AVALIAÇÃO DO IMPACTO DE UM SERIOUS GAME SOBRE A DEMORA PARA INÍCIO DE INSULINA POR MÉDICOS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE Lorrine Froes Prado (Iniciação Científica), Karollinne Boza (Fundação Araucária), Leandro Arthur Diehl, e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Londrina/Departamento de Clínica Médica /CCS Área e subárea do conhecimento: Medicina/Clínica Médica Palavras-chave: Educação Médica. Diabetes Mellitus. Insulina. Resumo O diabetes mellitus é um grande problema de saúde pública. No Brasil, os médicos da Atenção Primária à Saúde (APS), de maioria não-especialistas, encontram dificuldades no manuseio do paciente com diabetes mellitus descontrolado, principalmente com o uso de insulina. O objetivo deste projeto é avaliar se o uso de um serious game para educação sobre o uso de insulina pode se associar a mudança da prática profissional de médicos da APS. Foi conduzido um estudo experimental não controlado com médicos da APS de 2 municípios do Paraná, comparando o tempo médio decorrido entre o surgimento de indicação para início de insulina no histórico do paciente e a primeira prescrição de insulina feita pelo médico participante, 6 meses antes e 6 meses depois do uso do serious game InsuOnLine. Foram incluídos 10 médicos de Londrina e Cambé, que iniciaram insulina para 32 pacientes no período da pesquisa. O tempo decorrido entre o surgimento da indicação de insulina e a primeira prescrição pelo médico teve uma mediana geral de 11,7 meses (interquartil 5,7 a 36,8). Antes do game, essa mediana foi de 7,6 meses (interquartil 5,7 a 36,8), enquanto depois do game, foi de 12,5 meses (interquartil 7,5 a 45,5), sem diferença significativa (p=0,49). Portanto, neste estudo (com resultados parciais) não se observou diferença na demora para início de insulina comparando-se o período antes ou depois do treinamento dos médicos usando um game, o que pode se dever à amostra reduzida ou a outras limitações. Introdução O diabetes mellitus (DM) é, atualmente, um dos maiores problemas de saúde pública em todo o mundo. Estima-se que o DM afete cerca de 12 milhões de brasileiros (International Diabetes Federation, 2013). O tratamento adequado do DM, mantendo a glicemia em níveis próximos aos normais, reduz o risco de 1 complicações (mortalidade, infarto do miocárdio, doenças microvasculares), bem como os custos associados ao manejo do DM (Gilmer et al., 1997). Diversos estudos mostram que a maioria dos pacientes diabéticos não consegue manter bom controle da doença. Uma combinação de fatores contribui para esta baixa qualidade de tratamento dado pelos clínicos gerais da Atenção Primária à Saúde aos portadores de diabetes: falta de formação específica para o manejo do DM, baixa adesão aos guidelines de tratamento, desconhecimento e insegurança para utilizar o arsenal terapêutico disponível, hesitação em intensificar o tratamento quando necessário, receio em demasia de hipoglicemia e por último, porém não menos importante, falta de tempo para participar de educação médica continuada (Zafar et al., 2010). Este projeto objetiva avaliar se o uso de um serious game para educação médica sobre o uso de insulina se associa a mudança da prática profissional de médicos que trabalham na Atenção Primária à Saúde, avaliada pelo tempo decorrido entre o surgimento de indicação de uso de insulina e o recebimento da primeira prescrição de insulina por pacientes diabéticos atendidos por esses profissionais, antes e após uma intervenção educacional (serious game) para os médicos em questão. Populações e métodos Conduziu-se um estudo experimental, não controlado, para avaliar se o uso do InsuOnLine©, um serious game desenvolvido para servir como ferramenta de educação médica sobre o uso de insulina no tratamento do diabetes mellitus no contexto da APS, se associa à redução da inércia clínica, medida pelo tempo médio decorrido entre o surgimento de uma indicação clara para o início de insulina e o recebimento da primeira prescrição de insulina por pacientes diabéticos atendidos por esses profissionais. Foram recrutados médicos não-especialistas em Endocrinologia atuantes na Atenção Primária à Saúde e envolvidos diretamente no atendimento e tratamento de pacientes portadores de diabetes mellitus, em Cambé e Londrina (PR), que aceitaram participar voluntariamente do estudo. Após inclusão, foram levantadas em prontuários as novas prescrições de insulina (ou seja, os pacientes diabéticos que receberam prescrição para uso de insulina pela primeira vez) realizadas pelos médicos participantes, no período de seis meses anteriormente ao uso do game e seis meses posteriormente ao uso do game. Os dados dos questionários foram tabulados em planilha Excel e analisados em banco de dados do Epi-Info for Windows© 3.5.3 (CDC, Atlanta, GA, USA). 