UNINGÁ – UNIDADE DE ENSINO SUPERIOR INGÁ FACULDADE INGÁ CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ENDODONTIA FERNANDA LANGARO BERGMANN NECROSE PULPAR: TRATAMENTO EM SESSÃO ÚNICA OU MÚLTIPLA? Passo Fundo 2007 2 FERNANDA LANGARO BERGMANN NECROSE PULPAR: TRATAMENTO EM SESSÃO ÚNICA OU MÚLTIPLA? Monografia apresentada à unidade de Pósgraduação da Faculdade Ingá-Uningá – Passo Fundo – RS como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Endodontia. Orientador: Mateus Silveira Martins Hartmann Passo Fundo 3 2007 FERNANDA LANGARO BERGMANN NECROSE PULPAR: TRATAMENTO EM SESSÃO ÚNICA OU MÚLTIPLA? Monografia apresentada à comissão julgadora da unidade de Pós-graduação da Faculdade Ingá-Uningá–Passo Fundo – RS como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Endodontia. Orientador: Mateus Silveira Martins Hartmann Aprovada em ____/____/____. BANCA EXAMINADORA: Prof. Ms. Mateus Silveira Martins Hartmann Profª. Ms. Flávia Baldissareli Prof. Dr. José Roberto Vanni Passo Fundo 4 2007 DEDICO ESTE TRABALHO À MINHA FAMÍLIA E, EM ESPECIAL, A UM HOMEM BATALHADOR, GUERREIRO E MUITO AMIGO: MEU IRMÃO FARLEI, QUE PERDI DURANTE A REALIZAÇÃO DESTE CURSO. 5 AGRADECIMENTOS Ao professor Mateus Silveira Martins Hartmann, orientador deste trabalho, pela sua dedicação. Aos meus pais e esposo, pela motivação constante. Aos meus colegas, que contribuíram para o meu aprendizado. 6 RESUMO O tratamento endodôntico é formado por fases distintas, compostas pela limpeza, modelagem e obturação dos canais radiculares, a s q u a i s são indissociáveis, pois o sucesso depende da qualidade da execução de cada uma delas. Diante disso, torna-se oportuno discutir qual o número de sessões necessárias para realizar um saneamento adequado do s i s t e m a d e canais radiculares. A revisão da literatura sobre tratamento endodôntico, em dentes com necrose pulpar, foi utilizada para definir se é possível obter sucesso em tratamento realizado em sessão única, ou se é necessário um maior número de sessões para a completa sanificação deste sistema de canais radiculares. Deve-se considerar a dor pós-operatória, o tempo e as condições biológicas e microbiológicas envolvidas. Através dos dados encontrados neste trabalho, conclui-se que o tratamento endodôntico em dentes com necrose pulpar poderá ser realizado em apenas uma única sessão. Palavras-chave: Endodontia. Tratamento do canal radicular. Dente não vital. Necrose da polpa dentária. 7 ABSTRACT The endodontic treatment is formed by distinct phases, composed for the cleanness, modeling and filling of radicular canals, which are not separated because the success of the treatment depends on the quality of execution of each one of them. Ahead of this, it is opportune to argue which the number of sessions is necessary to have an adequate sanitation of the system of radicular canals. The revision of literature, on endodontic treatment in teeth with pulpar necrosis, trying to define if it is possible to get success in a treatment made in a single session or if it is necessary more sessions for a complete cure of this radicular canals system. It must be considered postoperative pain, the time and the biological and microbiological conditions involved. After the data found in this work, one concludes that the endodontic treatment in teeth with pulpar necrosis could be carried through in only one session. Key words: Endodontics. Root canal therapy. Nonvital tooth. Necrosis of the dental pulp. 8 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO.................................................................................................... 9 2. REVISÃO DE LITERATURA.............................................................................. 11 2.1. NECROSE PULPAR – CONSIDERAÇÕES GERAIS ................................ 11 2.2. COMO SE DÁ O PROCESSO DE REPARAÇÃO PÓS-TRATAMENTO ENDODÔNTICO................................................................................................. 14 2.3.O QUE PODE INFLUENCIAR NA REPARAÇÃO APICAL EM POLPA MORTA?................................................................................................................. 16 2.4. QUAL O MELHOR PROGNÓSTICO: SESSÂO ÚNICA OU MÚLTIPLA?............................................................................................................ 20 3. CONCLUSÃO..................................................................................................... 27 REFERÊNCIAS...................................................................................................... 26 9 1 INTRODUÇÃO O sucesso do tratamento endodôntico depende da execução de várias etapas, que são: a limpeza, a modelagem e a obturação dos canais radiculares, tendo cada uma delas a sua importância (HIZATUGU et al., 2002). O preparo biomecânico é uma das fases mais importantes no controle da infecção endodôntica, pois a ação de corte e de remoção dos tecidos mineralizados, feita pelos instrumentos associados ao fluxo do irrigante, m a i s a ação antimicrobiana, são capazes de alterar, significativamente, a microbiota, situada no canal radicular principal, e a poucos micrômetros da dentina circuncanalicular. No entanto, devido à natureza difusa da infecção endodôntica, pelos sistemas de canais, o preparo biomecânico e a imediata obturação do canal radicular deixam dúvidas. Apesar disso, a revisão de literatura relata plausíveis