DIAGNÓSTICO MICROBIOLÓGICO/MOLECULAR E ESTUDOS DE PATOGENICIDADE DE STREPTOCOCCUS AGALACTIAE EM PEIXES. Gabriel Augustho dos Santos Ferreira1; Ulisses de Pádua Pereira2; [email protected]. 1 Bolsista de Iniciação Científica CNPq, discente do Curso de Medicina Veterinária. 2 Orientador, Docente do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva, Coordenador do Laboratório de Bacteriologia em Peixes da UEL (LABBEP), CCA-UEL. Área e sub-área do conhecimento: Medicina Veterinária Preventiva, Doenças Infecciosas de animais. Palavras-chave: aquicultura, diagnóstico microbiológico, bacteriologia. Resumo A piscicultura mundial vem apresentando elevadas taxas de expansão nas últimas décadas e por este fato veio a ser um dos mais promissores ramos da agropecuária dentro do contexto da produção de proteína de origem animal e no Brasil não foi diferente. O cultivo de tilápias se destaca por liderar o ranque das espécies mais produzidas, possuindo grande importância econômica, entretanto, falhas no manejo auxiliam na manutenção e rápida disseminação de patógenos. A estreptococose em peixes é uma doença comum em várias partes do mundo podendo infectar diversas espécies de peixes de água doce e marinhos. Esta doença apresenta mortalidade elevada, principalmente em peixes cultivados em tanques-rede, quando há manejo inadequado ou elevação da temperatura da água. O presente trabalho teve como objetivo realizar o diagnóstico microbiológico e molecular em peixes acometidos por este patógeno e comprovar a virulência do Streptococcus agalactiae por infeção experimental. Foram coletados 55 peixes que apresentavam sinais clínicos, oriundos de sete propriedades e transportados ao Laboratório de Bacteriologia em Peixes (LABBEP) para posterior processamento, isolamento, analises bacteriológicas, identificação por métodos moleculares e posteriormente a reprodução da infecção por via intraperitoneal. As cepas isoladas foram identificadas como pertencentes ao grupo B de Lancefield e confirmadas por reação de PCR com primers espécie específicos para Streptococcus agalactiae. Todas as amostras sequenciadas agruparam com amostras já isoladas por outras equipes no país, em um cluster de amostras do sorotipo Ib, o mais comum em tilápias no Brasil. Todas as amostras foram resistentes a estreptomicina no antibiograma, e foram 1 sensíveis a todos os outros antimicrobianos testados. Na infecção experimental, a taxa de mortalidade foi de 100% dos animais infectados o que comprovou a virulência do patógeno. Introdução e objetivo Nas últimas duas décadas, houve um aumento na produção e no consumo mundial de peixe (FELDHUSEN, 2000). Segundo a Secretaria de Aquicultura e Pesca, SEAP (2006), a produção vem crescendo rapidamente no mundo, contribuindo de forma cada vez mais efetiva com o suprimento mundial de pescado. Assim, observa-se um crescente interesse dos pesquisadores e criadores, no que se refere aos prejuízos causados por mortalidade e problemas na produção piscícola (SCHALCH, 2011). As bactérias apresentam grande importância na piscicultura intensiva, uma vez que podem ocasionar impacto econômico considerável devido às doenças com elevadas taxas de morbidade e mortalidade. A estreptococose em peixes é uma doença comum em várias partes do mundo podendo infectar diversas espécies de peixes de água doce e marinhos. Esta doença apresenta mortalidade elevada, principalmente em peixes cultivados em tanques-rede quando há manejo inadequado, ocasionando estresse físico e fisiológico, deterioração da qualidade da água, nutrição deficiente, elevação da temperatura da água, infestação por parasitas e excessivas estocagens (FIGUEIREDO et al., 2008). O diagnóstico das afecções microbiológicas é importante na busca da identificação de quais são as bactérias, ou outro agente patogênico, causador de lesões graves que geralmente evoluem para o óbito. O conhecimento da distribuição sazonal dos microrganismos causadores de enfermidades, assim como, da complexa relação entre fatores ambientais, hospedeiros e patógenos são importantes para realizar a profilaxia adequada, através de programas preventivos de