interface alzheimer: um estudo de caso

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II Seminário, I Oficina e I Mostra ATIID – Acessibilidade, TI e Inclusão Digital, 23-25/09/2003
INTERFACE ALZHEIMER: UM ESTUDO DE CASO
André Junqueira XAVIER, Msc
e Daniel Sigulem, Livre Docente,
DIS/EPM/UNIFESP
Luiz Roberto RAMOS, PHD CEE/EPM/UNIFESP, São Paulo-SP, Brasil
Edla Faust RAMOS, Dra EPS/INE/UFSC, Florianópolis-SC, Brasil
João Bosco da Mota ALVES, Dr RExlab/INE/UFSC, Florianópolis-SC, Brasil
Josenei Braga dos SANTOS, Msc EPS/UFSC, Florianópolis-SC, Brasil
Gilberto Medeiros de SOUZA, RExlab/INE/UFSC, Florianópolis-SC, Brasil
[email protected]
1. INTRODUÇÃO
Sabe-se que a doença de Alzheimer (DA) provoca um profundo impacto
sobre a vida do paciente e também atua desestruturando família e
comunidade em função do alto nível de dependência e perda de autonomia
que gera sobre o indivíduo afetado.
Com a Transição Epidemiológica (mudança no perfil de adoecimento
populacional do padrão infecto-parasitário para o crônico-degenerativo), “O
sistema de saúde terá que fazer frente a uma crescente demanda por
procedimentos diagnósticos e terapêuticos das doenças crônicas não
transmissíveis,
principalmente
as
cardiovasculares
e
as
neurodegenerativas, e a uma demanda ainda maior por serviços de
reabilitação física e mental”. (Ramos. 2003). A DA, por suas
características, serve como exemplo desta mudança de abordagem: ao
invés de cura (ainda impossível), busca se a reabilitação.
O paciente com DA apresenta déficits cognitivos progressivos de memória,
orientação, funções executivas, aprendizado, praxias e comportamento
com o passar dos anos. Algumas destas funções são passíveis de melhora
a partir do uso de Sistemas de Auxílio Cognitivo (SAC) - conjunto de
tecnologias
computacionais
(Inteligência
Artificial,
Computação
Onipresente, softwares e hardwares variados) com a finalidade de
aumentar e potencializar capacidades humanas, promovendo a autonomia
e a independência daqueles que sofrem de limitações cognitivas, incluindo
os portadores de DA (Kautz, 2002).
Neste trabalho se agrega a metodologia de Modelagem Cognitiva (MC) para
uma melhoria na adaptação e uso de SAC por portadores de DA. A MC é a
determinação de qual o nível de complexidade no qual o Sistema Cognitivo
do Indivíduo consegue operar. Ela é obtida por meio da hierarquização de
tarefas ou perguntas em níveis progressivos de complexidade (dificuldade).
A partir desta hierarquização se verifica quais as habilidades cognitivas
restantes podem ajudar a pessoa a atingir seu melhor nível de autonomia,
independência, funcionalidade e realização. Apoiando-se do nestas
habilidades se procura a adaptação de um SAC que substitua total ou
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parcialmente as habilidades perdidas promovendo ao mesmo tempo a
manutenção das restantes.
O resultado é a construção de um sistema interativo entre um ser humano
demenciado e um sistema computacional, com o objetivo de buscar do
primeiro, a inserção social plena, autonomia e funcionalidade. Na MC está
implícita a idéia de que a DA possui uma forma de auto-organização, uma
arquitetura de evolução dos seus sinais e sintomas que não são totalmente
dependentes das lesões cerebrais mas sim do estado global do
funcionamento do Sistema Cognitivo, com grande interdependência de
funções. Esta metodologia, além da avaliação estática da patologia,
procura o acompanhamento e a avaliação do ganho ou perda cognitiva do
indivíduo.