resultados de dentes com polpa necrótica e radiolucidez periapical tratados em sessão única, muitos dos quais em um intervalo de tempo relativamente curto (SOARES; CESAR, 2001). A endodontia de consulta única pode ser executada com sucesso, se os profissionais escolherem seus casos cuidadosamente, e se basearem nos princípios endodônticos fundamentais. As evidências atuais indicam não haver aumento na dor pós-operatória ou diminuição do tempo de recuperação, quando comparada à endodontia de consultas múltiplas (ASHKENAZ, 1987). O progresso científico e tecnológico, aliado aos atuais conhecimentos biológicos, são fatores fundamentais que permitem a realização do tratamento em apenas uma consulta, com o objetivo de oferecer condições para que o organismo restabeleça, além da normalidade dos tecidos periapicais, sua estética e função (HIZATUGU et al., 2002). Dois fatores são críticos quando se considera o tratamento em consulta única de dentes despolpados, que são: a incidência de sintomatologia pósoperatória, sobre a qual não há diferença estatística, e o sucesso a longo prazo (SIQUEIRA; ROÇAS; LOPES, 2004). 10 Sabe-se que o tratamento endodôntico em consulta única é uma opção d e c onduta biologicamente possível, pois apresenta resultados clínicos bastante satisfatórios, tanto no período pós-operatório – onde são semelhantes aos obtidos em múltiplas sessões – quanto no índice de sucesso que, a longo prazo, é idêntico aos tratamentos realizados com o uso de medicação intracanal entre as sessões (HIZATUGU et al., 2002). A terapia endodôntica, em casos de dentes com necrose pulpar, visa à reparação da região apical, permitindo que o elemento dentário retorne às suas tarefas de estética e função. Após a obturação do canal radicular, processa-se uma série de transformações nos tecidos lesados, cuja finalidade é a reparação das estruturas destruídas (PAIVA; ANTONIAZZI, 1988). Desta forma, este trabalho busca esclarecer, com suporte em evidências científicas, qual a melhor opção de tratamento para dentes com necrose pulpar quanto ao número de sessões, levando-se em consideração o tempo, a dor pósoperatória e as condições biológicas e microbiológicas nele envolvidas. 11 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 NECROSE PULPAR – CONSIDERAÇÕES GERAIS A necrose ou a morte do tecido pulpar é a seqüela de uma inflamação aguda e crônica, ocorrida em uma interrupção da circulação, causada por lesão traumática. Esta lesão pode ser originária de abrasões ou atrições, traumas, procedimentos operatórios, cáries, capeamento pulpar e pulpites (WEINE, 1998). A polpa mortificada ou necrosada pode ser conceituada didaticamente de duas maneiras: Necropulpectomia tipo I, sem lesão visível radiograficamente, ou necropulpectomia tipo II, com lesão radiograficamente visível. Esta divisão tem uma influência, para alguns autores, na tomada de decisão a respeito da utilização, ou não, de uma medicação intracanal, ou seja, no tratamento endodôntico em sessão única ou múltipla. A presença de lesão periapical, visível radiograficamente, caracteriza uma periapicopatia crônica, com um tempo de desenvolvimento superior a um ano (LEONARDO et al., 1998). Vanni et al. (2007) afirmam que a visibilidade da lesão na radiografia se dá somente no momento em que uma das corticais ósseas é destruída e, portanto, uma lesão não visível já está presente no interior do trabeculado ósseo, com características semelhantes às lesões visíveis radiograficamente, em termos de qualidade, quantidade e presença de microrganismos, quando estes estiverem no seu interior. Isto é confirmado por Leonardo e Leal (1998) e Walton e Ardjmand (1992), pois sustentam que a área da lesão periapical é a indicação da ocorrência de destruição tecidual causada pelos irritantes produzidos no interior dos canais radiculares. O índice de sucesso do tratamento endodôntico é bastante alto quando a terapia é realizada dentro de princípios biológicos e técnicos satisfatórios. Quando se discute o tratamento da polpa mortificada ou necrosada, vários aspectos devem ser observados e levados em consideração, como será 12 mostrado a seguir. Assim, há necessidade de definir o que é considerado sucesso e o que é insucesso, após um tratamento endodôntico. Segundo Hüllsman (1994), a inexistência de dor e de edema, o fechamento de fístula e a ausência de drenagem, com o dente estando em função e com fisiologia normal, além do desaparecimento da rarefação óssea periapical, são critérios clínico-radiográficos que denotam o sucesso do tratamento endodôntico. Sundqvist et al. (1998) alertam que o diagnóstico clínico da polpa e dos tecidos periapicais são fatores que influenciam o prognóstico do tratamento endodôntico. Nos casos em que a polpa apresenta-se vital, ou com necrose pulpar, sem lesão periapical, e o tratamento endodôntico é realizado sob condições técnicas corretas, o índice de sucesso é d e , aproximadamente, 96%. Porém, quando há presença de lesão na área perirradicular, o índice de sucesso fica em torno de 86%. Entretanto, estudos como o de Chugal, Clive e Spangberg (2001) relataram índices diferentes para os casos de pulpite e de necrose pulpar, sendo que o prognóstico favorável foi de 89,7% e 69,7%, respectivamente. Quando a lesão na região periapical estava presente, índices inferiores de sucesso foram obtidos, de aproximadamente 76%. Os autores afirmam ainda