Barreiras sociais à democratização do acesso à educação

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CAVALCANTI, Ana Paula A. N.. Barreiras sociais à democratização do acesso à educação. In: Construindo Direito –
Periódico eletrônico do curso de Direito da Faculdade de Integração do Sertão – FIS, Serra Talhada, ano VI, v. 1, p. 19-38,
jan.-jun. 2016. ISSN 2177-9481.
BARREIRAS SOCIAIS À DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO À
EDUCAÇÃO
Ana Paula Antunes Novaes Cavalcanti
Resumo
O presente artigo trata dos obstáculos sociais que dificultam a democratização do acesso à
educação, conforme previsto na Constituição Federal do Brasil de 1988, onde determina que a
educação, direito de todos e dever do Estado e da família, visa o pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Devendo
ainda a educação ser disponibilizada de forma gratuita e universal, garantindo igualdade de
condições de acesso e permanência na escola. Ocorre que vários são os problemas sociais que
afetam diretamente a inclusão das crianças e adolescentes no ambiente escolar, tais como as
desigualdades sociais e a marginalidade.
Palavras-chave: Problemas sociais. Democratização. Educação.
Resumen
Este artículo se ocupa de los obstáculos sociales que obstaculizan la democratización del acceso
a la educación a lo dispuesto en la Constitución Federal de lo Brasil de 1988, que establece que
la educación, derecho universal y deber del Estado y de la familia, busca el pleno desarrollo de
la persona, su preparación para el ejercicio de la ciudadanía y su calificación para el trabajo. La
educación debe estar disponible de forma gratuita y universal, lo que garantiza la igualdad de
condiciones de acceso y permanencia en la escuela. Resulta que hay varios problemas sociales
que afectan directamente a la inclusión de los niños y adolescentes en el ámbito escolar, cómo
la desigualdad social y la marginalidad.
Palabras clave: Problemas sociales. Democratización. Educación.
INTRODUÇÃO
A educação é o elemento da vida social responsável pela organização das experiências
dos indivíduos na vida cotidiana, pelo desenvolvimento de sua personalidade e pela garantia da

Advogada, Especialista em Administração Pública, Mestranda em Educação na Universidad de la Empresa
(UDE), Professora no curso de Direito na Faculdade de Integração do Sertão – FIS. E-mail:
[email protected]
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sobrevivência e do funcionamento das próprias coletividades humanas. Portanto, olhar a
educação do ponto de vista da sociologia é compreender que se a pedagogia é o fundamento
das práticas educacionais, as crenças, os valores e as normas sociais são os fundamentos da
pedagogia.
Por outro lado, quando se fala de educação moderna, na realidade está se fazendo
referência a um fenômeno de origem relativamente recente que surge no cenário mundial a
partir da Revolução Francesa, sendo dos Estados democráticos, a forma de sistemas nacionais
de ensino. Portanto, para Ocaño (2010), a educação na modernidade significa a escola pública,
laica, obrigatória e universal, implantada a partir do século XIX.
É dessa forma que a pedagogia embutida nas práticas educacionais, se vinculam às
normas e aos valores sociais. As normas são tanto as leis e regulamentos inscritos na estrutura
jurídica, quanto às convenções estabelecidas no seio dos grupos sociais. Enquanto os valores
são as escalas de aprovação e reprovação de critérios de julgamento de si e dos outros, que
nunca são individuais, mas sim compartilhados pelos indivíduos na vida social.
Portanto, para Durkheim, a educação é essencialmente o processo pelo qual se aprende
a ser membro da sociedade, educação é socialização. Pois através da educação o ser individual
transforma-se em ser social. Essa socialização se opera desde o nascimento, na família, porém
é na escola que é sistematizada. Dessa forma, Durkheim (1985) entende a educação como sendo
a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas
para a vida social; tendo por objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados
físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política, no seu conjunto, e pelo meio
moral a que a criança, particularmente, se destine.
Segundo Piaget (1977), falar de um direito à educação é, pois, em primeiro lugar,
reconhecer o papel indispensável dos fatores sociais na própria formação do indivíduo e, mais,
entender que as principais condições sociais do homem são adquiridas por transmissão exterior,
desenvolvendo-se em função das interações sociais múltiplas e diferenciadas. Portanto, se pode
dizer que a educação é um dos processos de formação da pessoa humana, inserindo estas na
sociedade.
Assim, no desenvolver deste artigo, serão tratados os obstáculos sociais atinentes ao
acesso à educação. Passando pela questão das desigualdades sociais frente à educação, pela
problemática da marginalidade e, utilizando a educação como forma de mudança e inclusão
social.
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AS DESIGUALDADES SOCIAIS FRENTE À EDUCAÇÃO
A origem da desigualdade social na humanidade está diretamente ligada a relação de
poder, estabelecida desde o princípio dos tempos, popularmente conhecida como a lei do mais
forte. O homem sempre teve seu lugar de destaque, constituído através da força e da
inteligência, em que, por meio de combates, através de um melhor uso das aptidões que
possuem, estabelecia domínio e liderança sobre os demais, causando, assim, as primeiras
relações de desigualdade social que se tem notícias no mundo. Uns detinham as melhores partes
da caça, as melhores companheiras sexuais, as melhores moradias, enquanto que outros estavam
fadados a morrer de fome ou nos enfrentamentos com os semelhantes mais fortes e inteligentes.
Após o surgimento das relações de comércio, os tipos de desigualdades sociais foram se
tornando mais e mais complexos e crescentes, principalmente com a consolidação do
capitalismo e a expansão industrial. A antiga sociedade do período medieval estava, portanto,
se transformando, inclusive no que diz respeito aos tipos de desigualdades que antes se davam
apenas na relação de poderio entre senhores e vassalos, monarquia e plebe. Com a revolução
industrial e a crescente relação comercial estabelecida em todo o mundo, passa a se perceber
diferenças em todo o contexto social, e em esferas mais específicas das camadas sociais, como
patrão e empregado.
