PADRÕES, DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS EM CIDADES DE PORTE MÉDIO NO ESTADO DE SÃO PAULO: UMA ANÁLISE DE ASSIS, ITAPETININGA E BIRIGUI Vitor Koiti Miyazaki Docente do Curso de Geografia - Faculdade de Ciências Integradas do Pontal, FACIP/Universidade Federal de Uberlândia - UFU. Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Geografia - Faculdade de Ciências e Tecnologia, FCT/Universidade Estadual Paulista – UNESP – Campus de Presidente Prudente. E-mail: [email protected] INTRODUÇÃO: Nas últimas décadas, muitas cidades de porte médio têm se destacado no âmbito da rede urbana, seja por sua dimensão demográfica quanto pelo conjunto de papéis regionais que passam a desempenhar. Ao mesmo tempo em que tais mudanças ocorrem, difundem-se os estudos e pesquisas que tratam sobre as cidades médias. É neste contexto que se inserem os estudos realizados por Amorim Filho (1973), Andrade e Serra (2001), Amorim Filho e Sena Filho (2005), Sposito, Sposito e Sobarzo Miño (2006), Sposito (2007) entre outros. No entanto, apesar de muitos estudos já realizados e outros em andamento, a construção conceitual sobre o termo Cidade Média ainda encontra-se em desenvolvimento. Mesmo assim, como uma compreensão inicial, há um consenso da diferença existente entre os termos Cidade de Porte Médio e Cidade Média, uma vez que o primeiro refere-se ao tamanho ou dimensão definido por critérios quantitativos como o demográfico, por exemplo. Já o termo Cidade Média abrange, além do porte, um conjunto de elementos referentes à importância da cidade no contexto da rede urbana, enfocando aspectos como níveis de centralidade, quantidade e diversidade de bens e serviços oferecidos, papéis regionais de intermediação, entre outros. A partir dessa perspectiva, vários estudos são realizados atualmente enfocando as cidades médias. Porém, em uma rede urbana dinâmica e complexa como a de São Paulo, verificamos situações muito diversificadas que ainda não são contempladas pelos estudos urbanos. Um desses exemplos são as cidades que já apresentam um porte demográfico Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 1 médio (aproximadamente 100 mil habitantes) e que aos poucos vem desempenhando importantes papéis regionais na escala da rede urbana. No Estado de São Paulo, por exemplo, centros urbanos como Assis, Birigui, Catanduva, Guaratinguetá, Itapetininga, Itu, Jaú, Ourinhos, entre outros passam por transformações relevantes tanto na escala intra-urbana quanto na interurbana. É nesta perspectiva que este estudo, ainda em desenvolvimento, busca analisar os padrões, as diferenças e as semelhanças presentes nas cidades que se enquadram nesse grupo, enfocando os casos de Assis, Birigui e Itapetininga, todas localizadas no interior do Estado de São Paulo, porém, em contextos e situações diferentes. Todas elas possuem um porte demográfico relevante, com aproximadamente 100 mil habitantes, situando-se em um patamar não compreendido pelos estudos sobre cidades médias, considerando-se o contexto da rede urbana paulista. Por outro lado, já apresentam uma dinâmica urbana superior aos das pequenas cidades. É esta lacuna que esta pesquisa pretende explorar articulando as escalas intra e interurbanas. Para não limitar a análise apenas à dimensão demográfica, ressalta-se que tais centros urbanos apresentam, de acordo com o estudo Região de Influência das Cidades – REGIC/IBGE, níveis significativos de centralidade. Este trabalho enfoca duas frentes de investigação que se articulam: primeiro, a análise de aspectos demográficos, econômicos e sociais numa escala intra-urbana; segundo, a análise da morfologia e da rede urbana, numa escala interurbana. Apesar dessa distinção, ressalta-se que grande parte dos elementos analisados imbrica-se, necessariamente, entre as duas escalas de análise. ASPECTOS METODOLÓGICOS E BREVE CARACTERIZAÇÃO DO RECORTE ESPACIAL: Como já apresentado anteriormente, chama-se atenção, nesta pesquisa, para as cidades com tamanho demográfico no patamar de 100 mil habitantes no Estado de São Paulo. Longe de restringir a análise apenas aos critérios demográficos, este primeiro recorte foi definido a partir da seguinte perspectiva: muitos estudos sobre cidades médias paulistas são realizados a partir de centros urbanos com porte populacional mais elevado, situado Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 2 geralmente em um patamar superior a 150 mil habitantes. Aliado a este aspecto, a complexidade da rede urbana paulista apresenta cidades de porte demográfico inferior que também desempenham importantes papéis de intermediação. As transformações que ocorrem na rede urbana paulista já foram destacadas por diversos autores, entre eles Caiado (1995 e 2004), Feldman (2003) e Lencioni (2003 e 2004), enfatizando aspectos ligados ao fortalecimento da importância industrial que o interior do Estado passa a apresentar, bem como o papel que muitas cidades com população de aproximadamente 100 mil habitantes passam a desempenhar. A figura a seguir mostra a localização e a posição hierárquica, de acordo com o REGIC/IBGE 2007 dessas cidades. Figura 1 – Localização