panorama histórico da inserção da psicologia no

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PANORAMA HISTÓRICO DA INSERÇÃO DA
PSICOLOGIA NO CAMPO DA SAÚDE
Juliana Cecília Caniato Mayer1
O conceito de saúde sofreu diversas transformações através
dos tempos, desde suas iniciais concepções mágico-religiosas,
quando a doença seria uma forma de punição dos deuses, caminhando por sua concepção de ser o estado de ausência de uma
doença, passando pela definição da Organização Mundial de Saúde (1948, apud Scliar, 2007, p. 36), que diz que “Saúde é o estado
do mais completo bem-estar físico, mental e social e não apenas
a ausência de enfermidade”, chegando aos conceitos atuais, que
consideram ser a saúde influenciada por fatores sociais, biológicos,
culturais, ambientais e econômicos (RIBEIRO et al., 2007).
Portanto, pode-se afirmar que:
o conceito de saúde reflete a conjuntura social, econômica,
política e cultural. Ou seja: saúde não representa a mesma coisa para todas as pessoas. Dependerá da época, do
lugar, da classe social. Dependerá de valores individuais,
dependerá de concepções científicas, religiosas, filosóficas
(SCLIAR, 2007, p. 30).
O trabalho de psicólogos em instituições voltadas para a área
da saúde surge no início do século XX, com a proposta de integrar a Psicologia com a educação médica, de forma a propiciar
uma humanização dos atendimentos. Nesse momento, a Psicologia adota o modelo médico, seguindo uma visão cartesiana.
(GIOIA-MARTINS; JÚNIOR, 2001).
A partir da década de 30, com base nos trabalhos de Freud,
que apontavam o papel de conflitos emocionais na aparição de
sintomas que não mostravam nenhuma causa física imediata,
surge toda uma linha de desenvolvimento teórico da Medicina
Psicossomática, ramo da medicina que leva em conta, além do
corpo – estudado em seu aspecto mecanicista, a mente, ou seja,
o aspecto psíquico do sujeito.
Na década de 50, a concepção da saúde passa a englobar
o homem e seu ambiente social, sendo essa considerada um
processo de cidadania, pois, além de terem direitos, todos os cidadãos passam a ser responsáveis por sua manutenção. Nessa
realidade, são reconhecidas novas formas de adoecimento, o que
torna mais perceptível a necessidade da interdisciplinaridade e de
uma participação de outras esferas do conhecimento na saúde,
como a Psicologia, a Sociologia e a Antropologia.
Devido a esse contexto, ainda na década de 50, Lamosa
(1987, apud Bock, 2001) diz que a Psicologia Hospitalar surge
no Brasil como um ramo da Psicologia destinado ao atendimento
de pacientes portadores de alterações orgânicas, possibilitando
não só o atendimento ao paciente, mas fazendo uma interlocução
entre a equipe e familiares do paciente, tendo-se como objetivo
minimizar o sofrimento provocado pela hospitalização. Segundo
Romano (1999, p. 10), “o psicólogo tratará das representações
que o indivíduo tem de doença em geral e da sua doença em particular; ocupar-se-á de toda simbologia cultural, social e individual
ligada à doença daquela pessoa.”.
Mas, segundo Bock (2001), no Brasil, a psicologia, como em
qualquer outro país, foi historicamente construída e marcada pelos interesses das elites dominantes. Desde o início, prestou-se,
tanto como ciência e profissão, para o controle, classificação e
diferenciação entre classes sociais, pouco contribuindo para reais
transformações da sociedade.
Estruturam-se, então, na década de 70, duas novas áreas de
atuação da Psicologia no campo da saúde, ambas com inspiração
no behaviorismo: a Medicina Comportamental e a Psicologia da
Saúde, conceituada por Matarazzo como:
o conjunto de contribuições científicas, educativas e profissionais, que as diferentes disciplinas psicológicas fazem
à promoção e manutenção da saúde, à prevenção e ao
tratamento da doença, à identificação dos correlatos etiológicos e diagnósticos de saúde, à doença e as disfunções
relacionadas, à melhora do sistema sanitário e à formação
de uma política sanitária. (TRAVESSO-YÉRPEZ, 2001).
Assim, afirma-se que a Psicologia da Saúde cultiva a idéia de
que a saúde e a doença resultariam da inter-relação entre fatores
biológicos, psicológicos e sociais, passando o sujeito a ser visto de
uma forma mais completa, levando-se em consideração todos os
aspectos inerentes a sua vida. (AGUIAR et al., 2004).
