HOSPITAL DO SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL Gerência Técnica de Ensino e Pesquisa JÚLIA ALMEIDA FERREIRA COQUELUCHE: UMA PREOCUPAÇÃO MUNDIAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentada a Comissão de Residência Médica do Hospital do Servidor Público Municipal, para obter o título de Residência Médica. Área: Pediatria Orientadora: Dra. Irene Walter de Freitas São Paulo 2014 FICHA CATALOGRÁFICA Ferreira, Júlia Almeida Coqueluche: uma preocupação mundial / Júlia Almeida Ferreira. São Paulo, 2014. Trabalho de conclusão de curso apresentado à comissão de residência médica do HSPM-SP, para obter o título de Residência Médica, na Área de Pediatria. 1. Coqueluche 2. Coqueluche grave 3. Lactentes 4. Complicações 5. Imunizações 6. Vacina DTP I. Hospital do Servidor Público Municipal II. Título. AUTORIZAÇÃO AUTORIZO A DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE. São Paulo, ____/____/______ ___________________________________________________ Júlia Almeida Ferreira Aos pais e mães que lamentavelmente perderam seu filho, amor incondicional que deixará um vazio insubstituível, decorrente a uma grave doença, meus sinceros votos. AGRADECIMENTO Aos meus pais, maiores incentivadores, a quem tenho imensa gratidão e orgulho, que além de me preencher de amor e carinho, ensinaram-me a ter compaixão, humanidade e honestidade e buscar sempre em Deus à força maior para o meu desenvolvimento como ser humano. A vocês, serei eternamente grata. A Deus, meu maior protetor e guardião da minha fé, por me guiar e acompanhar durante toda essa trajetória me livrando do mal e fazendo acreditar que praticar o bem ao próximo é o melhor caminho. Aos meus irmãos, melhores amigos, por estarem sempre presente em minha vida, pelos conselhos mais fiéis, pelas confidências trocadas e momentos de sublime felicidade e amor. Aos meus amigos, por saber ouvir e aconselhar, por compartilhar as dificuldades, ansiedades e sonhos, por saber que posso sempre contar. Aos meus colegas de profissão, pelos conhecimentos compartilhados e pelo aprendizado de trabalhar em conjunto. Aos meus professores, pelo acolhimento, motivação e transmissão de experiência e sabedoria através dos ensinamentos que contribuíram para acrescentar o meu crescimento pessoal. A minha orientadora, Dra. Irene, por toda paciência, atenção e dedicação, pelo empenho em me ajudar a realizar esse trabalho. Aos pais dos pacientes, por depositarem em mim, a confiança de cuidar dos seus filhos. Aos pacientes, que tornam meu sonho em realidade, meus dias mais prazerosos e a sensação de dever cumprido. “O homem disse que tinha de ir embora mas antes queria me ensinar uma coisa muito importante: Você quer conhecer o segredo de ser um menino feliz para o resto de sua vida, disse o homem. Quero, respondi. O segredo se resume em três palavras, ele pronunciou com intensidade, mãos nos meus ombros e olhos nos meus olhos: - Pense nos outros”. Fernando Sabino RESUMO A coqueluche é uma doença infecciosa aguda causada pela Bordetella pertussis, caracterizada por tosse paroxística que pode evoluir de forma grave em menores de seis meses de idade levando ao óbito ou deixando sequelas. Apesar de ser uma doença imunoprevinível, persiste como uma preocupação de saúde pública, mesmo em países com alta cobertura vacinal. A observação do aumento dos casos entre adolescentes e lactentes não vacinados ou parcialmente imunizados justificam a recomendação do reforço vacinal para adolescentes e adultos, uma vez que a imunidade diminui ao longo dos anos. Este estudo objetivou, através de uma revisão da literatura, discutir a coqueluche, aspectos epidemiológicos e sua evolução em lactentes que necessitaram de hospitalização, suas complicações e causas de óbito. Trata-se de um estudo descritivo do tipo bibliográfico e compreendeu 58 artigos encontrados em três bases de dados: PUBMED, SCIELO e LILACS, além de informações disponíveis nos portais eletrônicos oficiais da OMS, CDC, Ministério da Saúde e do CVE do Estado de São Paulo nos últimos seis anos. Concluiu-se que as principais fontes de infecção para lactentes são os familiares, especialmente, as mães. Há necessidade de aumentar a conscientização sobre os benefícios da vacinação de adolescentes e adultos incluindo as gestantes e aprimorar a vigilância da B. pertussis nesses grupos. O maior acesso aos recursos laboratoriais identificando a bactéria nos casos suspeitos contribui indiretamente para o estabelecimento de estratégias de vacinação e de contenção de surtos epidêmicos visando à diminuição da ocorrência da doença em lactentes desprotegidos ou parcialmente protegidos. Palavras-chave: Coqueluche. Coqueluche Grave. Lactentes. Complicações. Imunização. Vacina DTP. ABSTRACT Pertussis is an acute disease caused by Bordetella pertussis, characterized by paroxysmal cough, that may evolve in a severe manner in children under six months old, leading to death or sequelae. Even though this is an vaccine-preventable disease, it is still a public health worry even in those countries with high vaccination coverage. The observing of increased number of cases among teenagers and nonvaccinated or partially immunized infant justify the recommendation of vaccine reinforcement in teenagers and adults, once immunity drops over the years. This study aimed, through literary review, to discuss Perussis, its epidemiological aspects and disease evolution in nurslings who need hospitalization, as well as its complications and death causes. This is a bibliographical description study and it has comprised 58 arcticles found in three databases - LILACS, SCIELO and PUBMED and also avaliable information found in the OMS, CDC, Ministério da Saúde (Heatlh Ministry) and CVE of Sao Paulo State oficial websites. It was concluded that the main nurselin sources of contamination are its relatives, especially their mothers. It is necessary to expand awareness of adult and adolescent vaccination benefits, including pregnant women, and enhance B. pertussis vigilance in these groups.The wider access to laboratorial resources that identify the bacteria in suspicious cases indirectly