HOSPEDEIROS Prof. Francisco Baptista São hospedeiros todos os vertebrados, cuja integridade estrutural e funcional é constantemente ameaçada pela ação de fatores físicos, químicos, biológicos ou sociais conhecidos como agentes de doença. A filogenia dos hospedeiros determina neles um estado de susceptibilidade ou de insusceptibilidade à ação de agentes de doença. Os hospedeiros susceptíveis permanecem saudáveis quando, através de suas forças defensivas, conseguem neutralizar a ação dos agentes de doença. Um hospedeiro é insusceptível (refratário) a determinado agente de doença quando a sua integridade não é afetada por este. Assim, os eqüinos, apesar de serem susceptíveis a vários agentes de doença, são refratários ao vírus da febre aftosa, ao qual são susceptíveis animais bi ungulados como bovinos, suínos, ovinos e caprinos. A temperatura corporal das aves, maior que a dos mamíferos, torna-as refratárias à infecção pelo Bacillus anthracis. Os hospedeiros apresentam vários graus de resistência, determinados pela capacidade das suas forças defensivas se contraporem à ação deletéria dos agentes de doença. Dessa forma as variações de susceptibilidade e, conseqüentemente, de resistência, podem ser encontradas entre indivíduos da mesma espécie ou entre indivíduos de espécies diferentes. A contraposição suficiente da resistência dos hospedeiros à capacidade agressiva dos agentes define um estado de equilíbrio dinâmico denominado saúde. Se essa contraposição for insuficiente, vários graus de desequilíbrio nas funções do organismo hospedeiro podem acontecer e, nesses casos, diz-se que há doença. Tudo depende da resultante da ação das forças que procuram manter e levar os parâmetros fisiológicos para a normalidade e da ação daquelas forças que, provocando danos nos hospedeiros, alteram esses parâmetros. A capacidade de resposta do organismo (resistência) pode ser sobrepujada e, conseqüentemente, estabelecer-se um estado de incapacidade transitório ou definitivo. Em casos extremos, essa incapacidade pode significar o desaparecimento (morte) do organismo como unidade biológica independente. Sob este ponto de vista, a vida pode ser entendida como a capacidade de resposta do organismo e restabelecimento da homeostasia o que, progressivamente, desde a concepção, se vai esgotando e orientando para a desagregação da unidade biológica. A Epidemiologia, ao cuidar dos hospedeiros, procura compreender melhor essas unidades biológicas e as respectivas forças defensivas, como premissa para ações de defesa, manutenção e promoção da saúde nas populações. As forças defensivas dos hospedeiros podem ser classificadas como inespecíficas ou específicas. São forças defensivas inespecíficas as que conferem imunidade inata, podendo ser de natureza química ou celular. O organismo mobiliza essas forças para combater qualquer substância estranha à sua composição ou, mesmo não sendo estranha, exista em quantidade ou situação não condizente, funcional ou estruturalmente, com a normalidade. Podem ser citadas como forças defensivas inespecíficas as células com capacidade fagocitária, certas enzimas como a lisozima das lágrimas, os sais biliares vertidos no tubo digestivo, os movimentos peristálticos do tubo digestivo, reflexos como o espirro e a tosse. No seu conjunto, tais forças defensivas influenciam e são influenciadas pelo funcionamento de tecidos, órgãos e sistemas. Incluem-se nessas forças a integridade da pele e das mucosas, que se constituem em verdadeiras fortalezas mecânicas e químicas. As forças defensivas específicas conferem imunidade adquirida e podem ser do tipo humoral (anticorpos) ou celular (linfócitos T). A particularidade destas forças é que elas só atuam contra as substâncias estranhas ao organismo que induzem a sua formação, complementando e reforçando a ação das forças defensivas inespecíficas anteriormente referidas. As substâncias estranhas ao organismo chamam-se antígenos e a as imunoglobulinas capazes de com eles se combinarem de forma específica são chamadas de anticorpos. Existem diferentes classes de imunoglobulinas como IgA, IgG, IgM, IgE. Em cada classe, com base em características físicoquímicas e estruturais, são conhecidas subclasses. A distribuição e a concentração das diferentes imunoglobulinas nos tecidos não são uniformes; variam na dependência do tipo de imunoglobulina e da reação imunológica que origina a sua formação (estímulo antigênico – natureza, intensidade e duração). Assim, a IgA é conhecida como protetora das mucosas, a IgG e a IgM encontram-se principalmente na corrente sanguínea e a IgE é tida como a imunoglobulina dos fenômenos alérgicos e parasitoses gastrintestinais. A Imunidade adquirida, estado conferido pelas forças defensivas específicas, pode ser classificada como apresentado no Quadro 1. Na imunidade ativa é o próprio organismo que produz os fatores protetores (anticorpos e células imunocompetentes); já na imunidade passiva o organismo recebe esses fatores de outro organismo previamente imunizado. A imunidade passiva é imediata, mas de duração menor que a imunidade ativa. Na imunidade ativa o organismo conserva a chamada memória imunológica, fazendo com que em um segundo contato com a substância antigênica a resposta (produção de anticorpos ou de células imunocompetentes) seja maior e mais rápida. Este aspecto é utilizado na imunização ativa através de vacinação, repetindo a inoculação da vacina para se obter uma proteção mais sólida. A imunidade ativa, ao contrário da passiva, só se estabelece algum tempo após o estímulo antigênico. Entretanto, o hospedeiro permanece vulnerável, isto é, sem proteção específica. Quadro 1- Classificação das forças defensivas específicas. TIPOS DE IMUNIDADE Natural CIRCUNSTÂNCIA Ativa Doença Passiva Tomada de colostro Através da placenta Artificial Ativa Vacinação Passiva Por soro imune Transferência de células Bibliografia 1. CÔRTES, JOSÉ DE ANGELIS. Epidemiologia – Conceitos e princípios fundamentais. São Paulo: Livraria Varela, 1993. 2. FORATTINI, Oswaldo Paulo. Epidemiologia Geral. 2ª Ed. Depto de Epidemiologia: Faculdade de Saúde Pública – USP. Editora Artes Médicas, 1996. 3. JEKEL, James F. et al. Epidemiologia, Bioestatística e Medicina Preventiva. 1ª Ed. Porto Alegre: Editora Artmed S.A., 2002 4. LESER, Walter. et al. Elementos de Epidemiologia Geral. São Paulo – Rio de Janeiro – Belo Horizonte: Editora Atheneu, 1997. 5. PEREIRA, Mauricío Gomes. Epidemiologia: Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A.,2001. 6. ROUQUAYROL, Maria Zélia. et al. Epidemiologia e Saúde. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Editora Medsi, 1999. 7. SAÚDE, Ministério da. Estudos Epidemiológicos. Ed. Única. Fundação Nacional da Saúde – Vigilância Epidemiológica. Agosto/2000 8. Thrusfield, M. V. Epidemiologia Veterinária. 2ª Ed. São Paulo: Roca, 2004