SECRETARIA DE SAÚDE DO ESTADO DO CEARÁ HOSPITAL GERAL DE FORTALEZA PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA KAROLINE MACÊDO SAMPAIO COLETÂNEA EM GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA VOLUME XI FORTALEZA-CE 2016 KAROLINE MACÊDO SAMPAIO COLETÂNEA EM GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA Monografia submetida à Coordenação do Programa de Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia, do Hospital Geral de Fortaleza, como requisito parcial para obtenção do título de especialista em Ginecologia e Obstetrícia, sob a orientação do Prof. Dr. Joaquim Luiz de Castro Moreira FORTALEZA- CE 2016 AGRADECIMENTOS A Deus pela dádiva da minha vida e de todos que fazem parte dela. Aos meus pais e irmãos que, mesmo na distância, foram porto seguro e incentivo para esses três anos de residência. Ao meu marido pelo companheirismo, cuidado e dedicação diários. Aos meus familiares pelo carinho e apoio em toda essa caminhada. Aos meus preceptores, que dedicam suas vidas nesta linda arte de ensinar e dividir conhecimentos. Ao Dr. Joaquim e Dr. Ananias, meus coordenadores da residência, pela luta em nosso favor e em busca de um ensino de excelência como o nosso. As minhas queridas colegas de residência que tornam o trabalho árduo e diário mais leve e prazeroso. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO..................................................................................................4 2 ANTICONCEPÇÃO...........................................................................................5 3 LESÕES INTRAEPITELIAIS CERVICAIS......................................................25 4 DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS...........................................46 5 CÂNCERES HEMATOLÓGICOS NA GESTAÇÃO........................................62 6 DIABETES MELITUS NA GESTAÇÃO...........................................................73 7 OBESIDADE NA GESTAÇÃO........................................................................86 4 1 INTRODUÇÃO Esta coletânea em ginecologia e obstetrícia surgiu a partir do interesse comum dos residentes e preceptores dos serviços de ginecologia e obstetrícia do Hospital Geral de Fortaleza em publicar um manual prático e atualizado sobre os temas mais relevantes ao cotidiano da especialidade. Como o hospital em questão trata-se de, e é, um hospital escola, o intuito primordial é de que esta coletânea possa ajudar estudantes, internos, residentes e plantonistas a se familiarizar com o serviço, servindo como fonte de estudo e pesquisa. Os temas principais foram escolhidos e divididos entre os residentes/ do serviço, que fizeram uma ampla revisão sobre cada assunto e dispuseramna como capítulos de livros. Cada capítulo foi revisado e corrigido por um dos preceptores, foi entregue para revisão final, edição e publicação. Até o momento, foram lançados oficialmente 3 livros: Temas em Obstetrícia – Manual de Condutas para médicos e estudantes de medicina, Manual de Intercorrências Clínicas na Gestação e Protocolos de obstetrícia – compilado dos dois livros anteriores, editado e publicado pela Secretaria de Saúde do Estado do Ceará, servindo de embasamento teórico para todos os médicos do Estado alocados em postos de saúde. Encontra-se em fase de elaboração o livro Temas em Ginecologia e a segunda edição do Temas em Obstetrícia, em revisão. Essa iniciativa foi bastante motivadora e espera-se que desta surjam muitas outras, não apenas em ginecologia e obstetrícia, mas em todos os outros serviços que compõem o Hospital Geral de Fortaleza. 5 2 ANTICONCEPÇÃO O planejamento familiar é parte integrante no cuidado com a mulher. A disponibilidade de vários métodos, assim como a facilidade do uso, proporcionam às mulheres e seus companheiros a decisão de quantos filhos ter e o intervalo entre eles. A eficácia de cada método é definida pelo índice de Pearl que é a aferição do número de gestações que ocorrem a cada 100 mulheres que utilizam o método de maneira ideal em um ano. A OMS define critérios de elegibilidade para uso dos anticoncepcionais em relação a condições clínicas apresentadas por cada paciente, sendo divididos em categorias: Categoria 1: o método pode ser empregado sem restrições. Categoria 2: o método pode ser empregado, pois as vantagens geralmente superam os riscos comprovados e possíveis. Categoria 3: o método não deve ser empregado, a menos que o profissional de saúde julgue que a paciente possa usá-lo de maneira segura. Os riscos comprovados e possíveis superam os benefícios do método. Deve ser o método de última escolha e, caso seja utilizado, requer acompanhemento rigoroso. Categoria 4: o método não deve ser empregado, pois apresenta risco inaceitável. 2.1 Contracepção hormonal 2.1.1 Contraceptivos hormonais combinados São formulações que contém a associação do estrogênio etinilestradiol com diversos tipos de progesterona. Atualmente foi lançado no 6 mercado um novo anticoncepcional chamado Qlaira® contendo o valerato de estradiol, um estrógeno natural, e o dienogest como progestágeno. O mecanismo de ação se baseia na inibição da ovulação devido ao efeito inibitório predominante que o estrógeno exerce sobre a secreção do hormônio folículo estimulante (FSH) e do progestágeno sobre a secreção do hormônio luteinizante (LH), possuindo também alguma ação hipotalâmica. Devem ser iniciados no primeiro dia do ciclo e possuem pausa de 7, 4 ou 0 dias entre as cartelas dependendo do número de comprimidos, sendo 21, 24 e 28 dias, respectivamente. Se iniciados em outra fase do ciclo tendo a devida comprovação de ausência de gravidez deve ser associado um método de barreira por 7 dias. Caso a paciente esqueça de tomar 1 pílula deve toma-la imediatamente ao lembrar, tomar a próxima no mesmo horário e seguir com o uso regular. Caso sejam esquecidas 2 ou mais pílulas deve-se toma-las imediatamente ao lembrar e usar métodos de barreira ou evitar relações por sete dias, se restarem mais de 7 pílulas na cartela deve ser feito o uso regular normalmente, caso restem menos de 7 pílulas a paciente deve tomar o restante como de costume e não fazer pausa entre as cartelas, podendo não haver sangramento. Os progestágenos variam de acordo com seu efeito clínico em: Derivados da 17-hidroxiprogesterona com efeito antiandrogênico: acetato de ciproterona, acetato de clormadinona, acetato de medroxiprogesterona (possui efeito androgênico), acetato de megestrol, acetofenido de diidroxiprogesterona. Derivados da 19-nortestoterona com efeito androgênico: noretisterona, acetato de noretisterona, acetato de etinodiol, linestrenol, 7 noretinodrel, levonorgestrel, desogestrel, gestodeno (possui também efeito antimineralocorticóide), norgestimato, norgestrel e dienogest. Derivados da espironolactona com efeito antimineralocorticóide e antiandrogênico: drospirenona. Os anticoncepcionais combinados orais (ACO) podem ser divididos de acordo com a dosagem do estrógeno em: alta com > 50mcg de etinilestradiol; média com 50mcg de etinilestradiol; baixa com 30 a 35mcg de etinilestradiol; muito baixa com 15 a 20mcg de etinilestradiol. Segundo a dosagem do etinilestradiol (EE) os ACOS também são classificados em gerações: primeira geração ACO com 50mcg ou mais de EE; segunda geração ACO com 35ou 30mcg de EE associados a levonorgestrel ou ciproterona; terceira geração ACO com 30mcg ou menos de EE associados a progestágenos de terceira geração como o desogestrel, gestodeno ou norgestimato. Os contraceptivos com dosagem muito baixa são os responsáveis pelos episódios de escapes e maior probabilidade de ausência de sangramento após a interrupção de seu uso (menor estímulo estregênico resulta em atrofia endometrial). Doses de estrógenos maiores que 35mcg estão mais relacionadas a eventos tromboembólicos, este risco pode ser potencializado com o uso associado de uma progesterona, sendo o desogestrel o de maior risco e o levonorgestrel o de menor. Os ACOs podem ser classificados, ainda, em monofásicos quando a dosagem hormonal é constante ao longo do ciclo, bifásico e trifásicos quando a dosagem hormanal apresenta variações tentando mimetizar o ciclo menstrual. Sendo os mais usado os monofásicos. Critérios de elegibilidade para uso de ACOs combinados em condições especiais: 8 Condição OMS, 2009. Obesidade (IMC>30kg/m²) Categoria 2 Tabagista com < 35 anos Categoria 2 Tabagista com > 35 anos < 15 cigarros/dia: categoria 3 >15 cigarros/dia: categoria 4 Hipertensão PAS entre 140 e 159 e PAD entre 90 PA controlada e 99: Categoria 3 PA não controlada PAS>=160 e PAD>=110: Categoria 4 História de AVC isquêmico, Categoria 4 doença cardíaca isquêmica, trombose venosa profunda, embolia pulmonar e uso corrente de anticoagulante, síndrome antifosfolipídeo Diabete Enxaqueca Categoria 2 Sem aura e idade <35 anos: categoria 2 Sem aura e idade > 35 anos: categoria 3 Com aura, independente da idade: categoria 4 Cefaleia Categoria 1 Lactação Antes de 6 semanas: categoria 4 Após 6 semanas: categoria 3 Após 6 meses: categoria 2 Pós parto sem amamentação com Categoria 3 menos de 21 dias Câncer Câncer de mama atual: categoria 4 Câncer cervical antes do tratamento: categoria 2 Câncer hepático benigno ou maligno: categoria 4 9 Cirrose Compensada: categoria 2 Descompensada: categoria 4 Hepatite viral Aguda: categoria 3 ou 4 (dependendo da gravidade) Se o paciente já fazia uso de ACO: categoria 2 Crônica: categoria 1 Cirurgia com imobilização Categoria 4 prolongada LES com SAF positivo ou Categoria 4 desconhecido Doença biliar atual ou Categoria 3 Antecedente de colestase Categoria 3 tratada clinicamente com uso de ACO Fonte: própria. Alguns fármacos como a rifampicina, (fenobarbital, carbazepina, fenitoína, primidona, etc) e anticonvulsivantes antirretrovirais (nelfinavir, ritonavir, lopinavir e nevirapina) reduzem a eficácia dos ACOs, seja por diminuição da quantidade de componentes esteroides ou por alterar sua absorção intestinal. Outros fármacos possuem seu efeito diminuído se utilizados junto com ACOs como a metildopa, hipoglicemiantes e a guanetidina. O uso de ACOs promove uma série de efeitos benéficos para a paciente, dentre eles: regularização do ciclo, alívio da síndrome pré-menstrual (TPM), melhora da acne leve e hirsutismo, diminui fluxo menstrual e a incidência de dismenorreia (sendo, assim indicados para tratamento da hemorragia decorrente da miomatose uterina e melhora sintomática da endometriose), diminui risco de DIP, gravidez ectópica ou doença trofoblástica gestacional, proteção contra cistos e neoplasias de ovário, melhora das doenças benignas das mamas, aumentam a densidade óssea, entre outros. 10 Dentre os efeitos adversos podemos dividí-los em decorrentes dos progestágenos: depressão, cansaço, alteração da libido, amenorreia, acne, ganho de peso, etc; decorrentes dos estrógenos: cefaleia, tonteira, vômitos, náuseas, edema, irritabilidade e cloasma. 2.1.2 Minipílulas O progestágeno tem uma dose de cerca de 1/10 dos ACOs combinados e seu uso deve ser feito de forma contínua. Seu uso é classicamente indicado para a amamentação onde o índice de Pearl é de 0,5. A ação das minipílulas se baseia na atrofia do endométrio e espessamento do muco cervical, a anovulação só ocorre em 40 a 50% dos casos. São compostas de: noretisterona 0,35mg (Micronor®, Norestin®), levonorgestrel 0,030mg (Nortrel®) e linestrenol 0,5mg (Exluton®). Atualmente há no mercado uma progesterona com maior dose: desogestrel 75mcg – Cerazette) que possui índice de Pearl de 0,2 e pode ser usado com maior segurança na anticoncepção. 2.1.3 Contraceptivos injetáveis trimestrais O mais usado é o acetato de medroxiprogesterona na dose 150mg, sendo a primeira injeção administrada até o 5º dia do ciclo e as demais com intervalo de 90 dias. Sua ação consiste na inibição do pico do estradiol e, consequentemente, do LH, inibindo, assim, a ovulação, além de tornar o endométrio atrófico e o muco cervical espesso. O índice de Pearl é de 0,3%. Seu uso pode levar a uma diminuição da densidade óssea, o que em alguns estudos não foi significativo, e é reversível com a descontinuação do uso. 11 Critérios de elegibilidade para uso de progestágenos isolados em condições especiais: Condição OMS, 2009. Tabagista Categoria 1 Hipertensão PA controlada PAS entre 140 e 159 e PAD entre 90 PA não controlada e 99: Categoria 1 PAS>=160 e PAD>=110: Categoria 2 Doença cardiovascular Categoria 2 (AVC, doença cardíaca, fatores de risco múltiplos) Trombose venosa profunda História: categoria 2 Atual: categoria 3 Cirurgia com imobilização prolongada: categoria 2 Diabete Categoria 2 Enxaqueca Categoria 2 Cefaleia Categoria 1 Lactação Antes de 6 semanas: categoria 3 Após 6 semanas: categoria 1 Câncer Câncer de mama atual: categoria 4 Câncer cervical antes do tratamento: categoria 1 Câncer hepático benigno: categoria 2/3 Câncer hepático maligno: categoria 3 Cirrose Compensada: categoria 1 Descompensada: categoria 3 LES com SAF positivo ou desconhecido Fonte: própria. Categoria 3 12 2.1.4 Contraceptivos injetáveis mensais São contraceptivos combinados que possuem em sua composição um estrógeno natural. Devem ser tomadas injeções com intervalos de 27 a 33 dias, sendo a primeira até o 5º dia do ciclo ou na certeza de ausência de gravidez. Apresenta índice de Pearl de 0,06 a 3%. No Brasil temos as seguintes associações: acetofenido de algestona (diidroprogesterona) + enantato de estradiol (Perlutan®); enantato de noretisterona + valerato de estradiol (Mesigyna®) e o acetato de medroxiprogesterona + cipionato de estradiol (Ciclofemina®). 2.1.5 Anel vaginal É conhecido no Brasil pelo nome de Nuvaring®, sendo um anel de evastane flexível, transparente, de 54mm de diâmetro e 4mm de espessura. Cada anel contém 2,7mg de etinilestradiol e 11,7mg de etonogestrel (metabólico biologicamente ativo do desogestrel). O seu uso deve ser iniciado do 1º ao 5º dia do ciclo menstrual, inserir em forma de 8 dentro da vagina, não havendo necessidade de circundar o colo ou local específico. Retirá-lo após 21 dias de uso e pausar 7 dias para ocorrer o sangramento por privação hormonal, após reintroduzir novo anel. O índice de Pearl é 0,3 a 8%. 2.1.6 Implantes subdérmicos São dispositivos contendo progestágenos como o etonogestrel (Implanon®) e o levonorgestrel (Norplant®). O implante de etonogestrel é composto de um bastonete único que contém 68mg do etonogestrel (um metabólito ativo do desogestrel) e tem duração de 3 anos. Seu mecanismo de ação se baseia na inibição da ovulação, atrofia endometrial e espessamento do muco cervical. O índice de Pearl é de 13 0,0 a 0,9%. Pode ser usado com segurança durante a amamentação e possui como principal causa de descontinuação do uso o sangramento irregular. O implante de levonorgestrel é composto por 6 cápsulas e pode ser usado por até 5 anos. O implante deve ser colocado até o 7º dia do ciclo através de um botão anestésico com um aplicador específico que acompanha o produto. O local para a inserção é a cerca de 6 cm da prega do cotovelo, no sulco entre o bíceps e o tríceps na face medial do braço. É importante saber que mulheres acima de 70kg apresentam maior taxa de falha do método. 