Uma das principais características do capitalismo é o acúmulo do capital que faz
movimentar a economia. Então, quem detém o capital é quem possui as melhores condições de
moradia, acesso aos recursos, educação, etc. Ao mesmo tempo, quem está do outro lado do
sistema, que o faz funcionar, são os trabalhadores que não detém renda nem capital, estão na
extremidade inferior da relação. Portanto, percebe-se assim um contexto de desigualdade social,
gerada primordialmente pela diferenciação econômica entre pessoas, entre classes.
Corroborando com esse entendimento, Rousseau (1989) declarara:
Concebo uma espécie humana, duas espécies de desigualdade: uma, que
chamo de natural ou física, porque é estabelecida pela natureza, e que consiste
na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do
espírito, ou da alma; a outra, que se pode chamar de desigualdade moral ou
política, porque depende de uma espécie de convenção, e que é estabelecida
ou, pelo menos, autorizada pelo consentimento dos homens. Consiste esta nos
diferentes privilégios de que gozam alguns com prejuízo dos outros, como ser
mais ricos, mais honrados, mais poderosos do que os outros, ou mesmo
fazerem-se obedecer por eles.
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A desigualdade social e a pobreza são problemas sociais que atingem a grande
maioria dos países atualmente. No entanto, a pobreza existe em todos os países, pobres ou ricos,
mas a desigualdade social é um fenômeno que afeta principalmente os países não
desenvolvidos. Ademais a desigualdade social compreende diversos tipos de desigualdades,
desde desigualdade de oportunidades, resultado, etc., até desigualdades de escolaridades, de
renda, de gênero, entre outros. Sendo a desigualdade econômica a mais conhecida e
habitualmente chamada de desigualdade social.
É talvez por um efeito de inércia cultural que se toma o sistema escolar como um fator
de mobilidade social, segundo a ideologia da escola libertadora, quando, ao contrário, tudo
tende a demonstrar que esse é um dos fatores mais eficazes de conservação social, pois fornece
a aparência de legitimidade às desigualdades sociais, e sanciona a herança cultural e o dom
social tratado como dom natural. Nesse sentido, conforme os ensinamentos de Bourdieu (2013),
Justamente porque os mecanismos de eliminação agem durante todo o cursus1,
é legítimo apreender o efeito desses mecanismos nos graus mais elevados da
carreira escolar. Ora, vê-se nas oportunidades de acesso ao ensino superior o
resultado de uma seleção direta ou indireta que, ao longo da escolaridade, pesa
com rigor desigual sobre os sujeitos das diferentes classes sociais. Um jovem
da camada superior tem oitenta vezes mais chances de entrar na universidade
do que o filho de um assalariado agrícola e quarenta vezes mais do que um
filho de operário, e suas chances são, ainda, duas vezes superiores àquelas de
um jovem de classe média. É digno de nota o fato de que as instituições de
ensino mais elevadas tenham também o recrutamento mais aristocrático.
No entanto, não é suficiente enunciar o fato da desigualdade diante da escola, é preciso
descrever os mecanismos objetivos que determinam a eliminação contínua das crianças
desfavorecidas. Para Bourdieu, na realidade, cada família transmite a seus filhos, mais por vias
indiretas do que diretas, certo capital cultural e certo ethos, sistema de valores implícitos e
profundamente interiorizados, que contribui para definir, entre coisas, as atitudes face ao capital
cultural e à instituição escolar.
Uma análise multivariada, levando-se em conta não apenas o nível cultural do pai e da
mãe, o dos avós paternos e maternos e a residência no momento dos estudos superiores e durante
a adolescência, mas também uma soma de características do passado escolar, como, por
exemplo, o tipo de estabelecimento de ensino, possibilita explicar os diferentes graus de êxito
1
Expressão latina empregada pelo autor para designar percurso efetuado pelo aluno ao longo de sua carreira
escolar.
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obtidos pelos diferentes subgrupos definidos pela combinação desses critérios, e isso sem
apelar, absolutamente, para as desigualdades inatas.
O nível de instrução dos membros da família e a residência são apenas indicadores que
permitem situar o nível cultural de cada família, sem nada informar sobre o conteúdo da herança
que as famílias mais cultas transmitem a seus filhos, nem sobre as vias de transmissão. Para
Bourdieu (2013), as crianças oriundas dos meios mais favorecidos não devem ao seu meio
somente os hábitos e treinamento diretamente utilizáveis nas tarefas escolares, e a vantagem
mais importante não é aquela que retiram da ajuda direta que seus pais lhes possam dar. Elas
herdam também saberes e um bom gosto, cuja rentabilidade escolar é tanto maior, quanto mais
frequente esses imponderáveis da atitude são atribuídos ao dom.
As atitudes dos pais e crianças de diferentes classes sociais a respeito da escola, da
cultura escolar e do futuro oferecido pelos estudos são, em grande parte, a expressão do sistema
de valores que eles devem à sua posição social. Isso explica como, em nível igual de êxito
escolar, as diferentes classes sociais enviam à quinta série partes tão desiguais de suas crianças,
invocando-se explicações, tais como a vontade dos pais. Essas mesmas condições que definem
as atitudes dos pais e dominam as escolhas importantes da carreira escolar, regem ainda a
atitude das crianças diante dessas escolhas.
Ainda que o êxito escolar e a taxa de entrada na quinta série dependam da classe social,
as desigualdades das taxas de entrada nessa série são mais afetadas pela origem social do que
pela desigualdade de êxito escolar. Tal fato demonstra que os obstáculos são cumulativos, tendo
em vista que as crianças de classes populares e médias que atingem em regra uma taxa de êxito
menor, devem ter um êxito maior para que sua família e seus professores as estimulem a
prosseguir seus estudos.