contributes to vaccination strategies settlement and outbreak control in order to minimize the incidence of this disease in unprotected ou partially protected infant. Keywords: Pertusis. Critical Pertusis. Infant. Complications. Immunization. DTP vaccine. LISTA DE ABREVIATURAS ACIP- Advisory Commitee no Immunization Practices ACT- Adenilato ciclase CDC- Centers for Disease Control and Prevention CI- Coeficiente de incidência CVE- Centro de Vigilância Epidemiológica dTpa(adulto)- Tríplice bacteriana acelular DTPa(infantil)- Tríplice bacteriana acelular DTP+ Hib- Vacina tríplice bacteriana de células inteiras combinada à vacina para Haemophilus influenzae tipo b ECMO- Oxigenação por Membrana Extra- corpórea FHA- Filamentos de hemaglutinina GMP- Monofosfato de guanosina cíclica OMS- Organização Mundial da Saúde PNI- Programa Nacional de Imunização PT- Toxina pertussis RT-PCR- Reação em Cadeia da Polimerase em tempo real SINAN- Sistema de Informação de Agravos de Notificação SHU- Síndrome hemolítico- urêmica TCT- Citotoxina traqueal UTI- Unidade de Terapia Intensiva VSR - Vírus sincicial respiratório SUMÁRIO 1- INTRODUÇÃO........................................................................................... .....................10 2- DISCUSSÃO.............................................................................. .....................14 2.1- Gráfico 1.................................................................................. .....................15 2.2- Gráfico 2.................................................................................. .....................17 2.3- Tabela 1.................................................................................. .....................24 2.4 - Tabela 2................................................................................. .....................30 3CONCLUSÃO............................................................................. .....................34 4-REFERÊNCIAS........................................................................... .....................36 11 1 INTRODUÇÃO A coqueluche é uma doença infecciosa aguda do trato respiratório de distribuição universal, altamente contagiosa, que afeta exclusivamente os seres humanos, e de grande repercussão na saúde pública, apesar de ser imunoprevinível 01, 02, 03 . O agente etiológico da coqueluche é a bactéria Bordetella pertussis (B. pertussis), um cocobacilo Gram-negativo e aeróbico 04 . A transmissão ocorre principalmente pelo contato direto da pessoa doente com pessoa suscetível, através da via respiratória predominantemente na fase catarral, pelo contato com gotículas de secreção de orofaringe eliminadas ao tossir, falar, ou espirrar 05,03 . A coqueluche pode acometer pessoas de qualquer faixa etária, porém, nos menores de um ano de idade, nos não-vacinados, ou com calendário vacinal incompleto, ela tende a se apresentar com quadros de maior gravidade e complicações 06,07 . As crianças são o principal reservatório dessa bactéria em regiões onde as taxas de cobertura vacinal são baixas. Porém, em regiões com alta cobertura vacinal, os adolescentes e adultos jovens são as principais fontes de transmissão da doença 08 . O período de incubação da coqueluche varia de sete a dez dias. A coqueluche evolui em três fases sucessivas: (1) Fase catarral com duração de uma a duas semanas; (2) Fase paroxística com duração de duas a seis semanas; e, (3) Fase de convalescença que pode durar semanas ou meses 09,10 . Em recém- nascidos, o quadro clínico pode ser marcado por insuficiência respiratória, cianose e crises de apneia 06 . 12 Em adolescentes e adultos o quadro pode apresentar-se de forma atípica, sem a tosse característica, porém com historia de tosse prolongada por até 10 semanas 11 . Segundo Soares et al., (2008 APUD WENDELBOE et al., 2006), os familiares, principalmente os pais, são responsáveis por 76 a 83% da transmissão da coqueluche para os lactentes 06,07 . Com o objetivo de aumentar a prevenção de coqueluche em lactentes, existem duas estratégias conhecidas como: "estratégia casulo": a primeira é a proteção direta das mães com ≥ 20 semanas de gestação e a segunda é a proteção indireta de contactantes próximos dos lactentes 12 . O diagnóstico clínico presumido ou clínico epidemiológico de coqueluche pode ser complementado por achados laboratoriais de leucocitose que se inicia por volta do final da fase catarral e atinge seu pico na terceira semana com aumento relativo de neutrófilos e aumento relativo e absoluto de linfócitos típicos 13 . O diagnóstico de confirmação é feito através da cultura bacteriana, que é o padrão ouro no diagnóstico, ou pelo seu isolamento por Reação em Cadeia de Polimerase (PCR) em tempo real em secreção de orofaringe colhida preferencialmente na fase catarral da doença, antes da antibioticoterapia ou com no máximo três dias de tratamento conforme preconizado 14 . As complicações da coqueluche são mais comuns entre lactentes, e incluem hipóxia, apneia, pneumonia, hipertensão pulmonar, choque e convulsões. A morbidade e mortalidade ocorrem, em sua maioria, em crianças menores de seis meses de idade 15 . A infecção por B. pertussis pode ter um curso fulminante em lactentes não imunizados em consequência de complicações como pneumonia com rápida progressão para insuficiência respiratória aguda acompanhada de hipoxemia 13 refratária, leucocitose extrema e choque cardiogênico com necessidade de suporte ventilatório e cardiovascular 16 . São sinais de alerta às complicações e gravidade: (1) taquipnéia com frequência respiratória acima de 60 movimentos respiratórios por minuto, (2) bradicardia abaixo de 50 batimentos por minuto, (3) contagem de leucócitos superior a 50.000 células/mm3 e (4) hipóxia persistente após os paroxismos 17 . As principais causas para admissão em unidade de terapia intensiva são: apneia, bradicardia, pneumonia e queda da saturação de oxigênio pulmonar contribui como um agravante da coqueluche 19 18 . A hipertensão . São fatores de risco associados à gravidade: pneumonia, baixa idade, leucocitose e hipoxemia 20 . A recomendação atual do Ministério da