-Intervenção na crise/ urgência e emergência em saúde mental. -Intervenções breves em contextos de crise. Deborah Sereno SBC 2013 crise: é uma complexa situação existencial e deve ser enfrentada com instrumentos e recursos complexos - criar condições para que a crise exprima sua demanda “global” que investe a vida e a possibilidade de “continuar a vive-la”, no âmbito de uma relação institucional. (DELL’ACQUA e MEZZINA) considerar a doença mental através da investigação do sofrimento existencial do sujeito, visto como “unidade biológica” ou membro de um sistema microssocial, ou ainda sujeito social, buscando as origens e os condicionamentos daquele sofrimento. -tentativa de aplicar metodologia unitária, não uniformizante, que permita encontrar a sua especificidade na singularidade dos problemas postos pelo sujeito (diferente do modelo médico) (DELL’ACQUA e MEZZINA) reconstrução da história, através dos vários momentos de contato e de conhecimento entre o serviço e a pessoa, nos seus locais de vida, com a rede de suas relações, com os seus problemas materiais e concretos, tende a colocar a crise no interior de uma série de nexos que são capazes de torná-la compreensível (não de explicá-la!), de dar um senso à crise e, enfim, de recuperar a relação entre as valências de saúde, os valores de vida e a própria crise. historia: entendida como elemento de reconstrução do percurso efetivo, social e institucional da pessoa e também recomposição da ruptura da sua experiência, representada pela crise em curso. (DELL’ACQUA e MEZZINA) espaço que reflete e representa tudo aquilo que uma população produz em termos de patologia, mal-estar, de conflito e de distúrbio social, e que se projeta de modo linear e constante no tempo, seguindo as historias, as experiências pessoais, a evolução daquele espaço territorial e da sua população, modificando as suas respostas em conformidade com novos contextos, Deve ser capaz de perceber, conhecer, entrar em contato e elaborar a rede de relações e de conflitos que constituem os limites da crise, que estariam escondidos, fragmentados, banalizados e desprovidos de significado, graças ao processo de simplificação baseado no modelo de centralização do hospital psiquiátrico. -como organizar o serviço de forma a permitir respostas adequadas e conseqüentes à complexidade das situações? (DELL’ACQUA e MEZZINA) “No hospício o que cura é o próprio hospício. Por sua estrutura e funcionamento, ele deve ser um operador de transformações dos indivíduos.”(Memória Loucura-Apostila) (Esquirol) - 1772-1840 "O internamento de um louco deve tender a dar nova direção às suas idéias e aos seus afetos e a impedir qualquer desordem, qualquer distúrbio do qual ele possa ser a causa, e para impedir o mal que ele possa fazer a si mesmo e aos outros, ser for deixado em liberdade. Assegurando-lhe novas impressões, livrando-se de seus hábitos e mudando seu modo de vida, chega-se aquilo que se destina o isolamento". (Esquirol, 1838, apud Pessotti, 1996, p. 135). "(...) Pinel postula o isolamento como fundamental a fim de executar regulamentos de polícia interna e observar a sucessão de sintomas para descrevê-los. (...) Dessa forma, o gesto de Pinel ao liberar os loucos das correntes, não possibilita sua inscrição em espaço de liberdade, mas, pelo contrário, funda a ciência que os classifica e acorrenta como objeto de saberes/discursos/práticas atualizados na instituição da doença mental". (Amarante, 1995, p. 26). Saúde é um direito de todos e dever do Estado: Universalidade do acesso Equidade, qualidade, responsabilidade Integralidade das ações (Abbês) Coletivo como plano de produção da vida. O Cotidiano como plano ao mesmo tempo de reprodução e de experimentação/ invenção. Indissociabilidade entre o modo como nos produzimos sujeitos e os modos de se estar na vida. (Abbês) Tecnologia do encontro: Implica mudança nos processos de trabalho: Qualificação da escuta, vínculo e acesso responsável. Um regime de afectabilidade (propiciador de alterações) construído a cada encontro e através dos encontros nos processos de produção de saúde. (Abbês) Construção de redes de conversações (autonomia e compartilhamento) onde a experimentação advinda da complexidade dos encontros possibilita que “eu me reinvente inventando-me com o outro”. Qualificação e humanização da assistência – inseparabilidade entre modos de atender e de gerir os serviços. (Abbês) Implica prestar um atendimento com resolutividade e responsabilização, orientando, quando for o caso, o