que as chances de insucesso são 45 % maiores na presença de uma lesão periapical. Outra discussão é o tempo de proservação dos casos, após o tratamento endodôntico, principalmente quando relacionado ao reparo das lesões periapicais. Estrela (2004) sugere um controle longitudinal, avaliando sinais e sintomas e utilizando recursos radiográficos por um período de, aproximadamente, dois anos, para os casos de polpa mortificada e de infecções endodônticas. Já para Leonardo, Bonetti Filho e Leonardo (1998), a proservação deve ser de seis meses a cinco anos. A forma de se proservar um caso é associando à ausência de sinais e sintomas com os exames radiográficos. Devido às limitações das técnicas radiográficas, pode-se definir como sucesso casos que não estão curados, ou ainda, como insucesso, casos em que há saúde periapical. Um exemplo são as escaras apicais as quais podem ser confundidas, radiograficamente, como um sinal de tratamento endodôntico fracassado (SELDEN, 2000), o que vai ao encontro do estudo de Nair et al. (1999), que realizaram cirurgia parendodôntica e biópsia em seis dentes que mostravam lesões periapicais persistentes, após cinco anos do 13 tratamento endodôntico. Entre esses casos, um foi identificado cisto como e outros dois corresponderam à cura periapical, através da formação de tecido cicatricial. Segundo Nair et al. (1990), a maior causa dos fracassos endodônticos está na negligência profissional e na persistência da infecção microbiana no sistema de canais radiculares e na região periapical. Além disso, fatores de ordem local são descritos, destacando-se entre eles as dificuldades anatômicas e as sobreobturações, os canais atresiados, as calcificações, a presença de instrumentos fraturados e as perfurações. Porém, segundo Siqueira Júnior e Lopes (2001), estas limitações não comprometem o tratamento, a menos que uma infecção esteja associada. De acordo com esta afirmação, Lin, Skribner e Gaengler (1992) mostraram, em seu estudo, que alguns fatores, como os microbianos, compreendendo as infecções intra e extra-radiculars, e os fatores não-microbianos, extrínsecos e intrínsecos, podem estar associados a resultados não satisfatórios nos casos em que os tratamentos estão tecnicamente bem executados. A infecção extra-radicular é conhecida como biofilme apical, que é uma placa dental formada através de interações bacterianas com o dente, em diferentes espécies, dentro de uma massa microbiana. São agregados polissacarídeos que, além do recobrimento, servem como meio nutritivo às bactérias (ESTRELA; FIGUEIREDO, 2001). Segundo Wayman et al. (1992), a infecção extra-radicular é um fator predisponente ao insucesso, pois o saneamento da região periapical é dificultado, uma vez que os microrganismos ficam inacessíveis à ação química e mecânica dos tratamentos endodônticos. Em casos de necrose pulpar, pode estar presente o biofilme apical, sendo uma das causas de fracasso do tratamento endodôntico, devido a uma infecção persistente (LEONARDO et al., 2002). Porém, segundo Siqueira Júnior e Lopes (2001, o biofilme apical está presente somente em uma pequena proporção dos casos. Desta maneira, um dos principais motivos do tratamento endodôntico é a máxima eliminação dos microrganismos do canal radicular, principalmente em casos de necrose pulpar e periodontites apicais (PUMAROLA et al., 1992). Segundo Paiva e Antoniazzi (1988), o objetivo da Endodontia é todo dirigido no sentido de se obter processo reparativo, no menor lapso de tempo, após 14 a intervenção praticada. Também deve ter um epílogo normal, permitindo ao dente o retorno às suas tarefas especificas – estética e funcional – como se com ele nada houvesse acontecido. Hizatugu et al. (2002) relatam que o sucesso do tratamento endodôntico visa a restabelecer a normalidade dos tecidos periapicais. Tais condições são alcançadas através da limpeza e da modelagem, que promovem a desinfecção do sistema de canais radiculares, e da obturação e selamento, que permitem a manutenção da desinfecção destes canais. Bergenholtz, Horsted-Bindslev e Reit (2006) citam que o tratamento endodôntico tem por objetivo a eliminação dos microrganismos localizados não apenas no tecido pulpar necrosado, mas também nas paredes do sistema de canais radiculares e no interior dos túbulos dentinários. 2.2 COMO SE DÁ O PROCESSO DE REPARAÇÃO PÓS-TRATAMENTO ENDODÔNTICO? Paiva e Antoniazzi (1988) ressaltam que, após a correta obturação do canal radicular, se processam uma série de transformações nos tecidos lesados, levando à reparação das estruturas destruídas. Esclarecem que o tempo necessário à reparação não é uniforme em todos os casos, dependendo da anatomopatologia da lesão, do grau de irritação ligado ao tratamento realizado, e das condições próprias do indivíduo, podendo variar de seis meses a cinco anos. Além disso, a passagem do osso primário para secundário demanda tempo maior, de até cinco anos ou mais. Lins, Leal e Lima (1996) afirmam que a região periapical possui capacidade ilimitada de reparo. Ressaltam que em dentes com mortificação pulpar, com ou sem lesão periapical, algumas estruturas podem estar destruídas (suporte ósseo, cemento e dentina), e que a reparação se inicia tão logo a infecção seja controlada, quando o processo inflamatório da região vai gradativamente diminuindo, devido a sua grande capacidade de reparo, pela rica vascularização. A remoção