ENSINO DE RADIOATIVIDADE: UMA PROPOSTA INTERDISCIPLINAR E CONTEXTUALIZADA MOTA, Matheus Leão¹ DUARTE, Ana Rosa¹ ¹Universidade Federal do Pará (UFPA), Instituto de Ciências Exatas e Naturais(ICEN), Faculdade de Química [email protected] / [email protected] RESUMO Este trabalho propõe uma abordagem de ensino alternativo ao tema Radioatividade em Química para alunos do Ensino Médio. De forma interdisciplinar, ou seja, atribuindo conhecimentos de outras áreas como na disciplina de História (Segunda Guerra Mundial, Guerra Fria, Corrida Armamentista, etc), além de conhecimentos da disciplina de Física, Artes, Matemática, geografia e Literatura. Ambas no contexto histórico da aplicação da Radioatividade durante suas grandes descobertas e avanços no final do século XIX e início do século XX até os dias atuais. Tratando os “benefícios e malefícios” do uso da radioatividade, energia nuclear, etc. Contextualizando com as diversas aplicações em demasiados setores, sua contribuição para a ciência, tecnologia e sociedade, assim como os acidentes, riscos e impactos ao homem e à natureza. Foram utilizados vídeos, textos e músicas como auxílio da capacidade de compreensão e assimilação destes conteúdos. Para um melhor processo de ensino-aprendizagem e análise dos resultados, também foram propostos atividades em sala e fora da mesma, buscando despertar o interesse investigativo dos alunos, bem como facilitar sua aprendizagem. Palavras Chaves: Radioatividade, Química, História 1- Introdução A Radioatividade (ou radiatividade, decaimento) é uma propriedade na qual alguns tipos de elementos químicos denominados “radioativos” emitem radiações a partir de transformações em seus núcleos atômicos, um fenômeno que acontece de forma natural ou artificial. A radioatividade natural ou espontânea ocorre através dos elementos radioativos encontrados na natureza (na crosta terrestre como o urânio, atmosfera, etc.). Já a radioatividade artificial ocorre quando há uma transformação nuclear, através da união de átomos (fusão) ou da fissão nuclear. Costuma-se dizer que esse fenômeno foi descoberto, acidentalmente, por Henri Becquerel, em 1896. Tudo aconteceu porque Becquerel guardou, em uma gaveta, um 307 composto de urânio juntamente com uma chapa fotográfica, havendo depois revelado a chapa e notado nela os sinais da radiação. Porém em 1895, antes dos estudos da radioatividade se iniciarem, o físico alemão Wilhelm Conrad Röntgen descobriu a existência do raio X. E isso suscitou quase instantaneamente um grande número de trabalhos acima deste tema, inclusive foi a principal motivação para o trabalho inicial de Becquerel. Muito se relacionava o raio X com corpos luminescentes, É a busca dessa relação entre fluorescência e raios X que irá levar aos estudos de Becquerel. Na verdade, de acordo com os nossos conhecimentos atuais, não existe relação direta entre a emissão de raios X e a luminescência. Mas é graças a essa pista falsa que muitas descobertas foram feitas. Em 1898, Dois anos depois do início dos estudos de Becquerel, o casal Curie (Marie e Pierre) na França e G.C. Schmidt na Alemanha se interessaram pelos estudos e ambos publicaram no mesmo ano um artigo sobre a descoberta da emissão de radiações pelo tório (até então só se conhecia o urânio como radioativo). Posteriormente, o casal Pierre e Marie Curie descobriu que outros elementos também emitiam esse tipo de radiação, que foi batizada de radioatividade por Marie Curie (CHASSOT, 1995) Além deles, diversos estudiosos como Bémont, Rutherford, Geisel, E. Dorn, Villard e Soddy publicaram descobertas a respeito da Radioatividade no início do século XX. Dentre as pesquisas desenvolvidas, a que proporcionou a mais marcante aplicação foi sobre a fissão do urânio. Em 1939, esta foi observada pelos alemães Otto Hahn e Fritz Strassmann e interpretada pela física austríaca Lise Meitner, já radicada na Suécia devido à perseguição dos nazistas. Nesse mesmo ano, o exército alemão invadiu a Polônia, iniciando a Segunda Guerra Mundial (1939- 1945). 