paciente e a família em relação a outros serviços de saúde para continuidade da assistência estabelecendo articulações com estes serviços para garantir a eficácia desses encaminhamentos. Rompimento com a lógica da exclusão. (Abbês) Modo de operar os processos de trabalho em saúde de forma a atender a todos que procuram os serviços. Acolher : Ouvir pedido Escutar : Analisar a demanda Dar as respostas mais adequadas aos usuários e sua rede social (Abbês) Não pressupõe hora, local ou profissional específico para atendimento. Abertura à diversidade cultural, racial e étnica. Identificação de riscos e vulnerabilidades conjugando necessidades dos usuários, cardápio de ofertas do serviço e encaminhamento responsável e resolutivo. (Abbês) Implica em: Problematização do processo de trabalho em saúde com foco nas relações. Percepção do usuário como sujeito e participante ativo na produção de saúde. Mudança na relação profissional/usuário, profissional/profissional, através de parâmetros éticos, técnicos, de solidariedade e defesa da vida. (ABBÊS) O ato da escuta e a produção de vínculo como ação terapêutica. O uso ou não de saberes e afetos para melhoria da qualidade das ações de saúde e o quanto estes saberes e afetos estão a favor da vida. (ABBÊS) É diferente da entrevista psiquiátrica que visa o diagnostico; procura-se estabelecer relação gradual de conhecimento recíproco, e as vezes envolvimento de mais operadores (DELL’ACQUA e MEZZINA) compreender todos os elementos constitutivos: os agentes do encaminhamento, o percurso de chegada ao serviço, as passagens institucionais precedentes, etc. o serviço deve ser capaz de entender como sinais de sofrimento, as passagens que, de uma crise muda, sem possibilidade de escuta, conduzem ao comportamento transgressivo ou alarmante, até a ativação dos sistemas sociais de emergência deve poder organizar diferentes modalidades de contato, encurtar os tempos de latência da crise e tornar mais precoce a intervenção. (DELL’ACQUA e MEZZINA) é preferencialmente voltada a conectar, a colocar em contato o paciente com um sistema de relações e de recursos humanos e materiais (antes de esperar uma resolução do conflito no cenário privado – familiar ou microssocialtentando chegar a uma rápida normalização do sujeito). a partir da chegada ao serviço, a crise se desenvolve em um âmbito coletivo. o paciente deve poder atravessá-la conservando sua continuidade existencial e histórica. (DELL’ACQUA e MEZZINA) pratica unitária de prevenção, cura e reabilitação. - resposta à crise: não pode ser desvinculada do trabalho de prevenção (2aria): com base na pratica da “tomada de responsabilidade” do conjunto dos elementos em jogo. Assim, o serviço estende suas potencialidades de relação em toda existência sofrida do individuo e sobre a totalidade das demandas da comunidade. (DELL’ACQUA e MEZZINA) esperar o paciente no serviço e enrijecer o protocolo de intervenção: remete aos mecanismos traumáticos dos tratamento por coação, ou em ultima instancia, à intervenção da policia, às internações nos pavilhões para agudos. -demandas de controle social: a presença do serviço e a aderência imediata às situações de crise redimensionam a temida periculosidade do doente mental, permitindo ao sujeito outras modalidade de expressão e ao contexto social a compreensão – com a mediação do serviço- das suas instancias. (DELL’ACQUA e MEZZINA) pode ser assumido como estimulo à transformação, ao crescimento da situação em seu todo. Cristaliza o paciente e outros e impede a todos a possibilidade de emancipação. (DELL’ACQUA e MEZZINA) para isso vai se equipar com instrumentos e recursos capazes de favorecer o crescimento e a autonomia do paciente, além de defender e incrementar o seu poder contratual. - isto pressupõe um itinerário de transformação de uma situação cristalizada e promover diversos modos de reprodução social dos sujeitos em jogo: o usuário e seus familiares. - boa saída para a antinomia histórica da psiquiatria entre repressão e emancipação, controle e cura (DELL’ACQUA e MEZZINA) Parâmetros para diagnosticar a crise: a. grave sintomatologia aguda psiquiátrica b. grave ruptura de relação no plano familiar e/ou social c. recusa dos tratamentos psiquiátricos (remédios, internação, programas terapêuticos. Afirmação da não necessidade de tratamento, mas aceitação do contato. d. recusa obstinada do contato psiquiátrico propriamente dito e. situações de alarme no contexto familiar e/ou social. Incapacidade pessoal de enfrentá-las. - são situações