UM ESTUDO TEÓRICO SOBRE CLASSIFICADORES NA CONSTITUIÇÃO DA LIBRAS E SUAS RELAÇÕES COM AFFORDANCES Jéssica Puhl (PIBIC/Fundação Araucária/UEPG), Elaine Ferreira do Vale Borges (Orientadora), e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Ponta Grossa/Departamento de Estudos da Linguagem/Setor de Ciência Humanas e Artes Linguística; Linguística Aplicada Palavras-chave: Libras, iconicidade, affordances. Resumo: Esta pesquisa, de cunho bibliográfico e interpretativista, desenvolve um estudo teórico sobre o papel e funções dos classificadores (Cls) na constituição da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Ainda, estabelece relações possíveis entre os CLs e as affordances (GIBSON, 1979; van LIER, 2004; PUHL e BORGES, 2016). Os resultados mostram que, mesmo os Cls não sendo propriamente icônicos, há um certo grau de iconicidade nesses morfemas (assemelhando-os a affordances) na constituição das línguas de sinais que pode permite uma melhor compreensão e assimilação deles, pelo observador, no processo de aquisição da Libras. Introdução A Língua Brasileira de Sinais (Libras) é caracterizada pela modalidade visoespacial e o sistema de classificadores faz parte do processo morfológico de formação lexical da Libras (QUADROS; KARNOPP, 2004). Os classificadores (Cls) são morfemas explícitos (BERNARDINO, 2012) e podem funcionar como nome, adjetivo, advérbio de modo ou de locativo, sendo no verbo ou no adjetivo que os CLs se incorporam, apresentando-se no sintagma verbal ou predicado. “Nesses morfemas, mãos e corpo seriam articuladores para indicar o nome do referente, ou o agente da ação” (SUPALLA, 1986 apud BERNARDINO, 2012, p. 251). Ainda, um Cl é “concatenado com um quantificador, demonstrativo ou predicado para formar um elo que não pode ser interrompido por um nome que ele classifica” (ALLAN, 1977 apud FERREIRA-BRITO, 1995, p. 102). Em Libras, segundo Ferreira-Brito (1995), os CLs funcionam como partes dos verbos em uma sentença, chamados de verbos de movimento e de localização. Em sua constituição, Cls não dependem apenas da Configuração de Mão (CM), mas também da Orientação de mão (O) e Movimento (M), podem referindo- se a entidades no singular e no plural (FERREIRA-BRITO, 1995). Como exemplo, temos o Cl „G‟ singular que se refere a uma única entidade, enquanto o Cl „V‟ é um dual, referindo-se a duas entidades. Após estudos de vários autores (SUPALLA, 1986; FERREIRA-BRITO,1995; FELIPE, 2002; SCHEMBRI, 2003. BERNARDINO, 2012) elencamos os dez tipos de classificadores como sistematizados em FATEC (s/d), a saber: 1. Descritivo (CL-D); 2. Que Especifica (CL-ESP); 3. De uma parte do Corpo (CL-PC); 4. Locativo (CL-L); 5. Semântico (CL-S); 6. Instrumental (CL-I); 7. Do Corpo (CL-C); 8. Do Plural (CL-P); 9. De Elemento (CL-E), e; 10. De Nome e Número (CL-NOME; CL-Nº). Em relação à atribuição de valor de significado aos CLs, aproximamos essa questão, nesta pesquisa, a importância das affordances e, como elas – e a iconicidade dos sinais na língua de sinais – podem possivelmente ajudar o aprendiz a compreender os Cls. Affordances (GIBSON, 1979; van LIER, 2004) são propriedades do meio percebidos ou não pelos observadores. No contexto linguístico, perceber, interpretar e agir sobre o que o meio disponibiliza pode ser crucial para aprender e/ou desenvolver uma língua. Essa reflexão foi possível tendo em vista um estudo (PUHL; BORGES, 2016) anteriormente realizados que mostra as relações entre affordances e a iconicidade emergente na Libras como segunda língua (L2). Materiais e métodos Esta pesquisa é de cunho bibliográfico (SEVERINO, 2007) pelo teor de pesquisa teórica na compreensão dos Cls; e interpretativista-qualitativa (MOITA LOPES, 1994) pelas reflexões no desenvolvimento e na produção dos resultados no que se refere às ligações dos Cls às affordances. Resultados e Discussão Os Cls em si, enquanto se tratando apenas no âmbito da CM, pouco se é atribuído iconicidade, já que, enquanto CM, se manifesta de forma estática. Nesse sentido, a produção de um Cl, não se utilizando O e M em sua produção, pode ocasionar no aprendiz (observador, se pensarmos nas affordances) a não percepção do grau de iconicidade que esse Cl possa manifestar. Vale salientar que a iconicidade observada, aqui, parte da sinalização como um todo na produção de um sinal, ou seja, não se trata apenas do Cl enquanto algo estático manifestado apenas via CM, mas como sendo utilizado em conjunto com a O e o M. Para exemplificar, usamos, aqui, o sinal “CARRO” que se trata de um sinal