2.1.7 Adesivo transdérmico São compostos de etinilestradiol e norelgestromin (metabólito ativo do norgestimato) que devem ser aplicados semanalmente (a cada 7 dias) em áreas da pele limpa e secas, preferencialmente em glúteos, face externa do braço, abdome inferior e tronco. Ao final do uso do terceiro adesivo (21 dias de uso) deve se realizar uma pausa de 7 dias para que haja o sangramento de escape. O primeiro adesivo deve ser colocado no primeiro dia da menstruação e deve-se rodiziar semanalmente os locais de aplicação. Caso haja descolamento total ou parcial de um adesivo por mais de 24 horas um novo ciclo deve ser começado, com novo dia de troca e empregar método de barreira por 7 dias. Há uma diminuição da eficácia em pacientes acima de 90kg. O índice de Pearl é de 0,3 a 0,8%. 14 2.2 Dispositivo intrauterino É o método contraceptivo mais usado em todo o mundo. Apresenta excelente relação custo-eficácia, pode ser utilizado por longos períodos e não interfere na atividade sexual. Estão disponíveis os modelos revestidos de substâncias metálicas (cobre) ou hormonais (progestágenos). 2.2.1 DIU de cobre Em formato de “T”, atua promovendo alterações no muco cervical pelo cobre, que impedem a sobrevivência dos espermatozoides. Além de causar reação inflamatória endometrial, que poderá impedir a implantação, caso a fertilização tenha acontecido. Eficaz por até 12 anos. 2.2.2. DIU de levonorgestrel Promove atrofia e decidualização das glândulas endometriais, atuando sobre a migração espermática. Pode ser utilizado por até 5 anos. Critérios de elegibilidade: Categoria 1 (não contraindicam o uso) Categoria 2 (vantagens desvantagens) Tumores ovarianos benignos Endometriose Lactação Tabagismo HAS controlada HAS moderada ou grave (DIU de cobre) Vasculopatias (DIU de cobre) Obesidade Enxaqueca Epilepsia Depressão Nulíparas superam Miomatose uterina História pregressa de evento tromboembólico Doença coronariana isquêmica 15 Categoria 2 (vantagens superam desvantagens) Categoria 3 (não recomendado) Categoria 4 (contraindicam o uso) AVC Dislipidemia Alto risco para DST e DIP Tromboembolismo em curso Doença trofoblástica gestacional Coagulopatias Neoplasia uterina maligna (corpo e colo) Sangramento uterino anormal de causa indeterminada Gravidez em curso DIP ativa ou nos últimos 3 meses Cervicite purulenta Deformidades acentuadas da cavidade uterina Fonte: própria A inserção pode ser realizada em qualquer período do ciclo, preferencialmente durante o período menstrual, uma vez que o procedimento é facilitado pelo amolecimento do colo e a possibilidade de gravidez é muito menor. Durante o uso de métodos hormonais ou na amenorreia por lactação, afastar a possibilidade de gravidez antes da inserção do DIU. As taxas de expulsão são maiores no puerpério imediato e no pósaborto. Recomenda-se aguardar 3-4 semanas antes da inserção. O DIU pode ser removido após a primeira menstruação póslaqueadura ou, se a paciente deseja utilizar um método hormonal, deve inicia-lo antes da remoção do DIU. A substituição do DIU pode ser feita em qualquer fase do ciclo. Caso a mulher deseje engravidar, a remoção pode ser feita em qualquer momento. Após exame pélvico minucioso, verificando a posição do útero e excluindo a presença de infecção, procede-se a limpeza cuidadosa da região vulvar e perineal, vagina e colo com solução de PVPI. Então será passado espéculo e pinçado o lábio anterior do colo do útero com Pozzi. Insere-se delicadamente o histerômetro até o fundo de útero, obtendo-se a medida do 16 tamanho do útero. Coloca-se o dispositivo de inserção através do colo, conforme as instruções do fabricante. Não é necessária a antibioticoprofilaxia, tampouco a solicitação de ultrassonografia para verificar o posicionamento do DIU. Seguindo a técnica correta, os acidentes de inserção são raros. As pacientes devem ser informadas de que podem ocorrer alterações menstruais do tipo spotting, aumento do fluxo e do tempo de sangramento após a inserção do DIU (de cobre – 3 a 6 meses; de levonorgestrel – 2 a 3 meses). A amenorreia acontece em 20% no primeiro ano e chega a 50% no final dos 5 anos de uso do DIU de levonorgestrel. Recomendar o uso de AINEs em caso de sangramento ou dismenorreia. A utilização do DIU reduz o risco absoluto de prenhez ectópica, no entanto, como reduz ainda mais os índices de gestação tópica, faz com que 5 a 8% das gestações que ocorrem na vigência do uso do DIU sejam ectópicas. Não há evidências que contraindiquem o uso do DIU em pacientes nulíparas, porém as taxas de expulsão e as dificuldades no momento da inserção são maiores nestas pacientes. As gestações que ocorrem durante o uso do DIU, têm maiores riscos de aborto, parto prematuro ou infecção. O processo de retirada do DIU pode provocar abortamentos, porém reduz os riscos da gravidez. Nos casos em que os fios estão visíveis, orienta-se retirar o dispositivo. 2.3 Métodos comportamentais São aqueles que dependem das atitudes do casal para sua execução. Baseiam-se na auto-observação de sinais e sintomas fisiológicos do ciclo menstrual, que ajudam a identificar o período fértil. Implicam em modificações do comportamento sexual do casal. 17 2.3.1 Coito interrompido Consiste na retirada do pênis da vagina para ejaculação externa. Sua eficácia é baixa (índice de Pearl 4). Não protege contra DSTs e interfere muito no grau de satisfação do casal. 2.3.2 Método do ritmo ou Ogino-Knaus (tabela) A mulher detecta o seu período fértil mediante controle dos dias do ciclo menstrual. É necessário que os ciclos sejam regulares. Observa-se os ciclos durante 6 meses, então subtrai-se 19 da duração do menor ciclo e obtém-se o primeiro dia do período fértil. A seguir, subtrai-se 11 da duração do maior ciclo, obtendo-se o último dia do período fértil. Índice de Pearl entre 10 e 25. 2.3.3 Método do muco cervival ou Billings Indica a fase fértil por meio da observação das características do muco cervical. A quantidade de muco produzida pode oscilar de acordo com o estímulo estrogênico ao longo do ciclo. Dias antes até imediatamente depois da ovulação, o muco cervical encontra-se fino e aquoso. Nos outros dias, o muco é espesso e opaco. A análise do muco é prejudicada na vigência de infecções vaginais, durante a excitação sexual, após uso de produtos e duchas vaginais ou após relações sexuais. Índice de Pearl 5. 2.3.4 Método da temperatura corporal basal Permite identificar a fase fértil por meio de oscilações da temperatura corporal basal durante o ciclo menstrual. Há uma redução discreta na temperatura de 24 a 36h depois da ovulação, a seguir há um aumento repentino de 0,3 a 0,4oC, permanecendo neste platô até 1 a 2 dias antes da próxima menstruação. O terceiro dia após o início da elevação da temperatura é considerado o final do período fértil. A persistência da elevação da 18 temperatura pode indicar gravidez. A medida da temperatura deve ser realizada com o mesmo termômetro, sob as mesmas condições, à mesma hora, sempre após 2 horas de repouso, no mínimo. Índice de Pearl de 2 a 3. 2.3.5 Método sintotérmico Consiste na combinação de vários métodos, associando o cálculo pré-ovulatório de Ogino-Knaus, as alterações no muco cervical e o registro da temperatura basal. Aumenta a segurança contraceptiva, se usado corretamente. Índice de Pearl 1 a 2. 2.3.6 Método da amenorreia lactação Fundamenta-se na amamentação, que provoca diminuição nas secreções de GnRH e, consequentemente, do FSH e do LH. A prolactina elevada também resulta em amenorreia e anovulação. O método exige aleitamento materno exclusivo e intervalos curtos e regulares entre as mamadas. Válido apenas nos 6 primeiros meses pós-parto, quando deve ser iniciado outro método. Índice de Pearl 0,9 a 2. 2.4 Métodos de Barreira Oferecem obstáculo à ascensão dos espermatozoides, impedindo a gravidez. 2.4.1 Condom masculino Fabricado em látex, deve ser colocado com o pênis ereto, antes da penetração e retirado imediatamente após a ejaculação. Tem eficácia comprovada e, quando usado de forma correta e regular, reduz em cerca de 80% a incidência de infecção pelo vírus HIV. 19 2.4.2 Condom feminino Consiste em cilindro de poliuretano com um aro que se adapta ao colo, revestindo todo o canal vaginal e parte da vulva. Proporciona à mulher o controle do seu uso. Maiores dificuldades técnicas para o seu uso em relação ao condom masculino, porém com índices de eficácia semelhantes. 2.4.3 Diafragma Capuz cervical de borracha que cobre o colo do útero e impede a ascensão dos espermatozoides. Pode ser introduzido pela mulher até 6 horas antes do coito e deve ser retirado após 8 horas. Tem maior eficácia quando associado a espermaticidas. 2.4.4 Espermaticidas São substâncias químicas que agem inativando ou matando os espermatozoides. Sua apresentação mais usada é a geléia de monoxinol-9, mas também são encontrados sob forma de comprimidos, espumas vaginais, supositórios ou películas dissolvíveis. Devem ser usados de 15 a 30 minutos antes do coito e, preferencialmente, associados a outros métodos. 2.4.5 Microbicidas Há vários produtos químicos em fase de teste para uso vaginal ou retal com o objetivo de prevenir a transmissão de DSTs e promover contracepção. 20 2.5 Métodos cirúrgicos 2.5.1 Laqueadura tubárea Consiste na obstrução tubárea bilateral, interrompendo seu trânsito e impedindo a fecundação. A técnica mais utilizada é a de Pomeroy, onde a ligadura é feita na porção ampular-ístmica da tuba, após realização e ressecção de alça e amarração com fio inabsorvível. Pode ser realizada por laparotomia, laparoscopia, colpotomia (via vaginal) ou histeroscopia (obstrução dos óstios tubários). No Brasil, a mulher deve ter pelo menos 25 anos ou 2 filhos vivos e assinar consentimento informado junto com o marido. A cirurgia não deve ser realizada durante a cesárea, exceto se a indicação for obstétrica (risco de vida materna em futura gestação). A síndome pós-laqueadura consiste nas mudanças do ciclo menstrual, principalmente a hipermenorréia, associada a dismenorreia, atribuída a falhas no suprimento vascular ovariano decorrentes das ligaduras no procedimento cirúrgico. As taxas de reversibilidade, quando a reanastomose é realizada por cirurgião treinado, alcançam 80% de êxito. Entretanto, o sucesso da cirurgia depende do método da laqueadura, do comprimento e vitalidade dos seguimentos a serem unidos, da idade da mulher no momento da reversão e do espermograma do parceiro. 2.5.2 Vasectomia Técnica de esterilização maculina que impede a presença de sêmen no ejaculado, através da ligadura dos ductos deferentes. Não altera o aspecto do sêmen e o desempenho sexual do homem. É método muito eficaz, com taxa de gravidez de 0,15% a cada 100 homens. Durante os 3 primeiros meses póscirurgia, é importante a utilização de métodos de barreira. O sucesso da 21 reversibilidade depende do tempo entre a realização da vasectomia e a tentativa de reversão. As taxas de sucesso em menos de 3 anos chegam a 75%. 2.6 Anticoncepção nos extremos da vida reprodutiva Continua a ser tema desafiador devido as peculiaridades da gravidez nestes dois períodos extremos da vida reprodutiva das mulheres. 2.6.1 Anticoncepção na adolescência Nesta época, a gravidez, geralmente indesejada, acarreta modificações profundas nas vidas das jovens, não só físicas, como emocionais e sociais. Devemos garantir o acesso aos métodos contraceptivos e à informação sobre saúde reprodutiva preferencialmente antes do início da vida sexual. A orientação referente ao método deve ser individualizada, baseada no perfil de cada adolescente, suas consições de saúde e suas preferências. Anticoncepcionais combinados orais (ACOs): são os mais populares e mais solicitados pelas adolescentes. Além da contracepção, oferece outros efeitos benéficos, como regularidade menstrual, redução do fluxo, alívio da dismenorreia, melhora da acne e do hirsutismo, entre outros. Os efeitos indesejáveis são: spottings, ganho de peso, mastalgia, náuseas e cefaleia. Dar preferência aos compostos com doses de etinilestradiol inferiores a 30µg associados a progestágenos sem atividade androgênica e/ou com efeito antimineralocorticóide. Injetável mensal: bem aceito pelas adolescentes pela sua praticidade e menor risco de esquecimento. 22 Adesivo transdérmico: Eficácia semelhante aos contraceptivos orais, tem como vantagem a eliminação da primeira passagem hepática. É possível praticar exercícios físicos, natação ou sauna. Anel vaginal: Por requerer manipulação dos genitais, pode não ser bem aceito nesta faixa etária. Progestágenos de uso contínuo (minipílulas): Deve ser usada com restrições antes dos 16 anos, pois existe preocupação com seu efeito hipoestrogênico. Injetável trimestral: Há questionamentos sobre seu uso na adolescência (<16 anos), pela possibilidade de inibição intensa do eixo hipotálamo-hipofisário, o que poderia cursar com diminuição da densidade óssea e hipodesenvolvimento puberal. Implantes: As únicas peculiaridades são risco de infecção no local do implante e a possibilidade de deixar cicatriz. Anticoncepção de emergência: Consiste no uso de compostos hormonais concentrados nos dias seguintes a uma relação sexual desprotegida. Somente deve ser utilizada neste contexto. Pode ser realizada com pílulas de levonorgestrel (0,75mg, 12/12h ou 1,5mh em dose única). Iniciar o mais precoce possível, em até 72 horas após a relação desprotegida ou a falha do método contraceptivo. Atua bloqueando a ovulação e interfere na capacitação dos espermatozoides através do espessamento do muco cervical. Não atua após a fecundação, tampouco impede a nidação. Diminui os índices de abortamentos provocados. Dispositivos intrauterinos (DIU): Como dito anteriormente neste capítulo, não há evidências que contraindiquem o uso do DIU em pacientes nulíparas, porém as taxas de expulsão e as dificuldades no momento da inserção são maiores nestas pacientes. Cuidar apenas para o risco aumentado de aquisição de DIP pela multiplicidade de parceiros nesta fase da vida da paciente. Métodos comportamentais: Não são métodos com boa indicação na adolescência, por exigirem conhecimento da fisiologia do ciclo menstrual e disciplina do casal. 23 Métodos de barreira: Embora sejam de baixa eficácia contraceptiva, se comparado aos métodos hormonais, sua utilização é altamente recomendada devido ao seu efeito protetor contra DSTs. 2.6.2 Anticoncepção no climatério Neste período, a gravidez vem frequentemente associada a doenças que acarretam maior risco à saúde materno-fetal, como hipertensão, diabetes e malformações fetais. Por volta dos 40 anos de idade, a frequência dos ciclos anovulatórios aumenta gradativamente, tornando os ciclos menstruais irregulares. Os métodos mais indicados no climatério são: Anticoncepcionais combinados orais (ACO): Mulheres hígidas, sem história de eventos tromboembólicos e não tabagistas, não têm contraindicação ao uso deste método. Para suspender o uso do ACO, dosar FSH no 7o dia após a tomada da última pílula. Valores superiores a 35mUI/L indicam falência ovariana. Progestágenos de uso contínuo (minipílulas): São uma boa opção para mulheres nesta faixa etária, com restrições ao uso de estrógenos. Implantes: Promovem excelente proteção endometrial e diminuem o sangramento uterino. Injetável trimestral: Outra boa opção quando há restrições ao uso de estrógenos. Métodos de barreira: Devem ser sempre estimulados. A adesão depende da frequência sexual e da motivação do casal. Os preservativos masculinos não costumam ser bem aceitos por homens em relação conjugal estável. 