2. OBJETIVOS
Promover a autonomia e a independência de um portador de Doença de
Alzheimer (DA) por meio da adaptação de um SAC (GPS) a partir de uma
metodologia de Modelagem Cognitiva (MC).
3. MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de um estudo de caso realizado com um paciente do sexo
masculino, 52 anos, portador de (DA) do tipo precoce (início antes dos 60
anos com curso acelerado), com evolução da doença atual de cerca de três
anos.
Seus principais sintomas: dificuldade progressiva em tarefas complexas e
seqüenciais, dificuldade de evocação, desorientação espacial e depressão.
Soma-se a isto, o histórico familiar positivo com mãe portadora da mesma
patologia. Dentro da evolução dos sintomas houve preservação da
orientação temporal e da linguagem.
O paciente obteve remissão parcial do quadro com o uso de antidepressivo
e anticolinesterásico. Após o período de seis meses passou a apresentar
nova piora com evolução semelhante a anterior apesar da continuidade do
tratamento.
Fig.1
Fig.2
Fig.3
Interface utillizada (Fig1), modo de operação (Fig.2) e navegação por
satélite (Fig.3).
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Este estudo de caso é um recorte de uma pesquisa em desenvolvimento há
um ano por meio de oficinas de MC e SAC com portadores de DA, nas quais
foram adotados os seguintes instrumentos:
a) Ferramentas da internet - Páginas de cadastro de e-mail, chats, fóruns,
videoconferência, uso de browsers, navegação e jogos interativos
voltados para suas potencialidades íntegras;
b) Dispositivos interativos – telefones celulares, caixas automáticos,
agendas eletrônicas, dispositivos de comando verbal e leitura de textos
para operação de computadores (IBM-Viavoice, Dosvox, Matrix) e
webcams.
c) Mini-Mental Status Examination – instrumento utilizado para triagem e
avaliação do status cognitivo desenvolvido por Folstein (1975), utilizado
como base da Modelagem Cognitiva.
d) Sistema de Posicionamento Global (GPS) – dispositivo interativo
comumente utilizado para orientação geográfica.
4. RESULTADOS
Após a aplicação da MC durante a realização das oficinas, nas quais foram
utilizadas as ferramentas citadas acima, identificou-se que o paciente
mantinha boa capacidade para realizar funções complexas (uso de
computadores), boa compreensão e linguagem sem alterações. Por outro
lado revelou baixa capacidade de evocação em situações novas e
desorientação espacial.
Foi desenvolvida uma oficina com a finalidade de verificar a capacidade de
interação do paciente com o GPS e, com isso, gerar perspectivas do seu
uso cotidiano. A MC indicou que o paciente tinha dificuldade de se orientar,
mas mantinha a consciência de que estava perdido e a capacidade de
consultar o SAC e tomar decisões por si próprio.
A oficina teve a duração de uma hora, inicialmente o paciente recebeu
instruções de uso e consulta do GPS na função “ir para” que apresenta
como interface uma seta que aponta para uma coordenada pré –
demarcada, corrigindo sua direção em função das mudanças de trajetória
do usuário, a interface também apresenta a distância que falta para o
objetivo, a velocidade da caminhada e o tempo estimado de chegada, bem
como um aviso de que se está perto do objetivo. Foram demarcados dois
pontos de chegada desconhecidos para o paciente dentro do campus da
universidade (UFSC) em local seguro e com o devido acompanhamento.
5. DISCUSSÃO
O paciente utilizou o GPS com progressiva eficácia encontrou os pontos
demarcados e tomou decisões a respeito do melhor caminho a ser seguido.