O princípio que leva à seleção das crianças das classes populares e médias, se
estabelecem de forma que as crianças dessas camadas sociais que, por falta de capital cultural,
têm menos oportunidades que as outras de demonstrar um êxito excepcional devem, no entanto,
apresentar um êxito excepcional para chegar ao ensino secundário. Nesse sentido, as estatísticas
mostram que o crescimento da taxa de escolarização secundária dissimula o fato de que as
crianças das classes populares devem pagar seu acesso a esse nível de ensino com um
estreitamento considerável do campo de suas possibilidades de futuro.
O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo, pois segundo dados da ONU, em
2005 o Brasil era o 8º país mais desigual do mundo. Alguns pesquisadores atribuem a
persistente desigualdade brasileira a fatores que remontam ao Brasil Colônia, antes de 1930, ao
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defenderem que são três os pilares coloniais que sustentam a desigualdade: a influência ibérica,
os padrões de títulos de posse de latifúndios e a escravidão.
Resta claro que essas variáveis contribuíram muito para a desigualdade brasileira
continuar por séculos em níveis inaceitáveis. Entretanto, a desigualdade social no Brasil tem
sido percebida nas últimas décadas, em decorrência do efetivo processo de modernização que
tomou conta do país no início do século XIX. Agregado ao desenvolvimento econômico,
cresceram também a miséria, as disparidades sociais, a concentração de renda, o desemprego,
a fome que atinge milhões de brasileiros, a mortalidade infantil, a baixa escolaridade, a
violência, expressando a que grau chegaram as desigualdades sociais no Brasil.
Apesar de ser um país rico em recursos naturais, o Brasil é um país extremamente injusto
no que diz respeito à distribuição de seus recursos entre a população. Um país rico, porém, com
um número elevadíssimo de pessoas pobres, devido ao fenômeno da desigualdade social. A
ONU mostra ainda como principais causas de tanta desproporcionalidade social, a falta de
acesso à educação de qualidade, uma política fiscal injusta, baixos salários e dificuldades da
população em desfrutar de serviços básicos oferecidos pelo Estado, como saúde, transporte
público e saneamento básico.
É extremamente delicado se realizar um estudo cuidadoso sobre o caráter assumido
pela escola pública elementar num país onde a superação da pobreza jamais compôs
efetivamente a pauta política nacional. No entendimento de Victor Vicent Valla (1994),
A partir da investigação das práticas históricas de utilização instrumental da
escola pública para a realização de ações que deveriam caber a outras políticas
setoriais sociais, como saúde e assistência, fazendo uma análise original da
escola pública fundamental, no Brasil, predominantemente “a escola dos
pobres”. Possibilita uma melhor avaliação das funções estratégicas assumidas
pela expansão escolar no processo histórico de formação do Estado brasileiro,
bem como no contexto atual, de seu reajuste estrutural. Nesse sentido,
empreende, igualmente, rico exame da história da contenção do acesso dos
pobres aos direitos sociais no país, evidenciando a desigualdade como marca
estrutural de nossa organização social, econômica e política.
A desigualdade está muito mais presente do que se imagina, seja no contexto social,
político, econômico, etc. Certamente, a solução mais eficiente para essas diferenças sociais, é
o acesso a uma educação de qualidade, democraticamente garantida a todos os cidadãos,
especialmente às crianças e adolescentes, por estarem em idade de formação da personalidade.
Além disso, acabar com a ideia de que escola pública é para pobre e escola particular, para rico.
O ideal que se deve alcançar é de que o ensino seja de qualidade e formador de cidadania,
independentemente da escola, bairro ou preço. Só assim, se formam cidadãos investidos do
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princípio da igualdade entre todos, conforme preceitua a Constituição Federal do Brasil,
corroborado pelos ensinamentos de Bourdieu (2013),
Para que sejam favorecidos os mais favorecidos e desfavorecidos os mais
desfavorecidos, é necessário e suficiente que a escola ignore, no âmbito dos
conteúdos do ensino que transmite, dos métodos e técnicas de transmissão e
dos critérios de avaliação, as desigualdades culturais entre as crianças das
diferentes classes sociais. Em outras palavras, tratando todos os educandos,
por mais desiguais que sejam eles de fato, como iguais em direitos e deveres,
o sistema escolar é levado a dar sua sanção ás desigualdades iniciais diante da
cultura.
A igualdade formal que pauta a prática pedagógica serve como máscara e justificação
para a indiferença no que diz respeito às desigualdades reais diante do ensino e da cultura
transmitida. Assim, deve-se compreender que a educação é a principal forma de intervenção no
mundo, de construção do conhecimento e de inclusão social. No entanto, os Estados não veem
cumprindo satisfatoriamente o dever de disponibilizar o acesso à educação para todos, sem
distinção de cor, sexo ou religião.
O DIREITO À EDUCAÇÃO E O PROBLEMA DA MARGINALIDADE
O contingente de crianças em idade escolar que sequer tem acesso à escola, já se
encontra, a princípio, marginalizadas dela. De acordo com os dados divulgados pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (Pnad) de 2011, o Brasil tem mais de 3,5 milhões de crianças e adolescentes, entre
4 e 17 anos, fora da escola.
Segundo a pesquisa, o país possuía em 2011 um total de 45,5 milhões de crianças e
adolescentes com idades entre 4 e 17 anos, idades estas correspondentes aos ciclos da préescola, ensino fundamental e ensino médio. É nessa faixa etária que é imprescindível que
crianças e adolescentes estejam na escola, pois é por meio da educação que se dar a formação
do cidadão, de sua personalidade.
Além disso, foram identificadas, nesta mesma pesquisa, 13,2 milhões de pessoas que
não sabiam ler nem escrever, tendo 15 anos ou mais de idade, ou seja, eram 8,7% do total da
população, formados por analfabetos. Os simples dados acima indicados lançam de imediato a
realidade da marginalidade relativamente ao fenômeno da escolarização.