Saúde para a profilaxia de coqueluche consiste na administração de três doses da vacina Pentavalente (DTP-Difteria, Tétano e pertussis + Haemophilus influenzae tipo b+ Hepatite B), a partir de dois meses de idade com intervalo de 60 dias entre as doses e dois reforços: o primeiro aos 15 meses e o segundo entre os quatro e seis anos de idade, aplicando-se a vacina DTP sozinha 12,21 . A perda da imunidade adquirida pela vacina ao longo dos anos, entre adolescentes e adultos, a utilização de novos métodos de diagnóstico, a melhoria dos sistemas de vigilância epidemiológica e a emergência de novas variantes de B. pertussis são algumas das possíveis causas da atual reemergência da infecção 07,22 . A coqueluche é uma doença de notificação compulsória e, apesar da vacina, continua a ser uma importante causa de morbimortalidade mundial, que cursa com ciclos hiperendêmicos a cada três ou cinco anos 13,21 . A OMS apresenta uma estimativa de incidência de 50 milhões de casos e 300 mil mortes por ano. 14 Atualmente, a coqueluche ocupa o quinto lugar dentre as causas de mortalidade por doenças imunopreviníveis em crianças menores de cinco anos 21 . A partir de 2011, o Ministério da Saúde- MS tem apresentado dados preocupantes sobre a situação da coqueluche no Brasil, observando aumento na ocorrência de casos e na letalidade. No mesmo ano foram notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação-SINAN, 1.540 casos suspeitos de coqueluche no Estado de São Paulo, dos quais 29,2% (451/1.540) com diagnóstico confirmados. Em 82,2% (371/451) ocorreu em crianças menores de um ano, com 14 óbitos (14/451) ou 3,1%, com prevalência total em menores de um ano. No ano de 2012, o número de casos foi crescente 03,21 . Torna-se indiscutível entre as medidas de contenção da doença, a importância de reforçar a imunização de adolescentes e adultos, entre eles, as gestantes, como forma de prevenção para os recém-nascidos e crianças que ainda não completaram o esquema básico de vacinação que são o grupo com maior risco de desenvolver coqueluche grave 12,23 . O objetivo deste trabalho é apresentar uma revisão da literatura sobre a situação epidemiológica atual, gravidade, importância e complicações da coqueluche grave em lactentes e demonstrar que novas estratégias de vacinação atendendo adolescentes e adultos seriam o alvo a ser atingido para prevenir essa doença. Foram analisados artigos publicados no PUBMED, SCIELO e LILACS, assim como as informações disponíveis nos portais eletrônicos oficiais da OMS, Center for Disease Control And Prevention-CDC em Baltimore,USA, Ministério da Saúde -MS, Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo-CVE e a literatura nacional e internacional no período de 2007 a 2014, o que resultou na leitura de 58 artigos científicos. 15 2 DISCUSSÃO A coqueluche, também conhecida como "tosse comprida", é uma infecção respiratória aguda, transmissível, causada pela B. pertussis que pode ocorrer em pessoas de qualquer idade, mas com maior risco de doença grave e morte entre lactentes 18 . Outras doenças respiratórias agudas, virais ou bacterianas causadas por Bordetella parapertussis, vírus sincicial respiratório (VSR), os adenovírus, o Haemophilus influenzae, o Mycoplasma pneumoniae, Chlamydia trachomatis e Chlamydia pneumoniae podem provocar uma Síndrome Coqueluchóide 12,21 . A B. pertussis é um cocobacilo gram-negativo, aeróbio, não esporulado, imóvel e pequeno, provido de cápsula e de fímbrias. O homem é o único hospedeiro natural conhecido dessa bactéria 24 . A coqueluche é um dos maiores problemas de saúde pública mundial, com 90% dos casos ocorrendo em países em desenvolvimento 25,26,27 . Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a coqueluche é a quinta doença com maior mortalidade em crianças menores de cinco anos entre aquelas evitáveis através da imunização, com incidência aproximada de 50 milhões de casos e mortalidade estimada de 300.000 por ano 01, 02, 21, 09, 28, 15, 26,32 .(Gráfico 1) A partir do início da década de 80 houve uma mudança no perfil epidemiológico da doença nos países desenvolvidos. Observa-se que o índice de acometimento de adolescentes com coqueluche vem crescendo, apesar do parcial controle da ocorrência da doença pela imunização. Entre os lactentes vem ocorrendo na forma de surtos epidêmicos da doença que acontecem a cada três a cinco anos esse motivo, discute-se a necessidade de acrescentar 02, 29, 30, 31,32 . Por 16 um reforço feito com a vacina tríplice bacteriana acelular em adolescentes e adultos . 32 Gráfico 1- Notificação de casos de Coqueluche, USA, 1990-2010 Fonte: Adaptado de CDC: National Notifiable Diseases Surveillance System and Supplemental Pertussis Surveillance System (2012, p. 1). Nos países em desenvolvimento, dificuldades no acesso aos serviços de saúde e deficiência nos programas de vigilância podem tornar difícil o diagnóstico, o que subestima a incidência e prevalência dessa morbidade 33 . Segundo a Organização Pan-americana de Saúde (OPAS) há evidências de que 20 a 40 milhões de pessoas contraem coqueluche a cada ano nas Américas. Dentre elas, 200 a 400 milhares de pessoas tem evolução fatal 25 . Nos Estados Unidos (EUA), entre 2000 e 2001, as taxas de incidência de coqueluche em adolescentes foi superior a 50 por 100000 em 11 estados. Em uma epidemia ocorrida no estado de Massachusets, 387 dos adolescentes com coqueluche apresentaram tosse há mais de um mês quando foi feito o diagnóstico 08. 