1.1 - Fissões Nucleares e sua contribuição para a Segunda Guerra Mundial Otto Hahn e seu colega Fritz Strassmann fizeram vários experimentos bombardeando o urânio com nêutrons e no final do ano de 1938 se depararam com algo surpreendente: ao analisar o urânio por eles bombardeado, encontraram partículas de bário. O bário é bem menor do que o núcleo de urânio e, se do urânio surgiu o bário, então é porque o núcleo explodiu. Foi exatamente assim que Hahn me explicou ao telefone sua inesperada descoberta. (WEIZSÄCKER, 1939) 308 Durante a Segunda Guerra, em 1940, a Dinamarca foi invadida pelo exército Nazista. Niels Bohr, físico que propôs o modelo atômico de Bohr, que era dinamarquês, recebeu uma visita do alemão Werner Heisenberg e tomou conhecimento a respeito dos estudos de fissões no urânio na Alemanha e temeu pelo possível uso de toda a quantidade de energia liberada nesse processo para a fabricação de armamento. Bohr foi perseguido pelos nazistas e fugiu para os Estados Unidos onde encontrou Einstein e advertiu que a Alemanha e outros países do Eixo (Japão e Itália) tinham o conhecimento teórico para fabricação de uma bomba atômica. Heisenberg e até O. Hahn foram mantidos sob custódia na Inglaterra e gravações das conversas feitas por eles indicavam que o programa nuclear nazista ainda era fraco de conhecimento. O programa nuclear nazista não fora capaz de gerar um reator nuclear autossustentável e esses cientistas estavam confusos sobre as diferenças entre um reator e uma bomba atômica (KLOTZ, 1997) Porém, segundo Eric Hobsbawm, os cientistas sabiam o que estavam fazendo na Alemanha, porém os nazistas optaram em avançarem no âmbito da corrida espacial que prometiam medidas em curto prazo. Em essência, hoje está claro que a Alemanha nazista não conseguiu fazer uma bomba nuclear não porque os cientistas alemães não soubessem fazê-la, ou não tentassem fazê-la, com diferentes graus de relutância, mas porque a máquina de guerra alemã não quis ou não pôde dedicar-lhe os recursos necessários. Eles abandonaram a tentativa e passaram para o que parecia uma concentração mais efetiva em termos de custos, os foguetes, que prometiam um retorno mais rápido. (HOBSBAWM,1995). Os Estados Unidos entram na guerra em 1941. Até então sua economia era baseada no modelo fordista de fabricação em massa para consumo em massa, logo eles transferem esse aspecto econômico para o lado bélico, direcionando para uma “guerra industrial”. Naquele momento de guerra, os avanços tecnológicos eram grandes o suficiente para se ter armamentos fortes químicos e biológicos, aviões, etc. Mas a bomba atômica era mais importante do que tudo isso. Os Estados Unidos então desenvolveram um projeto secreto para o estudo da bomba atômica reunindo vários cientistas no qual ficou conhecido como Projeto Manhattan. Com custo estimado em dois bilhões de dólares, esse projeto representou a maior concentração de cientistas já reunida para trabalhar em um só tema (STRATHERN, 1998). 309 1.2 - A Era Atômica em meio às guerras “quentes e frias” A “Era Atômica” teve seu início em 1942 com pesquisas e testes de reatores e bombas nucleares, um teste inclusive aconteceu em Julho de 1945 no Alamogordo, um mês depois do suicídio de Hitler e a rendição Alemã. Em agosto do mesmo ano, a bomba atômica foi lançada na cidade de Hiroshima massacrando mais de 100 mil pessoas na hora e cerca de 200 mil em longo prazo pelos efeitos da radioatividade, três dias depois outra bomba é lançada na cidade de Nagasaki matando mais de 40 mil pessoas na hora e 140 mil em longo prazo. Um momento histórico que marcou o fim da segunda guerra mundial. Foi um momento que para muitos era debatido, pois alguns diziam que esse foi um jeito de pôr fim à guerra que poderia provocar