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A marginalidade considera que as minorias têm uma cultura diferente e inferior em
relação à cultura dominante. E, portanto, a marginalidade social aplica-se à pessoa que se
encontra à margem do contexto social, sem usufruir das oportunidades e privilégios, tais como
a oportunidade de acesso à educação, moradia, saúde, dentre outra.
Entretanto, de acordo com os ensinamentos de Demerval Saviani (2008), pode-se dizer
que, em relação à questão da marginalidade, as teorias educacionais podem ser classificadas em
dois grupos. No primeiro, tem-se a teoria que entende ser a educação um instrumento de
equalização social, portanto, de superação da marginalidade. No segundo, estão as teorias que
entendem ser a educação um instrumento de discriminação social, logo, um fator de
marginalização. Diz ainda que, para o primeiro grupo,
A sociedade é concebida como essencialmente harmoniosa, tendendo à
integração dos seus membros. A marginalidade é, pois, um fenômeno
acidental que afeta individualmente um número maior ou menor de seus
membros, o que, no entanto, constitui um desvio, uma distorção que não só
pode como deve ser corrigida. A educação emerge aí como um instrumento
de correção dessas distorções. Constitui, pois, uma força homogeneizadora
que tem por função reforçar os laços sociais, promover a coesão e garantir a
integração de todos os indivíduos no corpo social.
Enquanto o segundo grupo das teorias entende a sociedade como sendo essencialmente
marcada pela divisão entre classes antagônicas que se relacionam à força, a qual se manifesta
fundamentalmente nas condições de produção da vida material. Nesse contexto, a
marginalidade é entendida como um fenômeno inerente à própria estrutura da sociedade.
Sendo assim, a educação é totalmente dependente da estrutura social geradora da
marginalidade e está longe de ser um instrumento de superação da marginalidade, convertendose num fator de marginalização, já que a sua forma de reproduzir a marginalidade social é a
produção da marginalidade cultural, mais especificamente, escolar.
A constituição dos sistemas nacionais de ensino tem origem em meados do século XIX
e sua organização foi inspirada no princípio de que a educação é direito de todos e dever do
Estado. Este direito de todos à educação decorria da sociedade correspondente aos interesses
da nova classe que vinha a se consolidar no poder: a burguesia. Entretanto, para superar a
situação de opressão, se fazia necessário romper a barreira da ignorância. Só assim seria
possível transformar os súditos em cidadãos livres por serem esclarecidos.
Assim, a causa da marginalidade se identifica com a ignorância. Pois, era marginalizado
da nova sociedade, quem não era esclarecido. A escola surge neste contexto, como um antídoto
à ignorância. O papel da escola era difundir os conhecimentos acumulados pela humanidade e
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sistematizados logicamente. Mas, esta escola, além de não conseguir cumprir seu objetivo de
universalização, ainda teve que se curvar ao fato de que nem todos os bem-sucedidos se
enquadravam ao tipo de sociedade que se queria consolidar.
As críticas à pedagogia tradicional, surgidas no final do século XIX, foram dando lugar
à outra teoria da educação. A teoria mantinha a crença no poder da escola e em sua função de
equalização social. Mas a esperança de corrigir as distorções do fenômeno da marginalidade
por meio da escola sobreviveu. Pois se a escola não vinha cumprindo essa função, isto se devia
ao tipo de escola implantado, de certo, inadequado.
Para esta nova teoria, a marginalidade deixa de ser vista sob o âmbito da ignorância, ou
seja, o marginalizado não é mais o ignorante, mas sim o rejeitado. Surge, assim, uma pedagogia
que apresenta um tratamento diferente a partir da descoberta das diferenças individuais. Para
Saviani (2008, grifos do autor) a grande descoberta é que
Os homens são essencialmente diferentes; não se repetem; cada indivíduo é
único. Portanto, a marginalidade não pode ser explicada pelas diferenças entre
os homens, quaisquer que elas sejam: não apenas diferenças de cor, de raça,
de credo ou de classe, o que já era defendido pela pedagogia tradicional; mas
também diferenças no domínio do conhecimento, na participação do saber, no
desempenho cognitivo. Marginalizados são os “anormais” [...] Mas a
“anormalidade” não é algo, em si, negativo; ela é, simplesmente, uma
diferença.
Portanto, não é suficiente para caracterizar a marginalidade, que haja fenômenos
associados à rejeição. Pois a educação é ferramenta de correção da marginalidade, na medida
em que adaptar os indivíduos à sociedade, colocando neles o sentimento de aceitação dos
demais; ao passo em que contribuir para a constituição de uma sociedade onde não importem
as diferenças de quaisquer tipos, onde todos se aceitem mutuamente e se respeitem nas suas
individualidades.
No entanto, ao invés de resolver o problema da marginalidade, esta teoria o agravou.
Ela enfatizou a qualidade de ensino, tirando a preocupação do âmbito político para o técnicopedagógico, realizando simultaneamente duas funções: manter a expansão da escola em limites
suportáveis pelos interesses dominantes e desenvolver uma forma de ensino adequado a esses
interesses.
Em meados do século XX, esta teoria se mostrava com sinais de exaustão. Uma triste
desilusão se alastrava nos meios educacionais. Articulando-se, por conseguinte, uma nova
teoria, a partir do pressuposto da neutralidade científica e dos princípios da racionalidade,
eficiência e produtividade. Teoria esta que buscava planejar a educação de modo a dotá-la de
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uma organização racional, capaz de minimizar as interferências subjetivas que pudessem pôr
em risco sua eficiência.
Diante disso, se deu a padronização do sistema de ensino a partir de esquemas de
planejamento previamente formulados aos quais devem se ajustar as diferentes disciplinas e
práticas pedagógicas. Se na pedagogia tradicional a iniciativa cabia ao professor; e se na
pedagogia nova esta iniciativa desloca-se para o aluno; na pedagogia tecnicista, em questão, o
elemento principal passa a ser a organização racional dos meios, ocupando o professor e o aluno
posição secundária, num processo cuja concepção, planejamento e controle ficam a cargo de
especialistas habilitados, objetivos, imparciais.