17 De acordo com o trabalho realizado por Barlow et al no estado de Oregon nos EUA, indivíduos vacinados tem menor risco de complicações em relação aos nãovacinados 30 . Além disso, apresentam menor duração da tosse que aqueles não- vacinados. A imunização ainda que incompleta, confere proteção razoável contra a doença grave 30,31 . Na era pré- vacina, a coqueluche era uma doença vista apenas em crianças. Com o passar dos anos começou- se a observar a incidência em adolescentes e adultos 34,35 . Os adolescentes e adultos se tornam fonte habitual de infecção para crianças jovens demais para serem vacinadas ou com uma resposta imune incapaz de protegê-la 36,18 . O aumento da incidência de coqueluche em adolescentes previamente vacinados tem demonstrado a perda da imunidade ao longo dos anos e um risco elevado de transmissão para as crianças com calendário vacinal incompleto, o que fortalece as recomendações dos reforços da imunização entre adolescentes com consequente aumento na proteção aos lactentes 23,04,15 . Crianças não vacinadas tem uma média de oito vezes maior risco de contrair coqueluche do que aquelas vacinadas 23 . No Brasil, na década de 80, foram notificados mais de 40 mil casos anuais de coqueluche e o coeficiente de incidência foi maior que 30/100.000 habitantes. Este número reduziu bruscamente a partir de 1983, mantendo, desde então, um declínio acentuado. Em 2008, o número de casos confirmados foi de 1.344 casos/ano e o coeficiente de incidência (CI) foi de 0,71 /100.000 habitantes 21 . Em 2011 foram notificados 1.975 casos e confirmados 583 para coqueluche no país, dos quais 76,3% (445/583) ocorreram em crianças menores de um ano e destes, 88,3% (393/445) em lactentes com idade inferior a seis meses sem diferença significativa em relação ao sexo. O que chamou atenção neste ano foi o número 18 óbitos, um total de 74. No ano de 2012, a incidência de casos confirmados registrados permaneceu crescente. (gráfico 2) No estado de São Paulo, os dados epidemiológicos recentemente analisados evidenciam que o número de casos confirmados da coqueluche têm aumentado. Métodos diagnósticos de melhor qualidade como o atualmente utilizado Reação em Cadeia da Polimerase (RT-PCR) tem sido realizado corroborando para o aumento de notificações da doença. Além disso, como já foi observado que os ciclos hiperendêmicos da doença ocorrem a cada três ou cinco anos seguidos por declínio e comprovado que o último ciclo hiperendêmico da coqueluche no estado de São Paulo ocorreu em 2008, esse aumento do número de casos no ano de 2011 já era esperado 21. Gráfico 2- Coeficiente de Incidência por coqueluche e cobertura vacinal com (DTP e DTP + HIB). Brasil, 1990 a 2013. Fonte: CGDT/DEVEP/SVS/MS 19 A duração da imunidade adquirida por infecção ou adquirida pela vacinação varia entre quatro a 20 anos e quatro a 12 anos, respectivamente. A infecção natural confere uma maior proteção do que a vacinação 31 . Portanto, vários fatores podem favorecer a reemergência da B. pertussis, entre eles, a comprovação de que a proteção oferecida pela vacina ou infecção natural reduz com o tempo e o uso de vacinas acelulares nas doses de reforço em lactentes que podem ter menor efeito quando comparada com as vacinas de células inteiras. A confirmação etiológica por meio de método diagnóstico mais sensível e específico, como PCR, cultura e sorologia, tem colaborado na elucidação dos casos suspeitos 33 . A possibilidade de alterações genéticas da B. pertussis e a efetividade da vigilância epidemiológica também contribuíram para o aumento de notificações 25,37 . A infecção inicia-se com a penetração das bactérias, presentes em gotículas eliminadas pela tosse, espirro, beijo, fala e fômites de indivíduos infectados nas vias aéreas do hospedeiro susceptível 38,21 , onde aderem às células do epitélio ciliado da traquéia e nasofaringe. Posteriormente, começam a replicar-se e a colonizar áreas próximas produzindo toxinas que danificam o epitélio, causando a perda das células ciliadas, o que acarreta a tosse característica e provocam hipóxia e congestão venosa no sistema nervoso central, levando a presença de edema local, hemorragia e convulsões. A B. pertussis tem a capacidade de danificar o epitélio alveolar através da ação combinada de vários fatores de virulência, que interferem também no movimento ciliar normal e contribuem para a permanência da bactéria no trato respiratório. Dentre os componentes da B. pertussis que são fatores de virulência podem ser citados: filamentos de hemaglutinina (FHA), pertactina (PRN), fímbrias (FIM) e o fator de colonização traqueal. Dentre as toxinas produzidas pela bactéria, 20 destacam-se: a toxina pertussis (PT), a citotoxina traqueal (TCT), a adenilato ciclase (ACT), a toxina termo lábil e endotoxina ou LPS. Todas estão relacionadas tanto com a patogênese da infecção quanto com a proteção imune 39,40,41, . Após a infecção natural, a toxina pertussis é observada em 80-85% das pessoas infectadas 07 . A fisiopatologia da pneumonia associada à infecção por B. pertussis pode ser explicada pela presença de hipóxia, acidose, vasoconstricção pulmonar aguda, aumento de leucócitos, além de mecanismos relacionados a toxina que, juntos provocam redução do fluxo sangüíneo pulmonar e aumento da pressão na vasculatura pulmonar que piora a hipoxemia e ocasiona a insuficiência cardíaca, síndrome da angústia respiratória aguda e choque. Estas situações em conjunto agravam a hipóxia existente e levam a um ciclo vicioso da hipertensão pulmonar refrataria 40,19 . A realização precoce do ecocardiograma contribui para o diagnóstico de hipertensão pulmonar e adequação terapêutica 06 . A principal fonte de transmissão da B. pertussis é o contactante familiar, particularmente, a mãe. A transmissão pode persistir por até três semanas após o início da fase paroxística e torna-se praticamente inexistente cinco dias após tratamento com antibióticos apropriados prevalência na primavera e verão 13 29 . É uma doença sazonal com maior . O pico sazonal de incidência da coqueluche em crianças antecede o pico sazonal de adolescentes e, assim sugere que estes não sejam o maior reservatório ou alvo da B. pertussis 18 . A intervenção terapêutica adequada realizada na fase paroxística não altera o quadro clínico, mas reduz significativamente a transmissão da bactéria pela nasofaringe 07 . As manifestações clínicas da doença são divididas em quatro fases: incubação, catarral, paroxística e convalescença. O período de incubação tem duração aproximada de 7 a 10 dias. O período de maior transmissibilidade da 21 doença é a fase catarral, que possui duração aproximada de duas semanas. Nesse período, dificilmente suspeita-se do diagnóstico, pois o quadro clínico é inespecífico com aparecimento de febrícula, anorexia, espirros, mal