controle destas enfermidades (SCHALCH; MORAES, 2005). O diagnóstico precoce por microbiologia e por técnicas moleculares em conjunto com o perfil de sensibilidade aos agentes antibacterianos é de fundamental importância para a eficácia do tratamento bem como para monitorar o aparecimento de linhagens mais resistentes (GASTALHO et al., 2014). Adicionalmente, análises filogenéticas também auxiliam nisso, uma vez que o aparecimento de linhagens geneticamente distintas das frequentemente isoladas na região também pode indicar diferenças na virulência e no perfil de resistência aos antibacterianos (PEREIRA et al., 2013). Realizar o diagnóstico microbiológico e molecular de Streptococcus agalactiae isolados de peixes e analisar filogeneticamente os isolados comparando com sequências de bactérias depositadas no Genbank. 2 Adicionalmente, avaliar o perfil de sensibilidade (por antibiograma) de amostras isoladas frente aos antimicrobianos mais utilizados na piscicultura e comprovar sua virulência em desafio experimental. Procedimentos metodológicos Foram coletados um total de 55 peixes (5-20 peixes) de 7 propriedades diferentes da bacia do rio Paranapanema que tiveram elevada mortalidade e com sinais clínicos variáveis (exoftalmia, apatia, hiporexia, escurecimento de pele e/ou natação errática). Os peixes foram transportados até o Laboratório de Bacteriologia em Peixes (LABBEP) do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Universidade Estadual de Londrina. Posteriormente, foi realizada a coleta assepticamente de baço, olhos, cérebro, fígado, abcessos caudais e rim cranial, e outras amostras provenientes de órgãos ou tecidos que apresentaram lesões macroscópicas e conteúdos anormais para realização das análises microbiológicas. Os swabs dos órgãos coletados foram semeados em caldo BHI e ágar nutriente enriquecido com 5% de sangue ovino desfibrinado e cultivados em estufa à 28ºC por até 72 horas. Onde houve o crescimento de colônias bacterianas puras, foram observadas características morfológicas: morfologia de colônia e células bacterianas, coloração de Gram, catalase, oxidase, crescimento em caldo BHI com 6,5% de NaCl, teste de CAMP e hemólise. Nos casos de bactérias cocos Gram positivos com testes de catalase e oxidase negativos, foi realizado o teste de esculina. Também foi utilizado o KIT Slidex Strepto, a fim de identificar a qual grupo de Lancefield pertencem os isolados, além de análises por biologia molecular (reação de PCR utilizando os primers espécie específicos para S. agalactiae, Sdi 61 e Sdi 252, e amplificação e posterior sequenciamento do gene 16S rRNA codificador da subunidade 16S ribossomal). Para análise do perfil de sensibilidade aos antibióticos seguiramse as normas do CLSI de 2012 (Clinical and Laboratory Standards Institute) considerando as especificidades dos testes para animais aquáticos reportados também pelo CLSI em 2006 (Methods for Antimicrobial Disk Susceptibility Testing of Bacteria Isolated from Aquatica Animals). As bactérias já identificadas e cultivadas em meio de cultura foram diluídas em solução salina até atingir a escala 0,5 de MacFarland e em sequência semeadas em ágar Mueller Hinton enriquecido com 5% de sangue ovino desfibrinado, com adição de discos contendo concentrações conhecidas de antibióticos (estreptomicina 10 µg, amoxacilina 10 µg, cloranfenicol 30 µg, tetraciclina 30 µg, enrofloxacina 10 µg, penicilina 10 µg e florfenicol 30 µg) no meio de cultura. Para a extração do DNA as bactérias isoladas foram cultivadas por 24 a 48 horas a 28ºC em meio de cultura líquido (caldo BHI). 