Para esta teoria, então, a marginalidade não será identificada com a ignorância nem com
a rejeição. O marginalizado será o incompetente, ineficiente e improdutivo. A educação virá a
contribuir para vencer à marginalidade ao passo em que formar pessoas eficientes, aptas a
contribuir para o aumento da produtividade social. E, portanto, a equalização social é
identificada com o equilíbrio do sistema.
Após analisar as três teorias, Demerval Saviani (2008) conclui que estas concebem a
marginalidade como um desvio, tendo a educação por função, a correção desse desvio. A
marginalidade é vista como um problema social, e a educação, que dispõe de autonomia em
relação à sociedade, estaria, por esta razão, capacitada a intervir eficazmente na sociedade,
transformando-a, tornando-a melhor, corrigindo as injustiças.
A EDUCAÇÃO NO PROCESSO DE MUDANÇA SOCIAL
Não há como se falar em mudanças, sem se fazer referência á Paulo Freire, tendo em
vista que este tema, assim como o tema da conscientização, acompanha todas as suas obras. Ele
trata da mudança de uma sociedade de oprimidos para uma sociedade de iguais, e o papel da
educação, nesse processo de mudança, é a sua preocupação principal.
Segundo Moacir Gadotti, no prefácio da obra de Paulo Freire, intitulada Educação e
Mudança, do ano de 1983, “Paulo Freire combate a concepção ingênua da pedagogia que se crê
motor ou alavanca da transformação social e política. Combate igualmente a concepção oposta,
o pessimismo sociológico que consiste em dizer que a educação reproduz mecanicamente a
sociedade”. Assim, surge um pensamento pedagógico que leva o educador a se engajar social
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e politicamente, a perceber as possibilidades da ação social e cultural na luta pela transformação
das estruturas opressivas da sociedade.
Contudo, na sociedade evidencia-se de um lado, o poder abusivo, as influências
políticas, a corrida pelo poder e pelo consumo, de outro, a falta de conhecimento do povo, a
falta de engajamento político, a omissão dos reais agentes de transformação, a alienação dos
menos favorecidos. Nesse contexto, a educação tão fundamental para mudança social, vem
exercendo sua função de forma distorcida, onde o papel principal é legitimar os interesses da
classe dominante. Percebendo-se assim, o descompasso entre a educação e as transformações
na sociedade.
Para Émile Durkheim, um dos principais teórico da educação liberal, a educação atua
como agente de mudanças, ou seja, é provocador de modificações sociais e culturais na
sociedade envolvente. Dessa forma os educadores, principalmente os do ensino fundamental,
poderiam promover alterações no comportamento individual dos alunos e, através deles, da
sociedade. Foi Durkheim quem primeiro definiu o conceito de educação escolar moderna, pois
os pensadores que o procederam diziam como a educação deveria ser, mas ele disse o que a
educação é, a ação exercida pelos adultos sobre aqueles que ainda não estão maduros para vida
social.
Essas ideias de Durkheim vieram a influenciar o educador John Dewey, um dos
principais pensadores da educação no século XX. Para Dewey (1978), a escola deve educar
para o tipo de sociedade que pretende estabelecer. Sendo assim, à medida que a escola produzir
pessoas diferentes, contribuirá para a melhoria dessa sociedade. “a escola não é uma preparação
para a vida; a escola é a própria vida”, significa que o papel da escola é vivenciar em seu
cotidiano todos os comportamentos que deveriam promover a vida social. Logo, a escola se
tornará um viveiro de novos e melhores predicados, como a democracia e o desenvolvimento
social, que surgirão naquela sociedade.
Assim, a educação pode ser interpretada como a porta de entrada para mudança de
paradigma. Vive-se num momento de transformações de estruturas, tais como: globalização,
revolução tecnológica, formação de blocos econômicos. É preciso democratizar essas
informações com a finalidade de dar ao homem condições que lhe permita entender os contextos
históricos, sociais e econômicos em que estão inseridos. Tais pressupostos dão base ao homem
para uma perspectiva de inclusão social numa convivência justa, pacífica e de respeito às
diferenças.
Em Pedagogia do oprimido (2011), Freire crer numa educação que contribua para a
democratização por meio de um movimento de homens e mulheres que dedicam suas vidas a
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transformar a realidade. A educação pensada por ele, deve ser para a promoção do homem como
sujeito-histórico, movido por um compromisso ético e político com a superação de todas as
formas de opressão.
Paulo Freire reconhece ainda que a educação é essencialmente de conhecimento e de
conscientização e que, por si só, não leva uma sociedade a se libertar da opressão. E tem o
mérito não apenas de denunciar uma educação supostamente neutra, mas de distinguir com
clareza a pedagogia das classes dominantes da pedagogia das classes oprimidas.
Uma conscientização que parte apenas do educador, limitada ao ambiente escolar, é
insuficiente para construir uma verdadeira mudança social. Pois a educação e o papel do
educador não se resumem a isso. Se em alguma época o papel do educador parecia ser esse,
ultimamente, o pedagogo, intelectual engajado, cimentado com o oprimido, não pode limitarse a conscientizar dentro da sala de aula. Deverá aprender a se conscientizar com a massa.
Ademais, não se pode ignorar que a educação é sempre um ato político. Os que
defendem o contrário, afirmam que o educador não pode fazer política, defendem uma política
de despolitização. Mas, se ao contrário, se a educação brasileira sempre ignorou a política, a
política nunca ignorou a educação. A educação sempre foi política e sempre esteve a serviço
das classes dominantes.