dos agentes da inflamação permite o curso normal do tecido de granulação, culminando na decomposição colágena e, posteriormente, deposição mineralizada. Para Berger 15 (1989), Leonardo e Leal (1991), Paiva e Antoniazzi (1993) a reparação endodôntica em dentes despolpados é de, no mínimo, seis meses. Leonardo e Leal (1998) citam que, durante o reparo apical e periapical, após tratamento de polpa mortificada, nos casos em que se combateu a infecção, os fibroblastos, cementoblastos e os osteoblastos determinarão a reparação, como ocorre nos casos onde persiste a infecção. Então se desenvolve o tecido granulomatoso, com grande quantidade de células inflamatórias; o forame, ao invés de fechar-se é, ao contrário, dilatado pelas reabsorções. Através da vascularização da região periapical, ocorre infiltração leucocitária e fagocítica, e o sistema linfático coopera no processo de limpeza e acelera a reparação. O tecido conjuntivo permite a formação de tecido ósseo e cementóide, levando a região à normalidade. Em casos de ramificações apicais, isto pode ser afetado. Ainda segundo Leonardo e Leal (1998), as evidências radiográficas de reparação oscilam de acordo com levantamento realizado por vários autores, obtendo entre 38% e 94,5% de sucesso. A capacidade biológica de cura, assim como a substituição de um espaço vazio por tecido fibroso de reparação, é peculiar à atividade biológica de cada paciente. Porém, devemos observar todos os possíveis fatores que poderão contribuir para uma maior porcentagem de sucesso clínico, radiográfico e histológico, no tratamento de canais radiculares. O reparo, então, depende dos fatores locais (presença de infecção, nutrientes, trauma operatório, e sobreobturação) e dos fatores sistêmicos (nutrição, estresse e idade). Leonardo, Vieira e Carvalho (2000) identificaram, através de Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV), nos 2mm apicais de dentes humanos com lesão periapical crônica, a presença de biofilme, o qual deve ser destruído durante o tratamento endodôntico, para se obter sucesso, pois nem sempre será eliminado pela ação mecânica dos instrumentos, pela ação química das soluções irrigadoras, bem como pelos próprios elementos de defesa orgânica, podendo persistir uma lesão periapical pós-tratamento endodôntico. De acordo com a análise, os autores sugerem, nestes casos, o emprego da associação de hidróxido de cálcio com o pmonoclorofenol canforado (CALEN/PMCC), como curativo de demora entre sessões. 16 2.3 O QUE PODE INFLUENCIAR NA REPARAÇÃO APICAL EM POLPA MORTA? Leonardo (1973) comparou os resultados obtidos no tratamento de canais radiculares de dentes unirradiculares, despolpados, infectados e com reação periapical, obturados, quer com teste bacteriológico positivo ou negativo. O controle clínico radiográfico, realizado por um período mínimo de dois anos, permitiu concluir que não existe uma diferença estatística significante entre os resultados apresentados. O autor ressalta que, independentemente do controle bacteriológico, devem ser observados os requisitos aceitos como indispensáveis para a obtenção de sucesso no tratamento endodôntico, a fim de ser adquirida uma elevada porcentagem de êxito. Ramachandran, Nair (1987) estudou em MEV 31, lesões de dentes que estavam profundamente cariados, sendo que 5 eram sintomáticos (inflamação periapical aguda), e os outros, assintomáticos (granulomas periapicais crônicos), todos apresentando bactérias em seus canais radiculares. A microbiota bacteriana consistiu de cocos, bacilos, formas filamentosas e espiroquetas e endodôntica foi separada do restante da lesão por densa parede de neutrófilos, ou por um “plug” epitelial. Somente pequena parte das lesões (cinco) revelou bactérias dentro de seu corpo. Tais lesões eram, invariavelmente, agudas e sintomáticas. Segundo Nair et al. (1990), os fatores de ordem sistêmica que poderiam afetar o reparo periapical estariam relacionados com à baixa resistência do organismo e ao potencial de reparo dos tecidos. Baumgartner e Falkler (1991,) usando método anaeróbico, fizeram cultura de 5 mm apicais das raízes de 10 dentes recém extraídos. Também duplicaram as culturas para incubação anaerobiamente. Cinqüenta espécies de bactérias foram isoladas e identificadas. A s mais destacadas nos 10 canais radiculares foram: Actinomyces, Lactobacillus, Bacteróides pigmentados, Peptostreptococcus, Bacteróides não pigmentados, Veillonella, Enterococcus faecalis, Fusobacterium nucleatum e Strptococcus mutans. Das 50 espécies bacterianas isoladas, 34 (68%) eram anaeróbias estritas, demonstrando a sua predominância nos 5 mm apicais dos canais radiculares infectados, em dentes cariados com exposição pulpar e lesões periapicais. Das mais de 350 espécies de bactérias, que residem na cavidade oral, os resultados deste estudo sugerem que somente um número limitado está no canal radicular infectado, mostrando assim as dificuldades postas para o organismo no 17 processo de reparo que, além de outros fatores, associa-se à presença de tais bactérias. Horiba et al. (1991) investigaram a presença de endotoxinas em 30 dentes de 27 pacientes, que não tinham tomado antibiótico nos seis meses anteriores ao tratamento, e nem no momento do mesmo. Foram encontradas endotoxinas nas 16 amostras (100%) de dentes que se apresentaram sintomáticos. Já nos 14 dentes assintomáticos, apareceram apenas 4 amostras (28%). As endotoxinas também estavam associadas à exsudação, e apresentavam áreas de radiolucências periapicais. Wayman et al. (1992) examinaram, histologicamente e em culturas, tecidos periapicais de 58 casos requerendo cirurgia periapical. Metade (29) mantinha uma possível comunicação com a cavidade oral. Culturas foram positivas em 51 casos, enquanto, nos exames histológicos, somente em 8. Um total de 50 espécies de bactérias diferentes foi isolado. De acordo com os dados, bactérias, material estranho, falhas nos canais, fraturas verticais da raiz e doença periodontal podem contribuir para lesão perirradicular crônica não curada. Hashioka et al. (1992,) investigando correlação entre composição da flora de canais infectados e sintomas clínicos, avaliaram 28 dentes, em 25 pacientes com periodontite. Observaram que os Eubacterium encontram-se significativamente relacionados aos sintomas agudos ou crônicos, enquanto os Peptococcus, os Peptostreptococcus e as Porphyromonas gingivalis, aos sintomas clínicos subagudos. Sugerem que os Peptococcus, os Peptostreotococcus, os Eubacterium, as Porphyromonas gingivalis e os Bacteróides encontram-se relacionados pela dor à percussão, e as Porphyromonas e os Bacteróides estreitamente vinculados ao odor em canais radiculares infectados. Walton e Fouad (1992), após estudo em 946 pacientes, encontraram mais flare-up em casos de polpa morta do que em casos de polpa viva; também não foi verificada diferença em relação ao número de sessões; observaram mais flare-up nos casos sintomáticos. Em relação ao tratamento convencional e ao retratamento, não encontraram diferença. Baumgartner e Watkins (1996) coletaram amostras microbiológicas de 43 dentes hígidos, associados à rarefação periapical, e fizeram culturas anaeróbias. A média das espécies foi 8, variando de 1 a 15 por amostras. De 43 dentes, 23 (54%) tinham amostras positivas para crescimento de bactérias com pigmentos negros. 18 Três amostras tinham duas diferentes espécies de bactérias com pigmentos negros. Das bactérias isoladas, com pigmentos negros, 3 eram Prevotella intermédia; 13, P. nigrescens; 5, P. melaninogênica; 4, Porphyromonas gigivalis, e 1, P. endodontalis. Outras bactérias isoladas foram: Fuso bacterium nucleatum (23 espécies); Peptostreptococcus morbillorum (13 espécies) e não pigmentada Poralis (10 espécies). Leonardo et al. (1998) afirmaram que a reparação apical e periapical, nos casos de tratamento de polpa morta, sofrem influência dos seguintes fatores: combate à infecção do sistema de canais radiculares; limite apical de obturação; condensação lateral ativa durante a obturação; irritação mecânica e química persistente, produzida pelo material obturador; capacidade de reparo e atividade biológica intrínseca a cada paciente. Segundo Soares e Queiroz (2001), o tratamento endodôntico tem o objetivo de proporcionar o efetivo controle da infecção e estimular a reparação apical, o que está associado, essencialmente, às particularidades histopatológicas do ápice radicular e do tipo de mudanças proporcionadas no segmento apical do canal radicular. Assim, o padrão de limpeza da porção apical do canal radicular, a manutenção da trajetória original do forame apical, o término apical da obturação, o tipo de material obturador utilizado e, sobretudo, a ausência de microrganismos nas imediações, são fatores determinantes da resposta tecidual e do êxito do tratamento endodôntico. Soares (2001) avaliou a reparação periapical de dentes anteriores e prémolares de pacientes portadores de necrose pulpar, associada às lesões periapicais, tratados em sessão única. Realizou-se o preparo biomecânico (técnica híbrida), irrigação com hipoclorito de sódio a 1,0% e, após, obturação do canal radicular. Em um ano de proservação observou-se, radiograficamente, que o tratamento endodôntico em sessão única apresentou 63% de reparação periapical parcial. A cultura microbiológica negativa, e as obturações ligeiramente aquém do ápice radiográfico, contribuíram para a maior freqüência do completo reparo periapical, não influenciando no tipo de reparo. Clinicamente, o tratamento endodôntico em sessão única obteve 100% de sucesso; já, radiograficamente, proporcionou um prognóstico duvidoso sobre a qualidade da reparação periapical. Segundo Hizatugu et al. (2002), o sucesso do tratamento endodôntico em sessão única depende de uma adequada limpeza e modelagem, o que é obtido por 19 meio da ação mecânica dos instrumentos e do uso de substâncias químicas auxiliares, obedecendo a cinco princípios: limpeza no sentido cérvico-apical, (diminuindo assim a extrusão de material contaminado para fora do canal radicular); preparo cônico (pois a concentração de bactérias no sistema de canais radiculares é maior nas porções mais próximas à coroa dental, decrescendo em sentido apical); patência do canal radicular, do forame e dos túbulos dentinários (sendo que a patência do canal radicular remove as raspas de dentina que se acumulam no interior do canal radicular, possibilitando a sua remoção através da irrigação e da aspiração; patência do forame, a qual evita o acumulo de detritos nos milímetros finais do canal radicular, e a patência dos túbulos dentinários, que ocorre através de substâncias químicas auxiliares, removendo a lama dentinária de sua superfície, mantendo-os abertos e patentes); forame com o menor diâmetro possível (para não