um número maior de mortes e outros diziam que a guerra já ia acabar pelo rendimento da Alemanha antes das explosões e o rendimento do Japão já sendo previsto sem precisar do uso de bombas atômicas. A necessidade do uso da bomba é questionada até os dias de hoje. Antes do primeiro teste nuclear, a Alemanha já havia se rendido e a derrota do Japão, apenas com o uso de armamentos convencionais, já era prevista. Entretanto, para os EUA, a bomba representou muito mais do que a vitória na guerra: foi uma demonstração de poder, uma demonstração de força diante dos soviéticos e dos movimentos de libertação nacional que amadureciam na China, Coréia e países do Sudoeste Asiático (VIZENTINI, 2000). O fim da Segunda Guerra Mundial não pôs fim à corrida armamentista. Uma ordem mundial foi estabelecida no pós-guerra, que deu início à “Guerra Fria” entra os EUA e a URSS nos anos de 1947 a 1989. Todo avanço tecnológico ainda era usado para a fabricação de armas nucleares mais poderosas dando início a uma nova corrida armamentista e também espacial. Quando Josef Stalin tomou conhecimento dos possíveis avanços dos EUA e da Alemanha, retornou o até então interrompido programa nuclear e os soviéticos explodiram o seu primeiro armamento militar em 1949. Em 1952 os Estados Unidos passaram os Soviéticos na corrida armamentista com a criação da bomba de hidrogênio. É importante saber que outros países também faziam testes nucleares como a Inglaterra, França e China. Logo a URSS tratou de revidar o feito e saiu novamente na frente, com o lançamento do Sputinik em 1957 (Primeiro satélite espacial) e em 1961 lançou o primeiro homem em 310 órbita terrestre. Mas oito anos depois, os Estados Unidos superou novamente a União Soviética com a chegada do homem na lua. A corrida armamentista cresceu a ponto de abrir um debate sobre a possível extinção da humanidade com tantas armas poderosas. Então campanhas pelo desarmamento e fim de testes nucleares se espalharam pelo mundo dando início à conferência e tratados antinucleares que nem sempre eram respeitados. Mas isso não era o suficiente, pois só o que acabou “amenizando” o uso da energia nuclear para bombas foi o fim da Guerra Fria em 1989. 1.3 - Energia nuclear e aplicações “pacíficas” Finalmente, depois de guerra atrás de guerra, os cientistas começaram a usar a energia nuclear para geração de energia elétrica através de Usinas Nucleares. É claro que antes a radioatividade já tinha aplicações pacíficas em diversas áreas como os raios-X, radiografia, esterilização, datações de fósseis, etc. E também os estudos sobre usinas deram início na década de 50 pós-segunda guerra e durante a guerra fria. As usinas nucleares vieram como uma grande alternativa na geração de energia elétrica, pois como a demanda de energia era crescente, foi importante a descoberta de outras propostas. Essas usinas não precisariam de características geográficas específicas, áreas extensas como as Hidrelétricas, nem de combustíveis fósseis como o petróleo ou poluíam a atmosfera como as Termelétricas. Porém o custo e a manutenção são caros, além de que correm sérios perigos de acidentes nucleares e a preocupação com o lixo radioativo. Como previsto, o uso de usinas nucleares acarretou uma série de desastres que desviaram os olhos das bombas para os acidentes nucleares. Um deles foi o de Chernobyl em 1986, na Ucrânia. Inclusive este é o mais conhecido de todos os acidentes nucleares. Todavia, houveram outros acidentes como o de Three-Mile Island (EUA) em 1979, que foi o primeiro registrado. Em função de mobilizações populares a respeito dos acidentes nucleares e do lixo radioativo, muitos países começaram a desativar seus programas nucleares. Nos EUA, depois de Three-Mile Island, 21 dos 125 reatores foram desligados. Na Europa, após Chernobyl, apenas três reatores foram inaugurados. Várias conferências também foram feitas para minimizar o número de acidentes com controle e fiscalização adequada. 