A análise dos depoimentos do paciente (gravados) mostrou: “estou
desenvolvendo novas formas de aprendizado e relação com a
máquina” (novos aprendizados), “novidade muito interessante”
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(satisfação do usuário), “o GPS é um instrumento de fácil utilização”
(adequação do dispositivo e boa acessibilidade), “além de me dar uma
segurança estando com o aparelho eu posso encontrar caminhos
alternativos, vou por um caminho e vejo que estou fora da reta, vou
mudando e vou seguindo a seta, é tranqüilo, pois o aparelho auxilia
muito no sentido de mostrar as diversas maneiras de chegar num
ponto .... interessante” (manutenção da autonomia e independência,
capacidade funcional), “pensando sobre as oficinas, acho que eu
andava sem prestar atenção ao meu redor, agora vou procurar
perceber o que está em volta” (melhoria do nível de consciência sobre o
problema). A partir da oficina propõe-se a construção de uma interface
voltada para o paciente de DA.
Especificamente para o GPS se propõe: ao ser acionado deve ficar
automaticamente na função “ir para” com local pré-programado, voltar a
esta função automaticamente caso o paciente saia da tela e possa se
perder na utilização do aparelho. Vários endereços poderão ser também
pré-programados, ex., padaria, casa, supermercado, hospital etc. Poderá
ser inserido um mapa do local sugerindo ruas e caminhos mais curtos e
mais usados. Sugestões e dicas de tela poderão ajudar na orientação.
Tempo de chegada no objetivo e velocidade da caminhada foram bem
aceitos e compreendidos. “A carga de trabalho pode diminuir por meio de
diálogos e telas compatíveis com as necessidades dos usuários em suas
tarefas e por uma maior flexibilidade na interação” (Cibys, 2002).
6. CONCLUSÃO
O paciente foi capaz de usar o dispositivo atingindo os objetivos propostos
na oficina. Conseguiu-se perceber que este SAC auxiliou-o na recuperação
de uma função que havia perdido: andar na rua sem se perder,
promovendo sua autonomia e capacidade de tomada de decisões.
A Modelagem Cognitiva se mostrou útil tanto na construção da hipótese a
ser testada quanto no uso da interface correta, ajudando no processo de
inclusão social e aproveitando as capacidades não comprometidas na
melhoria das atividades da vida diária por meio de uma Interação HumanoComputador humanizada.
7. REFERÊNCIAS
Baranauskas M.C.C., Mantoan M.T.E. “Acessibilidade em Ambientes
Educacionais para Além das Guidelines” In Quevedo AAF, Oliveira JR.,
Mantoan M.T. E. (Org.). “Mobilidade, Comunicação e Educação:
Desafios à Acessibilidade”. WVA Editora e Distribuidora
Cybis, W. Laboratório de Utilizabilidade. http://www.labiutil.inf.ufsc.br
acessado em 26/06/2003.
II Seminário, I Oficina e I Mostra ATIID – Acessibilidade, TI e Inclusão Digital, 23-25/09/2003
Kautz H., Etzioni O., Foundations of Assisted Cognition Systems
Department of Computer Science & Engineering University of
Washington Seattle, 2002.
Ramos, L R. Fatores determinantes do envelhecimento saudável em idosos
residentes em centro urbano: Projeto Epidoso, São Paulo. Cad. Saúde
Pública. [online]. jun. 2003, vol.19, no.3 [citado 23 Junho 2003],
p.793-797.
8. BIBLIOGRAFIA
1O Seminário ATIID - "Acessibilidade, Tecnologia Da Informação E Inclusão
Digital", Anais online, Faculdade de Saúde Pública/USP, São Paulo,
2001 disponível em http://www.fsp.usp.br/acessibilidade
Maturana H. “A Ontologia da Realidade”. Ed. UFMG, Belo Horizonte, 1999.
Varela F.,”Conhecer: As ciências cognitivas tendências e perspectivas”
Instituto Piaget, Lisboa, 1985.
Importante:
Qualquer citação deste texto ou partes dele, sob qualquer forma ou meio, deve
obrigatoriamente incluir, além do título e autor, a menção de "Anais do II Seminário ATIID,
São Paulo-SP, 23-24/09/2003", disponível on-line em: http://www.fsp.usp.br/acessibilidade
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