24 Dispositivo intrauterino (DIU): O DIU de cobre pode alterar o já desregulado ciclo menstrual, dificultando a adesão a este método. Já o DIU de levonorgestrel promove excelente proteção endometrial, cursando com amenorreia na maioria das mulheres. Esterilização cirúrgica: São excelentes métodos para casais que desejam contracepção nesta faixa etária. 2.7 Bibliografia BEREK, Jonathan S. et al. Tratado de Ginecologia [tradução Cláudia Lúcia Caetano de Araújo; revisão Ronaldo Carauta de Souza]. 14º ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. 1392 p. BALDWIN, Maureen K et al. Contraception during perimenopause. Maturitas. July 2013. FREITAS, Fernando et al. Rotinas em Ginecologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.736 p. HURT, K. Joseph et al; tradução: Maria da Graça Figueiró da Silva Toledo; revisão técnica: Ricardo F. Savaris. Manual de ginecologia e obstetricia do Johns Hopkins. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012. 720 p. 25 3 LESÕES INTRAEPITELIAIS CERVICAIS Lesão precursora do câncer do colo do útero de evolução lenta para invasão (10 a 15 anos). O câncer cervical, ocupa o segundo lugar mundial entre os cânceres mais comuns na população feminina.(5). A infecção pelo papilomavírus humano (HPV), uma das mais comuns doenças sexualmente transmissíveis, é fator essencial para o aparecimento do câncer cervical. A persistência da infecção é fator primordial para a evolução da lesão. Logo, situações que comprometam a imunidade podem diminuir o clearance viral e aumentar essa chance. 3.1 Conceitos fundamentais Epitélio colunar (cilindrico) simples: epitélio característico da região endocervical, responsável pela secreção do muco cervical. Epitélio escamoso estratificado não queratinizado: epitélio caraterístico da região da ectocérvice. Confere proteção à região. Também reveste os fundos de saco e a vagina em toda a sua extensão. Junção escamocolunar (JEC): o ponto de encontro entre o epitélio colunar simples da endocérvice com o epitélio escamoso não queratinizado da ectocérvice. Teoricamente, a JEC deve situar-se ao nível do orifício externo do colo, mas diversos fatores fisiológicos podem modificar sua posição, como idade e uso de hormônios. Metaplasia escamosa: processo fisiológico de transformação do epitélio colunar em escamoso, que origina uma nova JEC (zona de transformação) Zona de transformação: região entre a JEC primitiva (original) e a nova JEC (fisiologicamente ativa). Ou seja, corresponde a região que sofreu metaplasia escamosa. 26 Ectopia ou ectrópio: é quando a JEC ativa encontra-se deslocada para fora do orifício externo do colo uterino. 3.2 Manifestações clínicas As lesões intraepitelias cervicais e os tumores em fases iniciais são geralmente assintomáticos. Os tumores em estágios mais avançados normalmente apresentam sintomas inespecíficos como dor, corrimento vaginal e perdas sanguíneas anormais. 3.3 Papilomavírus humano (HPV) A maioria das infecções é assintomática ou subclínica, evoluindo para cura espontânea em cerca de dois anos, fato esse mediado, principalmente, pela imunidade da paciente. 27 É considerado fator de risco em pelo menos 90% dos casos de cânceres cervicais por apresentar oncogenes (E6 e E7) que inibem vários processos antineoplásicos da cérvice uterina. Além do HPV outro fatores estão relacionados: idade, multiparidades tabagismo, coinfecção por outros agentes de DSTs e doenças imunossupressoras, múltiplos parceiros, inicio precoce da atividade sexual e multiparidade. A transmissão se dá por contato sexual, facilitado por presença de fissuras da pele ou mucosas, provocadas pelo trauma tecidual das relações. O padrão da infecção é praticamente anérgico, não causando viremia e não destruindo a célula que o hospeda. Mais de 200 tipos de HPV foram identificados, entre os quais podem ser classificados como de baixo, intermediário ou alto risco para o desenvolvimento de câncer cervical. Pelo menos 14 são considerados de alto risco oncogênico. Os tipos 16 e 18 são responsáveis por cerca de 70% dos cânceres cervicais, e os tipos 6 e 11 causam condiloma acuminado, ou verrugas genitais O pico de incidência está entre 15 e 25 anos, logo após o início da atividade sexual. Em contrapartida, observa-se uma maior taxa de infecção transitória nessas pacientes jovens. Grávidas, imunossuprimidas e diabéticas possuem risco aumentado de lesões mais graves, devido a menor taxa de clareamento viral, conforme já discutido. O diagnóstico das lesões intraepiteliais induzidas por HPV é baseado no tripé: citologia, colposcopia e biópsia; sendo o histopatológico o padrão ouro. Podem ser realizados também métodos que permitem identificar o DNA viral no sítio da lesão: captura híbrida e PCR (genotipagem). Captura Híbrida para HPV de alto risco: teste com maior sensibilidade que a citologia, mas cujo custo-efetividade é desfavorável para ser usada como rastreamento no Brasil. A Sociedade Americana (ASCCP) preconiza rasteio com citologia combinada a teste de HPV( co-teste Pap) , nas mulheres acima de 30 anos, de forma que, se ambos estão normais, pode-se repetir os exames apenas com 5 anos. Apenas os teste de HPV de alto risco 28 são recomendados para rastreamento do câncer cervical. Algumas indicações para Captura Híbrida: ASC-US em paciente com mais de 30 anos de idade; após seis meses do tratamento de NIC II/III (para quantificar risco de recidiva); AGC; rastreamento (segundo o protocolo da ASCCP, 2007). Genotipagem para HPV de alto risco: utiliza a técnica de PCR e permite identificar pacientes portadoras especificamente dos subtipos 16 e 18, que são aqueles considerados de “altíssimo risco”. Dispomos de duas vacinas contra o HPV: a quadrivalente (HPV 6, 11, 16 e 18) para mulheres com 9 a 26 anos de idade, administrada em 3 doses intramusculares em 0, 60 e 180 dias; e a bivalente (HPV 16, 18) para mulheres com 10 a 25 anos de idade, administrada também em 3 doses intramusculares em 0, 30 e 180 dias. Estas vacinas ainda não são aprovadas para uso em gestantes e pacientes imunossuprimidas. 3.4 Diagnóstico citológico Método de rastreamento do câncer de colo uterino e suas lesões precursoras. Atualmente dispõe-se da citologia convencional (coletada com espátula de Ayre e citobrush, sendo o material transferido para uma lâmina) e da citologia em meio líquido. 3.5 Citologia em meio líquido Técnica mais cara, que possibilita maior transferência de células para o meio e através da qual se obtém um esfregaço de camada celular única, uniforme. Permite, ainda, a possibilidade de testagem adicional para DNAHPV no líquido remanescente. É um teste que teoricamente reduz erros de amostragem e preparo, aumentando para 80% a sensibilidade do exame e reduzindo em 70% 29 a taxa de esfregaço insatisfatório; apresenta resultados semelhantes a da citologia convencional na prevenção do câncer. DIRETRIZES DE RASTREAMENTO DO CÂNCER CERVICAL COM CITOLOGIA DIRETRIZ MINISTÉRIO DA ACS (American ACOG (American SAÚDE Cancer Society) College of Obstetricians and Gynecologist) Rastreamento 25 anos de 21 anos de idade ou 21 anos de idade inicial 3 anos após relação ou 3 anos após sexual vaginal. relação sexual idade. vaginal. Intervalo Uma vez por ano Anual para citologia Anual para e, após dois convencional. citologia exames anuais A cada 2 anos para convencional e em consecutivos citologia em meio meio líquido. negativos, a cada líquido. A cada 2-3 anos três anos. A cada 2-3 anos após 30 anos com após 30 anos com 3 3 exames normais exames normais consecutivos. consecutivos. Interromper 64 anos.Devem 70 anos se houver 3 Não há limite ser interrompidos exames normais máximo de idade. após 64 anos consecutivos em 10 nas mulheres anos. que tiveram pelo Histerectomia em menos dois qualquer idade por exames doença benigna. negativos consecutivos nos últimos cinco anos. 30 Fonte: Própria. A nomenclatura dos exames citopatológicos utilizados no Brasil foi baseada no Sistema Bathesda e, para os exames histopatológicos, é utilizada a nomenclatura de Richart. 3.6 Outros achados citológicos Alterações citopatológicas que sugerem a presença de HPV: coilocitose, discariose e disceratose. Fungos morfologicamente compatíveis com Candida. Trichomonas vaginalis. Alterações celulares compatíveis com vírus do herpes simples Bactérias morfologicamente compatíveis com Actinomyces: achado típico de pacientes usuárias de DIU. 3.7 Colposcopia 3.7.1 Definição Consiste na visualização do colo uterino através de colposcópio, após aplicação de ácido acético (3 ou 5%) e lugol. O ácido acético coagula proteínas celulares. Portanto, quanto mais proteína, mais esbranquiçada fica a lesão. Como há maior concentração proteica nas células alteradas, o acetobranqueamento é um marcador de lesão suspeita. É importante observar o colo antes da aplicação do ácido acético: se há áreas avermelhadas que denotem neovascularização e se as mesmas tornam-se brancas após a ação do ácido. 31 O lugol é usado para realização do Teste de Shiller com a finalidade de identificar áreas do epitélio escamoso desprovidas de glicogênio (que não se coram pelo iodo). A colposcopia é considerada satisfatória quando a JEC é visualizada. Quando isso não acontece a investigação do canal endocervical é formalmente indicada. 3.7.2 Indicações de colposcopia 1. ASC-US (controversa sua indicação como conduta inicial) 2. LIE-BG 3. Duas citologias consecutivas com resultado citológico de ASC-US ou LIE-BG 4. Paciente com idade acima de 30 anos e teste de HPV positivo para alto risico.( Asccp 2013) 5. Paciente imunossuprimidas com LIE-BG ou ASC-US na citologia. 6. Resultado citológico de LIE-AG 7. Resultado citológico de ASC-H 8. Resultado citológico de AGC 9. Resultado citológico de Lesão intraepitelial de alto grau não podendo excluir microinvasão ou carcinoma epidermóide invasor 10. Resultado citológico de Adenocarcinoma in situ e invasor 32 Terminologia colposcópica do colo uterino IFCPC 2011¹ Colposcopia adequada ou inadequada Avaliação geral (especificar o motivo: sangramento, inflamação, cicatriz, etc) Visibilidade da junção escamocolunar: completamente visível, parcialmente visível e não visível Zona de transformação Tipo 1,2 e 3 Achados Epitélio escamoso original colposcópicos Maduro normais Atrófico Epitélio colunar Ectopia Epitélio escamoso metaplásico Cistis de Naboth Orifícios (glândulas) abertos Deciduose na gravidez Achados Princípios gerais Localização da lesão: colposcópicos dentro ou fora da ZT e anormais de acordo com a posição do relógio Tamanho da lesão: número de quadrantes do colo uterino envolvidos pela lesão e tamanho da lesão em porcentagem uterino do colo 33 Grau 1 (menor) Epitélio tênue, acetobranco de borda irregular ou geográfica, Mosaico fino, Pontilhado fino. Grau 2 (maior) Epitélio acetobranco denso, acetobranqueamento de aparecimento orifícios rápido, glandulares espessados, Mosaico grosseiro, Pontilhado grosseiro, Grau 2 (maior) Margem sinal demarcarda, da margem interna, Sinal da crista (sobrelevado) Não específico Leucoplasia (queratose, hiperqueratose), erosão, captação da solução de lugol: positiva (corado) ou negativa (não corado) (teste de shiller negativo ou positivo) Suspeita de invasão Vasos atípicos Sinais adicionais: vasos frágeis, superfície irregular, lesão exofítica, necrose, ulceração (necrótica), neoplasia tumoral/grosseira Miscelânea Zona de transformação congênita, condiloma, pólipo (ectocervical/endocervical), inflamação, estenose, anomalia congênita, sequela pós-tratamento, endometriose Fonte: International Federation for Cervical Pathologyand Colposcopy. 34 Terminologia colposcópica do colo uterino IFCPC 2011¹ - Apêndice Tipos de Tipo de excisão 1, 2 e 3 tratamento excisional do colo uterino Dimensões do Comprimento: corresponde à distância da margem espécime da distal/externa à margem proximal/interna excisão Espessura: distância da margem estromal à superfície do espécime excisado Circunferência (opcional): perímetro do espécime excisado Fonte: International Federation for Cervical Pathologyand Colposcopy. Terminologia colposcópica da vagina IFCPC 2011¹ Avaliação Colposcopia adequada ou inadequada (especificar o geral motivo do sangramento, inflamação, cicatriz, etc.) Achados Epitélio escamoso original colposcópicos Maduro normais Atrófico Achados Princípios gerais Terço superior/2 terços inferiores colposcópicos Anterior/posterior/lateral (direito ou anormais esquerdo) Grau 1 (menor) Epitélio acetobranco tênue Mosaico fino Pontilhado fino Grau 2 (maior) Epitélio acetobranco denso Mosaico grosseiro Pontilhado grosseiro Suspeita de Vasos atípicos invasão Sinais adicionais: vasos frágeis, superfície irregular, lesão exofítica, necrose, ulceração (necrótica), neoplasia tumoral/grosseira Não específico Epitélio colunar (adenose) Captação da solução de lugol: positiva (corado) ou negativa (não corado) (teste de Shiller negativo ou positivo) Miscelânea Erosão (traumática), condiloma, pólipo, cisto, endometriose, inflamação, estenose vaginal, zona de transformação congênita Fonte: International Federation for Cervical Pathologyand Colposcopy. 35 3.8 Histopatológico Padrão-ouro no diagnóstico das afecções cervicais. Material para esse estudo pode ser proveniente de biópsia incisional dirigida por colposcopia, conização, curetagem endocervical ou biópsia excisional através de cirurgia de alta frequência (EZT). CLASSIFICAÇÃO DE RICHARDT (1967) A classificação de Richardt foi proposta para diagnósticos histopatológicos. No entanto, posteriormente, passou a ser empregada na citopatologia. NIC 1 o Presença de células atípicas em até 1/3 do epitélio o Apenas 25% progridem para NIC II em dois anos NIC II o Presença de células atípicas em 1/3 a 2/3 do epitélio. o 5% progridem para câncer invasor NIC III o Presença de células atípicas em mais de 2/3 do epitélio. o 20% progridem para câncer invasor o Quando a atipia celular atinge toda a espessura do epitélio, mas não ultrapassa a membrana basal, a lesão é denominada de carcinoma in situ. Fonte: Própria. 36 3.9 Interpretação e conduta de acordo com os achados citológicos 3.9.1 Resultado normal: seguir rotina de rastreamento citológico. 