Joel Faria de Abreu Pai e Filho Um diálogo filosófico e matemático Uma monografia sobre ternos pitagóricos 1681²=(6!)² +1519² Revisão RONALDO SANTIAGO Ilustração Altamiro Ferreira da Costa Projeto Gráfico, Capa e Diagramação TEREZA PIRES Este livro é dedicado à minha esposa, Eliane, aos meus filhos, Leandro e Letícia, e a todos os professores de Matemática. Sumário Prefácio......................................................................................................9 Introdução...............................................................................................15 I – Par ordenado, terno ordenado, e n-upla ordenada...............19 II – O conjunto Z............................................................................27 III – Sobre r, s ∈ Z...........................................................................35 IV – Ternos pitagóricos..................................................................45 V – Como pares ordenados geram ternos pitagóricos...............55 VI – Sobre (p, q) ∈ P1 e (a, b, c) ∈ T1............................................63 VII – Sobre (a, b, c) ∈ T1................................................................69 VIII – A infinitude dos conjuntos T, T1 e T2................................77 IX – Sobre as raízes da equação a4 = b4 + c4. ...............................85 X – Sobre n-uplas pitagóricas........................................................95 Epílogo...................................................................................................101 Prefácio Matemática – divertida e curiosa, nas palavras de um divertido matemático e escritor brasileiro. Matemática – uma ciência meio esotérica, só acessível a alguns iniciados, terror da grande maioria dos alunos do ensino médio e dos calouros das universidades. Matemática – explorada como tema por muitos escritores, até mesmo por Walt Disney, que, na sua genialidade, entendeu de misturar dois conceitos, imaginando uma terra chamada “Matemagicolândia”, onde a Matemática e a magia se confundem. Nesse sentido, o consagrado cientista global Karl Sagan asseverava que, para o homem comum, não há como distinguir a tecnologia da magia. Afinal, o que é a Matemática? Não temos como fugir do conceito de que a Matemática é uma ciência, no sentido de resultado da soma sistematizada de conhecimentos históricos acumulados, passíveis de transmissão, com sua inconfundível natureza de universalidade e objetividade. Mas convenhamos que se trata de uma ciência um pouco diferente das demais, dados o seu nível peculiar de abstração e a sua característica de independência e descomprometimento com o pragmatismo, com resultados concretos, aplicáveis. Todo professor de Matemática certamente já foi inquirido alguma vez: “Professor, para que serve isso?”, “Professor, qual a utilidade daquilo?” Ora, todos sabemos que não se produz Matemática com um objetivo prático em vista, mas como um apuramento do exercício da inteligência humana na busca de critérios formais e lógicos que possam dar um respaldo seguro à busca do conhecimento, qualquer que seja a área em que se deseja aprofundar e sistematizar, com segurança, o entendimento dos profundos mistérios da natureza e da sociedade. Dentro desse enfoque, a Matemática pode se confundir com uma linguagem. Uma linguagem muito especial. Uma linguagem científica. Conheci Samir há mais ou menos treze anos, quando ele, extasiado, interrompeu uma aula de Álgebra Linear que eu ministrava numa universidade em Brasília apenas para me informar em primeira mão Pai e Filho 11 Joel Faria de Abreu 12 que, finalmente, após séculos de tentativas, alguém havia demonstrado o Último Teorema de Fermat. Como ele não conseguia, noticiando aos brados a notícia, conter o seu entusiasmo, acabou contagiando os meus alunos, que, espertamente, logo pegaram a deixa, interromperam a matéria e me exigiram a explicação da importância desse teorema. É claro que o teste agendado para a aula seguinte foi adiado. Na Matemática existem alguns fenômenos interessantes, singulares, e que provam inequivocamente como ela, mais do que qualquer outra disciplina, é capaz de desafiar, seduzir e até mesmo subjugar o espírito humano. Estamos hoje na era da informática e podemos nem compreender direito por que razão alguns matemáticos do passado, quando ainda sequer se imaginava a possibilidade de existência das máquinas de calcular de hoje, dedicaram a sua vida inteira na busca frenética do valor de pi com dez casas decimais, com vinte, depois cinqüenta, cem casas decimais... Milhares de matemáticos, ao longo dos séculos, embranqueceram os cabelos tentando encontrar uma fórmula para os números primos. O mesmo ocorreu com o Último Teorema de