alterar a trajetória e não causar injúrias aos tecidos periapicais); proibição de transportar o forame apical. Para Estrela (2004), o reparo de lesões periapicais é dependente da influência de fatores sistêmicos e locais. São fatores locais: a infecção (a qual impede a formação do tecido de granulação) e a agressão tecidual (quanto menor a intensidade do trauma, mais rápido se instala o processo de reparo). Nos casos de necrose pulpar, com rarefação óssea apical, é importante que os procedimentos sejam feitos somente no interior do canal radicular. E m casos onde houver extravasamento para áreas de rarefação, geralmente os reparos são impedidos, (até que o material extravasado seja reabsorvido), pois prejudicariam: a interferência com o suprimento sanguíneo (quanto mais vascularizado um tecido, melhor é a reação inflamatória com a finalidade de cura); e os objetos estranhos (onde irritações de origens químicas e mecânicas podem interferir no processo de reparo). Já os fatores sistêmicos seriam: a nutrição, o estresse, os estados debilitantes crônicos, os hormônios e as vitaminas, a desidratação e a idade do paciente. 20 2.4 QUAL O MELHOR PROGNÓSTICO: SESSÃO ÚNICA OU MÚLTIPLA? A E ndodontia se envolve com as inovações e, cada vez mais, novas técnicas e materiais surgem, com o intuito de melhorar a qualidade do tratamento endodôntico no menor tempo possível. Desta maneira, quando se fala em prognóstico melhor, deve-se levar em consideração o tempo despendido para o tratamento endodôntico, a dor pósoperatória e as questões biológicas ou microbiológicas envolvidas no tratamento de dentes com necrose pulpar. Cauduro (1967) afirmou que, quanto ao tempo despendido, ele é bem menor para o profissional, quando se conclui o tratamento endodôntico na mesma sessão, o que resulta em economia no custo do tratamento. Porém, cita algumas desvantagens, como: maior fadiga para o profissional e para o paciente, execução limitada a profissionais experientes, e realização somente em pacientes que colaborem para o seu bom desenvolvimento. O autor afirma ser indiscutível que o problema endodôntico reside no canal radicular que, uma vez eliminado, deixará o organismo se encarregar da reparação. Evitando a contaminação, a involução da infecção deve ocorrer com um preparo correto e uma obturação satisfatória. Assim, é possível realizar o tratamento em uma única sessão, tanto em casos de polpa viva, como em casos de polpa morta, com e sem lesão periapical, obtendo-se um resultado satisfatório, independente do número de sessões. Segundo Mohammadi, Farhad e Tabrizizadeh (2006) o tratamento em uma sessão tem várias vantagens, como menor tempo e custo para o paciente, mais lucro para o endodontista, além de ser menos doloroso e traumático do que em múltiplas sessões. Mas, nos casos de necrose pulpar e/ou associada à doença perirradicular, os autores afirmam que se deve utilizar medicação intracanal. Já o pós-operatório foi motivo de estudo para Motta, Barros e Cunha (1986), que avaliaram a dor após o tratamento endodôntico, realizado em uma ou duas consultas. Foram selecionados 89 pacientes e, destes, 54 tiveram seus dentes tratados e obturados imediatamente (23 com polpa vital e 31 com polpa necrótica). Realizaram duas consultas em 38 casos (26 com polpa vital e 12 com polpa necrótica), e os autores constataram não haver diferença quando se executa a obturação imediata ou mediatamente, tanto nos dentes com um ou outro tipo de polpa. Após a experiência, os autores se mostraram favoráveis ao tratamento 21 endodôntico realizado em uma única consulta. Toda vez que os princípios biológicos que compõem a base tridimensional do tratamento endodôntico forem obedecidos, obter-se-á sucesso na terapia, independentemente do número de sessões. Eleazer e Eleazer (1998) estudaram taxa de flare-up em dentes com polpas necróticas, em tratamento endodôntico de uma e de duas sessões. Foram tratados os primeiros e os segundos molares de 402 pacientes: 201 em múltiplas sessões e 201, em sessão única, no período de 1985 a 1996. Somente o sangramento incontrolável ou a prévia drenagem do canal radicular impediram o tratamento em sessão única. Este foi conduzido com lima no comprimento de trabalho, pelo menos até o número 30, instrumentado com EDTA e líquido de Dakin, e obturado com Sealapex, usando condensação lateral. O próprio paciente fez o controle. Nos casos tratados em sessão única, houve dor pós-operatória em 6 deles, enquanto que em duas sessões, ocorreram em 16 casos. Os autores não encontraram diferença com relação ao uso de antibiótico. O menor número de dor pós-operatória, em sessão única, foi creditado ao fato de que as bactérias ou outros agentes irritantes não tenham permanecido no canal radicular vazio. Outra possível razão é a supressão de medicação intracanal, o que pode diminuir a reação imune. Ainda outra possibilidade é o precoce fechamento do canal radicular, eliminando o ingresso de bactérias. Rezende, Arruda e Silva (2000) avaliaram a terapia endodôntica em uma única sessão, para os casos de necrose pulpar. Concluíram que não houve diferença em relação à dor pós-operatória. Assim, o número de sessões não produz aumento da experiência dolorosa após o tratamento, nem em relação ao flare-up, que não é maior no tratamento em sessão única, comparado aos tratamentos em múltiplas sessões. Além disso, em relação à regressão de lesões periapicais, após a terapia endodôntica em sessão única, os níveis de recuperação são semelhantes aos obtidos em tratamentos com sessões múltiplas. Fava, Cruz e Giorgi (2001) estudaram relatos da literatura sobre o tratamento endodôntico em sessão única, e m dentes portadores de polpa mortificada, concluindo que a incidência de dor pós-operatória é de baixo índice e que há sucesso do tratamento em longo prazo. No entanto, ressaltam que o tratamento em uma só sessão deve ser reservado aos profissionais com destreza e experiência clínica, e que o caso deve ser selecionado de forma correta. 