311 Não foi só o caso de acidentes nucleares e lixos radioativos que preocuparam os cientistas e populares a respeito do uso da radioatividade. Em 1987, aconteceu em Goiânia, no Brasil, um acidente radiológico com o césio-137 (material radioativo) encontrado por catadores dentro de uma cápsula em um hospital abandonado. O material foi vendido para um dono de ferro velho que rompeu a parte externa rodeada de chumbo, o que liberou a radiação e matou milhares de pessoas que ficaram expostas e esta radiação. Alguns anos depois a radioatividade “saiu de moda” com a diminuição dos riscos nucleares. Esse tema passou a ocupar um espaço cada vez menor na mídia e, consequentemente, nas discussões cotidianas. O foco ético das discussões científicas foi transferido para a genética e temas como clonagem, DNA e alimentos transgênicos foram incorporados ao nosso dia-a-dia. Um exemplo está no personagem Homem-Aranha (criado por Stan Lee e Steve Ditko) que ao ser criado, em plena Guerra Fria (1962), obteve seus poderes ao ser picado por uma aranha radioativa. Em 2000, foi proposto um novo começo, mais adequado aos jovens do século XXI: os poderes do herói vieram de uma aranha geneticamente modificada. 2 - O desafio do professor e a intenção contextual e interdisciplinar É óbvio que o professor deve sempre estar preparado com as condições onde o ensino se realiza, não somente com a estrutura escolar em si, mas também com a relação que mantém com os alunos e os processos utilizados para uma aprendizagem significativa. Nessa relação, além de ter uma função incentivadora e orientadora, o professor transmite e assimila conhecimentos, troca ideias, expressa opiniões, compartilha experiências, manifesta suas formas de ver e também observa outras. Assim, ele facilita a veiculação de ideais, valores e princípios de vida, contribuindo até para a formação da personalidade do aluno. O processo de ensino e aprendizagem não é unilateral, ou seja, não é só o professor o ser ativo, enquanto o aluno passivo “memoriza” conteúdos e fórmulas. Hoje em dia o professor tem o grande desafio de despertar o interesse do aluno, sendo a fonte incentivadora da motivação interna do aluno. Então cabe ao professor utilizar métodos que, de modo geral, desperte o interesse desses alunos. Propondo várias alternativas metodológicas que ajudem os estudantes a terem uma melhor capacidade de compreensão e assimilação dos conteúdos. A educação, tanto formal quanto informal ou não formal, é um fenômeno que só ocorre em razão de um processo básico de interação 312 entre pessoas, ou seja, a construção de conhecimentos são processos interativos. Portanto, nem professor e nem aluno são o centro do processo de aprendizagem, e sim a relação entre esses dois que mantém uma aprendizagem significativa. (GARCIA, 2000) A interdisciplinaridade pode se integrar com o propósito de promover uma interação entre o aluno, professor e cotidiano. É uma temática que é compreendida como uma forma de trabalhar em sala de aula, no qual se propõe um tema com abordagens em diferentes disciplinas. É compreender, entender as partes de ligação entre as diferentes áreas de conhecimento, unindo-se para transpor algo inovador, abrir sabedorias, resgatar possibilidades e ultrapassar o pensar fragmentado. É a busca constante de investigação, na tentativa de superação do saber. Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (PCNs) orientam para o desenvolvimento de um currículo que contemple a interdisciplinaridade como algo que vá além da justaposição de disciplinas e, ao mesmo tempo, evite a diluição das mesmas de modo a se perder em generalidades. O trabalho interdisciplinar precisa partir da necessidade sentida pelas escolas, professores e alunos de explicar, compreender, intervir, mudar, prever, algo que desafia uma disciplina isolada e atrai a atenção de mais de um olhar, talvez vários (PCNEM, 1999). Esse conceito fica mais claro quando se considera que realmente todo conhecimento mantém um diálogo permanente com outros conhecimentos que podem ser de questionamento, de confirmação e de aplicação. Para Paulo Freire (1987), a interdisciplinaridade é o processo metodológico de construção do conhecimento pelo sujeito com base em sua relação com o contexto, com a realidade, com sua cultura. Busca-se a expressão dessa interdisciplinaridade pela caracterização de dois movimentos dialéticos: a problematização da situação, pela qual se desvela a realidade, e a sistematização dos conhecimentos de forma integrada. (...) É importante enfatizar que a interdisciplinaridade supõe um eixo integrador, que pode ser o objeto de conhecimento, um projeto de investigação, um plano de intervenção. Nesse sentido ela deve partir da necessidade sentida pelas escolas, professores e alunos de explicar, compreender, intervir, mudar, prever, algo que desafia uma disciplina isolada e atrai a atenção de mais de um olhar, talvez vários. Explicação, compreensão, intervenção são processos que requerem um conhecimento que vai alem da descrição da realidade mobiliza competências cognitivas para deduzir, tirar inferências ou fazer previsões a partir do fato observado (MEC, 2002). 313 Então o professor tem o desafio de estimular o processo de aprendizagem do aluno de diversas formas, desde uma imagem, vídeo até uma atividade. Desse modo, o desafio se torna cada vez maior e o professor deve se adequar a isso com novidades que motivam o aluno a aprender aquele determinado assunto. Dois deles são abordados nesse trabalho: A Interdisciplinaridade e a Contextualização. Ambas requerem um esforço tanto do professor em ter domínio dos assuntos que serão abordados já que não são apenas da sua “área” e também da necessidade de passar para o cotidiano, quanto do aluno de assimilar esses conhecimentos no seu contexto histórico e formar opiniões críticas, construir conhecimento e até agir em cima deste. Entre os maiores desafios para a atualização pretendida no aprendizado de Ciência e Tecnologia, no Ensino Médio, está a formação adequada de professores, a elaboração de materiais instrucionais apropriados e até mesmo a modificação do posicionamento e da estrutura da própria escola, relativamente ao aprendizado individual e coletivo e a sua avaliação (PCNEM, 1999). Ao se desejar um ensino que faça sentido para os alunos no presente e não somente no futuro, ou nunca mais, isto é, um ensino que tenha a ver com a vida cotidiana dos indivíduos, com os fatos e questões do dia-a-dia, a necessidade da contextualização surge naturalmente. Machado (2000) enfatiza que: (...)Contextuar é uma estratégia fundamental para a construção de significações. Na medida em que incorpora relações tacitamente percebidas, a contextualização enriquece os canais de comunicação entre a bagagem cultural, quase sempre essencialmente tácita, e as formas explícitas ou explicitáveis de manifestação do conhecimento. 2.1- A abordagem da Radioatividade em sala de aula A Radioatividade tem sido abordada de forma geral, em livros de química do ensino médio e na sala de aula, com pouca ênfase histórica e grande ênfase aos conceitos (leis da radioatividade, cinética das desintegrações, meia-vida, etc.), estas formas de abordagens são tradicionais e “conteudistas”, passíveis de crítica, pois alguns fatos como os acidentes, guerras, desastres, datação de fósseis e radiologia citados anteriormente, que podem ser classificados como acontecimentos históricos e avanços tecnológicos, podendo estes ser utilizados como meio de transposição didática, sendo capaz de estimular significativamente os alunos, pouco se encontram nos materiais didáticos sendo também muito pouco mencionados pelos professores durante suas aulas. Dessa forma o aluno não terá uma visão crítica sobre o 314 tema, não será ativo e sim um memorizador. Decorando as leis e fórmulas para um vestibular o que leva ao velho questionamento: “o que isso vai ajudar na minha vida?”