3.9.2 Alterações celulares benignas: Inflamação sem identificação do agente: seguir rotina de rastreamento citológico. Havendo queixa clínica de leucorréia, a paciente deverá ser encaminhada para exame ginecológico. Reparação: seguir rotina de rastreamento citológico. Metaplasia escamosa imatura: seguir rotina de rastreamento citológico. Atrofia com inflamação: seguir rotina de rastreamento citológico. Caso o laudo do exame mencionar dificuldade diagnóstica decorrente da atrofia deve ser prescrito administração vaginal de creme de estrogênios conjugados, 0,5 g (0,3mg) ou de creme de estriol, 1g. São dois esquemas alternativos de um a três meses: durante 21 dias com intervalo de 7 dias; ou duas vezes por semana, sempre nos mesmos dias. Nova citologia deve ser realizada após sete dias da parada do uso. Radiação: seguir rotina de rastreamento citológico. Outros achados: achados microbiológicos como Lactobacillus sp., cocos e outros bacilos são considerados achados normais. Quando houver queixa clínica de leucorréia, prurido vulvar ou odor genital a paciente deve ser encaminhada para exame ginecológico. Recomendações especiais: mulheres até 20 anos de idade, gestantes, na pós-menopausa e imunossuprimidas com alterações benignas não demandam recomendações especiais. 3.9.3 ASC-US ou Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado, possivelmente não neoplásicas: 37 Em mulheres com 30 anos de idade ou mais a recomendação é a repetição da citologia em seis meses, precedida, quando necessário, do tratamento dos processos infecciosos e de melhora do trofismo genital. Em mulheres com idade inferior a 30 anos a repetição colpocitológica está recomendada no intervalo de 12 meses. Se dois exames citopatológicos subsequentes forem negativos a paciente deverá retornar à rotina de rastreamento. Porém, se o resultado de alguma citologia for igual ou mais significativa a paciente deverá ser encaminhada para colposcopia. Na colposcopia sem alterações está recomendado o retorno ao rastreio semestral ou anual dependendo da faixa etária. Na colposcopia com alterações, deve-se realizar biópsia. Em mulheres até 20 anos está recomendado acompanhamento citopatológico anual por até dois anos. Considera-se regressão quando ocorrerem duas citologias consecutivas negativas. Em caso de persistência após este período ou alterações mais relevantes a paciente deverá ser encaminhada para colposcopia. Em gestantes a abordagem não é diferente. Mulheres imunossuprimidas com este resultado citológico devem ser encaminhadas para colposcopia já no primeiro exame alterado. A conduta acima corresponde àquela preconizada pelo Ministério da Saúde. A ASCCP (Sociedade Americana de Colposcopia e Patologia Cervical), entretanto, admite outras 2 opções para não adolescentes: encaminhamento imediato para colposcopia ou solicitação de teste de DNAHPV. Este sendo negativo, a paciente retornaria ao seguimento anual. 3.9.4 ASC-H ou Células Escamosas Atípicas de significado Indeterminado, quando não se pode excluir lesão intraepitelial de alto grau A conduta padrão é o encaminhamento dessas pacientes para colposcopia. Quando não são evidenciadas alterações à colposcopia, nova citologia está indicada com 6 meses. 38 No resultado citológico, quando se mantém o mesmo diagnóstico ou mais grave, mesmo na ausência de achados colposcópicos, está recomendado a Exérese da Zona de Transformação (EZT). Na presença de alterações colposcópicas deve-se proceder à biópsia. Caso o diagnóstico histopatológico seja negativo ou compatível com NIC I, em colposcopia satisfatória, uma nova citologia está indicada com seis meses e retorno ao rastreamento habitual após duas citologias negativas seguidas. Resultado histológico com NIC II ou III- seguir protocolo específico Em caso de exame colposcópico insatisfatório que não revela alterações, deverá ser colhida uma nova citologia endocervical. Se a nova citologia mantiver o mesmo resultado ou mostrar lesão de alto grau ou suspeita de câncer é recomendável a conização para diagnóstico. Caso a nova citologia seja negativa uma nova citologia deve ser repetida após seis meses e retorno ao rastreamento habitual após duas citologias negativas seguidas. Alternativamente a uma nova citologia, pode ser solicitada a revisão da lâmina. Se presentes alterações colposcópicas, mesmo no exame insatisfatório, deve ser realizada biópsia. Em mulheres até 20 anos a conduta inicial é solicitar colposcopia. Em caso de resultados negativos ou menores é indicado seguimento citológico anual. Achados colposcópicos maiores indicam realização de biópsia. Em gestantes o encaminhamento para colposcopia e realização de biópsia é indicado apenas se houver suspeita de lesão invasora. Assim, a paciente deverá ser reavaliada após dois meses do parto para confirmação diagnóstica e decisão terapêutica. Em pacientes imunossuprimidas a conduta é a mesma das demais pacientes. 39 3.9.5 AGC (denominação atual de AGUS) ou células glandulares atípicas de significado indeterminado. Pacientes com esse diagnóstico citológico devem ser encaminhadas para colposcopia. Além da colposcopia, deve ser realizada coleta de material para citologia do canal cervical (escovado endocervical). É recomendável a avaliação endometrial (ultrassonografia e/ou estudo anatomopatológico) em paciente acima de 35 anos e/ou com sangramento uterino anormal. Qualquer alteração evidenciada à colposcopia deve ser biopsiada. Seguir recomendações específicas em caso de exame histopatológico compatível com AIS/invasor. No caso de diagnóstico histopatológico de NIC II ou NIC III devese buscar excluir doença glandular (através do escovado endocervical e avaliação endometrial). Caso a nova citologia mantenha o diagnóstico de AGC, independente do diagnóstico de doença escamosa, é recomendável conização do útero. Se a nova citologia sugerir doença escamosa ou for negativa, seguir recomendação específica para o diagnóstico obtido pela biópsia ou pela nova citologia (o que for mais grave). Caso o resultado da biópsia seja negativo ou na ausência de lesões à colposcopia, considerar o diagnóstico da nova citologia para definir conduta. Caso mantenha o diagnóstico de AGC é recomendável conização do colo. Se a nova citologia for negativa deve-se dar seguimento com citologias semestrais. Após dois anos com exames semestrais normais a paciente retorna ao rastreamento habitual. Nos casos de persistência de AGC, em que não foi possível concluir diagnóstico de patologia do colo, mesmo com ultrassonografia normal, estará indicada a avaliação histológica endometrial. 40 3.9.6 LIE-BG ou LSIL ou Lesão Intraepitelial de Baixo Grau A literatura é controversa frente a essa alteração. A conduta do Ministério da Saúde é a repetição do exame citopatológico em seis meses, já a ASCCP recomenda o encaminhamento imediato à colposcopia. Processos infecciosos ou atrofias devem ser tratados antes da nova coleta citológica. Se a citologia de repetição for negativa em dois exames consecutivos a paciente deverá retornar ao rastreamento habitual. Se qualquer citologia subsequente for alterada a paciente deverá se encaminhada para realizar colposcopia. Na colposcopia, satisfatória ou insatisfatória, se qualquer alteração do colo do útero, deve-se realizar biópsia. Na colposcopia sem alterações é recomendado controle citológico semestral. Após dois exames citológicos normais consecutivos a paciente retorna ao rastreamento habitual. Caso persista o diagnóstico citopatológico de LSIL, a mulher deverá continuar em seguimento citológico semestral até que os exames retornem à normalidade. Se diagnóstico subsequente de maior gravidade, seguir conduta de protocolo específico. Frente ao diagnóstico histopatológico de NIC I recomenda-se o seguimento citológico semestral ou anual. Mulheres com mais de 21 anos de idade com persistência de NIC I por 24 meses a manutenção do seguimento citológico ou tratamento são aceitáveis. O tratamento, frente à colposcopia satisfatória, pode ser através de métodos destrutivos (eletrocauterização, criocauterização ou laserterapia) ou EZT. Nos casos de lesões recorrentes o tratamento excisional se faz necessário. Na colposcopia insatisfatória, a conização estará indicada. 41 Em mulheres até 20 anos está indicada a repetição do citopatológico a cada 12 meses, sendo referidas para colposcopia somente se houver persistência desse diagnóstico por 24 meses. Métodos excisionais não estão indicados antes dos 21 anos. Em gestantes com 30 ou mais semanas de gestação é indicado colposcopia após três meses do parto. Só deverão ser submetidas à biópsia as gestantes com alterações colposcópicas sugestivas de invasão. Pacientes gestante com histopatológico de NIC I devem aguardar até três meses após o parto para reavaliação. Se alterações colposcópicas maiores ainda no primeiro trimestre, nova reavaliação ainda na gravidez pode ser feita. Mulheres na pós-menopausa devem ser abordadas como as demais mulheres, mas a segunda amostra citológica deve ser precedida de tratamento da colpite atrófica. Mulheres imunossuprimidas devem ser encaminhadas imediatamente para colposcopia. As lesões persistentes devem ser tratadas excisionamente, com EZT ou conização (esta em caso de zona de transformação não completamente visível). 3.9.7 LIE-AG ou HSIL ou Lesão Intraepitelial de Alto Grau A conduta inicial é o encaminhamento para colposcopia. Se paciente maior de 20 anos, colposcopia satisfatória com alterações maiores, sugestivas de alto grau, restritas ao colo do útero, lesão totalmente visível e não se estendendo além do primeiro centímetro do canal a conduta recomendada é a EZT (ver e tratar). Caso a alteração colposcópica se estenda à periferia do colo ou para a vagina, deve-se considerar a possibilidade de neoplasia intraepitelial grau I concomitante. Nesse caso, avaliar a necessidade de biópsia para diagnósticos nesses locais. Lembrando que o procedimento excisional deve ser direcionado para as alterações maiores e as demais áreas podem ser tratadas de forma destrutiva ou deixadas sem tratamento. 42 Caso a colposcopia seja satisfatória e sugira lesão de baixo grau ou sugestiva de câncer, uma biópsia deve ser realizada. Se biópsia negativa ou apresentar diagnóstico de menor gravidade deve-se repetir a citologia e a colposcopia em três a seis meses e adotar conduta específica de acordo com o novo laudo. Quando biópsia compatível com NIC II ou NIC III ou sugestiva de microinvasão um método excisional deve ser realizado (EZT no caso de colposcopia satisfatória, ou conização, no caso de colposcopia insatisfatória) Se a colposcopia não evidenciar lesão, uma nova citologia, com ênfase no canal endocervical, deverá ser colhida após três meses. Se esta nova citologia apresentar o mesmo resultado uma EZT ou conização deverá ser realizada, caso a colposcopia seja satisfatória ou insatisfatória, respectivamente. A biópsia somente será útil caso o aspecto colposcópico seja sugestivo de lesão invasiva, pois, se confirmação de câncer, dispensará a conização. Em mulheres com até 20 anos também está indicado a colposcopia. Na ausência de alteração colposcópica ou na ausência de alteração colposcópica maior a mulher deverá repetir o exame citopatológico em três a seis meses e uma nova conduta deverá ser adotada conforme o resultado. Na presença de alteração colposcópica maior, deve ser realizada a biópsia. Se a biópsia for negativa ou apresentar diagnóstico de menor gravidade deve-se repetir a citologia entre três e seis meses e adotar conduta específica. Se a biópsia mostrar presença de NIC II ou NIC III a paciente deverá ser seguida com citologia semestral por até dois anos. Após este período, em caso de persistência da lesão a paciente poderá ser mantida em seguimento ou tratada de forma excisional e destrutiva. No caso de colposcopia insatisfatória com biópsia mostrando NIC II/III estará indicada a conização. A conduta nas gestantes é o encaminhamento para colposcopia. A biópsia só deve ser realizada caso a colposcopia apresente aspecto sugestivo de invasão. Na ausência de suspeita colposcópica de invasão ou 43 diante de um diagnóstico histopatológico de NIC II ou NIC III recomenda-se conduta expectante com reavaliação de novo exame citopatológico e colposcopia 90 dias após o parto. Em mulheres na pós-menopausa a conduta também será a colposcopia, porém com o intuito de melhorar a condição do exame, recomenda-se que a mulher seja preparada com estrogênio. A conduta para mulheres imunossuprimidas é a mesma das demais, difere apenas no seguimento: exame citopatológico semestral por dois anos e anual após este período. 3.9.8 Lesão intraepitelial de alto grau não podendo excluir microinvasão ou carcinoma epidermóide invasor Encaminhamento imediato à colposcopia Se presentes alterações sugestivas de invasão, realizar biópsia. Se não, realizar EZT ou conização, respectivamente, nos casos de colposcopia satisfatória ou não. 3.9.9 Conduta subsequente de acordo com laudo histopatológico Adenocarcinoma in situ e invasor Encaminhamento imediato à colposcopia Se alteração sugestiva de invasão, realizar biópsia, caso contrário, proceder à conização. Realizar investigação endometrial (com US e/ou estudo anatomopatológico) se SUA e/ou idade maior ou igual a 35 anos. Laudo histopatológico de AIS na peça de conização indica histerectomia simples, exceto se prole incompleta (nesse caso acompanhar com citologia semestral até 2 anos, progredindo para novo cone ou histerectomia se evidência de lesão residual). 44 3.10 Conduta frente ao laudo histológico: NIC I: Apenas 25% progride para NIC II em 2 anos. São aceitas 3 condutas: observação e seguimento citológico a cada 6 meses por 2 anos; tratamento destrutivo (ATA 80% ou eletro, crio ou laserterapia) ou excisão da lesão. NIC II/III: Risco de progressão para CA invasor de 5 e 20% para NIC II e III, respectivamente. Nesse caso é consenso o tratamento excisional, com conização a frio ou por CAF (cirurgia de alta frequência), mantendo seguimento posterior com controle cito-colposcópico a cada 6 meses, por 2 anos. Uma alternativa proposta pela ASCCP é solicitar DNA-HPV após 6 meses e, se este vier negativo, já retornar ao controle anual. Lembrando que uma exceção é o achado dessa alteração (NIC II/III) em menores de 20 anos, conforme já discutido acima. 3.11 Bibliografia DIRETRIZES BRASILEIRAS PARA O RASTREAMENTO DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO, Rio de Janeiro: INCA, 2011. FREITAS, Fernando et al. Rotinas em Ginecologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.736 p. Garcia M, Jemal A, Ward EM, Center MM, Hao Y, Siegel RL, et al. Global Cancer Facts & Figures 2007. Atlanta, GA: American Cancer Society; 2007. HURT, K. Joseph et al; tradução: Maria da Graça Figueiró da Silva Toledo; revisão técnica:Ricardo F. Savaris. Manual de ginecologia e obstetricia do Johns Hopkins. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012. 7204. MANUAL DE ORIENTAÇÃO DO TRATO GENITAL INFERIOR, São Paulo: FEBRASGO, 2010. 45 WRIGHT JR, Thomas C. et al. 2006 consensus guidelines for the management of women with abnormal cervical cancer screening tests. American Journal of Obstetrics & Gynecology, Nova Iorque, v. 197, n. 4, p. 34655, out. 2007. 