estar, irritabilidade e tosse seca discreta podendo ser causado por vírus ou bactérias. Quanto mais precoce o diagnóstico menor o risco de doença grave. Geralmente, o diagnóstico é realizado na fase paroxística com duração de uma a seis semanas caracterizado por aumento da freqüência e intensidade dos episódios da tosse, com acessos de tosse acompanhado de cianose, guinchos inspiratórios, vômitos pós-tosse, com ausência de febre ou febre baixa. A fase convalescente é caracterizada pela redução da freqüência e intensidade da tosse com duração de semanas a meses, podendo haver novos ataques de tosse paroxística, desencadeados por infecções respiratórias subseqüentes 10,29,41,42 . As pessoas que já foram vacinadas ou contraíram a coqueluche pela segunda vez apresentam um quadro clínico mais brando da doença 10 . Em adolescentes e adultos, muitas vezes a infecção é assintomática ou indistinguível de outras doenças respiratórias causadas por vírus ou outras bactérias 08 . Há evidências de que uma grande parte dos casos de coqueluche são subnotificados devido a dificuldade de realização na rotina laboratorial dos serviços de saúde, principalmente, em países em desenvolvimento, prejudicando a real dimensão da epidemia de coqueluche 43 . Muitas vezes a coqueluche é subdiagnosticada pela falta de reconhecimento do médico ou pela sensibilidade limitada do teste diagnóstico 12 . A suspeita diagnóstica de coqueluche é realizada principalmente a partir do quadro clínico característico da doença. O diagnóstico laboratorial presumido marcado pela leucocitose com predomínio de linfocitose pode ser observado desde 22 início da fase catarral. A leucocitose extrema pode estar relacionada com o grau de toxicidade 42 . A cultura bacteriana é o padrão- ouro para o diagnóstico com alta especificidade, apesar de menor sensibilidade comparada ao PCR 07,12,29 . A confirmação diagnóstica deve ser realizada por meio de exames laboratoriais com detecção da B. pertussis através da cultura de secreção orofaríngea com isolamento da bactéria 34, 42 , técnicas de detecção do DNA da bactéria por PCR ou exames sorológicos de detecção de anticorpos 34 . A técnica adequada com coleta do material de casos em investigação de coqueluche e de contactantes com tosse prolongada deverá ser realizada de preferência na fase catarral, no início dos sintomas característicos da doença, antes de começar a terapia antibiótica ou com no máximo três dias de tratamento 14 . A PCR é método mais caro que a cultura bacteriana, sua sensibilidade diminui com a progressão dos dias de tosse e é considerada método de escolha para os casos com duração de tosse inferior a três semanas. A maioria dos adultos infectados buscam atendimento de saúde quando a cultura e o PCR já não podem ser indicados. O diagnóstico poderá então ser realizado através de métodos sorológicos. Nos pacientes reinfectados pela B. pertussis, altos níveis de anticorpos para antígenos da B. pertussis serão encontrados 34 . Resultados de PCR falso- negativos podem ocorrer nas seguintes situações: uso de antibiótico recentemente, falta de experiência do laboratório na coleta e processamento da secreção, outros agentes etiológicos, imunidade parcial pela vacina e eliminação espontânea da B. pertussis pelo organismo 42 . Quanto menor a idade, maior a gravidade e risco de complicações 44 . A maioria das internações e mortes causadas por coqueluche é notificada em crianças 23 menores de um ano. Os neonatos são especialmente suscetíveis e geralmente, a apresentação clínica é atípica, o guincho característico e a febre podem estar ausentes, podendo apresentar dificuldade respiratória, pausas inspiratórias, bradicardia e cianose, o que dificulta o diagnóstico e propiciam evolução para complicações e seqüelas 01, 29, 06 . Os adolescentes e adultos podem apresentar apenas tosse intensa por tempo prolongado 29, 25 . Devido a persistência dos sintomas, a coqueluche é considerada "a tosse dos cem dias". Pessoas imunizadas para coqueluche podem não apresentar o quadro clínico típico e ter uma evolução mais branda 28 . O grande grupo de risco para a coqueluche severa é o lactente menor de seis meses que corresponde a 90% das causas de mortes 02,18 . Os fatores de risco para mortalidade são: idade inferior a um ano, hiperleucocitose, pneumonia, convulsões e vacinação incompleta 02 . Dados publicados pelo CDC revelam que, aproximadamente 2/3 dos pacientes com diagnóstico confirmado de coqueluche evoluem com necessidade de internação 38 . A taxa de mortalidade em lactentes menores de seis meses varia entre 0,8 e 6,7%. A pneumonia pode ocorrer devido a um evento primário ou secundária a uma infecção por outro microorganismo. A pneumonia (6 a 15% dos casos) é a principal causa de morte 12 dentre as complicações e a mais grave é a hipertensão pulmonar. A encefalopatia e a convulsão são raras e representam 0,1-0,2% dos casos em consequências de hipóxia cerebral por crises repetidas de tosse e por danos da própria toxina pertussis ao tecido cerebral. O seu diagnóstico geralmente é de exclusão e clínico, naqueles com crises convulsivas repetidas. Outras complicações possíveis são otite média aguda, sinusite e superinfecção bacteriana 01, 02, 33, 09, 16. 