2 O protocolo de pesquisa foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (parecer 1.518.429) e também pelos gestores do SUS nos municípios envolvidos. Resultados e Discussão Dos 10 médicos incluídos, 1 era de Cambé e 9 de Londrina (PR), sendo 6 do sexo masculino. Estes médicos iniciaram insulina para 32 pacientes no período da pesquisa (14 antes e 18 após o game), sendo 20 do sexo feminino, com idade média de 60±12 anos no início do uso da insulina. A idade média no diagnóstico do diabetes foi de 53±12 anos (disponível em 28 pacientes). A duração média do diabetes até o início da insulina foi de 7,5±5,7 anos (desconhecida em 4 pacientes). Quantitativamente, 2 médicos introduziram a terapia com insulina em mais pacientes antes de concluírem o game, 5 iniciaram insulina em mais pacientes após o game, e 3 iniciaram insulina em igual número de pacientes antes e depois do game. Os esquemas de medicação antidiabética usada no momento em que se iniciou insulina foram: nenhuma medicação (3%); somente metformina (38%); metformina + sulfonilureia (50%); metformina + sulfonilureia + inibidor de DPP-4 (3%), e somente sulfonilureia (6%). Os critérios para indicação do início de insulina, detectados a partir da análise do prontuário, foram classificados em: glicemia >300 ou A1c>10% (66%); falência da terapia oral (59%); contraindicação às drogas orais 4 (12%) sintomas importantes (9%); perda de peso involuntária (6%), e descompensação aguda 2 (6%) (alguns pacientes tinham mais de uma indicação). O tempo decorrido entre o surgimento da indicação de insulina e a primeira prescrição pelo médico foi de 11,7 meses (mediana), com interquartil 5,7 a 36,8 meses. Comparando-se os períodos antes e depois da intervenção educacional com o game, observou-se uma mediana de 7,6 meses (interquartil 5,7 a 36,8) antes, e 12,5 meses (interquartil 7,5 a 45,5) após o game (p= 0,49, teste de Kruskal-Wallis). Embora não tenha havido diferença significativa, observa-se tendência a maior tempo com indicação de insulina no período após o game. Uma explicação possível é que mais pacientes com clara indicação à insulina há muito tempo foram introduzidos ao tratamento, uma vez que o número de introduções aumentou após o jogo. No entanto, é possível o efeito do acaso devido à pequena amostra. A falta de diferença estatística neste estudo também pode se dever ao baixo número de médicos, uma vez que estes são resultados apenas parciais e a coleta de dados ainda está em andamento. Também houve dificuldades com a coleta de dados devido a prontuários incompletos e de difícil análise. Outras limitações também podem estar 3 relacionadas a dificuldades diversas da prática profissional na APS, uma vez que o manejo da insulina exige tempo, esforço, monitorização e possui riscos, e pode haver restrições ao acompanhamento adequado de pacientes no serviço público. Conclusões Neste estudo, o uso do game não se associou a mudança significativa da inércia clínica (tempo decorrido entre o surgimento da indicação e o efetivo início de insulina), o que pode ser ao menos em parte devido ao pequeno tamanho da amostra, o que pode mudar futuramente ao final da coleta de dados. É possível também que este game possa ser útil na melhora da conduta clínica se somado a outras intervenções, não somente na educação médica, mas também nas condições de atendimento, disponibilidade de equipe multiprofissional, insumos e fitas para monitorização. Referências INTERNATIONAL DIABETES FEDERATION. IDF Diabetes Atlas. 6ª edition. Brussels: International Diabetes Federation, 2013. GILMER, T. P. et al. The cost to health plans of poor glycemic control. Diabetes Care, v. 20, p. 1847-1853, dez. 1997. ASSUNÇÃO, M. C. F.; SANTOS, I. S.; GIGANTE, D. P. Atenção primária em diabetes no Sul do Brasil: estrutura, processo e resultado. Revista de Saúde Pública, São Paulo, v. 35, n. 1, p. 88-95, fev. 2001. ZAFAR, A. et al. Clinical inertia in management of T2DM. Primary Care Diabetes, v. 4, n.4, p. 203-207, dez. 2010. HARRIS, S.B. et al. Clinical inertia in patients with T2DM requiring insulin therapy in clinical practice. Canadian Family Physician, v.56, p. 418-424, dez. DIEHL, L.A. et al. A serious game for education of primary care physicians on insulin therapy: early results of a randomized controlled trial. Abstracts of the American Diabetes Association 75th Scientific Sessions (p. 746-P). Boston: American Diabetes Association (ADA), 2015. DIEHL, L. A. et al. InsuOnline, a serious game to teach insulin therapy to primary care physicians: design of the game and a randomized controlled trial for educational validation. JMIR Research Protocols, v.2, n.1, jan./jun., 2013. 4