46 4 DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS As doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) são foco de ação da saúde pública devido à alta prevalência na população, complicações sistêmicas, ginecológicas e obstétricas. O presente capítulo tem como objetivo sistematizar a abordagem e tratamento das principais DSTs. 4.1 Diagnóstico Sindrômico: Síndrome Sintomas comuns Corrimento Corrimento vaginal vaginal Prurido Dor à micção Sinais comuns Etiologias comuns Edema de vulva Tricomoníase Hiperemia de vulva Candidíase Corrimento vaginal e/ou Gonorreia cervical Clamídia Dispareunia Odor fétido Corrimento Corrimento uretral uretral Corrimento uretral Gonorreia Clamídia Prurido Tricomoníase Disúria Micoplasma Polaciúria Ureaplasma Odor fétido Úlcera genital Úlcera genital Úlcera genital Sífilis Cancro mole Linfonodomegalia inguinal Donovanose Herpes genital Dor pélvica Dor pélvica Dispareunia Fonte: Própria. Dor à palpação abdominal Gonorreia Dor à mobilização uterina Clamídia Temperatura > 37,5°C Anaeróbios 47 Um atendimento integral de uma DST deve conter as seguintes ações complementares essenciais: 1. Aconselhar e oferecer sorologia para Anti-HIV, VDRL, Hepatites B e C, quando disponíveis; 2. Vacinar contra a Hepatite B, se menor de 30 anos de idade; 3. Orientar que a conclusão do tratamento mesmo que os sintomas e sinais tenham desaparecido; 4. Interromper as relações sexuais até a conclusão do tratamento e desaparecimento dos sintomas; 5. Orientar o paciente que comunique seus parceiros (as). Os parceiros que devem ser contactados são aqueles que tiveram contato sexual nos últimos 30 dias antes do aparecimendo da doença; 6. Oferecer preservativos, orientando sobre as técnicas de uso; 7. Notificar o caso; 8. Marcar retorno em sete dias para analisar exames complementares solicitados e para controle de cura. 4.2 Sífilis: Doença sistêmica, crônica, marcada por surtos de agudização e períodos de latência quando não tratada, causada pelo Treponema pallidum e que pode ser classificada de acordo com sua evolução: S. recente S. tardia (<1 ano de evolução) (>1 ano de evolução) Primária Latente S. congênita Precoce (até 2º ano de vida) Secundária Fonte: Própria. Terciária Tardia (após 2º ano de vida) 48 Pode ser transmitida por contato sexual, transfusão sanguínea ou de forma transplacentária, A doença é contagiosa apenas quando estão presentes as lesões mucocutâneas, já na forma transplacentária o risco de transmissão é definido pela sorologia positiva. O período de incubação é de aproximadamento 21 dias, podendo variar de 10 a 90 dias, sendo inversamente proporcional ao tamanho da inoculação. A sífilis primária, também chamada de cancro duro, caracteriza-se pela presença de úlcera única, indolor, endurecida, circular, medindo de 1 a 2 cm de diâmetro, fundo liso e limpo, bordos infiltrados e cor de carne. Geralmente esta lesão é acompanhada por enfartamento ganglionar regional (bulbão sifilítico), indolor, móvel, sem sinais flogísticos, que aparecem de 1 a 2 semanas após o cancro. Após o tratamento curam espontaneamente e deixam de ser infectantes em 24 horas. A sífilis secundária caracteriza-se pela presença de lesões polimorfas, como as roséolas (pápulas ou lesões planas eritematosas que acometem principalmente o tronco) e as sifílides (lesões papuloerosivas, pustulosas e hipertróficas, que acometem a cavidade oral, genital, palmas das mãos e planta dos pés). A confluência das lesões papulosas forma placas secretantes e com muitos parasitas, denominada de condiloma plano. Sintomas sistêmicos como artralgias, mialgias, mal-estar e frebícula são comuns. A sífilis latente é definida pela soropositividade sem evidência de manifestações clínicas. Inicia quando desaparecem as lesões cutâneas e persiste até que surjam manifestações terciárias. A sífilis terciária apresenta manifestações tardias e raras decorrentes de complexos imunológicos: goma (15%) acometem pele, tecido subcutâneo ou osso, mas também pode acometer vísceras como o fígado; lesões cardiovasculares (10%) como o aneurisma aórtico, insuficiência aórtica e 49 estenose coronariana; neurossífilis (8 a 10%) que se manifesta por tabes dorsalis, mielite transversa e demência. Observação: o comprometimento do sistema nervoso central pode ocorrer em qualquer estágio da sífilis. O diagnóstico da sífilis é feito pela identificação do antígeno, em caso de lesões sifilídicas em atividade, ou por sorologia. Os testes sorológicos podem ser divididos em não treponêmicos: VDRL e RPR; e os treponêmicos: TIP, FTA-abs, TPHA e o ELISA. Na investigação inicial deve ser solicitado o teste não treponêmico (VDRL) e caso haja positividade é necessária a confirmação com um teste treponêmico. O líquido cerebroespinhal deve ser avaliado (VDRL, FTA-abs, celularidade, albuminas) sempre que houver sinais e sintomas neurológicos ou oftálmicos, sífilis terciária, falha de tratamento, paciente anti-HIV positivo, VDRL (altos títulos) e tratamento não penicilínico em sífilis tardia. Interpretação dos resultados sorológicos: VDRL FTA-abs Não Não Não reagente reagente incubação. Não Reagente Sífilis primária ou doença de longa evolução, reagente Reagente Interpretação se evidencia sífilis ou período possivelmente curada. Não Falso-positivo. reagente Reagente Fonte: Própria. Reagente Doença não tratada ou tratada recentemente. de 50 Fonte: Brasil (2006). Tratamento: há indicação formal do uso de penicilina, sendo alternativas: doxiciclina (100mg, VO, 12/12h por 14 dias ou até a cura clínica), estearato de eritromicina (500mg, VO, 6/6h por 15 dias). Recomenda-se: (1) sempre tratar o parceiro, mesmo que sorologicamente negativo, (2) abstinência sexual até comprovação de cura e (3) repetir o VDRL quantitativo 6, 12 e 24 meses após o tratamento, exceto nos casos com sorologia decrescente. Tratamento da sífilis: Sífilis primária Penicilina G benzatina: 2.400.000U, IM, dose única. Penicilina G procaína: 1.200.000U, IM, por 10 dias Sífilis recente Penicilina G benzatina: 2.400.000U (1.200.000U em cada secundária e glúteo), IM, repetida após 1 semana latente Sífilis latente Penicilina G benzatina: 2.400.000U (1.200.000u em cada glúteo)/ semana, IM, por 3 semanas (total: 7.200.000). e tardia – tempo Penicilina G procaína: 1.200.000U, IM, por 15 dias indeterminado Neurossífilis Penicilina G cristalina: 2 a 4 milhões de unidades, EV, 4/4h por 10-14 dias 51 Fonte: Adaptado de Brasil (2006). Após a dose terapêutica inicial na doença recente, poderá surgir uma reação febril de Jarisch-Herxheimer, com exacerbação das lesões cutâneas e involução espontânea em aproximadamente 12 a 24 horas. O tratamento durante a gestação deve ser feito com penicilina e é considerado inadequado quando: (1) houver tratamento com outra droga que não seja a penicilina com dose adequada para a fase da doença, (2) tratamento a menos de 30 dias antes do parto, (3) não resposta ao tratamento considerando a queda do VDRL e (4) com parceiro não tratado. 4.3 Cancro mole: Afecção de transmissão exclusivamente sexual que é causada pelo Haemophilus ducreyi, um cocobacilo gram-negativo com período de incubação de 2 a 5 dias. Geralmente a lesão clínica inicia-se como uma pápula ou vesícula e evolui rapidamente para uma úlcera, que pode ser única ou, mais frequentemente, múltipla, dolorosa, com base amolecida e bordos escavados com fundo purulento e fétido por infecção secundária. Estas lesões podem estar associadas à adenopatia satélite dolorosa e, algumas vezes, supurativa (tipicamente por orifício único). O diagnóstico definitivo requer a identificação do h. ducreyi em meio de cultura específico. O tratamento pode ser feito com: azitromicina (1g, VO); ceftriaxona (250mg, IM); ciprofloxacina (500mg, VO, 12/12h por 3 dias); estearato de eritromicina (500mg, VO, 6/6h por 7 dias); tetraciclina (500mg, VO, 6/6h por 15 dias) ou doxiciclina (100mg, VO, 12/12h por 10 dias ou até cura clínica). Durante a gravidez deve-se dar preferência ao uso da ceftriaxona ou eritromicina (estearato). 52 É importante sempre tratar o parceiro, realizar punção com agulha grossa do bubão para alívio da dor e para tornar o tratamento mais rápido e reexaminar os pacientes em 3 a 7 dias após o tratamento. 4.4 Linfogranuloma venéreo Doença sistêmica crônica causada pela Chlamydia trachomatis, com sorotipos invasivos L1, L2 e L3. O período de incubação é de 7 a 21 dias. Os principais efeitos causados pela bactéria são através do comprometimento do sistema linfático de drenagem da infecção. São definidas 3 fases evolutivas: a primeira é o ponto de inoculação que, quando é identificado, aparece como uma pequena úlcera ou pápula indolor, precoce e fugaz; na segunda fase, após cerca de 4 dias, ocorre a invasão dos vasos linfáticos desencadeando a linfadenite inguinal que, em 2 semanas, supuram, abscedam e podem fistulizar por múltiplos orifícios; a terceira fase desenvolvese após alguns meses, sendo caracterizada pela presença de áreas de fibrose cicatricial com focos de abcesso e fistulização, levando à elefantíase e à estenose. O diagnóstico geralmente é feito com base na clínica, não sendo rotineira a comprovação laboratorial. A droga de escolha para o tratamento é a doxiciclina (100mg, VO, 12/12h por 14 dias). Alternativas: tetraciclina (500mg, VO, 6/6h por 14 dias); eritromicina (500mg, VO, 6/6h por 14 dias) e o tianfenicol (500mg, VO, 8/8h por 14 dias). Durante a gravidez o tratamento deve ser realizado com eritromicina (estearato). O tratamento cura a infecção e previne a destruição tecidual, embora possam resultar cicatrizes da reação e, infelizmente, as sequelas já existentes não revertem. A aspiração dos linfonodos flutuantes pode ser necessária e o antimicrobiano deve ser substituído se o processo supurativo não melhorar em 14 dias. Lembrar que o parceiro deve ser tratado. 53 4.5 Donovanose Doença causada pelo agente Calymmatobacterium granulomatis que infecta órgãos genitais e extragenitais, tem caráter crônico e progressivo. É pouco contagiosa e seu período de incubação é de 3 a 6 meses. O diagnóstico é feito por meio da identificação dos corpúsculos de Donovan em esfregaço ou material de biópsia com coloração de Wright, Giemsa ou Leishman, Inicialmente se apresenta com uma lesão nodular, única ou múltipla, de localização subcutânea, que pode erosar, produzindo uma ulceração bem definida, de crescimento lento e sangrante. As lesões são indolores, autoinoculáveis com configuração em “espelho”. A forma clínica mais frequente é a ulcerovegetante com abundante tecido de granulação e sangramento fácil. Na ausência de tratamento a cura é incomum, evoluindo para extensa destruição tecidual com cicatrizes retráteis, deformante e estase linfocitária. Tratamento: doxiciclina (100mg, VO, 12/12h por 21 dias); sulfametoxazol/trimetropim (160mg e 800mg, VO, 12/12h por 21 dias ou até a cura clínica); tiafenicol (2,5g, VO, ataque + 500mg, VO, 12/12h por 14 dias); eritromicina (500mg, VO, 6/6h por 21 dias); ciprofloxacina (750mg, VO, 12/12h por 21 dias); azitromicina (1g por semana por 3 semanas). Se não houver resposta ao tratamento habitual nos primeiros dias pode-se adicionar um aminoglicosídeo como a gentamicina (1mg/Kg/dia, EV, 8/8h). Durante a gestação é dado preferência ao uso da eritromicina (estearato) e pode-se adicionar a gentamicina. É recomendado tratamento cirúrgico para lesões extensas, cicatrizes e estenoses. Avaliar necessidade de prolongar tratamento até a cura clínica. Devido à baixa infectividade não é necessário fazer o tratamento dos parceiros sexuais, devendo-se apenas investigá-los. 54 4.6 Herpes genital É uma doença recorrente e incurável causada por um vírus de DNA, sendo na maioria dos casos pelo HSV-2. É a DST ulcerativa mais frequente. As primo-infecções comumente apresentam sintomas mais severos que nas recorrências e são mais intensos nas mulheres que nos homens. O primeiro episódio pode cursar com lesões bilaterais e múltiplas, dor local, linfadenopatia inguinal dolorosa, evolução das lesões de vesículas a pústulas, úlcera e crosta, disúria, parestesia sacra, febre, mal-estar e mialgia. As recidivas podem ser precedidas por pródromos: parestesia, dor nas nádegas, prurido ou dor. Fatores desencadeantes conhecidos são: trauma mecânico, tensão emocional, doença sistêmica, alteração imune, antibioticoterapia prolongada, menstruação, febre, exposição ao sol ou frio intenso, fadiga e estresse. A duração média de disseminação é de 4 dias, a de cicatrização, 10 dias. Complicações: meningite asséptica; retenção urinária por mielite transversa ou disfunção do sistema nervoso autônomo; disseminação cutânea e visceral (fígado, pulmão e meninges), e retinite herpética. O diagnóstico na maioria das vezes é clínico, mas podem ser visualizadas lesões ou úlceras à colposcopia, presença de células multinucleadas à citologia oncótica, outros exames diagnósticos: sorologia IgM 1 e 2 e IgG, imunufluorescência direta e cultura. O tratamento do HVS tem como objetivo encurtar o curso da doença, diminuir a intensidade dos sintomas, as recidivas e as taxas de transmissão. O tratamento no episódio inicial é: aciclovir (400mg, VO, 3x/dia por 7 a 10 dias); fanciclovir (250mg, VO, 3x/dia por 7 a 10 dias); valaciclovir (500 a 1000mg, VO, 2x/dia por 7 a 10 dias). Este tratamento pode ser prolongado caso não haja cura clínica e os pacientes que persistem com lesões por cerca de 30 dias devem ser rastreados sorologicamente para o HIV. Nas recidivas o 55 tratamento é o mesmo da primo-infecção, entretanto 5 dias de tratamento já são suficientes e deve ser iniciado o mais precoce possível. Tratamento supressivo é indicado para pacientes que apresentam recidivas frequentes (6x/ano), baseia-se no uso de aciclovir (400mg 2x/dia por 6 a 12 meses) ou valaciclovir (500mg/dia) ou fanciclovir (250mg 2x/dia). Na gestação o herpes pode evoluir como uma complicação obstétrica. Há risco de abortamento em caso de infecção nos primeiros meses da gravidez. A infecção primária no final da gravidez oferece maior risco de infecção neonatal comparada a recidivas, sendo maior o risco de infecção no canal de parto. Desse modo, se houver lesões herpéticas (ou pródromos) no período do parto ou se a primo-infecção ocorrer após 34 semanas de gestação e não houver bolsa rota com mais de 4 horas de evolução está indicada a cesariana. A taxa de transmissão placentária é de aproximadamente 1:3500 gestações. Está sempre indicado o tratamento das primo-infecções e de profilaxia a partir das 36 semanas de gestação em caso de primo-infecção durante a gravidez ou recidivas frequentes. Esta profilaxia é feita com aciclovir (400mg, VO, 3x/dia por 10 dias). 