Na década de 80, começa a se desenvolver, no campo da pesquisa, a Psicologia Social da Saúde, que aponta para “variáveis psicossociológicas que influenciam os processos saúde-doença, ou seja,
como a psicologia social contribui para a compreensão e modificação
dos comportamentos relacionados à saúde”. (TRAVESSO-YÉRPEZ,
Revista de Psicologia - Edição 1 l
41
2001, p. 52)
De acordo com a Organização Pan-americana de Saúde (1983,
citada por Romano, 2003, p. 17), a importância da integração da
Psicologia, como profissão, nos serviços de saúde se refere a:
Estudos epidemiológicos que têm demonstrado que pelo
menos uma quinta parte de todos os pacientes que acorrem aos serviços gerais de saúde padecem de problemas
fundamentalmente psicossociais... e os problemas em saúde mental são muito semelhantes entre as diversas culturas... (a equipe multiprofissional) é um processo menos
custoso que o procedimento que se utiliza, com frequência,
para tratar esses 20% de pacientes de ambulatórios gerais
que recorrem aos serviços de saúde.
Nessa realidade, a atuação do psicólogo no campo da saúde sofre modificações, sendo que Achcar (1984, citado por Gioia-Martins;
Júnior, 2001, p. 38), define que o psicólogo:
atua na área específica da saúde, colaborando para a
compreensão dos processos intra e interpessoais, utilizando
enfoque preventivo ou curativo, isoladamente ou em equipe
multiprofissional em instituições formais e informais. Realizam pesquisa, diagnóstico, acompanhamento psicológico,
e atenção psicoterápica individual ou em grupo, através de
diferentes abordagens teóricas.
Assim, pode-se dizer que, influenciada pela visão holística atual da saúde, o fazer do psicólogo possuiria um caráter abrangente,
tendo como diretrizes:
- atuação interdisciplinar, orientação das ações profissionais na direção da saúde coletiva e o caráter educativo da
assistência;
- inserção dos indivíduos, grupos e comunidades na promoção da saúde;
- a natureza da intervenção deixaria de ter uma perspectiva unidisciplinar para evoluir para uma perspectiva multidisciplinar, com ênfase em equipes multiprofissionais e
interdisciplinares;
- o enfoque poderia ser de natureza curativa ou preventiva
numa perspectiva primária, secundária e terciária. (Gioia-Martins; Júnior, 2001, p. 38).
Portanto, a intervenção do psicólogo no campo da saúde
poderia ocorrer em instituições diversas, tais como educacionais
– creches, escolas etc.; de saúde ou saúde mental – hospitais,
centros de saúde mental etc.; ou ainda, em qualquer tipo de insti42 l Revista de Psicologia - Edição 1
tuição - atuando com as condições e relações de trabalho, prevenindo e intervindo terapeuticamente em situações com diferentes
graus de gravidade. Dessa forma, seria possível ao psicólogo, por
meio da ampliação de sua atuação, integrar diferentes equipes
multidisciplinares, agregando, para sua profissão, diversos conhecimentos, conquistando definitivamente seu espaço na prática do
fazer saúde.
REFERÊNCIAS
AGUIAR, Alba; Medina, Elisabete; Besnosik, Raquel; Vasconcelos, Soraia; Barreto,
Tânia. A Formação em Psicologia da Saúde. CienteFico, Faculdade Rui Barbosa,
Salvador, ano IV, v. I, p. 1 – 14, 2004. Disponível em: < http://www.frb.br/ciente/
Impressa/Psi/Saude/P.16.AGUIAR,PoliticasSaude.pdf>. Acesso em: 16 out. 2008.
BOCK, A. M. B. As Práticas Alternativas em Psicologia ou as Alternativas para as
Práticas Profissionais. IN: Novo, H.A.; Souza, L.; Andrade, A.N.. (Org.). Ética,
Cidadania e Participação: debates no campo da Psicologia. Vitória: Editora da
Universidade Federal do Espírito Santo, 2001. v.1, p.11-21.
GIOIA-MARTINS, Dinorah; JÚNIOR, Rocha. Psicologia da Saúde e o Novo Paradigma: novo paradigma? Revista Psicologia Teoria e Prática, São Paulo, v.
3, n. 1, p. 35 – 42, 2001. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/
Editora/RevistaPsicologia?Teoria_e_Pratica_Volume_3_-_Numero_1/v3n1_art3.
pdf>. Acesso em: 15 out. 2008
SCLIAR, Moacyr. História do Conceito de Saúde. Physis: Revista de Saúde
Coletiva, Rio de Janeiro, v. 17, n. 1, p. 29 – 41, 2007. Disponível em: <http://
www.scielo.br/pdf/physis/v17n1/v17n1a03.pdf>. Acesso em: 22 out. 2008.
RIBEIRO, Wânier; et al. Projeto do Núcleo de Políticas de Saúde da Clínica de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva. Centro Universitário Newton Paiva. Clínica de Psicologia. Belo Horizonte, 2007.
ROMANO, Belkiss Wilma. Princípios para a Prática Clínica em Hospitais.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999. 145 p.
TRAVESSO-YÉRPEZ, Martha. A Interface Psicologia Social e Saúde: perspectivas e
desafios. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 6, n. 2, p. 49 – 56, jul./dez., 2001.
Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pe/v6n2/v6n2a07.pdf>. Acesso em:
15 out. 2008.
NOTAS DE RODAPÉ
1 Aluna do curso de Psicologia do Centro universitário Newton Paiva do estágio
supervisionado pela professora Wânier Aparecida Ribeiro.
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