Para falar na educação no processo de mudança social, não é possível refletir sobre o
que é a educação, sem juntamente refletir sobre o próprio homem. Pois não haveria razão de
existir a educação, se o homem fosse um ser acabado. Conforme os ensinamentos freireanos, o
homem pode fazer uma reflexão sobre si e se colocar num dado momento, numa certa realidade
de que é um ser que busca constantemente ser mais, e se descobrir como um ser inacabado, que
está em constante busca. Para Freire, esta sim é a raiz da educação.
Para tanto, existem concepções que envolvem ou são envolvidas pelos homens que
procuram a plenitude, fazendo com que a sociedade esteja em constante mudança. Pois existem
fatores que rompem o equilíbrio e daí os valores começam a decair, não correspondendo aos
novos anseios da sociedade. Mas, como a sociedade não morre, os novos valores começam a
buscar a plenitude. É este período acima descrito que se chama transição, e toda transição é
uma mudança, visto que não há transição que não implique um ponto de partida, um processo
e um ponto de chegada.
Além disso, existe uma série de fenômenos sociológicos que têm ligação com o papel
do educador. Para Freire, nesta etapa da sociedade, existem as massas populares espectadoras
passivas. Quando a sociedade se incorpora nessas massas, começa um processo chamado
democratização. As massas populares começam a se procurar e a procurar seu processo
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histórico. As massas descobrem na educação um canal para um novo status2 e começam a exigir
mais escolas. Começam a ter um desejo que não tinham, surgindo uma correspondência entre
a manifestação das massas e a reivindicação.
As massas passam a exigir voz e voto no processo político da sociedade, percebem que
outras pessoas têm mais facilidades e vantagens que eles e descobrem que a educação lhes abre
uma perspectiva. Às vezes emergem em posição ingênua e de rebelião ao se depararem com
alguns obstáculos. Querem ainda as massas, participar mais da sociedade, no entanto, acham
esta ideia absurda e criam instituições de assistência social para domesticá-las. Mas uma
sociedade justa dá oportunidade às massas para que tenham opção, mesmo não sendo a opção
dada a elite, e sim a própria opção das massas.
Para tanto, a educação, como diretriz para mudança social, perpassa pelo projeto político
pedagógico, a qual deve ser articulada por uma gestão participativa que visualize a
dinamicidade do currículo na comunidade escolar e de seu entorno. No entanto, os projetos não
podem permanecer apenas nas mentes dos diferentes grupos, não é suficiente, que existam
projetos pensados coletivamente, é necessário que os projetos e os seus pensadores assumam
uma dimensão política de forma a defender formas de superação da realidade social.
As mudanças no âmbito educacional dependem primordialmente da vontade política
dos diversos grupos que fazem a educação em suas variadas instâncias, a começar pela
comunidade escolar, que deve atuar de forma ativa buscando soluções para a problemática
vigente da escola e da comunidade.
Para um desenvolvimento satisfatório da escola, é preciso instituir uma relação
horizontal, onde faça valer a liberdade de falar, sugerir e buscar soluções para o bom caminhar
da escola. A socialização e a participação ativa do indivíduo na sociedade contribuem d certa
forma, para estimular uma reflexão sobre a realidade sociocultural, educativa e tecnológica e,
também o encaminhamento, das inovações e evolução social, pois, o currículo tem que está
com seus objetivos entrosados com os avanços sociais. Da mesma forma que os alunos precisam
construir conhecimentos para viverem em sociedade, também se faz necessário trabalhar com
toda gama de valores, atitudes e sentimentos essenciais a sua existência numa sociedade em
transformação.
Acredita-se, portanto, que a educação tem como função promover mudanças na
sociedade e, sabe-se que, a democracia, por preservar os princípios da igualdade e da
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Status é um termo oriundo do latim e significa a posição social de um indivíduo, o lugar que ele ocupa na
sociedade.
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fraternidade, mantém abertos os caminhos para a construção da liberdade e da justiça entre os
homens e as nações. Compreende-se que muito há que se fazer a favor da instalação e
consolidação de formas verdadeiramente mais justas e democráticas de convivência entre as
pessoas e instituições que integram a sociedade. Para que se faça cumprir a função da escola é
preciso que além de desenvolvimento da aprendizagem cognitiva o homem também aprenda
sobre solidariedade.
INCLUSÃO SOCIAL POR MEIO DO DIREITO À EDUCAÇÃO
Neste ponto faz-se uma abordagem sobre a questão do direito à educação em uma
perspectiva para além do texto constitucional. Pois não basta o Estado dá o direito à educação,
se faz necessário ainda que o ensino público seja de qualidade, igual para todos, formador de
cidadãos e sintonizado com a inovação científico-tecnológica. Pois o momento em que se vive,
clama por uma educação que tenha como eixo principal, a formação para o exercício pleno da
educação. Sobre cidadania Covre (2002) enfatiza que,
As pessoas tendem a pensar a cidadania apenas em termos dos direitos a
receber, negligenciando o fato de que elas próprias podem ser o agente da
existência desses direitos. Acabam por revelar os deveres que lhes cabem,
omitindo-se no sentido de serem também, de alguma forma, parte do governo,
ou seja, é preciso trabalhar para conquistar esses direitos. Em vez de meros
receptores, são acima de tudo sujeitos daquilo que podem conquistar.
Dessa forma, é de fundamental importância que o Poder Público, através da legislação,
proponha diretrizes que almejem à melhoria do processo educativo, garantindo além da
aprendizagem do aluno, a capacidade de cada um aplicar os conhecimentos adquiridos, nas
mais diversas situações da vida cotidiana, fazendo pleno gozo da sua cidadania. Visto que a
educação deve criar nos indivíduos a capacidade de compreender os seus direitos diante dos
problemas que afligem a sociedade contemporânea e a capacidade de desempenhar ações que
permitam reverter esta situação em prol de uma sociedade mais justa e comprometida com o
bem comum.