icônico, pois refere-se ao volante de um carro. Por um lado, na sinalização do Cl de “CARRO”, enquanto CM, a mão fica aberta, porém com todos os dedos juntos, e a posição da mão deverá estar paralela ao chão, dando ao Cl de carro, a sua forma estática. Por outro lado, na produção da sentença “O CARRO BATEU EM UMA ÁRVORE” pode-se utilizar o Cl “CARRO” (CM), movimentando-o (M) em direção (O) a uma árvore (que deverá ser sinalizada do lado oposto da mão que produz o sinal CARRO). O sinal de árvore, por sua vez, também se trata de um sinal icônico, pois faz referência ao desenho de uma árvore. Percebemos nesta frase um grau maior de iconicidade, pois podemos visualizar através do Cl “CARRO” como o fato ocorreu. Assim, para a constituição dos Cls, não bastam apenas os recursos das CMs (componente primário), mas se faz necessário também a O e o M – componentes secundários na importância na produção dos sinais nas LS, mas importantes para formação dos CLs, principalmente (como mostrado acima) para a emergência de uma iconicidade maior à sinalização que a aproxima das propriedades das affordances. Conclusões Uma primeira constatação que podemos trazer como um dos resultados desta pesquisa e que se verificou que autores importantes na área da língua de sinais (LS) e da Libras como Bernardino (2012), Ferreira-Brito (1995), Felipe (2002), Schembri (2003), dentre outros – estudados e/ou consultados para a realização deste trabalho –, não fazem uma sistematização dos Cls na área de Libras. Assim, percebeu-se a carência de pesquisas que tragam a discussão sistemática dos Cls. Notou-se, ainda, que os autores em questão não embasam suas pesquisas em todos os tipos de Cls nas LS, mas recortam os Cls mais usados na LS pesquisada, direcionando seus estudos e análises apenas em determinados Cls, e não em um grupo mais amplo. Uma sistematização mais completa dos Cls em Libras foi encontrado apenas em FATEC (s/d). Com essa pesquisa, ainda, compreendeu-se que os Cls são morfemas, vinculados a substantivos, adjetivos, advérbios de modo ou de locativo no momento da sinalização, porém essencialmente incorporados a verbos ou a adjetivos. Como partes da estruturação gramatical de qualquer LS, os Cls emergem naturalmente na enunciação, facilitando a conversação entre os interlocutores, pois podem atribuir graus de iconidade aos sinais durante a sinalização. No que se refere as relações possíveis entre os CL e as affordances, pode-se entender que as affordances emergem quando os Cls não são usados de forma estática (apenas no âmbito da CM), mas quando aos Cls são atribuídos a O e o M, e ainda se necessária as expressões faciais e corporais, oferecendo maior iconicidade aos interlocutores e, possivelmente, uma melhor possibilidade de compreensão do enunciado, ajudado possivelmente na aquisição da Libras. Sabe-se que nas línguas de sinais, cada país possui a sua, assim como a interpretação e a percepção da iconicidade perante aos objetos/animais e também aos classificadores. Todavia, as affordances, associadas aos Cls, podem propiciam um melhor entendimento e compreensão do que o meio realmente significa no momento da aquisição de uma língua visoespacial, bem como influenciar no momento da sinalização, no momento do uso dos Cls e no momento da organização da enunciação. Agradecimentos Agradeço primeiramente a Deus, família e amigos por sempre me apoiarem e me incentivarem em todas as etapas da minha vida, que envolvem as pesquisas realizadas. Além, de agradecer a instituição, UEPG, por oferecer oportunidades para nós acadêmicos, assim como agradeço a fonte beneficente da bolsa, a PIBIC/FUNDAÇÃO ARAUCÁRIA. Referências BERNARDINO, E. L. A. O uso de classificadores na língua de sinais brasileira. ReVEL, v. 10, n. 19, 2012. FATEC (s/d) http://www.fatecc.com.br/alunos/apostilas/libras/Classificador/classificador.pdf. Acesso em: 10 dez de 2015. FELIPE, T. Sistema de flexão verbal na Libras: os classificadores enquanto marcadores de flexão de gênero. In: Congresso Internacional do INES. RJ. Anais do Congresso Internacional do INES, v. 1, 2002. FERREIRA-BRITO, L. Por uma gramática de línguas de sinais. Rio de Janeiro, RJ: Tempo Brasileiro, 1995. GIBSON, J. J. The theory of affordances. In: SHAW, R & BRANSFORD, J. Perceiving, acting, and knowing. 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Amsterdam, Philadelphia: John Benjamin Publishing Company, 1986. van LIER, L. The Ecology and Semiotics of Language Learnig: A Sociocultural Perspective. Boston: Kluwer Academic Publishers, 2004.