56 4.7Abordagem sindrômica das úlceras genitais Paciente com úlceras genitais Anamnese e exame físico História ou evidência de lesão vesiculosa? SIM Tratar Herpes genital NÃO Tratar Sífilis e Cancro mole Fonte: Adaptada de Brasil (2006). Lesões com mais de 4 semanas? NÃO SIM Tratar Sífilis e cancro mole. Fazer biópsia e tratamento para Donovanose 4.8 Gonococcia Doença também conhecida como blenorreia causada pela Neisseria gonorrhoeae que infecta o epitélio colunar ou de transição (uretra, reto, endocérvice, faringe, conjuntiva, etc.). O tempo de incubação é de 2 a 5 dias. Estudos demonstram forte evidência que a infecção pelo gonococo facilita a transmissão do HIV. É uma doença assintomática em 60 a 80% dos casos. Mas pode cursar com os seguintes sintomas: secreção endocervical mucopurulenta, dor pélvica, dispareunia, sangramento irregular, hiperemia vaginal, polaciúria e em 57 casos não tratados pode evoluir para doença inflamatória pélvica (DIP), infertilidade de causa tubária, gestação ectópica e dor pélvica crônica. O diagnóstico é feito pela cultura de secreção endocervical utilizando o meio de Thayer-Martin e, alternativamente, pela realização do gram de secreção cervical que evidencia diplococos gram negativos. O tratamento pode ser realizado com dose única de ciprofloxacina (500mg, VO), ofloxacina (400mg, VO), ou ampicilina 2g + probenecide 1g, VO. Outras alternativas ao tratamento temos: tianfenicol (2,5g, VO, 12/12h), duas doses, ceftriaxone (250mg), IM, estearato de eritromicina (500mg, VO, 6/6h por 7 dias), tetraciclina (500mg, VO, 6/6h por 7 dias). 4.9 Clamídia Tracomatis Trata-se de um bacilo gram negativo com tropismo por células epitelias colunares (conjuntiva, uretra, endocérvix, endométrio e trompa). Agente responsável por cerca de 50% das uretrites não gonocócicas, associado à DIP e à infertilidade. O tempo de incubação é de 14 a 21 dias. Há 17 sorotipos diferentes (L1, L2 e L3 são responsáveis pelo linfogranuloma venéreo, e os sorotipos D a K, pelas DSTs). O quadro clínico é geralmente assintomático, mas pode cursar com corrimento vaginal anormal, ardência ao urinar, sangramento intermenstrual (spotting) e após relação sexual (sinusorragia). Um corrimento mucopurulento amarelo pode estar presente. O diagnóstico pode ser feito por meio de cultura em células de McCoy, células de Gupta evidenciadas no Papanicolau, ELISA, imunufluorescência direta e indireta e por meio de PCR. O tratamento é feito preferencialmente com doxiciclina (100mg, VO, 12/12h por 7 dias) ou azitromicina (1g, VO). Alternativas ao tratamento podem ser: estearato de eritromicina (500mg, VO, 6/6h por 7 dias), ofloxacina (400mg, VO, 1x/dia por 7 dias), tetraciclina (500mg, VO, 6/6h por 7 dias). 58 4.10 Abordagem sindrômica do corrimento uretral Paciente com queixa de corrimento uretral Anamnese e exame físico Bacterioscopia disponível no momento da consulta? Não Sim Diplococos gram negativos intracelulares presentes? Sim Não Tratar clamídia e gonococo Tratar só clamídia Fonte: Adaptada de Brasil (2006). 59 4.11 Abordagem sindrômica do corrimento vaginal e cervicite Paciente com queixa de corrimento vaginal -Parceiro com sintomas -Paciente com múltiplos parceiros sem proteção Anamnese e avaliação de risco + exame ginecológico -Paciente pensa ter sido exposta a uma DST -Paciente proveniente de região com alta prevalência de gonococo e clamídia Critério de risco positivo e/ou sinais de cervicite com mucopus/teste do cotonete/friabilidade/sangramento do colo Sim Não Tratar gonorreia e clamídia pH vaginal: teste de KOH a 10% pH>= 4,5 e/ou KOH (+) Tratar vaginose bacteriana e tricomoníase pH<= 4,5 e/ou KOH (-) Aspecto do corrimento grumoso ou eritema vulvar? Sim Tratar candidíase Não Causa fisiológica 60 Fonte: Adaptada de Brasil (2006). Paciente com queixa de corrimento vaginal -Parceiro com sintomas -Paciente com múltiplos parceiros sem proteção Anamnese e avaliação de risco + exame ginecológico -Paciente pensa ter sido exposta a uma DST -Paciente proveniente de região com alta prevalência de gonococo e clamídia Critério de risco positivo e/ou sinais de cervicite com mucopus/teste do cotonete/friabilidade/sangramento do colo Não Sim Coleta de material para microscopia Presença de hifas Presença de clue cels Tratar candidíase Tratar vaginose Tratar gonorreia e clamídia Presença de tricomonas Tratar tricomoníase Fonte: Adaptada de Brasil (2006). 4.12 Bibliografia FREITAS, Fernando et al. Rotinas em Ginecologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.736 p. 61 HURT, K. Joseph et al; tradução: Maria da Graça Figueiró da Silva Toledo; revisão técnica: Ricardo F. Savaris. Manual de ginecologia e obstetricia do Johns Hopkins. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012. 720 p. MANUAL DE CONTROLE DAS DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS DST. Brasília: Ministério da Saúde. 2005. NAUD, P. et al. Doenças sexualmente transmissíveis. In: FEDERAÇÃO BRASILEIRA DAS ASSOCIAÇÕES DE GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA. Tratado de ginecologia. Rio de Janeiro: Revinter, 2000. P. 731744. ROMANELLI, Roberta Maia de Castro et al. Doenças sexualmente transmissíveis na mulher: como abordar?. Femina, São Paulo, v. 38, n. 9, p 445-58, set. 2010 62 5 CÂNCERES HEMATOLÓGICOS NA GESTAÇÃO Os cânceres hematológicos na gestação embora apresentem baixa incidência, estão entre as neoplasias mais frequentemente diagnosticadas mesmo não existindo uma relação causal entre gravidez e as neoplasias hematológicas malignas. O Linfoma Hodgkin é o mais comum, seguidos do linfoma não-Hodgkin e da leucemia aguda. O diagnóstico se torna desafiador ao tempo que muitos dos sintomas podem ser confundidos com condições próprias da gravidez ou de outras patologias mais comuns nesse período e na limitação no uso dos métodos de diagnóstico por imagens. A segurança e eficácia do tratamento são pouco conhecidas devido aos escassos números de dados, tem foco na quimioterapia e agentes biológicos e possui como principal objetivo preservar a saúde da mãe, sendo em alguns casos indicado a interrupção da gravidez já que os riscos de malformações fetais podem chegar a 25% dos casos. 5.1 Linfomas. O linfoma mais comum na gestação é o de Hodgkin pois tem como característica epidemiológica o pico de incidência entre 20 a 40 anos o que coincidi com a idade fértil feminina. Tem uma incidência de 1:6.000 gestações e estima-se que 3,2% das pacientes com linfoma de Hodgkin (LH) fazem o diagnóstico na gravidez. O linfoma não-Hodgkin (LNH) é raro, com relato de aproximadamente 100 casos no mundo, porem com tendência a crescer devido ao aumento da idade da mulher no momento da concepção. 5.1.1 Apresentações clínicas e laboratoriais A manifestação clínica mais comum, em cerca de 2/3 dos pacientes, seja no LH como no LNH é a adenomegalia periférica principalmente de característica indolor, móveis e de consistência elástica e eventualmente são endurecidos por fibrose e dolorosos como no LH. No LNH predomina em cadeias cervicais, supraclaviculares, epitrocleares, mesentéricos, retroperitoneais e inguinais e a valocidade de crescimento geralmente está diretamente realcionada com sua agressividade. No LH tendem a serem 63 maiores, coalescentes, se disseminam por contigüidade e de forma centrípeta, localizados em especialmente em região cervical, supraclavucular e com freqüência em mediastino. É importante biopsiar linfonodos com seguintes características: Tamanho > 2 cm Localização supraclavidular, escalenico ou epitroclear Crescimento progressivo Consistencia endurecida, aderido aos planos e profundos Persistencia por mais de 4 semanas Podem apresentar sinais e sintomas diversos como vômitos, plenitude pós-prandial, diarréia, prurido, hepatoesplenomegalia, anemia, fadiga, mal-estar, febre >38, perda de peso superior a 10% do peso em 6 meses e sudorese noturna. Estes 3 últimos são chamados de sintomas B e quando presentes, 40% dos casos, se associa a pior prognostico. O acometimento extranodal ocorre em 50% dos casos, principalmente no trato gastrointestinal e medula. Mama, ovário, colo do útero e útero são mais comumente envolvidos em pacientes com LNH e gestante do que não gestantes com mesma idade e subtipo semelhantes. Especula-se que a fisiopatologia dessa tendência está relaciona com um crescimento hormôniodependente ou um estado hiperproliferativo pré-existente desses tecidos durante a gravidez. Labotarorialmente podemos encontrar em 50% dos casos, uma leve anemia normocítica e normocrômica, linfopenia, monocitose, eosinofilia, trombociopenia e discreta leucocitose que dificilmente passará de 25.000/mm 3. A desidrogenase láctica, a velocidade de hemossedimentação e a beta-2microglobulina estarão bastante elevados principalmente em estágios mais avançados e são parâmetros de prognóstico e na resposta ao tratamento. 64 5.1.2 Diagnóstico e Estadiamento O diagnóstico de ambos os linfomas é feito com a biopsia e histopatológico do linfonodo acometido. A biópsia é feita sob anestesia local ou geral e não trás riscos materno/fetal. No LH é encontrado, ao histopatológico, células de Reed-Sternberg, cercadas por linfócitos, histiócitos, plasmócitos e eosinófilos, podendo ser confirmado com imunohistoquímica que marcará o CD15 e CD30 e o subtipo esclerose nodular é também o mais freqüente na gestação assim como nas mulheres com mesma idade. O LNH é representado em sua maioria pelo subtipo histológico difuso de grandes células B que normalmente expressa o CD20 na imunohistoquímica, porém todos os outros subtipos podem ocorrer na gravidez. Os exames de imagem são importantes tanto na busca de adenomegalia quando em investigação ou guia para a biópsia do linfonodo como para o estadiamento dos linfomas. Na gestante deve-se usar preferencialmente a ressonância nucelar magnética evitando a tomogafia computadorizada e a PET-CT, que seriam os exames padrão ouro, devido aos riscos fetais. A radiografia de tórax pode ser usada com cautela e sempre com blindagem abdominal. A ultrassonografia é útil na avaliação abdominal e pode ser usado com segurança. A reavaliação com CT e PET-CT podem ser feita após o parto, no entanto o contraste usado na PET-CT (glicose marcada com flúor radioativo) se concentra em grande quantidade no tecido mamário por isso se deve evitar amamentar nas 72 horas seguintes da administração do marcador. 5.1.3 Diagnóstico diferencial Os principais diagnósticos diferenciais são com doenças que podem se apresentar com adenomegalia e sintomas constitucionais em mulheres em idade fertil. Algumas são Rubéola, Citomegalovírus, HIV, Tuberculose, Doença da Arranhadura do Gato, micoses profundas, Toxoplasmose, Mononucleose, Sjogren e Doença IgG4 relacionada, Lupus Eritematoso Sistêmico, Leucemias, Doença de Kimura, Doença de Kikuchi e Fujimoto, Doença de Castleman, e Doença de Rosei-Dorfman. 65 5.1.4 Tratamento O manejo da mulher gestante com linfoma seja Hodgkin ou nãoHodgkin, embora geralmente seja a mesma das grávidas sem a doença, necessita de modificação a depender da idade gestacional e do tipo do linfoma. Tabela 1 Idade gestacional Abordagem Terapia Complicação Materno-Fetal Linfoma não-Hodgkin indolentes (Ex.: Folicular) 1º Trimestre Expectante. - - 2º e 3º Trimestre Tratar se Rituximab com ou Geralmente não sintomático ou sem CPV ou CHOP, afetados evidencia de considerar se for o progressão da caso radioterapia de doença. cabeça ou pescoço. Linfoma não-Hodkin agressivos (Ex.: Difuso de grande células B) e Altamente agressivos (Ex.: Burkitt) 1º Trimestre 2º e 3º Trimestre Interrupção da Rituximab com Interrupção da gestação e CHOP + gestação. tratamento igual a Metotrexato se da mulher não altamente grávida. agressivo. Tratamento igual da Rituximab com Provavelmente não mulher não grávida. CHOP + afetados. Metotrexato após o 3º trimeste se altamente agressivo. 66 Linfoma Hodgkin 1º Trimestre Tentar adiar o Se necessário Interromper a tratamento para o tratamento gravidez se uso de segundo trimestre conciderar terapia padrão. se doença com o monoterapia com crescimento lento Vinblastina com ou Interromper intervalo de 2 a 3 gravidez se semanas ou Terapia necessário padrão ABVD tratamento padrão 2º e 3º Trimestre Tratamento igual da Terapia padrão Não afetados com mulher não grávida. ABVD. Se terapia padrão. Se Se progressão progressão da progressão da interromper a doença escalonar doença interromper. gestação e para BEACOPP e escalonar terapia. radioterapia se necessário. ABVD = doxorrubicina, bleomicina, vinblastina, dacarbazina. BEACOPP = bleomicina, vincristina, procarbazina, prednisona, etoposido, doxorubicina, ciclofosfamida. CHOP = ciclofosfamida, doxorubicina, vincristina, prednisona. CVP = ciclofosfamida, , vincristina, prednisona. A exposição a quimioterapia no segundo e terceiro trimestre é menos provável de se resultar em efeitos teratogênicos, porem possa aumentar o risco de restrição do crescimento intra-útero. Os efeios tardios não foram visualizados em filhos de mães submetidas a tais quimioterapias durante a gestação. Mesmo assim todos os quimioterápicos só devem ser administrados com consentimento do paciente e com monitorização fetal freqüente. 67 5.2 Leucemias 5.2.1 Introdução A associação entre leucemia e gestação é rara, correspondendo a 1 a cada 100.000 gestações. Dentre as leucemias diagnosticadas na gravidez as de maior prevalência são a Leucemia Linfóide Aguda (LLA), Leucemia Mielóide Aguda (LMA) e a Leucemia Mielóide Crônica (LMC). 5.2.2 Apresentação clínica e laboratorial As leucemias agudas apresentam quadros clínicos muito semelhantes sendo a astenia, hemorragia e febre uma tríade de sintomas clássicos. O sangramento pode ser por petéquias, equimoses, gengivorragia, epistaxe e eventualmente CIVD com sangramentos graves (hemorragia pulmonar e intracraniana). Outros sinais e sintomas são os decorrentes da infiltração leucêmica de tecidos e orgãos como a hepatoesplenomegalia e hiperplasia gengival, que são mais comuns na LMA e linfadenopatia e dor óssea mais frequentes na LLA. Na leucemia crônica muitas pacientes são assintomáticas e o diagnóstico pode ser suspeitado nas primeiras consultas do pré-natal através do exame físico mostrando uma esplenomegalia ou um hemograma evidenciando uma leucocitose neutrofílica acentuada, com desvio para a esquerda até mielócito ou mieloblasto os demais sintomas são geralmente semelhantes aos apresentados nas leucemias agudas. Laboratorialmente uma leucemia aguda é caracterizada por uma anemia com hemoglobina entre 5 e 9g/dL, normocítica e normocrômica e sem reticulocitose, uma plaquetopenia que em ¼ das pacientes podem estar abaixo de 20.000/mm3 e uma leucocitose na maioria dos paciente e em 25% pode apresentar leucopenia. Na LMC é mais caracterizada por anemia com o mesmo padrão das agudas, com leucocitose em níveis mais acentuados podendo chegar ate 1.000.000/mm3 e com trombocitose. 