24 Lynfield et al., comprovaram através de um estudo que mais da metade das crianças evoluem com complicações e necessitam de internação. As principais são: apneia (67%), pneumonia (23%), convulsões (1,6%) e encefalopatia (0,4%), sendo que 1 a 2% apresentam como desfecho final a morte 28 . Os critérios principais para admissão de pacientes com coqueluche em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) são: apneia (82%), bradicardia (63%), pneumonia (28%) e dessaturação de hemoglobina (24%). Estes e os que evoluíram para óbito são classificados como doença critica ou severa. O maior índice de morte foi visto no sexo feminino 19,18, 20 . Sinais de alerta precoce de gravidade são: taquipnéia com frequência respiratória maior que 60 movimentos respiratórios por minuto, bradicardia com frequência cardíaca menor que 50 batimentos / minuto, contagem de leucócitos acima de 50.000 células/mm3 e hipóxia persistente após paroxismos 17 . A apneia prolongada com redução da saturação de oxigênio e hipóxia grave podem ser vistas nos casos de lactentes jovens que progrediram com coqueluche severa 01 . Estudo realizado em um hospital pediátrico na cidade de São Paulo avaliou 16 lactentes admitidos na UTI no período de 2011 a 2014 com diagnóstico confirmado de coqueluche. As principais causas de internação hospitalar foram tosse paroxística acompanhada de cianose central e leucocitose elevada com predomínio de linfocitose. Dentre as causas para admissão com necessidade de cuidados intensivos encontram-se a infecção secundária( pneumonia e bronquiolite), choque séptico e insuficiência respiratória aguda. De acordo com esse estudo, as principais complicações encontradas durante a internação foram convulsão, choque séptico com necessidade de suporte medicamentoso, insuficiência renal aguda com 25 terapia substitutiva, diálise peritoneal, hipertensão pulmonar com necessidade de terapia com óxido nítrico e óbito.(Tabela1) Tabela1-Coqueluche Grave: Apresentação de recém-nascidos e lactentes que necessitaram de cuidados intensivos- tema livre apresentado no Congresso brasileiro de medicina intensiva em Florianópolis no dia primeiro de Agosto do ano de 2014 # Fonte: Alvo, M. et al. (2014). De início, a etiologia da doença na forma grave pode não ser evidente. O paciente pode apresentar um quadro de sepse com necessidade de cuidados intensivos na presença de leucocitose acompanhada de linfocitose com retardo no diagnóstico etiológico 18 . Paddock et al., sugerem que em casos de crianças com evolução letal com achado laboratorial de hiperleucocitose, broncopneumonia e 26 hipertensão pulmonar, principalmente, em menores de seis meses, a coqueluche dever investigada 40 . A síndrome hemolítico-urêmica, em sua maioria, é causada por uma infecção intestinal por E. coli produtora de toxina (SHU típica) provocando uma lesão endotelial e microangiopatia renal. Contudo, estudos recentes comprovam que a SHU atípica pode ocorrer como consequência de uma infecção não- entérica patogênica, causada entre outros pela B. pertussis 35 . No calendário vacinal do Programa Nacional de Imunização (PNI) do Brasil, o esquema básico de imunização contra a coqueluche utiliza a vacina tríplice bacteriana de células inteiras composta de toxóide diftérico, toxóide tetânico, suspensão de B. pertussis mortas, de células inteiras 45 combinada à vacina para Haemophilus influenzae tipo b e Hepatite B(DTP+ Hib+ Hep B) administradas em três doses: a primeira aos dois meses, a segunda aos quatro e a terceira aos seis meses de idade seguida de dois reforços: aos 15 meses e o outro entre os quatro e seis anos de idade com a vacina DTP 21, 33, 09, 10 . O esquema básico da vacina tríplice bacteriana tem uma eficácia próxima de 70 a 80% duração em torno de cinco a 10 anos após a última dose 03 42 com a proteção de . A DTP está contra- indicada para maiores de sete anos de idade. A dose preconizada da vacina DTP é 0,5ml IM. 29 . A idade mínima permitida para a primeira dose é seis semanas de vida . 12, 46 Uma vacina tríplice bacteriana acelular está disponível para uso em lactentes em condições especiais e adultos (DTPa e dTpa) composta por componentes antigênicos de B. pertussis (toxóide e FHA) purificados. Ambas as vacinas de células inteiras e a acelular contêm a mesma eficácia, mas a acelular possui maior tolerância vacina pertussis acelular foi produzida em 1981 no Japão 07 45 . A primeira 27 e substituiu a dose de reforço da tríplice bacteriana no ano de 1997 um aumento na proteção de crianças contra a coqueluche 47 12 conferindo . A vacina DTP não é recomendada para as crianças maiores devido ao maior risco de eventos adversos relacionada à componente pertussis dor, hiperemia, edema e enduração no local da aplicação 13 07,13 como febre baixa, . O calendário de vacinação da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBim) sugere o uso de vacinas acelulares tanto no esquema primário como no de reforço por serem vacinas muito menos reatogênicias 08 . A vacina dTpa já é utilizada de rotina no Canadá, EUA, Alemanha, Austrália, França e alguns países da América Latina recomendam seu uso, entre eles o Brasil, embora o real impacto da vacinação de adolescentes com essa vacina ainda não esteja estabelecido 08 . Nos adolescentes e adultos, a vacinação deve ser continuada utilizando-se difteria e tétano adulto (dT) a cada dez anos após o segundo reforço, conforme orienta a portaria GM/MS no 3.318, de 28 de outubro de 2010.8 que institui em todo o território nacional o calendário básico de vacinação da criança, adolescente, adulto e idoso 33 . Nos EUA, o CDC indica duas doses de reforço para os adolescentes, a primeira aos 11-12 anos e a segunda aos 19 anos seja feita com a vacina dTpa assim como adultos maiores de 19 anos 48 09 . A perda ou diminuição da proteção conferida pela vacina ou após infecção pela B. pertussis torna o indivíduo susceptível a infecção ou reinfecção 49 . A vacina dTpa pode ser recomendada como dose única também para os familiares adultos próximos de caso índice 36,12 . Existem duas estratégias, conhecidas como "estratégia casulo", com o objetivo de aumentar a prevenção de coqueluche em lactentes: a primeira é a 28 proteção direta das mulheres gestantes e a segunda é a proteção indireta de contactantes próximos dos lactentes 12 . A estratégia casulo inclui também as mulheres em planejamento de gravidez, as gestantes no último trimestre, preferencialmente, as com 20 semanas de gestação e até no puerpério. A vacina recomendada nesses casos é a tríplice bacteriana acelular (dTpa), dose única. Familiares não vacinados recentemente para a coqueluche em contato com lactentes jovens também devem receber a mesma vacina uma semana antes de entrar em contato com os mesmos e a dose de reforço é indicada a cada 10 anos 37,12 . O Advisory Commitee no Immunization Practices (ACIP) do CDC, EUA recomenda vacinar com dTpa todas as gestantes, de preferência, após 20° semana de gestação ou, pelo menos, 15 dias antes do parto podendo ser administrada no mesmo momento que outras