e hierarquia dos centros urbanos com aproximadamente 100 mil habitantes no Estado de São Paulo Neste conjunto de cidades, cabe ressaltar inicialmente que cada uma apresenta características distintas, necessitando uma análise que abranja as especificidades locais e regionais. Tais cidades encontram-se inseridas em diferentes contextos históricos e regionais: algumas cidades estão atreladas à dinâmica metropolitana, à dinâmica dos eixos de Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 3 desenvolvimento, à dinâmica de regiões com agricultura moderna, à dinâmica da desconcentração das atividades industriais, entre outras. Neste texto, optou-se por centrar a análise em três cidades deste conjunto: Assis, Birigui e Itapetininga, por representarem realidades e situações diferentes (e em alguns aspectos semelhantes) entre elas, além do fato dos levantamentos estarem mais avançados para estes centros urbanos. Até o momento, a pesquisa buscou analisar os dados censitários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, bem como as informações disponibilizadas por instituições como Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados - SEADE, Banco de dados do Sistema Único de Saúde - DataSUS, Prefeituras Municipais e levantamentos de campo. Já no que se refere à morfologia urbana e as novas formas espaciais, são utilizadas imagens de satélite e atividades de campo para análise e elaboração de mapas. Tais levantamentos têm permitido observar essas novas morfologias e acompanhar certas tendências no que se refere à expansão territorial urbana. Outro aspecto considerado nesta pesquisa foram os diferentes contextos regionais e econômicos nas quais se inserem as cidades analisadas: Assis, com 92.965 habitantes, possui uma economia voltada ao setor de comércio e serviços, com importantes papéis regionais; Birigui possui 103.394 habitantes com um expressivo setor industrial, mas que apresenta uma complementaridade de funções juntamente com Araçatuba, com a qual compõe uma aglomeração; e Itapetininga, com 138.450 habitantes, onde o setor agropecuário é mais representativo que nas cidades anteriores, mas com várias tentativas de dinamização do setor industrial no contexto da desconcentração da atividade industrial, utilizando-se como argumento a proximidade com a capital paulista. Considerando-se, por exemplo, a classificação proposta por Lencioni (2004), Itapetininga está inserida na Região de Expansão Metropolitana, enquanto Assis e Birigui fazem parte da Região Não Metropolizada (figura 2). A diferença entre Assis e Birigui, como veremos mais adiante, está no fato do primeiro não configurar aglomeração urbana, constituindo-se em centro urbano “isolado” do ponto de vista da morfologia urbana. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 4 Figura 2 – Localização de Assis, Birigui e Itapetininga segundo regionalização de Lencioni (2004). Com o intuito de avançar na análise destas cidades, será realizado ainda um levantamento mais aprofundado sobre a estruturação na escala intra-urbana, bem como a questão das interações interurbanas. Nesse sentido, além de levantamentos de campo, a pesquisa focará sobre as estatísticas do Microdados disponibilizado pelo IBGE, especificamente nos dados sobre deslocamentos pendulares. RESULTADOS PARCIAIS: Inicialmente, vale lembrar que as cidades paulistas com aproximadamente 100 mil habitantes ainda não são estudadas na perspectiva das cidades médias, porém, já possuem porte e níveis de centralidade expressivos, o que não os qualificam como pequenas cidades. Longe de tentar enquadrá-los em uma classificação hierárquica (pequenas cidades, cidades médias e grandes cidades) o que se busca é analisar, a partir dos resultados obtidos, as dinâmicas, transformações e permanências de tais centros urbanos, inseridos numa rede urbana dinâmica e complexa como a de São Paulo. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 5 Considerando-se as informações sobre economia, condições sócio-econômicas e morfologia, os resultados obtidos mostram uma combinação de semelhanças e diferenças, tanto do ponto de vista intra-urbano quanto interurbano. Diante do porte e dimensão que estas cidades apresentam (não só demográfico), passam a atrair e contar com determinados tipos de comércio, bens e serviços especializados, com impactos diretos no processo de estruturação urbana e da cidade. Os dados sobre vínculos empregatícios formais, por exemplo, contribuem para mostrar a heterogeneidade que caracteriza as cidades analisadas (tabela 1). Tabela 1 – Distribuição dos vínculos empregatícios por setores da economia (em %): Município Assis Birigui Itapetininga Agropecuária 1,7 1,7 19,8 Comércio e Serviços Indústria Construção Civil 85,2 9,2 3,9 35,8 60,4 2,1 57,4 20,5 2,3 Fonte: Fundação Seade, 2006. Org: Vitor K. Miyazaki, 2010. Enquanto no município de Assis o setor de comércio e serviços emprega mais de 85% dos trabalhadores, em Birigui o setor industrial tem destaque, com mais de 60% dos vínculos empregatícios. Itapetininga, por sua vez, apresenta maior concentração dos vínculos no comércio e serviços, porém, com um setor