68 5.2.3 Diagnóstico Nas leucemias o diagnóstico deve sempre ser confirmado pelo biópsia óssea e mielograma onde o aspirado deve ser analisado do ponto de vista citoquímico, morfológico, imunofenotípico e citogenético. Na LMA o mielograma revela a preseça de mais de 20% de blastos. A LLA o aspirado mostra mais de 25% de linfoblastos em proporção do total de células nucleadas. Já na LMC a confirmação é feita com o achado do cromossomo Philadelfia na avaliação citogenética do aspirado ou na identificação do gene bcr/abl por PCR ou FISH. 5.2.4 Tratamento As leucemias agudas são de difícil manejo na gravidez, já que o tratamento deve ser iniciado imediatamente após o diagnóstico para que não haja prejuízo no prognóstico materno. Sem retardo para início da terapêutica, a gestação parece não alterar a evolução natural das leucemias agudas. Quando diagnosticada no primeiro trimestre da gravidez a abordagem deve ser multidisciplinar e, em geral, se opta pelo aborto terapêutico. Já no caso de gestações de segundo e terceiro trimestre pode-se optar pela quimioterapia sem prejuízo para o feto e programação do parto quando houver maturidade pulmonar e a paciente não estiver citopênica. Dentre as complicações observadas em casos de leucemias agudas relacionada a gravidez são: insuficiência placentária comprometendo a vitalidade fetal, baixo peso ao nascer e prematuridade. Acredita-se que esses efeitos estejam relacionados com a gravidade da anemia, da coagulação intravascular disseminada e com prejuízo das trocas placentárias pela hemoconcentração. A ocorrência de cesarianas também foi maior nesse grupo. A gravidez não parece afetar o curso da LMC e, por vezes, não necessita de tratamento imediato. Em geral não se observa comprometimento 69 da vitalidade fetal e a resolução da gestação muitas vezes ocorre no termo, sendo a via de parto obstétrica. Os risco in útero da exposição a quimioterapia esperados são anormalidades no crescimento, organogênese, intelecto e reprodução. No geral, os relatórios de acompanhamento a longo prazo mostram poucos efeitos colaterais, principalmente se administrada no segundo ou terceiro trimestre. Complicações maternas relativas as leucemias são: neutropenia febril no puerpério, infecção de ferida operatória e hematoma de parede abdominal. 5.2.4.1 LMA O tratamento é dividido em duas etapas. A primeira, indução da remissão, tem como objetivo destruir o clone neoplásico onde é utilizado duas potentes drogas citotóxicas: arabinosídio-C (ara-C) + dounorrubcina. A remissão é atingida em 60-80% dos casos. As pacientes que não responderem bem, possuem um prognóstico muito ruim mas ainda podem se beneficiar com o transplante alogênico. A segunda etapa conhecida como terapia pósremissão, tem como objetivo prolongar a remissão completa, sendo obrigatória já que sem esse a recidiva é certa. Esta etapa pode ser feita com uma quimioterapia de consolidação, usando altas doses de ara-C, e é indicada as pacientes com cariótipo de bom prognóstico. Uma segunda opção para esta terapia é o transplante alogênico de células hematopoiéticas e é considerado a mais eficaz em termos de cura porem apresenta alta toxicidade e mortalidade de 20%. Outra opção é o transplante autólogo que é indicado é recomendado como primeira opção em pacientes sem cariótipo favorável e sem doador compatível. 5.2.4.2 LLA A quimioterapia dividi-se em quatro fases. A remissão pode se usar o esquema HyperCVAD ( corticosteróides, vincristina, L asparginase e daunorrubicina) mais ciclofosfamida e tem um sucesso de cerca de 75% dos casos. A segunda etapa é a profilaxia do SNC, já que a LLA possui tendência a 70 recidiva no SNC após a quimioterapia. É iniciada junto com a remissão, e é feito com metotrexate intratecal ou associado com ara-C e prednisona. A radioterapia é usada nas pacientes de alto ou intermediário risco de recidiva. A terceira fase é a consolidação da remissão, diversas drogas podem ser usadas nessa fase com destaque para o metotrexate. A última fase, de manutenção, utiliza 6-mercaptopurina + metotrexate. 5.2.4.3 LMC O quimioterapia mais usada é com o mesilato de imatinibe, apresentado uma excelente taxa de remissão completa tanto hematológica como citogenética. Porem o tratamento de primeira linha para pacientes jovens e nos casos de recidiva é o transplante alogênico. Nos casos de recidiva póstransplante o imatinibe é capaz de controlar a recaída. 5.3 Efeitos colaterais na gestação de drogas usadas em hematologia. Mesilato de imatinibe: apesar do potencial teratogênico, relatos de casos na literatura tem sido apresentado sem comprometimento fetal. Vincristina/vinblastina: menos teratogênico que a maioria dos agentes, na literatura há casos de exposição no primeiro trimestre de gestação sem alterações na morfologia fetal. Ciclofosfamida (alquilante): seu uso no primeiro trimestre de gravidez acarreta em anormalidades nos olhos, inserção baixa das orelhas, fenda palatina e atresia de esôfago; mas seu uso parece seguro no segundo e terceiro trimestre. Doxorrubicina/danorrubicina (antraciclinas): podem complicar com pré-eclâmpsia, restrição de crescimento fetal, neutropenia e sepse neonatal; com poucas malformações relatadas, mesmo com o uso no primeiro trimestre. Dentre as mal formações a mais relatada é a cardíaca. Ácido altransretinoico (ATRA): associado a alta teratogenicidade no primeiro trimestre, mas é considerado seguro no segundo e terceiro trimestre. 71 Metotrexato: deve ser evitado durante a gestação devido ao seu potencial teratogênico. Efeitos colaterais de drogas usadas em emergência oncológicas: Alopurinol: não há estudos suficientes para definir seu risco na gravidez, mas tem sido usado amplamente sem consequências danosas aparentes. Antibióticos e antifúngicos de amplo espectro: o cefepime e a anfotericina são classificados como de risco B, já a vancomicina e o imipenem como risco C para a gestação. Fator estimulador de granulócitos (Granulokine): seu uso na gestação parece ser seguro. Efeitos colaterais de quimioterápicos usados para tratamento da LMC: Compostos baratos e que trazem poucos efeitos adversos, mas que detém potencial de causar abortamento, restrição de crescimento fetal e malformações congênitas Hidroxiureia: não há relatos de efeitos teratogênicos. Interferon-alfa-2b: categoria C na gestação, mas seu uso parece oferecer mais segurança em relação as possíveis complicações fetais. Mesilato de imatinibe (inibidor da tirosino quinase): potencial teratogênico, porém há relatos de casos na literatura de seu uso na gravidez sem acometimento fetal 5.4 Bibliografia BENJAMIN BRENNER, Irit Avivi, Michael Lishner. Haematological cancers in pregnancy. The Lancet. 2012; 379: 580-87 72 CAROLINA KASSAB et al. Linfoma de Hodgkin e gestação: série de casos e proposta de protocolo para tratamento. Eintein. 2011; 9(2 Pt 1): 216-9. JONATHAN TICKU, MD, Shilpa Oberoi, MD, Sarah Friend, MD, John Busowski, MD, Mary Langenstroer, MD, Said Baidas, MD. Acute Lymphoblastic Leukemia in Pregnancy. Ther Adv Hem. 2013;4(5):313-319. NOMURA, Roseli et al. Resultados maternos e perinatais em gestantes portadoras de leucemia. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. 2011; 33 (8): 174-81. REZENDE, obstetrícia/Carlos Antônio Barbosa Montenegro, Jorge de Rezende Filho. – 12. Ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013. SYHEDA L. HOXHA, Vlora A Ibishi, Ahmet Brovina, Mynevere Hoxha, Shefqet Lulaj. Refusal of Treatment for Acute Leukemia in Pregnancy - A Case Report. J Med Case Reports. 2013;7(148). 73 6 DIABETES MELLITUS 6.1. Definição A definição até 2009 pela ADA (American Diabetes Association) considerava DMG como qualquer grau de intolerância à glicose com início ou primeiro diagnóstico durante a gravidez. Não descartava, porém, a existência de DM1 ou DM2, que não foi diagnosticado previamente a gestação. Não excluía a possibilidade de persistência da intolerância a carboidratos (ITG) após o término da gestação. Não distinguia o tipo de tratamento necessário para o controle glicêmico (insulina ou dieta). A partir de 2010, baseado nas recomendações da IADPSG, a ADA recomenda que pacientes com alto risco para DM devem realizar pesquisa na primeira consulta pré-natal, utilizando critérios padrão diagnósticos, e receberem diagnóstico de DM pré-gestacional nessa ocasião. 6.2. Epidemiologia Tradicionalmente, DMG ocorre em cerca de 7% de todas as gestações e é responsável por 90% das alterações de tolerância a glicose na gravidez. Com a utilização do novo critério diagnóstico, a prevalência pode chegar a 17,8%. A prevalência de DMG varia de 0,6 a 15%, dependendo da população estudada. No Brasil, a prevalência é de 7,6%, segundo o EBDG. A ocorrência na gestação de DM1 é de 0,1% ao ano, de DM2 é de 2 a 3% ao ano e de DMG é utilizados. de 12-13% ao ano, dependendo dos critérios diagnósticos 74 6.3. Fatores de risco ALTO RISCO- uma das condições seguintes: o idade materna > 35 anos; o sobrepeso materno (IMC>25) ou ganho excessivo de peso na gravidez atual; o macrossomia, polidramnio, hipertensão e pré-eclâmpsia; o historia familiar de DM em parentes de primeiro grau; o antecedentes - abortamentos, malformações, morte fetal ou neonatal, macrossomia ou DMG ; o uso de medicação hiperglicemiante: corticóides, HCTZ e etc. o história de SOP. 6.4. Rastreamento diagnóstico O rastreamento é considerado universal para todas as gestantes na visita INICIAL. Deve ser realizado com a glicemia de jejum na primeira consulta pré-natal, obedecendo as recomendações seguintes. RESULTADO: GLICEMIA GLICEMIA GLICEMIA JEJUM < 92 JEJUM: 92 - 125 JEJUM > 126 RECOMENDAÇÕES: TTGO 75g com DMG 24-28 sem Pacientes diagnosticadas no – iniciar 2x = DM dieta primeiro trimestre deverão ser consideradas como DM pré-gestacional. Os valores utilizados no TTGO 75g no primeiro trimestre devem ser os mesmos usados fora da gestação 75 CRITÉRIO DIAGNÓSTICO TTGO 75g NO 1º TRIMESTRE (DM PRÉ) GLICEMIA JEJUM GLICEMIA 2 h: > 126 > 200 CRITÉRIO DIAGNÓSTICO 1 VALOR ALTERADO – DMG 2 VALORES ALTERADOS – DM PRÉVIO Nas 24-28 semanas de gestação: TOTG 75g jejum, 1h, 2h ( 92/180/153)- para aquelas mulheres não previamente diagnosticadas na primeira consulta. CRITÉRIO PARA DIAGNÓSTICO DE DMG COM TTGO 75g ADA JEJUM 1 HORA 2 HORAS CRITÉRIO DIAGNÓSTICO 92 180 153 1 VALOR ALTERADO 2011 6.5 Tratamento Tratamento Médico Nutricional (TMN) o Dieta - 90% respondem em 2-3 semanas. o Dieta fracionada em seis refeições – desjejum, lanche manhã, almoço, lanche tarde, jantar e ceia (22h). o Ganho ponderal de 7-12 Kg (em média 400g/mês no 1 º trimestre; 200-350g/semana no 2 º e 3 º trimestres). o IMC. Valor calórico total (VCT) deve ser calculado de acordo com 76 o Tabela 2 (Kcal/kg/dia x IMC) IMC entre 20 - 30 kcal/kg 24,9 IMC >25-34,9 25 kcal/kg IMC > 35 20 kcal/kg OBS - Evitar cetose e crianças com retardo (baixo QI). OBS - Restrição de CH - 35-40% VCT/dia reduz glicemia materna e melhora prognóstico maternofetal. Tabela 3 (Distribuição dos carboidratos nas diversas refeições) Desjejum Lanche Almoço Lanche Jantar Ceia 15% 10% 40% 10% 25% 10% INSULINIZAÇÃO o Quando? Glicemia de jejum > 95 mg/dl. Glicemia 1h pós-prandial > 140 mg/dl (monitorização domiciliar ou consulta). Glicemia 2h pós-prandial > 120 mg/dl. Aproximadamente 15% das gestantes. o Como? 77 1o trimestre 0,5-0,7 U/Kg/dia. 2o trimestre 0,7-0,9 U/Kg/dia. 3o trimestre 0,9-1,0 U/Kg/dia. Iniciar com a metade da dose calculada nas primeiras 48h. Preferir insulinas menos imunogênicas para evitar transporte e presença de anticorpos na placenta. Insulina prandial (Bolus) o Insulina regular - muito usada (recomendação A). o Análogos UR - lispro e aspart (C) pouca passagem pelo cordão e melhora hipoglicemia prandial (recomendação B). Insulina basal o A insulina basal deve ser NPH humana. o Análogos UL-glargina (grande ligação IGF-1) e detemir (recomendação C). o Esquemas 1. (N+R, 0, R, N) 60% NPH (2/3 jejum 1/3 BED) + 40% regular pré- refeição (1/2 jejum e 1/2 jantar). 2. (N+R, R, R, N) 50% NPH (2/3 jejum e 1/3 BED) e 50% bolus regular (dividido em 3 doses). Obs.: sempre preferir esquemas com insulinas prandiais. Monitorização o Peso semanal (ganho ponderal < 300g/semana). 78 o Monitorização glicêmica 3 a 7 vezes ao dia (jejum, 1h após refeição, pré-almoço, 2h pós-almoço, 18h, 22h (bedtime) e às 3h a cada 03 dias) e reajuste da insulina até controle adequado. o Visita pré-natal mensal até 28ª semana, a cada 2 semanas até 32ª semana e semanal após 32ª semana. o Atividade física regular. o Medir PA, rastrear ITU e tratar bacteriúria assintomática. o Fundo de olho e função renal, para ver lesão de órgão alvo. o Metas de controle adequado da glicemia Jejum < 95 mg/dl 1h pós-prandial <140 mg/dl 2h pós-prandial < 120 mg/dl Qualquer horário > 70 mg/dl. Tratamento oral o Glibenclamida (C) - não mostrou risco aumentado de hipoglicemia fetal ou teratogênese, porém não deve ser utilizado em decorrência de relatos de hepatotoxidade e nefrotoxidade. o Metformina (B)- reduz abortos, atravessa placenta, sem teratogenicidade, usado na Sindrome do Ovario Policistico (esta droga pode ser mantida na gestação) - estudo MiG 2008 não mostrou teratogenicidade desta droga. o Inibidores da alfa-glicosidase (B) - redução Gpp (sem estudos). o TZD (D) - retardo do crescimento e óbito fetal intraútero. 6.6. Monitoramento - cuidados fetais Altura de fundo uterino em todas as consultas. 79 Mobilograma (movimentos fetais) a partir da 28ª semana. US morfológico fetal entre 20-24ª semana. Cardiotocografia no 3º trimestre e a critério clínico. Dopplerfluxometria e perfil biofisico fetal (PBF) a critério clínico. Avaliação da maturidade pulmonar fetal por amniocentese a critério clínico. 1º TRIM USG – avaliar IG, TN, malformações 2º TRIM USG morfológico – 20 a 24 sem Doppler da aa. uterina e umbilical Ecocardiograma fetal – 24 a 26 sem (DM pré) 3º TRIM USG mensal CTG basal – 28 sem (DM pré) Doppler (hipertensão, pré-eclâmpsia ou vasculopatia) Mobilograma diário - >28 sem 6.7. Critérios para internação imediata Controle metabólico inadequado. Alteração da função renal. HAS. RCF. Polidrâmnio moderado a grave. ITU complicada. 80 Cardiotocografia suspeita. 6.8. Conduta no parto Via do parto: indicação obstétrica. Indução do parto na 40ª semana, se controlada. Cesariana com estimativa de peso fetal > 4000g. Durante o parto: o Cesárea - reduzir insulina na noite anterior (50% da dose) e não administrar insulina na manhã do parto; o Vaginal - suspender insulina com diagnóstico de trabalho de parto; o SG 5% 100ml/h e Gcap 2/2hs (manter entre 70-120mg/dl); e o insulina regular conforme Gcap ou infusão contínua 3-4h antes. BIC de insulina: 50U de insulina regular + 500ml SF 0,9% (solução 1U/10ml – média 2-4U/h). Suspender BIC imediatamente após o parto. Tabela 4 (BIC de Insulina conforme Gcap) Glicemia capilar (Gcap) BIC insulina (ml/h) Ins SC (UR) <80mg/dl não infundir 0 81-140mg/dl 1U/h=10ml/h 0 141-180mg/dl 15ml/h 1-2 181-220mg/dl 20ml/h 2-3 221-300mg/dl 30ml/h 4-6 81 301-340mg/dl 40ml/h 6-8 >340mg/d 50ml/h 8-10 6.9. Manuseio pós-parto Reiniciar esquema prévio de insulina ou anti-diabetico oral quando a paciente reiniciar sua alimentação. Utilizar a insulina em doses pequenas, como aquelas utilizadas antee de engravidar. Transição entre Insulina EV e SC. Reiniciar NPH 2 hs antes da suspensão da Bomba de Infusão. Reiniciar NPH + REG, 30 minutos antes de suspender a Bomba de Infusão. Reiniciar NPH + UR imediatamente após a suspensão da Bomba de Infusão. As alterações metabólicas secundárias ao estresse cirúrgico podem persistir por até 04 dias após a cirurgia. Deve-se manter o suporte nutricional de 1.800cal/dia no pósoperatório, administrando 600Kcal através de SG 5%, enquanto a paciente permanecer em dieta zero. 6.10. Acompanhamento pós- parto TOTG-75g realizado por volta da 6ª semana do puerpério. Critério: Glicema em jejum < 126 mg/dl Glicemia após 02 h> 200 mg/dl Diabetes Melitus 82 Glicemia em 140-200 mg/dl Intolerãncia à glicose Se normal, realizar glicemia de jejum a cada 3 anos. Anticoncepção de baixa dose (se controle glicêmico adequado). 