vacinas preconizadas na gestação, como as vacinas Hepatite B e H. influenzae. Isso se justifica porque mulheres que somente foram vacinadas na infância apresentam baixos títulos de anticorpos reduzindo a proteção para os recém-nascidos 29,31 . As gestantes tem fácil acesso à imunização através das consultas realizadas no pré- natal 36 . Outras possibilidades de prevenção seriam a vacinação neonatal e a imunização de mulheres no pós- parto para aumentar a proteção naquelas mulheres que não foram vacinadas durante a gestação. Existe um período de risco de 14 dias após a vacinação que seria o tempo de resposta e ação dos anticorpos IgG e IgA para proteger os recém- nascidos amamentados, já que a lactação materna não protege contra a doença. Assim, se a mãe já entrou em contato ou foi infectada até 15 dias antes, a vacinação pós- parto não seria suficiente para proteger a mãe e a criança 50,36 . O CDC recomenda vacinar todas as gestantes em cada uma de suas 29 gestações entre 27 e 36 semanas de gestação para favorecer que altos níveis de anticorpos sejam mantidos e passados para os neonatos durante cada gravidez. A proteção também pode ser conferida através da passagem de anticorpos pela amamentação após a vacinação 50,51,52 . Estudos finlandeses evidenciaram que cerca de 10% dos pacientes não vacinados ou com vacinação incompleta internados com diagnóstico inicial de bronquiolite com idade inferior ou igual a seis meses e ausência inicial de suspeita de coqueluche apresentaram infecções confirmadas por VSR e B. pertussis. A coinfecção de B. pertussis e vírus respiratórios nos meses de predomínio de infecções virais torna importante o diagnóstico diferencial entre as infecções respiratórias. O vírus respiratório mais encontrado é o VSR (80%) seguido de parainfluenza (13%) e de adenovírus associado com influenza. A confirmação laboratorial da infecção por vírus respiratórios nos pacientes em investigação de coqueluche evita o uso indiscriminado de macrolídeos, estimula a prevenção de transmissão intra-hospitalar de infecções respiratórias e deixa evidente que a identificação do vírus respiratório não exclui a possibilidade de coqueluche concomitantemente 41 . Para Raya et al, os pacientes com co- infecção da B. pertussis e VSR hospitalizados apresentam uma evolução do quadro clínico de menor gravidade do que quando encontrados isoladamente 53 . Outros agentes infecciosos, que fazem parte da “síndrome coqueluchóide” como a Bordetella parapertussis podem ser responsáveis por um quadro clínico mais brando e de menor duração com ciclos endêmico a cada três a quarto anos 54 . O tratamento da coqueluche é feito pelo uso de macrolídeos, especialmente a 17 azitromicina por cinco dias . O ideal é que o tratamento seja instituído na fase 30 catarral da doença para atenuar os sintomas e reduzir a transmissão. A antibioticoterapia deve ser administrada, mesmo nas fases mais avançadas da doença, visando transformar o paciente em não infectante em tempo menor do que na evolução natural 55,56,57 . A infecção bacteriana secundária é comum nesses pacientes e a associação de ampicilina e cefotaxima pode ser uma das opções terapêuticas para os menores de seis semanas. Na hipertensão pulmonar primária neonatal, o óxido nítrico é terapia de escolha, mas na hipertensão pulmonar secundária, o óxido nítrico deve ser usado como teste terapêutico e seus benefícios devem ser avaliados 01 . Todos os pacientes com diagnóstico confirmado e todos os contactantes próximos devem receber tratamento ou profilaxia com antibiótico. A droga de escolha recomendada atualmente pelo Ministério da Saúde é a azitromicina devido a maior facilidade posológica. Outras opções terapêuticas são a claritromicina e a eritromicina que possuem boa penetração nas vias respiratórias. Porém, a eritromicina em menores de um mês de idade pelo risco de causar a síndrome da hipertrofia pilórica, doença grave que pode levar a morte, está contra-indicada nessa faixa etária. O tratamento e a quimioprofilaxia têm os mesmos esquemas terapêuticos 17, 56,58 . ( Tabela 2) A azitromicina tem posologia de uma vez ao dia e deve ser administrada durante cinco dias e a claritomicina deve ser administrada de 12 em 12 horas por sete dias. Esses esquemas terapêuticos facilitam a adesão dos pacientes ao tratamento e dos contactantes próximos à profilaxia quando comparados à eritromicina. Vale ressaltar que a azitromicina pode ser utilizada no tratamento das crianças menores de um mês de idade 17 . 31 No caso de intolerância à macrolídeos, pode-se usar sulfametoxazol – trimetropim, 40mg/kg/dia e 8mg/kg/dia respectivamente, em duas doses diárias, por via oral, por sete dias 18 . 32 Os corticosteróides podem alterar a gravidade e o curso da doença reduzindo as crises de paroxismos (hidrocortisona 30 mg/kg/dia IM, 6/6h por dois dias) assim como os anticonvulsivantes diminuem o número e a intensidade dos acessos paroxísticos (fenobarbital: ataque com 15 mg/kg/dose 1x/dia e manutenção com 6mg/kg/dia 6/6h). Nas crises convulsivas pode-se utilizar diazepam 0,3 mg/kg/dose IV ou outro anti-convulsivante conforme protocolo de atendimento de crises convulsivas 13 O tratamento inicial da coqueluche severa é de suporte e inclui estabilização hemodinâmica e respiratória, além da correção da anemia. A presença de choque é um sinal de mau prognóstico, o que agrava a hipóxia e a acidose e tem o tratamento eficaz através de expansores de volume, uso de drogas vasoativas como catecolaminas de efeito inotrópico positivo (dobutamina) ou drogas vasodilatadoras como o milrinone para aumentar a contratilidade miocárdica e a resistência pulmonar e sistêmica 01 . O óxido nítrico é um potente vasodilatador pulmonar seletivo que atua na parede dos vasos sangüíneos. Ele ativa a ganililciclase gerando a produção de monofosfato de guanosina cíclica (GMP) e relaxamento do músculo liso indicado nos casos de hipertensão pulmonar confirmada 06 . A exsanguineotransfusão é uma opção terapêutica para os casos de leucocitose extrema promovendo a queda do número de leucócitos circulantes com objetivo de reduzir o efeito mecânico na vasculatura pulmonar 01 . Segundo Murray et al., (2013) e Erin et al., (2011), a retirada de excesso de leucócitos anormais da vasculatura pulmonar para o tratamento leucocitose marcada com linfocitose, assim como os vasodilatadores seletivos dentre eles, o sildenafil e óxido nítrico, tem sido eficazes para o tratamento da hipertensão pulmonar 18,57 . 