agropecuário expressivo, com quase 20%, índice que nas outras cidades analisadas não chega a 2%. Além dessas diferenças e semelhanças constatadas, observa-se também a configuração de morfologias urbanas verificadas antes em centros urbanos de maior porte, tais como os casos de processos de aglomeração ou de configuração de formas urbanas cada vez mais dispersas e descontínuas. Mesmo no caso dos centros urbanos mononucleados, sem tendência à aglomeração, como Itapetininga e Assis, a distância de novos loteamentos urbanos periféricos em relação ao centro da cidade já é significativa (figura 3). A dificuldade de acesso e deslocamento para a área central por quem vive nas áreas periféricas distantes pode se constituir em problema tão grave quanto nas cidades de maior porte, uma vez que os centros urbanos de menor porte, muitas vezes, possuem um sistema de transporte coletivo menos eficiente e grande parte das atividades de comércio e serviços concentrados no centro tradicional. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 6 Assis-SP Birigui-SP Itapetininga-SP Figura 3 – Áreas urbanas de Assis-SP, Birigui-SP e Itapetininga-SP Em Itapetininga, por exemplo, há loteamentos localizados a 7 quilômetros de distância do centro da cidade, configurando áreas urbanas descontínuas e dispersas. Aliado a este aspecto, cabe ressaltar que Itapetininga apresenta sérios problemas de circulação, uma vez o sistema viário da cidade é comprometida pelas estreitas vias herdadas do século XVIII e ausência de vias arteriais planejadas. Em contrapartida, algumas ações no sentido de Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 7 desconcentrar as atividades do centro tradicional (onde a circulação torna-se ainda mais difícil) vêm sendo realizados, como o caso da transferência da sede da Prefeitura Municipal para um setor periférico. Em Assis e Birigui nota-se a conformação de uma mancha urbana mais compacta e contínua, com alguns loteamentos periféricos descontínuos localizados, no máximo, a 5 quilômetros do centro. Porém, a concentração das atividades no centro tradicional destas cidades é expressiva. Assis, por exemplo, apesar de ser uma cidade mais nova, fundada já no século XX, apresenta problemas significativos de trânsito na área central, em decorrência de não possuir vias arteriais bem estruturadas no centro, onde estão localizados todas as agências bancárias, órgãos da administração pública e serviços de saúde. Birigui, por sua vez, é considerada como centro urbano que compõe uma aglomeração urbana juntamente com Araçatuba. Assis começa a apresentar uma leve tendência nesse sentido, considerando-se a proximidade e os fortes laços sociais e econômicos que mantém com Cândido Mota, bem como a localização de loteamentos aprovados recentemente. Do ponto de vista da rede urbana e das relações interurbanas, tanto Assis quanto Itapetininga são classificadas como Centro Sub Regional B, de acordo com a REGIC (2007). Já Birigui ocupa uma posição inferior na hierarquia, sendo classificada como Centro de Zona A. Essa diferença se deve ao fato de Birigui compor uma aglomeração urbana junto com Araçatuba, centro urbano de maior porte (com aproximadamente 170 mil habitantes) cujo nível de centralidade é maior, classificada como Capital Regional C. A “competição” entre as cidades, ou melhor, a complementaridade de funções que caracteriza a aglomeração torna seu nível de centralidade menor, quando comparada a centros urbanos como Assis e Itapetininga. CONSIDERAÇÕES FINAIS: Diante da aceleração do processo de urbanização no país nas últimas décadas, considera-se importante compreender a dinâmica das transformações em curso nas cidades e no urbano brasileiro. A partir desta pesquisa, pretende-se apresentar elementos para contribuir nesta discussão, enfocando o caso das cidades de porte médio em questão. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 8 Considerando-se que a análise desses centros urbanos se dá no contexto do Estado de São Paulo, é preciso considerar as especificidades dessa rede urbana densa e complexa. Se, por um lado, essa maior dinamicidade e complexidade da rede podem, num primeiro momento, desqualificar tais centros urbanos como “cidades médias”, por outro lado, podem dotar essas cidades com papéis especializados e mais diversificados, tornando seus níveis de centralidade ainda mais expressivos. Os resultados parciais apontam para mudanças significativas na morfologia urbana destas cidades que, de certa forma, começam a adquirir contornos semelhantes àqueles encontrados nas cidades médias. Porém, é preciso ainda avançar nesta pesquisa, por meio do levantamento de informações e bibliografia sobre o tema e análise de dados que permitam uma discussão mais aprofundada para estas cidades. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: AMORIM FILHO, O. B.; SENA FILHO, N. A morfologia das cidades médias. Goiânia: Vieira, 2005. AMORIM FILHO, O. B. Contribution à l’étude des Villes moyennes au Minas Gerais – Formiga et Le Sud-Ouest Du Minas Gerais. Tese (doutorado em Geografia). 361f. 1973. 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