. Estes acontecimentos, uma vez associados aos conteúdos didáticos, podemos tornar a aprendizagem algo mais interessante e apreciável para os nossos alunos. Daí o interesse na interdisciplinaridade e contextualização. Há alunos que gostam mais de ciências humanas do que de exatas ou vice-versa, e trabalhar os dois juntos relacionados com o cotidiano desperta o interesse de ambos. Temos a capacidade de receber novas informações e, assim, entendermos o que se passa ao redor, porque as informações adquiridas associam-se à rede de representações conceituais de que dispomos. Nesse sentido, nada nos é totalmente novo e aquilo que não entendemos consiste em informações que não conseguimos associar à nossa rede de relações (GALEMBECK, 2009) O tema escolhido para este estudo – Radioatividade - é um dos conteúdos que se estabelece na grade de ensino para o 1º Ano do Ensino Médio e para o 3º ano do Ensino Médio e se torna importante devido também a ser um dos temas abordados em vestibulares em todo o território nacional e principalmente no ENEM. Frequentemente, quando questionados em aulas de química, sobre este tema ou sobre qualquer outro, os alunos costumam demonstrar uma visão um pouco debilitada em relação à ciência, indagados sobre alguns conceitos, acabam por justificar certos acontecimentos embasados em explicações muitas vezes diferentes daquelas que seriam aceitáveis cientificamente. Essas explicações dadas pelos alunos a certos fenômenos são chamadas de concepções alternativas (MORTIMER, 1995), e têm se mostrado importantes, como material de referência para a reflexão de professores de química e ciências, não só porque oferecem pistas sobre o pensamento dos alunos, mas também porque possibilitam a oportunidade de rever o que os professores, pensam e fazem em suas aulas. Outro fator bastante notável, este percebido em livros didáticos e também na fala de muitos professores, se refere ao julgamento, por parte dos mesmos, de alguns fenômenos científicos sendo considerados como uma verdade inquestionável. Segundo Chalmers a ciência até hoje se reflete com um alto nível de prestígio no meio social. Nos tempos modernos, a ciência é altamente considerada. Aparentemente há uma crença amplamente aceita de que há algo de especial a respeito da ciência e de seus métodos. A atribuição do termo “científico” a alguma afirmação, linha de raciocínio ou peça de 315 pesquisa é feita de um modo que pretende implicar algum tipo de mérito ou um tipo especial de confiabilidade (CHALMERS, 1993). Seguindo essa afirmativa, fica claro o entendimento da ciência, para alguns, como algo pronto, acabado, atemporal e histórica, sendo o seu entendimento considerado como privilégio de poucos, seletivo. Uma maneira de converter essa compreensão da ciência pode estar em, levar para a sala de aula, conceitos científicos trabalhados por meio de métodos de ensino diferenciados e alternativos que torne a aula mais significativa para o aprendiz, fazendo com que haja uma correlação entre os conteúdos mais complexos e os conteúdos que os alunos já sabem ou até trazem de casa, tornando assim, a ciência algo mais próximo da vida destes alunos, algo mais humano. No entanto, sabemos que ao adentrar em uma sala de aula o educador não possui um relatório da vida do educando, este fato ressalta novamente a importância do uso de metodologias de ensino variadas a fim de que se possam obter materiais/dados interessantes, para que juntamente com a interação do educando se faça o aprofundamento de conhecimentos que possibilitarão maior aproveitamento e rendimento das aulas. O que percebemos atualmente, com relação à convivência entre educando e educador em sala de aula é que está se encontra