33 A Oxigenação por Membrana Extracorpórea (ECMO) foi usado pela primeira vez em 1990 para terapia de B. pertussis com ECMO apresentam sucesso 20 18 . Somente 30% dos pacientes tratados . Segundo Donozo e tal, a ECMO não apresentou resultados satisfatórios. Nesse estudo, cerca de 84% dos pacientes menores de seis semanas apresentam evolução fatal e, naqueles com mais de seis semanas, a mortalidade chegou a 61% dos casos 01 . Apesar dos avanços no tratamento das complicações da coqueluche como ventilação pulmonar mecânica, utilização de óxido nítrico, drogas inotrópicas e ECMO, a mortalidade em lactentes permanece significativa 18,20 . Seqüelas podem ocorrer por ação direta da toxina da B. pertussis ou devido à consequência de efeitos colaterais do tratamento utilizado 18 . A profilaxia para a coqueluche está indicada para todos contactantes menores de um ano, entre um ano e sete anos, naqueles não vacinados, parcialmente imunizados ou com vacinação desconhecida. Aqueles com mais de sete anos que tiveram contato com o caso índice, nos 21 dias que precederam o início dos sintomas dos casos também devem receber a quimioprofilaxia 32 . Dentre as medidas de contenção da infecção por B pertussis em ambiente hospitalar recomendada dos casos de criança em investigação de coqueluche destaca-se: 1) isolamento em quarto individual até confirmação da etiologia e afastamento de outras causas de infecções respiratórias; realizado esse procedimento e confirmada coqueluche poderá haver compartilhamento do mesmo quarto com outra criança com o mesmo diagnóstico, 2) criança com coqueluche suspeita deve ficar em quarto privado ou dividi- lo com outra criança com coqueluche comprovada que tenha feito tratamento adequado por cinco dias ou que não apresente tosse por um período de 21 dias e 3) isolamento de contato com uso 34 de máscaras e luvas devem ser indicadas para todos que entrarem no quarto da criança com coqueluche confirmada ou suspeita 18 . Entre as orientações para profilaxia (quem? Quando indica?) a Secretaria de Estado da Saúde da Bahia por meio do protocolo de 2013 orienta fazer a quimioprofilaxia para: 1) Contactantes menores de um ano, independente da situação vacinal e característica de tosse; 2) Contactantes menores de sete anos não vacinados, com situação vacinal desconhecida ou que tenham cartão vacinal incompleto; 3)Contactantes adultos que trabalham em profissões que envolvem o contato direto e frequente com menores de um ano ou imunodeprimidos devem, após o início do uso do antimicrobiano, ser submetidos à quimioprofilaxia e afastados das atividades próximos às crianças por cinco dias, 4) Contactantes adultos que moram com menores de um ano; 5) Contactantes que são pacientes imunodeprimidos; e, 6) Profissionais de saúde que realizaram coleta da secreção ou exame próximo ao nariz e boca do paciente e manobra de respiração boca a boca em um caso de coqueluche, sem utilizarem os equipamentos de proteção individual. 35 3 CONCLUSÃO A Coqueluche continua a ser um problema de saúde relevante para o mundo com altas taxas de morbidade e mortalidade. Estudos sugerem que uma intervenção por meio de reforço vacinal aos adolescentes e adultos jovens possa gerar um impacto acentuado na tentativa de diminuir a transmissão da B. pertussis aos lactentes principalmente aos que tem idade insuficiente para terem recebido o esquema de vacinação básico completo, faixa etária mais suscetível às complicações e formas severas dessa doença. As atuais estratégias de imunização utilizando vacina tríplice bacteriana de células inteiras(DTP) nas crianças com quatro doses até os seis anos de idade tem se mostrado ser insuficientes para evitar a ocorrência de coqueluche na adolescência e vida adulta. Devem ser consideradas como forma de prevenção a imunização coletiva de adolescentes e adultos incluindo mulheres grávidas, com a vacina tríplice bacteriana acelular (dTap), não apenas para evitar a infecção, mas, principalmente, a transmissão da doença dos adultos para os lactentes. Diante da literatura pesquisada, verificou-se que a vacina em grávidas além da proteção materna crescente é primordial para proteção do bebê através da passagem de anticorpos passivamente pela placenta ou através da amamentação. As evidências atuais indicam que as vacinas acelulares atualmente recomendadas são seguras para as mulheres grávidas. A dificuldade na suspeita diagnóstica e da comprovação diagnóstica laboratorial da coqueluche nos serviços de saúde, principalmente entre adolescente 36 e adultos, aumenta o índice da subnotificação dos agravos o que prejudica a vigilância epidemiológica da doença. Avanços em estudos clínicos e epidemiológicos são importantes para otimizar o diagnóstico e a instituição precoce do tratamento. A conscientização dos médicos, da população em geral, e uma maior divulgação sobre os riscos da gravidade da B. pertussis aos indivíduos suscetíveis, especialmente os lactentes, além das evidências sobre os benefícios da vacinação de adolescentes e adultos são fundamentais para que essas novas estratégias alcancem o sucesso. 37 REFERÊNCIAS 1- Donoso, A. Díaz, F. Coqueluche grave: Puesta al día. Neumología Pediátrica. ISSN 0718-3321. Disponível em:< http://www.neumologiapediatrica.cl/PDF/200613/ Coqueluche.pdf>. 2-Donoso, A., Arriagada, D., Cruces, P. Díaz, F. Coqueluche grave: Estado del arte Rev. Chilena Infectol 2012, 29 (3): 290-306 3- Ministério da Saúde disponível em http://portalsaude.saude.gov.br/índex.php/ profissional-e-gestor/vigilancia/Links 4- Higgs, R., S. C. Higgins, P. J. Ross, and K. H. Mills. 2012. Immunity to the respiratory pathogen Bordetella pertussis. Mucosal Immunol 5: 485-500. 5- Elias CD, Rocha AM, Werneck LD et al. Coqueluche em lactante. 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