que pela gravidade e alarme, (perigosas para o sujeito e para os outros) eram encaminhadas ao HP com internação forçada. (DELL’ACQUA e MEZZINA) - se a demanda não é do paciente, os operadores desenvolvem desde o inicio um papel ativo no estabelecimento do contato. - o encontro com o paciente à 1ª manifestação de crise pode se dar em tempos e com percursos diferentes. Quando possível: lugares de vida do paciente (sua casa, o bar, lugar de trabalho, etc.) e os intermediários serão as pessoas significativas do seu ambiente. O serviço se mobiliza com máxima flexibilidade para este fim, sem protocolos de intervenção préconstituidos, ou mesmo “equipes especiais” de intervenção. (DELL’ACQUA e MEZZINA) a disponibilidade de “ir ao encontro” do paciente evita impactos traumáticos: tranqüilizador para familiares, vizinho,s ambiente, além de desdramatizar os conteúdos da crise, angustiantes para o paciente e pessoas do entorno. presença do serviço na vida dos sujeitos: os mais sozinhos, menos recursos, menos capacidade cognitiva e de relação com meio externo, recusa obstinada de contato. Serviço deve multiplicar as banais estratégias de aproximação: telefonemas, mensagens debaixo da porta; envolvimento de outros sujeitos (padre, encanador, etc) ou mesmo buscar o encontro em locais diversos. - oferta de ajuda: uma referencia real em direção ao qual a pessoa possa orientar as suas ações e o seu comportamento. (DELL’ACQUA e MEZZINA) sobre a saúde mental de todo território de referencia e pressupõe papel ativo na sua promoção. -hospitalidade 24hs Responsabilização é assumir a demanda com todo alcance social conectado ao estado em sofrimento. Sem desvio burocrático em setores separados por competência. O Cidadão é apoiado e acompanhado pelo serviço na rede de instituições da organização social (tribunal, presídio, hospital, assistência social, escola, serviços para menores, serviços de casas populares, agencias de emprego, consultórios familiares, casas de repouso, aposentadorias, etc) ativadas pelo serviço de acordo com necessidade dos paciente - a necessária intersetorialidade... (DELL’ACQUA e MEZZINA) mesmo “internado” na hospitalidade: possibilidade de transito do usuario só ou acompanhado dos operadores. - o serviço assume conotação simbólica de lugar de relações e não de limitação, segregação, temporária. - o serviço pode reconhecer a necessidade de proteção de tal pessoa e impedir que saia do serviço temporariamente; novamente: a escuta deste sujeito. (limite critico e escolha concreta, nunca um a priori!) - hospitalidade no centro como parte da intervenção e nunca uma resposta a crise em si. - hospitalidade tem condições de mobilizar quantidade maior de energia humana e recursos institucionais, já que a atenção de toda organização está focada no paciente. (DELL’ACQUA e MEZZINA) A escuta organizada- usuário no CSM nõ é submetido a entrevista psiquiátrica visando o diagnostico; procura-se estabelecer relação gradual de conhecimento recíproco, envolvimento de mais operadores e as vezes de outros pacientes. - dado tempo para que se oriente no espaço e entenda a atenção dirigida a ele. - clima de disponibilidade difusa: multiplicidade de intercâmbios e interações entre o paciente e os operadores profissionais, as outras figuras da equipe de trabalho (cozinheiras faxineira, usuários cooperados admitidos nestes serviços), outros pacientes, voluntários. (DELL’ACQUA e MEZZINA) ocorrem momentos de discussão e entretenimento coletivos animados pelos operadores, onde pacientes são provocados participar e confrontar com outros pacientes, -reunião diária equipe de troca de turnos, constante momento de comunicação, informação e reflexão entre os operadores incluem a participação de pacientes - as vezes o paciente se sente a estimulado a falar sobre seu próprio problema, ele encontra escuta e reconhecimento coletivo e o seu problema chega, sem mediações interpretativas, à atenção do grupo. De maneira geral, em situações de crise, estes momentos informais se tornam o mais significativo e utilizáveis pelo paciente. (DELL’ACQUA e MEZZINA) nunca segundo modelos pré-determinados. -devem estimular confronto entre situação real e suas contradições com relação a ela; analisar a crise, reconstrução da historia da “doença”, identificar os problemas atuais. (DELL’ACQUA e MEZZINA) 1º contato de escuta e os momentos de verificação da realidade de vida compõem o quadro das necessidades: onde vive, dorme, come, com quanto dinheiro, com quem, onde trabalha? formulação