distante, acabando por se colocar como obstáculo no processo de ensino e aprendizagem, essa distância entre educar/educando, aqui referida por nós, é mencionada em termos da falta de utilização de contextos que aproximem o conteúdo abordado em sala com o dia a dia do aluno. “Se o conteúdo trabalhado tiver relação com a vida do educando, o êxito será maior”. A principal proposta é diminuirmos a ideia de disciplinas fragmentadas, enquanto na disciplina de Química trabalhamos com Radioatividade, em História poderiam ser trabalhados os fatores políticos que influenciaram os ataques das bombas de Hiroshima e Nagasaki (2º Guerra Mundial) e a Guerra fria, como exposta anteriormente, o que é à base do trabalho, mas também relaciona com várias disciplinas. Em Artes, as culturas (monumentos, esculturas, pintores) que prevaleciam naquela época, em Biologia (os problemas causados por mutações genéticas, por exposição a emissões radioativas) em Matemática (as cidades atingidas por radiação e o número de vítimas). Assim o educando e até o educador vejam a diversidade de um tema, ligado a diferentes conceitos e disciplinas que o deixa mais “real” e não mais um conteúdo de mais uma aula. 316 3 - Metodologia Até o momento, foi trabalhado esta proposta em um cursinho pré-vestibular localizado em Icoaraci, Belém – PA. Denominado “Classe A” com um total de 25 alunos. Realizando-se uma oficina no local, com o período de 2 horas. No início foi exposto um vídeo editado pelo autor deste trabalho, contendo cenas históricas desde a descoberta da radioatividade até o lançamento da bomba atômica e foi questionado aos alunos o que eles entendiam sobre a relação dos dois temas. Como previsto, a maioria não tinha ideia de como essas duas disciplinas poderiam estar ligadas. Então, iniciou-se a oficina explicando o processo de descoberta da radioatividade e seu avanço. Dando-se ênfase a “pouca” tecnologia que se tinha naquela época e o avanço desse tema, que foi tão rápido, tanto que em 1938 já estavam descobrindo as fissões nucleares. À medida que eram introduzidos alguns conceitos mais científicos como partículas, emissões e leis, os mesmos eram sempre relacionados com a vivência do educando. Foi mencionado seu uso na conservação de alimentos, tratamento radioterápico, modificação genética, esterilização por radiação, bomba atômica, lixo nuclear, sendo estes alguns tópicos que fazem parte do conteúdo aplicado. Mas tudo isso no decorrer dos processos históricos, ou seja, desde a descoberta até os dias atuais quase que cronologicamente. É importante ressaltar que foram utilizados vários recursos audiovisuais como imagens, vídeos, histórias em quadrinhos e até músicas a respeito do tema. O que despertou bastante o interesse dos alunos. Vídeos sobre uso radioativo pacífico e bélico, além de acidentes e desastres, os deixaram chocados de como algo invisível pode fazer tão mal e bem ao mesmo tempo. Poemas como “Rosa de Hiroshima – Vinícius de Morais, musicalizada pelo cantor Ney Matogrosso” fizeram os educandos interpretarem de várias formas os versos quando questionados e o uso de imagens das histórias de quadrinhos onde super-heróis e vilões obtinham poderes através da radioatividade deixaram a aula bastante interessante. 317 4- Resultados e Discussões Próximo do fim da aula, os alunos resolveram alguns exercícios do atual exame nacional do ensino médio (ENEM), mostrando bastante evolução na interpretação das questões, até mesmo na parte de leis e fórmulas como as leis da radioatividade e o tempo de meia-vida. Foi obervado também que a maioria se interessou pelo assunto a ponto de expor na sala algumas experiências que trouxera de casa e buscaram investigar mais sobre os usos da radioatividade. Inclusive pediram para colocar no quadro vários filmes sobre os desastres e acidentes ocorridos. Essa proposta mostrou que trabalhar com radioatividade da forma como é abordada em livros didáticos e até como vem sendo trabalho por alguns professores em sala de aula não é tão eficaz quando se trata de um ensino e aprendizagem significativos, pois não há diálogo na relação professor-aluno, o que termina por não despertar o interesse por parte dos alunos em aprender. 