22 Inamoto et al. (2002) enviaram um questionário a 738 endodontistas dos Estados Unidos, e 156 deles responderam. Os resultados do estudo mostraram que 87 dos endodontistas (55,8%) terminavam o tratamento em uma única sessão, em caso de pulpectomia. Já em casos de canais infectados, o número de profissionais que utilizavam sessão única era de 52 (34,8%). Quanto à dor pós-operatória, o exame mostrou que 34,2% dos endodontistas já haviam enfrentado este quadro. Os autores afirmaram que o tratamento em uma sessão tem muitas vantagens, como reduzir o número de visitas do paciente, eliminar a possibilidade de contaminação do tratamento na outra sessão e permitir a obturação imediata do canal radicular. Entretanto, citaram a falta de habilidade do profissional e a incidência dos flare-ups maior em canais infectados como desvantagens na terapia endodôntica de sessão única. Oginni e Udoye (2004) estudaram a incidência de dor pós-operatória em tratamento endodôntico realizado em sessão única e múltipla, em pacientes do hospital da Nigéria. Foram tratados 283 dentes de 255 pacientes, sendo que houve 10 casos (8,1%) de dor pós-operatória em tratamentos realizados em múltipla sessão, e 19 casos (18,3%) em tratamentos de uma sessão, sendo esta diferença estatisticamente significante. Furtado et al. (2005) avaliaram a dor pós-operatória em tratamentos endodônticos realizados em sessão única e sessão múltipla, em 80 pacientes, 40 em sessão única e 40 em sessão múltipla. Os elementos dentários foram divididos em quatro grupos: polpa morta sem lesão, polpa morta com lesão, retratamento sem lesão e retratamento com lesão. Dos 40 dentes tratados em sessão única, houve 7 casos (17,5%) de dor pós-operatória, sendo em 3 casos (7,5%) dor leve, em outros 3 (7,5%) moderada e, em 1 caso, (2,5%), dor severa. Dos 40 dentes tratados em sessão múltipla, 5 (12,5%) casos apresentaram dor pós-operatória, sendo em 3 (7,5%) dor leve e em 2 (5%), moderada. Concluíram que o tratamento endodôntico, em sessão única, mostrou-se confiável quanto à dor pós-operatória, não havendo diferença entre sessão única ou múltipla. As questões biológicas ou microbiológicas envolvidas no tratamento de dentes com necrose pulpar são bastante conflitantes na literatura, sendo motivo de muitos estudos e, sem dúvida alguma, uma das grandes discussões da Endodontia atual. 23 Berger (1991) relatou 116 casos de tratamentos endodônticos em dentes sem vitalidade pulpar, metade feita em sessão única, e metade em sessão múltipla. Para a sessão única, foram utilizados dentes sem sintomatologia, sem fístula e sem exsudação. Os canais radiculares foram esvaziados com cuidado, para não extruir detritos para a região periapical. Um ano após o tratamento, 87 retornaram para avaliação. Foram considerados sucessos aqueles casos livres de sinais e sintomas: os que não apresentaram lesão periapical, antes do tratamento, deveriam apresentar aspecto de normalidade nas radiografias; os que apresentavam lesão periapical, no momento da obturação, deveriam revelar desaparecimento da mesma ou diminuição de seu volume. As taxas de sucesso foram similares em 90% de sucesso, em dentes sem lesão periapical, tratados em múltiplas sessões, e em 88,8% de sucesso, quando tratados em uma única sessão. Já os dentes com lesão periapical, quando tratados em sessões múltiplas, apresentaram 91,6% de sucesso e para os casos tratados em uma única sessão, 88,8% de sucesso. Os autores concluíram que o tratamento endodôntico, em dentes sem vitalidade pulpar, com ou sem lesão periapical, pode ser realizado em sessão única. Leonardo et al. (1998) salientaram que nos tratamentos de polpa morta, sem lesão periapical, com condições clínicas que não favorecem a obturação na mesma sessão, é indicada a colocação de medicação intracanal, apenas para impedir a contaminação do canal radicular já preparado. Hizatugu et al. (2002), por sua vez, defenderam o tratamento endodôntico em sessão única, salientando q u e o mesmo está diretamente relacionado ao controle da infecção endodôntica, para ser bem sucedido. Dizem ser indiscutível o fato de que o tratamento, realizado em sessão única, traz vantagens tanto para o paciente, quanto para o profissional, tais como: economia de tempo, de material, e a dispensável refamiliarização com a anatomia do canal radicular. Citam como desvantagens, em portadores de disfunção temporomandibular, a exacerbação sintomatológica. Spangberg (2002) afirma que os profissionais estão usando o tratamento de dentes infectados em uma sessão, como forma de propaganda, e que a desinfecção dos sistemas de canais radiculares não é possível de ser alcançada com uma única sessão. Para Batista e Berger (2002), o tratamento endodôntico busca a completa remoção do tecido conjuntivo necrosado e dos