03900 Quinta-feira 12 DIÁRIO DO SENADO FEDERAL Justificação A questão do consumo de entorpecentes por crianças e adolescentes tem tirado o sono de muitos pais em nosso País. O contato com esses produtos ocorre cada vez mais precocemente e seus efeitos destrutivos são potencializados por essa exposição prematura. Segundo levantamento realizado pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (Cebrid), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), os solventes são o grupo de drogas mais consumido entre estudantes dos ensinos fundamental e médio, quando são excluídos da análise o álcool e o tabaco. Como primeiras drogas experimentadas pelos jovens, só perdem para o álcool. Esse estudo revelou que l3,8% dos estudantes pesquisados já haviam experimentado essas substâncias alguma vez na vida, sendo que 10% desses faziam uso freqüente delas. São mais consumidas, portanto, do que maconha e cocaína, por exemplo. São dados assustadores, principalmente se pensarmos que os solventes – componentes psicoativos da chamada “cola de sapateiro” –sempre tiveram o seu uso associado a meninos e meninas de rua. Com efeito, esse grupo está mais sujeito a fazer uso de solventes – cerca de metade dessas crianças já consumiu a substância –, contudo constatou-se que o problema é bem mais generalizado do que se supunha. De modo geral, a questão é negligenciada, visto que, quando se fala em drogas, as pessoas pensam imediatamente em substâncias ilícitas, como maconha e cocaína, e não valorizam os produtos químicos comercializados legalmente que podem ser utilizados de forma abusiva. Os dados do Cebrid corroboram essa afirmação. No levantamento realizado entre os estudantes, 45,3% dos usuários obtinham o solvente em sua própria casa e 38%, com amigos. Com efeito, o uso de drogas, assim como o desenvolvimento da dependência, é permeado por inúmeras variáveis. Embora a substância consumida seja um fator indispensável, as características pessoais e as condições oferecidas pelo meio também são fatores que contribuem significativamente. Quando se trata de crianças e adolescentes em situação de rua, tanto o indivíduo quanto o meio facilitam o uso de inalantes. Há que se salientar, todavia, que os solventes representam ameaça à saúde pública sempre e não somente quando utilizados de forma abusiva por drogaditos. Também causam danos à saúde dos nossos Fevereiro de 2004 trabalhadores, quando estes são expostos aos inalantes, seja na indústria de calçados, seja na construção civil ou outras áreas que impliquem contato freqüente com as colas de sapateiro. O poder entorpecente da cola de sapateiro é conferido pelos seus componentes voláteis, cuja função é diluir a resina para permitir sua aplicação. Os mais utilizados no mercado são o tolueno e o n-hexano, todos do grupo químico dos hidrocarbonetos. No entanto, o que realmente produz o efeito de promover a adesão das superfícies é a resina base. Porém, esta, em sua forma pura, teria consistência sólida e não serviria para a colagem. O solvente é utilizado para dar a consistência viscosa ao produto e facilitar sua aplicação. Depois, deve evaporar para que a resina promova a adesão desejada. E essa propriedade volátil do solvente, essencial para o uso profissional da cola, que permite que ele seja usado de forma indevida pelas pessoas. Os hidrocarbonetos evaporam a partir da cola e são aspirados pelos usuários. Uma vez que atravessem as membranas dos pulmões, entram na circulação sangüínea e atingem rapidamente o cérebro, onde causam os maiores danos. Os efeitos dos solventes vão desde uma estimulação inicial, seguindo-se uma depressão, podendo também ocasionar processos alucinatórios. Vários autores afirmam que os efeitos dos solventes se assemelham àqueles do álcool. Entre esses, o mais predominante é a depressão. Finalmente, sabe-se que a aspiração crônica dos solventes pode levar a destruição de neurônios e causar lesões irreversível no cérebro. Além disso, pessoas que usam solventes por longo período apresentam-se apáticas e têm dificuldade de concentração e déficit de memória. Os solventes, quando inalados cronicamente, podem afetar outros órgãos além do cérebro e, por exemplo, provocar lesões da medula óssea, dos rins, do fígado e dos nervos periféricos que controlam os nossos músculos. Em alguns casos, principalmente quando existe no solvente uma impureza, o benzeno, mesmo em pequenas quantidades, pode haver uma diminuição da produção de glóbulos brancos e vermelhos pelo organismo. As tentativas do Poder Público de impedir o acesso dos menores a essas substâncias não têm logrado êxito. A Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, (Estatuto da Criança e do Adolescente), proíbe, por meio de seu art. 243, o fornecimento, aos menores de idade, de produtos que possam causar dependência.