio da Prata e a obtenção
do domínio sobre as terras da Banda Oriental e das que, futuramente, viriam a conformar o
território do RS. Com esta orientação, os portugueses fundaram os fortes de Santa Teresa e
São Miguel e, mais tarde, a cidade de Rio Grande (1737). Os espanhóis, por seu turno,
responderam com a fundação de Montevidéu e (1723) e Maldonado (1757). A disputa estimulou
a efetiva ocupação das campanhas do Uruguai e do RS pelas metrópoles, ao mesmo tempo em
que comerciantes, criollos e luso-brasileiros progressivamente valorizavam o gado e as terras da
região, expandindo as estâncias de criação. A formação das primeiras milícias de blendengues:
indivíduos – sem formação militar - que exerciam o patrulhamento da região e recebiam soldo
para defenderem as linhas de fronteira, também contribuiu para a ocupação do território. As
milícias se constituíram, ao mesmo tempo, em postos avançados de defesa, de povoamento e
exploração econômica.
O Tratado de Madrid (1750) representou uma tentativa de definir os limites entre os dois
Impérios: ele deliberou que a Colônia de Sacramento passasse ao domínio espanhol, enquanto
as terras dos 7 Povos recairiam sob controle português O Tratado teve poucas chances de ser
aplicado e motivou a Guerra Guaranítica, uma reação dos índios das aldeias jesuíticas contra a
decisão de terem de abandonar o território. Como as milícias portuguesas não conseguissem
submeter os índios, o governador de Buenos Aires (D. Pedro Cevallos) permitiu o regresso dos
índios ás suas aldeias, enquanto Gomes Freire de Andrade (governador do RJ) manteve a
Colônia sobre domínio português; em 1762 Cevallos atacou Sacramento e abriu as portas do RS
à dominação espanhola (até 1776). Em 1777 o Tratado de Santo Ildefonso pôs fim às diferenças
de fronteira na área.
Portugal, assim, renunciou ao direito de navegação dos rios da Prata e Uruguai e às terras
adjacentes nas suas margens setentrional e meridional, colocando sob controle espanhol a
Colônia de Sacramento, os 7 Povos e a ilha de São Gabriel. Em troca, recebeu os direitos
exclusivos de navegação e entrada no Rio Grande de São Pedro, com o domínio da parte
meridional até o arroio Taim. Estabelecia-se, ainda, uma faixa de terra (Campos Neutrais) que
separava as dias linhas de fronteira.. Situada entre a Lagoa Mirim, a Lagoa Mangueira e a costa
atlântica, estas terras tornaram-se um corredor para o contrabando de gado entre a Banda
Oriental e o RS. Até o final do século XVIII, graças a uma política mais incisiva de ocupação de
terras da fronteira por parte de Portugal doando sesmarias e estâncias a colonos e militares - a
área foi incorporada ao território brasileiro.
[1] Ver: GUTFREIND & REICHEL . Fronteiras e guerras no Prata. São Paulo: Atual, 1995. (Discutindo a
História).
[2] Do lado português citamos as expedições de Martin e Pero Lopes de Souza ao Aio da Prata em 1531
e o batismo das terras ao sul de Laguna (sob o nome de Porto ou Barra de São Pedro) por Gaspar Viegas
em 1534.
[3] Introduzido na região por Juan Dias de Solis em 1515.
[4] De fato as fundações excederam este número, mas 30 foram os que tiveram uma permanência mais
estável.
Arquivo da conta:
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COHEN, William _ Thomas Jefferson e o problema da escravidão.pdf (1345 KB)
FERREIRA, Hevelly. Escravidão e liberdade em territórios coloniais_ Portugal e
Espanha fronteira platina. Dissertação de Mestrado.pdf (1369 KB)
 CEBALLOS_Rodrigo _A margem do Imperio.pdf (101 KB)
GOUVEIA, Maria de Fátima_ Mito e História no contexto dos movimentos.pdf (919 KB)
 PASSETI, Gabriel _O Prata Colonial.pdf (2994 KB)
Outros arquivos desta conta:
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 Bethell, Leslie
 Casas, Bartolomé de las
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