microrganismos existentes no 24 sistema de canais radiculares. A contaminação do sistema de canais radiculares e da região apical ocasiona agressão às estruturas do ligamento periodontal, ao osso a l v e o l a r e ao cemento radicular apical, por destruição celular. Os germes anaeróbios, localizados no terço apical do canal radicular, invadem a região do periápice e, se persistirem após tratamento endodôntico, manterão a lesão apical, a fístula e a sintomatologia dolorosa, denominada de lesão refratária. Ainda segundo Batista e Berger (2002), em dentes com polpa necrótica, o preparo do canal radicular deve objetivar a desinfecção e a construção de uma matriz apical. Eles afirmam que só se consegue a eliminação das bactérias com limpeza mecânica, aliada à ação germicida com uma solução irrigadora, sendo fundamental complementar com medicação eficiente no canal radicular entre as sessões. A remoção de todo o tecido pulpar contaminado pode ser impedida pela complexidade da anatomia interna d o c a n a l radicular, onde o instrumento endodôntico não atua, podendo abrigar substrato pulpar suficiente para o desenvolvimento, multiplicação e proliferação de microrganismos, possibilitando o desenvolvimento de lesões apicais, resultando, assim, no insucesso endodôntico. Também em casos de reabsorções provocadas por lesões apicais, há a formação de crateras na superfície radicular, podendo haver, neste local, a sobrevivência de microrganismos, sendo necessário o uso de medicação para se alcançar maior índice de sucesso no tratamento. Leonardo, Tanomaru Filho e Leonardo (2003) afirmam que a desinfecção do canal radicular não é possível de ser alcançada em apenas uma sessão, pois a polpa necrosada associada a uma lesão perirradicular necessita de um canal radicular adequadamente desinfectado, não sendo isto possível somente através da instrumentação e da irrigação. Há necessidade de uma medicação intracanal para a desinfecção completa. Assim, por razões biológicas, esta condição patológica requer mais do que uma sessão de tratamento. Porém Kvist et al. (2004), num estudo clínico randomizado, em que compararam a quantidade de microrganismos residuais após o tratamento endodôntico de dentes com periodontite apical, em uma ou duas sessões, não encontraram diferenças, sob o ponto de vista microbiológico, quanto ao número de sessões. Khademi, Yazdizadeb, Feizianfard (2006) avaliaram a quantidade mínima de instrumentação necessária para que a solução irrigante penetrasse efetivamente 25 no terço apical dos canais radiculares. Foram utilizadas as raízes mésio-vestibulares de 40 molares inferiores extraídos, divididas de acordo com o diâmetro cirúrgico apical: 0.20, 0.25, 0.30 e 0.35 mm. Após a análise em MEV, os autores concluíram que a quantidade mínima de instrumentação para uma efetiva penetração da solução irrigadora no terço apical é de 0.30 mm, ou seja, o preparo apical deverá ser executado, no mínimo, com um instrumento de diâmetro 30. Hsieh et al. (2007) avaliaram a influência do calibre e da profundidade de inserção de agulhas de irrigação, durante o preparo dos canais radiculares, e o diâmetro cirúrgico necessário para que a sua irrigação fosse efetiva. Sete dentes extraídos, com canal radicular único, foram instrumentados com os seguintes diâmetros cirúrgicos: 0,25, 0,30, 0,35, 0,40, 0,45, 0,50 e 0,80 mm. Um sistema de imagem termal (ThermaCAM) registrou a dinâmica de distribuição do fluido no canal radicular preparado e analisado, durante a irrigação pela inserção de agulhas com diferentes calibres (23, 25 e 27), e em diferentes profundidades (3, 6 e 9 mm do ápice). Os canais radiculares foram irrigados com água destilada a 50ºC. Os resultados mostraram que a solução irrigante chegava à região apical quando uma agulha de calibre 27 era inserida em um canal radicular com diâmetro cirúrgico de 0,30 mm a 3 mm do batente apical. A mesma agulha, a 6 mm do comprimento de trabalho (CT), necessitava de canais radiculares com diâmetro cirúrgico de 0,50 mm ou mais, para a irrigação ter sucesso. Utilizando uma agulha de calibre 25, a 3 mm do CT, o alargamento apical mínimo foi de 0,45 mm para uma irrigação efetiva e, quando o calibre 23 foi utilizado, na mesma posição, o preparo mínimo foi de 0,50 mm. A 9 mm do CT, nenhum calibre de agulha obteve sucesso, independente do diâmetro cirúrgico. Os autores concluíram que o processo de irrigação foi influenciado pelo diâmetro da agulha, pela distância entre a ponta da agulha e o CT, e pelo diâmetro cirúrgico do preparo do canal radicular. 26 3 CONCLUSÃO Com base nos dados encontrados nesta revisão de literatura, pode-se concluir que: · o tratamento endodôntico em dentes com necrose pulpar poderá ser realizado em sessão única; · a dor pós-operatória não tem diferença quando comparada com os casos que foram tratados em sessão múltipla; · é possível uma desinfecção do sistema de canais radiculares através da instrumentação e irrigação adequada, sem a necessidade de medicação intracanal, obtendo-se a reparação apical. 27 REFERÊNCIAS ASHKEMAZ, P. J. Endodontia: clínicas odontológicas da América do Norte: Endodontia de consulta única. 1ª. ed. São Paulo: Roca, p. 229-230, 1987. BATISTA, A.; BERGER, C. R. Tratamento da polpa morta. In: BERGER, C. R. Endodontia Clínica. 2ª ed. São Paulo: Pancast, p. 209-232, 2002. BAUMGARTNER, J. 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