5- Conclusões O esforço no sentido de formar um cidadão crítico e consciente já é uma realidade nas escolas, mas tratar o aluno como um “pré-vestibulando” preparando-o para uma maratona de provas acaba contrariando esse esforço. O que falta é a complementação dos métodos de ensino, onde se dá através da diretoria, educadores e todos os responsáveis pelo processo de ensino e aprendizagem. Um déficit na metodologia pode acarretar ao educando um nível baixo de compreensão e interpretação do mundo ao seu redor, ficando tudo de forma superficial. Trabalhar com várias disciplinas e ainda relacionar com o cotidiano parece ser difícil e desafiador tanto para o educador quanto para o educando, mas essa proposta alternativa mostrou que é possível. Pois quando se é feito de forma organizada, com métodos alternativos para despertar o interesse e com a utilização de diversos recursos audiovisuais (e até mesmo sem esses recursos) o processo de ensino-aprendizagem se torna mais significativo. O aluno passa a ser um ser ativo, que interage com a aula e leva tudo para fora de sala também. Ele observa o mundo ao seu redor com o auxílio não só da ciência, mas da arte, da história, da literatura, etc. 318 Este método alternativo mostrou bastante eficácia em sala de aula, de modo que pôde auxiliar o educando em sua assimilação, compreensão, interesse e relação de conteúdos que aparentemente não têm nada em comum, indicando a interligação dos conteúdos nas disciplinas. Esta proposta também estimulou o interesse de alunos com dificuldades nas ciências exatas e humanas. Por exemplo, alguns gostavam de química, mas não de história ou vice-versa, e trabalhar com esse agregado de disciplinas de forma organizada contribuiu para a aprendizagem significativa de ambos os conteúdos. O mesmo foi observado tanto na resolução de exercícios quanto na investigação por parte dos alunos em quererem desfrutar mais do tema. 319 Referências Bibliográficas CHALMERS, A., F. O Que é Ciência Afinal? 2ª Edição. São Paulo: Editora Brasiliense, 1993. CHASSOT, A. Alfabetização científica: questões e desafios para a educação. 2ª Edição. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2001. CHASSOT, A.I. Raios X e radioatividade. Química Nova na Escola, n. 2, p. 19-22, 1995. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. Paz & Terra, São Paulo: 2004. GOLDEMBERG, J. Energia, meio ambiente & desenvolvimento. Trad. A. Koch. São Paulo: Editora da USP, 1998. GALEMBECK, Paulo de Tarso. Texto, Contexto e Contextualização. Disponível em http://www.filologia.org.br/xiicnlf. Acesso em: 14 junho 2009. HELENE, M.E.M. A radioatividade e o lixo nuclear. São Paulo: Scipione, 1996. HOBSBAWM, E.J. Era dos extremos O breve século XX: 1914 - 1991. 2ª ed. Trad. M. Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. KLOTZ, I.M. Captives of their fantasies: the german atomic bomb scientists. J. Chem. Educ., v. 74, p. 204-209, 1997. MARANGON, Cristiane; LIMA, Eduardo. Os novos pensadores da educação. Revista Nova Escola, São Paulo: Abril, agosto, n. 154, p.19-25, ago. 2002. MACHADO, N. J. Educação: projetos e valores. São Paulo: Escrituras, 200. MERÇON, Fábio; Quadrat, Samantha. A Radioatividade e a história do tempo presente. Química Nova Escola, São Paulo: 13 de Abril de 2004. MOREIRA, M. A., Aprendizagem Significativa Crítica. Disponível em: www.if.ufrgs.br/~moreira/apsigcritport.pdf. Acesso em 13 de jun de 2009. Ministério da Educação e Cultura - MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais: ensino médio: bases legais. 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