6.11. Diabetes pré- gestacional DM diagnosticado antes gravidez (DM1 ou DM2) ou no primeiro trimestre. Efeitos da hiperglicemia materna na concepção: o malformações congênitas : Cardiopatias complexas , síndrome da regressão caudal ( sirenomelia ) , anencefalia , agenesia renal, atresia duodenal . A mais frequente malformação associada ao diabetes é a cardiopatia ; contudo , a mais característica desta endocrinopatia é a sirenomelia . No primeiro trimestre, ocorre aumento da sensibilidade a insulina pelo E, hiperêmese e com tendência a hipoglicemia (pode ocorrer redução da dose de insulina habitual). No 2º e 3º trimestres - com aumento da resistência a insulina pelos hormônios placentários - maior risco de cetose (há aumento da necessidade de insulina, com aumento da dose habitual). Agravamento de retinopatia (RP pode ter risco de cegueira), nefropatia, neuropatia autonômica e cardíaca. Uso de ácido fólico 5mg/dia (mínimo de 12 semanas préconcepção até 12ª de gestação). Atividade física: recomendada, exceto em: o DHEG; 83 o amniorrexe prematura; o indícios de trabalho de parto pretermo; o STV persistente após 2º trimestre; o RCIU; o síndrome nefrótica; o retinopatia pré ou proliferativa; o hipoglicemias inexplicadas; e o neuropatia autonômica periférica avançada. Tratamento:- insulina Metformina e glibenclamida- continuam sem fortes evidencias. Tratamento com múltiplas doses de insulina basal-bolus é o ideal. Geralmente é necessária redução de dose, cerca de 10-20% no primeiro trimestre e aumento entre 18-24 semana de gestação. DM 2 previo- converter medicação oral para insulina ( DOSE 0,71,0U/kg/dia). DMG clássico- suspender insulina logo após o parto. Parto a termo se não houver complicações. Insulinas de ação rápida ( análogos) são seguros na gestação. Insulina ultralenta(glargina e levemir) recomendação C. A bomba de insulina pode ser usada, mas não iniciada na gestação. A redução da necessidade insulina no 2º e 3º trimestres pode sugerir morte fetal intrauterina. 84 BIC com baixas doses (20ml/h) ou insulina regular SC conforme esquema. Pós-parto: redução de 50% da dose de insulina em 5-6 dias. 6.12 Complicações tardias maternas e fetais 6.12.1 Maternas DM2 (17-63% entre 5-16 anos). HAS. Recorrência de DMG – em até 50% dos casos. 6.12.2 Fetais DM. Baixo peso ou obesidade. Déficit de desenvolvimento. 6.13 Bibliografia AMERICAN DIABETES ASSOCIATION. Standards of medical care in diabetes-2011. Diabetes Care. 2011; vol. 34(Suppl 1), p. 11-61. BRASIL, Ministério da Saúde. Gestação de alto risco. Brasília, 2010. 183-192 p. Febrasgo, Diabetes Mellitus Gestacional . In: FEBRASGO (Comp.). Manual de Gestação de Alto Risco. São Paulo: Casa Leitura Médica, 2011. Cap. 3, p. 47-64. Febrasgo, Diabetes Mellitus preexistente à gestação. In: FEBRASGO (Comp.). Manual de Gestação de Alto Risco. São Paulo: Casa Leitura Médica, 2011. Cap. 4, p. 65-76. INTERNATIONAL PREGNANCY STUDY ASSOCIATION GROUPS OF CONSENSUS DIABETES PANEL. AND International 85 Association of Diabetes and Pregnancy Study Groups recommendations on the diagnosis and classification of hyperglycemia in pregnancy. Diabetes Care. 2010. Vol. 33(Suppl. 3), p. 676-682. LEE, S., PETTKER, C., FUNAI, E., NORWITZ, E., THUNG, S. Is lowering the diagnostic threshold for gestational diabetes (GDM) cost-effective? Implications from the hyperglycemia and adverse pregnancy outcomes (HAPO) trial. Am J Obstet Gynecol. 2008; vol. 199(6 Suppl A), p. 199. MAGALHÃES, José Antônio; et. al. Diabetes melito e gestação. In: FREITAS, Fernando et al. Rotinas em obstetrícia. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2006. Cap. 35, p. 557-570 86 7 OBESIDADE E DISLIPIDEMIA 7.1. Introdução A obesidade, distúrbio metabólico que conduz ao aumento de peso com valores acima da média para a altura, constitui um fator de risco para doenças crônicas e degenerativas, sendo considerado como um dos maiores, porém negligenciado problema de saúde pública da atualidade, visto que sua prevalência, inclusive durante a gestação, tem aumentado substancialmente. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o excesso de peso e a obesidade entre as mulheres cresceram 50% nos últimos 30 anos, sendo que, atualmente, mais da metade (51,9%) das brasileiras entre 20 e 44 anos estão com um IMC acima de 25. No período de gestação ocorre intenso e peculiar processo de formação de tecidos e transformações orgânicas. A mulher grávida experimenta sobrecarga imposta ao funcionamento dos órgãos e em alguns deles impõem marcas indeléveis à sua passagem. Acredita-se que a gênese da obesidade em mulheres em idade reprodutiva seja resultante de uma multiplicidade de fatores envolvidos simultaneamente. Além dos hormônios normalmente presentes no ciclo menstrual e das alterações hormonais devido à presença de gravidez, fatores psicológicos, comportamentais e culturais podem também estar envolvidos. 7.2. Avaliação da gestante A avaliação do peso corporal e o estudo de hábitos alimentares, durante a avaliação pré-natal, são importantes para a identificação do estado nutricional das gestantes, sendo possível, dessa forma, a orientação nutricional individualizada, visando à melhoria das condições maternas para o parto e à adequação do peso do recém-nascido. O ganho de peso normal na gestação se deve principalmente aos produtos da concepção (feto, líquido amniótico e placenta) e ao aumento dos tecidos maternos (expansão do volume sanguíneo, do líquido extracelular, crescimento do útero e das mamas e aumento dos depósitos materno – tecido 87 adiposo), podendo ainda sofrer influência de fatores como estresse, condições de saúde e hábitos alimentares. A avaliação antropométrica constitui um método rápido e recomendado para acompanhar o estado nutricional durante a gestação. A partir do conhecimento do peso pré-gravídico e da altura, calcula-se o Índice de Massa Corporal (IMC), classificando a gestante como: baixo peso, adequado, sobrepeso e obesidade. Dessa forma, é possível indicar um ganho de peso de acordo com as recomendações: Avaliação antropométrica: Ganho de peso recomendado para a gestante: 7.3. Gravidez, obesidade e complicações A obesidade durante a gravidez está associada a um maior risco de infecções do trato urinário, de desordens tromboembólicas, da função cardiorrespiratória e do sistema esquelético-muscular, de doença hipertensiva específica da gravidez, diabetes mellitus gestacional, dislipidemia, efeitos adversos no sistema circulatório e maior número de partos do tipo cesariano. Alterações hemodinâmicas em obesas durante a gestação incluem o aumento da pressão arterial e alteração da função cardíaca. Desordens 88 hipertensivas são significativamente maiores em gestantes obesas do que em não obesas. Mesmo quando o sobrepeso é moderado, a ocorrência de hipertensão e pré-eclâmpsia é significativamente maior. A taxa de cesarianas é consistentemente maior em obesas, e as complicações pré-parto da obesidade contribuem para o aumento dessa taxa. Motivos que levam à cesariana geralmente incluem: desproporção cefalopélvica associada à macrossomia fetal, perigo de morte fetal e prolongamento do trabalho de parto. 7.3.1 Risco para o feto Existe relação direta entre o elevado peso pré-gestacional e o maior peso do recém–nascido, e também entre o ganho de peso durante a gestação e o peso do recém–nascido. O diabetes gestacional também afeta o crescimento fetal. A macrossomia aumenta o risco de lesão ao nascer ( distócia de ombro ) e de morte perinatal. Sabe-se que a obesidade está associada a distúrbios do metabolismo lipídico e do sistema endócrino. A hiperlipidemia pode, através da redução na secreção de prostaciclinas e elevação da produção de tromboxanos, aumentar o risco de trombose placentária e reduzir a perfusão placentária. Esse risco pode se elevar ainda mais nas pacientes que apresentam hiperlipidemia em associação à resistência insulínica, nas quais a atividade fibrinolítica está sabidamente comprometida. Assim, o risco aumentado de morte fetal, causado por disfunção fetoplacentária, pode ser explicado pelo fluxo sanguíneo debilitado. A combinação de crescimento fetal acelerado induzido pela hiperinsulinemia endógena, em mulheres obesas, e a limitação funcional da placenta na transferência de oxigênio suficiente para atender as necessidades fetais podem levar, em última análise, a hipóxia e óbito fetal. 89 7.3.2 Complicações a longo prazo No pós-parto, mães obesas estão mais propensas a ter complicações urinárias, como incontinência. Além disso, o ganho de peso gestacional excessivo pode aumentar a obesidade materna. Filhos de mães obesas apresentam maior risco de terem sobrepeso aos 12 meses de vida. Bebês macrossômicos são mais propensos a se tornarem obesos no futuro. A hipertensão durante a gestação também é responsável pela maior morbidade na infância. Aos seis anos de idade, a pressão sanguínea diastólica é maior em filhos de mulheres que desenvolveram pré-eclâmpsia durante a gestação. É importante lembrar que fatores genéticos também têm um grande papel no desenvolvimento da obesidade nos filhos de mães com sobrepeso. 7.4. Recomendações Dada a crescente prevalência de obesidade entre mulheres em idade fértil e considerando-se o fato de que o peso materno acima do ideal é um dos poucos fatores de risco potencialmente modificáveis e, provavelmente, relacionados a um desfecho gestacional desfavorável, estratégias que incluam a prevenção da obesidade gestacional fornecidas ainda no período periconcepcional se tornam atualmente importantes ações de saúde pública. O pré-natal constitui um momento privilegiado para a discução e esclarecimento de questões que mostram – se únicas para cada mulher. Tanto a gestante como a equipe de saúde devem se esforçar para identificar e eliminar os fatores de risco por meio de uma avaliação cuidadosa e tratamento apropriado. Dessa forma, as orientações nutricionais devem ser oferecidas de acordo com as possibilidades econômicas, sociais e culturais de cada paciente. Faz-se necessário um acompanhamento eficiente do ganho de peso adequado durante a gestação, bem como da mudança comportamental, por 90 meio de práticas alimentares saudáveis e atividades físicas. O tratamento das dislipidemias, durante a gestação, não deve envolver a utilização de medicamentos hipolipemizantes, visto que estes podem ter efeito deletério sobre o concepto. Problemas emocionais são geralmente percebidos como conseqüências da obesidade, embora conflitos e problemas psicológicos possam preceder o desenvolvimento dessa condição. No tratamento psicoterápico, a terapia cognitiva vem mostrando eficácia, por objetivar a organização das contingências para mudanças de peso e comportamentos, em princípio, relacionados ao autocontrole de comportamentos alimentares e contexto situacional mais amplo. 7.5. Gravidez após cirurgia bariátrica Pacientes com obesidade mórbida e/ou com complicações da obesidade, como hipertensão, diabetes, doença aterosclerótica, geralmente recorrem à cirurgia bariátrica. A técnica empregada , em geral , é a de Capella ou gastroplastia com ressecção parcial do estômago. Dados da literatura apontam que, comparando-se gestações de pacientes obesas mórbidas antes da gastroplastia e após a perda de peso induzida pela cirurgia, encontra-se redução significativa na necessidade de cesárea, incidência de macrossomia e de diabetes gestacional. Fato particularmente importante em relação ao planejamento da gestação em pacientes previamente submetidas à gastroplastia diz respeito aos aspectos nutricionais. Uma vez que essas pacientes podem evoluir com deficiências de alguns compostos como ferro, vitamina B12, folato e cálcio, isso poderia resultar em aumento do risco para complicações maternas (anemia) e fetais (defeito no tubo neural, restrição no crescimento intrauterino), recomendando-se o adequado manuseio especialmente quando se planeja uma nutricional no pós-operatório, futura gestação, para assegurar concentrações séricas adequadas desses nutrientes antes da gestação. 91 Recomenda-se a utilização a longo prazo de compostos polivitamínicos para todos as pacientes que realizaram gastroplastia. Os acompanhamentos são usualmente semestrais, e se a paciente apresenta anemia, deficiência de albumina ou hiperparatiroidismo secundário, uma suplementação constituída de sulfato ferroso, proteínas e cálcio/vitamina D, respectivamente, são , de pronto , iniciadas. Ocorrência de hérnias internas tem sido relatada na literatura, de modo que devemos ficar atentos a essa complicação potencial. Alguns cuidados devem ser levados em consideração para minimizar riscos em gestantes que foram submetidas a uma gastroplastia. A paciente deve ser aconselhada a não engravidar no primeiro ano pós-cirurgia, visto que esse é o período em que a perda de peso se faz de forma mais intensa. Se a paciente engravida nesse período , certamente terá prejuízo , justo na fase de maior perda ponderal . Além disso, as quantidades de alimentos ingeridos neste período de adaptação geralmente são menores, de modo que o risco de desnutrição, é , teoricamente maior. Outro aspecto importante do acompanhamento pré-natal, que merece consideração especial nas mulheres que engravidam após gastroplastia, diz respeito ao rastreamento do diabetes gestacional. Essa estratégia é comumente realizada pelo do teste oral de tolerância à glicose, após sobrecarga oral de 75 g de glicose, entre a 24a e a 28a semana de gestação. A realização do teste oral de tolerância à glicose não deve ser recomendada nessas pacientes, tendo em vista o risco do aparecimento da síndrome de dumping. Essa síndrome decorre do esvaziamento gástrico rápido e consiste de náuseas, vômitos, sudorese fria, astenia, desconforto abdominal. A cirurgia bariátrica aparentemente não compromete o desenvolvimento fetal intrauterino nem o crescimento e desenvolvimento da criança no primeiro ano de vida. Entretanto, a maioria dos estudos a casuística é pequena, ainda não tendo evidência forte na literatura. Diante disso, investigações adicionais são necessárias para estabelecer recomendações apropriadas com relação ao seguimento dessas gestações. 92 7.6 Bibliografia ASSUNÇÃO, L.P. et al. Ganho ponderal e desfechos Gestacionais em Mulheres atendidas pelo programa de saúde da família em Campina Grande, PB, Brasil. Revista Brasileira de Epidemiologia, São Paulo, v. 10, n 3, p. 352-360. Set/2007. BAIÃO, M.R., DESLANDES, S.F. Alimentação na gestação e puerpério. Revista Nutrição, Campinas, v.19, n. 2, p. 245-253. Março/Abril. 2006. CNATTINGIUS S., BERGSTRÖM R., LIPWORTH L., KRAMER MS. Prepregnancy weight and the risk of adverse pregnancy outcomes. N Engl J Med. 1998 338:147-52. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF 2002-2003. Rio de Janeiro, 2004. GALTIER-DEREURE, F., BOENGNER, C., BRINGER, J. Obesity and pregnancy: complications and cost. Am J Clin Nutr, v. 71, p. 1242S – 1248S, 2000. LEMOS AC, MACIEL AA, COELHO SC, RIBEIRO RL. 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