Fermat. Como ninguém conseguia demonstrá-lo, surgiram vários casos particulares do teorema, como para n igual a cinco, n igual a sete etc., donde se pode compreender e perdoar Samir pelo seu incontido entusiasmo, já que Andrew Wiles, um professor de Matemática, havia demonstrado o teorema para qualquer n – a vitória sobre um desafio que percorreu séculos e acabou até sacrificando vidas inteiras de matemáticos dedicados na busca da solução para o problema O professor Joel Faria de Abreu, colega de muitos e muitos anos, decidiu analisar com maior profundidade, depois de acumular uma sólida experiência no magistério, a natureza e as propriedades das n-uplas de números inteiros positivos. Quem está afeto ao dia-a-dia do magistério, da repetição interminável da mesma matéria em turmas diferentes, ou em semestres diferentes, raramente tem consciência da quantidade de pequenos detalhes que estão “escondidos” nessas n-uplas. Numa história divertida, o professor Joel vai mostrando pouco a pouco essas propriedades intrigantes até chegar, com uma facilidade fascinante, a uma demonstração simples e inteli- Qualquer estudante de Matemática certamente sabe que o estudo sério da disciplina é difícil e árduo. É como se disse num certo livro de fábulas: “não existe um caminho real (fácil, privilegiado) para o aprendizado da Matemática”. Assim, um livro que trate desse assunto não pode deixar de apresentar seus desafios intelectuais e formais, os seus rigores naturais. O livro do professor Joel, apesar da leveza do texto, não pôde fugir do formalismo exigido pela Matemática nas demonstrações, que, nós sabemos, são indispensáveis. Em Matemática, uma proposição demonstrada – não tem erro! – é uma verdade incontestável. Em algumas ocasiões são relembrados alguns interessantes paradoxos que apenas endossam a visão de que a Filosofia e a Matemática compartilham de uma fronteira muito tênue e indefinível. Desta maneira, recomendo este livro não só aos professores, mas também aos milhares de entusiastas da busca do conhecimento, pessoas que, pelo fato de buscarem o conhecimento, certamente jamais excluiriam a Matemática de sua peregrinação intelectual. Professor Waldemar Villas Bôas Filho Pai e Filho gível do Último Teorema de Fermat para n igual a quatro. Não é que essa demonstração para n igual a quatro seja, inerentemente, muito difícil, mas o autor consegue fazer isso de uma maneira muito simples e direta, qualidade que nunca encontrei em outras demonstrações do gênero. Mas o que conta mesmo, na minha opinião, não é a demonstração em si, mas a quantidade de resultados intermediários de muito valor e utilidade para os professores de Matemática, principalmente para os professores do ensino médio. 13 Introdução Dos ternos pitagóricos, (5, 4, 3) é, sem dúvida, o mais simples e o mais conhecido. E é um terno pitagórico porque, como veremos no capítulo IV, 52 = 42 + 32. Também pode-se provar que (5, 4, 3) é o único terno pitagórico que tem como coordenadas números sucessivos. Além disso, não por coincidências, 4, 5 + 4 e 5 – 4 são quadrados, com a particularidade de 5 + 4 = 32. Veremos neste livro que, assim como em (5, 4, 3), se (a, b, c) é um terno pitagórico com b par e a, b e c, dois a dois, primos entre si, então b é múltiplo de 4, a + b e a – b são primos entre si e a + b e a – b são quadrados. A particularidade a + b = c2 se verifica quando a – b = 1. Demonstração Se (a, b, c) é um terno pitagórico, então, por definição, a2 = b2 + c2 a2 – b2 = c2 (a + b). (a – b) = c2 Para a – b = 1, tem-se: ( a + b) . 1 = c2 a + b = c2 Pode-se calcular, como veremos no capítulo V, uma infinidade de ternos pitagóricos com b par e a, b e c, dois a dois, primos entre si, bem como ternos pitagóricos com coordenadas tão grandes quanto queiramos. Exemplo: (154212504617, 3141592, 154212504585), ou 1542125046172 = 31415922 + 1542125045852. Pai e Filho 15 Joel Faria de Abreu Esse exemplo foi construído de tal modo que a segunda coordenada do terno pitagórico fosse o número formado pelos sete primeiros algarismos do número π. Vejamos outro exemplo. Porém, agora, uma quádrupla pitagórica: (11811, 1414, 1610, 11615), ou 11811² = 1414² +1610² +11615² 16 Observem também que 1414 é o número formado pelos quatro primeiros algarismos de Este livro tem como personagens: Sócrates, professor aposentado de Filosofia e Matemática; Samir, filho de Sócrates e estudante de Matemática; Caboré, jovem curioso e zelador do bloco “B” da SQN 316; e (por que não?) um solitário bem-te-vi que cantava na mesma árvore todas as manhãs. Caboré é apelido, visto que criava uma caboré como animal de estimação. O livro narra histórias interessantes e divertidas. “Ser interessante é suficiente para ser útil”. O autor.