Conforme preceitua John Dewey (1953), se tem visto que uma comunidade ou grupo
social se sustenta mediante uma contínua auto renovação, e que esta renovação tem lugar por
meio do desenvolvimento educativo dos membros imaturos do grupo. A educação é, assim, um
processo de estimulação, de nutrição e de cultivo. Todas estas palavras significam que aquela
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supõe uma atenção as condições de crescimento. Etimologicamente, a palavra educação
significa justamente um processo de dirigir ou repassar, ou seja, o ato de repassar
conhecimentos.
Os sistemas de ensino atualmente não têm incorporado essa nova dimensão do
desenvolvimento dos indivíduos, como cidadãos, a partir da construção, via Constituição, do
conceito de cidadania. O direito à educação exige uma resposta para os valores da cidadania
social e política, a qual requer uma reinterpretação do sentido de inclusão social que transcenda
o sentido dado pelo direito, a partir da perspectiva do desenvolvimento social.
Para Eliane Ferreira de Sousa (2010), o tema da inclusão social é tratado como um dever.
O seu processo de construção conceitual é constante, caminha em paralelo com a concretização
do próprio direito à educação e com desenvolvimento técnico-científico. A ideia parte do fato
de que a verdadeira inclusão social exige a superação da racionalidade técnica, hoje presente
nos discursos sobre a educação.
Na realidade do mundo de hoje, apenas existe o lado do capital. Os indivíduos vêm
passando de escravo a servo, de servo a súdito, de súdito a cidadão e de cidadão a consumidor.
Tendo em vista que na atualidade, quem não consome não têm direitos, pois não é útil ao
sistema voltado ao lucro. Neste contexto, quem não consome é excluído, e os excluídos não
têm direitos. É como defende Bittar (2004):
Numa sociedade marcadamente influenciada pelo ideal do capital (lucro como
meta de vida), pelo valor material (ter no lugar de ser), pela dimensão da
vantagem pessoal na organização das relações humanas (reificação das relações
interpessoais), sem dúvida alguma será o despossuído a nova figura a ser
demonizada. Então, o despossuído será o desviante, por não ter condições de
estar incluído nas múltiplas dimensões da vida socioeconômica contemporânea,
carecendo de acesso ao emprego, a condições dignas de vida, informação e
participação nas decisões sociais. Estar fora do mercado é o decreto suficiente
dado pela sociedade para o princípio do processo de degradação da pessoa
humana, nisso envolvido seu esquecimento, seu desprezo, a diminuição de sua
liberdade, a castração de seu acesso a bens etc. estar fora do mercado é sinônimo
de estar fora da dimensão de inclusão social e, portanto, tornar-se um convidado
a participar da divisão do grande bandejão da miséria social, do refugo do que
a própria sociedade é capaz de produzir, exatamente porque é incapaz de
distribuir adequadamente.
Por sua vez, Foucault (1996) defende que existem em nossa sociedade alguns princípios
de exclusão, tais como o da separação e da rejeição. Para ele, o sistema de exclusão apoia-se
sobre um suporte institucional: é ao mesmo tempo reforçada e reconduzida por todo um
compacto conjunto de práticas como a pedagogia, é claro, como o sistema dos livros, da edição,
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das bibliotecas, como as sociedades de sábios outrora, os laboratórios hoje. Mas ela é também
reconduzida, mais profundamente sem dúvida, pelo modo como o saber é aplicado em uma
sociedade, como é valorizado, distribuído, repartido e de certo modo atribuído.
Assim, o ser humano foi gradativamente sendo reconhecido, pois a pessoa humana
possui valores que lhes são inerentes e, por isso, não podem ser relativizados, tendo em vista
serem intrínsecos à condição humana. De acordo com Nunes (2002), o conceito de dignidade
foi sendo elaborado no decorrer da história e chega ao início do século XXI como um valor
supremo, construído pela razão jurídica e pela prática social. Desta forma, a dignidade pode ser
entendida como qualidade daquele que é digno, merecedor de respeito e de consideração,
qualidade esta inerente a todo ser humano.
A educação como pilar da ideologia liberal, passa por um grave perigo de se transformar
em apenas mais uma mercadoria no setor de serviços. Dessa forma, a educação fica prestes a
perder o seu caráter de bem social para tornar-se nada mais que um serviço do setor terciário.
Nesse caso, fica a cargo do Estado encarar a educação como um valor social, um bem intangível,
sob pena de se tornar igual a qualquer outro tipo de serviço, atentando contra a soberania
nacional, o desenvolvimento e a cultura do país.
A inclusão social, por sua vez, obrigatoriamente, passa pelo desenvolvimento
tecnológico, econômico, político e social. Sendo o alicerce desse desenvolvimento, a inovação
tecnológica, que influencia a capacidade de geração de riqueza e acumulação de poder. Na
proporção em que se tem conhecimento, mais possibilidades existem de se romper as barreiras
dos mínimos existenciais. Entretanto, hoje, a maior barreira não é encontrar informação, mas
sim ter acesso a uma informação de qualidade, que permita potencializar o desenvolvimento
dos indivíduos, e assim, se tornem menos distantes da exclusão social, que tem como principal
ingrediente, a falta de informação. Nesse contexto Sousa (2010, grifos do autor) ainda afirma
que,
Na contemporaneidade, em que vai se constituindo a chamada “sociedade do
conhecimento”, a distância entre pobres e ricos aumenta também por causa do
acesso aos conhecimentos disponíveis e às novas formas de linguagem que
necessitam de uma socialização própria. Essa distância também tem
aumentado a distância entre países ricos e pobres, no momento em que o
conhecimento tem-se constituído em mais-valia intelectual e base para o
desenvolvimento autossustentado dos países.
Por isso, proporcionar aos indivíduos uma educação de qualidade é dever da escola,
garantido constitucionalmente, como requisito essencial ao desenvolvimento social. Educar
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cientificamente é preparar para o futuro, formar cidadãos conscientes e críticos. No entanto, são
muitos os obstáculos para se conseguir implementar políticas públicas voltadas para a
democratização do acesso ao conhecimento, como por exemplo, deficiências na formação
docente, escassez de recursos financeiros, entre outros.