de programa pratico que considere algumas capacidades do paciente e seu crescimento e alguns recursos que o serviço pode oferecer mais os atos médicos (medicalização): configurase o Programa terapêutico. (DELL’ACQUA e MEZZINA) recursos concernem a esfera habitacional, do dinheiro, ganhos, da provisão alimentar, cuidados pessoais (lavanderia, higiene pessoal), das possibilidades de trabalho, do tempo livre (artes, ginástica, costura, passeios, férias) pressupõem o “estar com o paciente”: visitar parentes, organização do cotidiano, consultas médicas, exames, sair com ele: operações que tendem a conservar ou ativar a relação do usuário com seu ambiente externo, além de promover relação mais informal e confidencial com o operador fora do centro. (DELL’ACQUA e MEZZINA) - reformulação continua da demanda: pode-se passar da linguagem desarticulada da crise à capacidade de compreender e exprimir as próprias exigências e expectativas de vida, com as quais o serviço deve se orientar e organizar. Este é o trabalho de “desinstitucionalização da doença” – o ultimo e mais difícil nível da desinstitucionalização, porque alude a psiquiatria como ocultamento dos problemas humanos. (DELL’ACQUA e MEZZINA) na internação no hospital psiquiátrico e nas unidades psiquiátricas do hospital geral: usuário vive o tempo e ritmo da instituição. o tempo pode se tornar fator tático fundamental no projeto de intervenção -tempo é preenchido com atos, presenças e prestações uteis a pessoa em crise; o tempo próprio do paciente conjuga-se com os tempos da intervenção, em formas ambíguas e conflituais. - programa diário: deve tentar preservar o cotidiano do usuário, que deve continuar a viver apesar da crise. O respeito ao tempo próprio do paciente é fator de reforço/ conservação das suas potencialidades de “sujeito” e não objeto dominado e institucionalizado. (DELL’ACQUA e MEZZINA) a rede de serviços- laboratórios de pintura, teatro, corte e costura, cerâmica, gráfica, musica, barco a vela, etc: reconstrução das relações e capacidade de estabelece-las. Para o usuário: outras possibilidades de expressão, reconhecimento coletivo, possibilidade de contenção da crise e recomposição. (DELL’ACQUA e MEZZINA) “trabalho com o sujeito” exige um “trabalho sobre o serviço” - serviço : somatória de recursos e subjetividade - a flexibilidade, ie, a capacidade de determinar em cada situação as respostas operativas adequadas é possível através do trabalho coletivo. - trabalhadores devem encontrar possibilidades de se expressar no grupo e de trabalhar com o paciente em diferentes níveis. - no processo de desinstitucionalização: criamse espaços de autonomia decisional e operativa para todas as figuras profissionais. (DELL’ACQUA e MEZZINA) Isto é condição de possibilidade para o trabalho (resultado histórico do processo de desinstitucionalização): divisão de trabalho o mais horizontal possível autogestão dos turnos permite de modo não formal, a expressão da criatividade e dos recursos de cada um, segundo a singularidade da própria cultura, da linguagem e do comportamento. (DELL’ACQUA e MEZZINA) o serviço, no entanto, é um espaço institucional e como tal reproduz continuamente aspectos regressivos da institucionalização, quer nos pacientes em sua relação com o serviço, quer nos operadores e na sua relação com o trabalho. (DELL’ACQUA e MEZZINA) exige constantes investimentos, busca de novos recursos, capacidade de resistir a queda de produtividade, aos fracassos, à desordem. -assim, sistema organizativo encontra-se em constante condição de “desequilíbrio”, frequentemente em risco de esfacelamento. - as diversas instancias e em geral contrapostas, das diversas figuras profissionais, sempre em duvida entre a defesa corporativa da sua profissão e a sua expansão, entre a satisfação das necessidades subjetivas e a resposta ampla às necessidades do serviço, são o ponto central, critico e conflitual a partir do qual se elabora a estratégia operativa. (DELL’ACQUA e MEZZINA) ABBÊS, C. O Acolhimento como Rede de Conversações. http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/ APPS_PNH.pdf BELLUZZO, L. de C. S. Doença mental, psicose, loucura: representações e práticas da equipe multiprofissional de um Hospital-Dia. São Paulo, Casa do psicólogo, 2001. DELL’ACQUA, G.; MEZZINA, R. Resposta à crise: Estratégia e intencionalidade da intervenção no serviço psiquiátrico territorial. Trad. Jaques Delgado. In: DELGADO, J.(Org.). A loucura na sala de jantar. Santos: Edição do Autor, 1991. p. 5379.