Por isso se faz necessário dominar mais metodologias e linguagens, estar sempre
conectado em rede. Não é mais possível ter um modelo que reserve a educação científica apenas
a uma elite. É imprescindível que todos os setores da população tenham acesso ao conhecimento
científico para que estejam aptos a compreender o mundo e, assim, conquistar uma melhor
qualidade de vida.
Medeiros (2001), ver o direito à educação fundamental como uma ferramenta para
atingir o desenvolvimento econômico e social, bem como erradicar a pobreza e as
desigualdades. Pode-se dizer ainda que este direito está estreitamente relacionado com as
políticas sociais e econômicas que devem ser instituídas pelos governos.
Dessa forma, o direito à educação advém do reconhecimento de que o saber é mais do
que uma simples herança cultural. O cidadão é parte integrante da herança cultural e, assim
sendo, torna-se capaz de se apossar de padrões cognitivos e formativos através dos quais se
passa a ter maiores possibilidades de atuar nos destinos de sua sociedade e contribuir na sua
transformação. E então Sousa (2010) afirma que,
Para alcançar o objetivo constitucional de preparar o cidadão para o exercício
da cidadania e para o trabalho, deve-se reconhecer que a necessidade do
ensino não se encerra no âmbito do aprimoramento pessoal. É preciso que se
dê ao fundamental do ensino um sentido mais abrangente, como sendo
fundamental também para o Estado, que necessita do indivíduo para alcançar
a sua meta de desenvolvimento.
Nesse aspecto, o acesso de todos a um ensino de qualidade amplia a competência do
país para operar transformações e cria um clima favorável para mudanças. O direito à educação,
nesse ponto, é o que possibilita o crescimento do cidadão e o faz ter estima e admiração por si
próprio.
No atual contexto brasileiro, percebe-se que o ensino tem se apresentado insuficiente,
no que diz respeito à quantidade de vagas disponibilizadas para atender o número de alunos, se
tendo como um dos maiores desafios à melhoria de sua qualidade. Com a perspectiva de incluir
aqueles que se encontram em processo de exclusão social, a escola possibilita aos seus alunos
fazerem parte da sociedade em que vivem.
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A escola enquanto ferramenta social deve compreender as mais diversas formas de
exclusão social as quais possam estar acontecendo, desde questões quem envolvam a violência
urbana, atitudes discriminatórias, de etnia, de gênero, de sexo, de classe social, etc., reprovações
até a evasão escolar, que por vezes é provocada pela necessidade do aluno de trabalhar para
ajudar na renda familiar, no sustento de sua família e seu próprio sustento.
Assim, diante deste contexto social, a escola deixa de ser apenas uma instituição
responsável por transmitir conhecimento, existindo a necessidade de entender todos os aspectos
sociais que permeiam a existência do aluno. Tal existência é marcada por conflitos envolvendo
a prostituição e o trabalho infantil, as diferentes formas de violência, o alcoolismo e uso de
drogas, entre outros. Portanto, se faz imprescindível a identificação e posterior
encaminhamento e atendimento a essas demandas para que o corpo técnico da escola possa dar
continuidade em seu trabalho pedagógico.
Então, é essencial criar uma rede de atendimento multiprofissional e ao mesmo tempo
interdisciplinar no interior da escola, é uma saída para que o aluno possa, além de ter garantido
seu direito à educação, também tenha atendido outros direitos básicos que configuram sua
existência humana.
CONCLUSÃO
Percebe-se, dessa forma, que os problemas sociais que dificultam o acesso à educação,
tanto são vários, como são graves. As desigualdades sociais, bem como a marginalidade, por
exemplo, não são problemas fáceis de solucionar, principalmente em países pobres ou em
desenvolvimento, como é o caso do Brasil.
Atualmente o mundo encontra-se marcado por contrastes e desigualdades de recursos,
oportunidades e direitos. Onde, cada vez mais, uns poucos concentram muito e a grande maioria
sofre escassez e exclusão. Não se trata apenas de recursos financeiros, mas de outros bens e
direitos, como espaço de participação, voz ativa, poder de decisão, informação e oportunidades
de aprendizagem.
Um dos principais sintomas das falhas que impedem a civilização de atingir o bem
comum é a desigualdade que pode ser a que se deve às características individuais de cada ser
humano ou aquela causada por circunstâncias sociais. A primeira forma de desigualdade pode
ser considerada natural, no entanto, esta segunda deve ser combatida. Pois esta segunda forma
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de desigualdade, se caracteriza como nociva e teria suprimido gradativamente a liberdade dos
indivíduos, e em seu lugar restaram artifícios como o culto das aparências e as regras de polidez.
No caso do Brasil, apesar da garantia do direito à educação ser prevista na Constituição
Federal, na prática existem inúmeros fatores tanto sociais, como políticos e econômicos, que
formam barreiras à democratização desse direito que é fundamental à formação do cidadão, da
sua personalidade, da sua dignidade enquanto ser humano.
Portanto, apesar dos problemas sociais serem obstáculos ao acesso à educação, é a
educação que pode causar mudanças sociais e, por conseguinte, a inclusão social dessas pessoas
menos favorecidas. Ou seja, ao mesmo tempo em que esses problemas impedem o acesso das
crianças à escola, é a própria escola que vai possibilitar a formação da cidadania e dignidade
humana nessas pessoas, possibilitando assim, a inclusão social.
Dessa forma, se conclui que a educação é a principal forma de resolver as desigualdades
sociais, a marginalidade, a violência infantil, a prostituição infantil, etc. É preciso que existam
políticas públicas educacionais que consigam garantir o acesso de todas as crianças à escola.
No entanto, não se faz suficiente apenas o acesso à escola, é imprescindível que o ensino seja
de qualidade, que a escola possua estrutura adequada, que haja acompanhamento
psicopedagógico individual a cada problema específico.
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