3 Posteriormente, as amostras foram centrifugadas a 8.000 g por 10 minutos, descartado o sobrenadante, e realizado o método de extração conforme Pereira et al. (2013). O precipitado bacteriano foi lavado com solução 1 mL Tris/EDTA/NaCl [10 mM Tris/HCl (pH 7.0), 10 mMEDTA (pH 8.0), and 300 mM NaCl] e centrifugado novamente nas mesmas condições, realizando-se novamente o processo de centrifugação, descartando novamente o sobrenadante e se ressuspensão do pellet em 1 mL TE/lisozima [25 mM Tris/HCl (pH 8.0), 10 mM EDTA (pH 8.0), 10 mM NaCl, e 10 mg lisozima/mL]. As amostras foram incubadas a 37ºC por 60 minutos, em seguida adicionaramse 30 µl de 30% N-lauroyl-sarcosine sódico (Sarcosyl) a cada amostra, vortexado e incubado por 20 minutos a 65ºC, seguiu-se por incubação a 4ºC por cinco minutos. O DNA foi purificado utilizando fenol/clorofórmio/álcool isoamílico (25:24:1) e precipitado com etanol e posteriormente utilizado para PCR. A identificação das espécies das bactérias foi realizada a partir das análises in silico utilizando o software BLAST do NCBI ou por análises de alinhamento e filogenia realizadas pelos programas Bioedit e Mega5. Para verificar a virulência do S. agalactiae foi realizada uma infecção experimental deste patógeno via intraperitoneal. Adquiriu-se juvenis de produtores de alevinos do estado do Paraná e antes do início do experimento foram acondicionados em aquários de 60 L (em uma densidade de 15 peixes por aquário) com renovação contínua de água (0,5 L/h), 12h de luz diária e alimentados três vezes ao dia com ração de 32%PB por 10 dias para ambientação. Os animais foram divididos em grupos de 10 peixes cada, delineado da seguinte forma: grupo controle negativo, grupo infectado com baixa dosagem bacteriana (1 x 104 UFC/peixe) e grupo infectado com elevada dosagem bacteriana (1 x 108 UFC/peixe). Após infecção experimental, os animais foram observados 4 vezes ao dia para avaliação de sinais clínicos e para processamento microbiológico logo após a ocorrência de óbitos. Resultados e discussão Do total de amostras coletadas, foram isoladas 39 cepas de rim, cérebro e olho. As colônias encontradas foram puntiformes, com bordos regulares, não hemolíticas, catalase negativas, oxidase negativas, apresentaram ausência de crescimento em caldo BHI suplementado com 6,5% de NaCl, esculina negativos e foram negativas no teste de CAMP. No teste de sensibilidade, todas as cepas foram resistentes à estreptomicina, entretanto, todas foram sensíveis aos outros antimicrobianos testados. Os isolados foram identificados como pertencentes ao grupo B de Lancefild pelo Kit Slidex Strepto e, posteriormente confirmado pela reação de PCR utilizando os primers espécie específicos para Streptococcus agalactiae. Adicionalmente, a relação filogenética foi analisada pelas sequencias obtidas no sequenciamento do gene 4 16S rRNA sugerindo que as amostras pertencem ao sorotipo Ib, o qual é o mais frequente no país (PEREIRA, et al., 2013). Após a infecção experimental foi observado no primeiro dia pósinfecção anorexia, escurecimento de pele e natação errática no grupo que recebeu maior dosagem bacteriana. Já no grupo que recebeu menor dosagem bacteriana, no terceiro dia pós-infecção hiporexia e escurecimento de pele. Mortalidade começou a ocorrer no segundo e quinto dia pós-infecção nos grupos de maior dosagem do patógeno e menor dosagem, respectivamente. No fim do experimento in vivo, todos os animais evoluíram ao óbito e a presença de S. agalactiae foi confirmada por cultura bacteriana. Adicionalmente, no grupo controle negativo não houve mortalidade e todos os animais foram negativos na cultura bacteriana. Conclusão Os métodos de diagnósticos microbiológicos e moleculares quando utilizados conjuntamente proporcionam maior rapidez, praticidade e confiabilidade no diagnóstico de S. agalactiae em peixes. Foi demonstrado que este patógeno está presente nas pisciculturas da bacia do rio Paranapanema e com relação filogenética das bactérias isoladas similar aos resultados obtidos em outras regiões do país e do mundo. Adicionalmente, foi comprovada a virulência deste patógeno, com mortalidade de 100% dos animais. Por fim, o monitoramento do perfil de sensibilidade aos agentes antibacterianos deve ser realizado de forma periódica, uma vez que a resistência a estreptomicina está amplamente disseminada nas linhagens isoladas na região. Referências FELDHUSEN, F. The role of seafood in bacterial foodborne diseases. Microbes and Infections, v.2, p. 1651–1660, 2000. FIGUEIREDO, H. C. P. & LEAL, C. A. G. Tecnologias aplicadas em sanidade de peixes. Revista Brasileira de Zootecnia, v.37, p.8-14, 2008. GASTALHO, S.; SILVA, G. J.; RAMOS, F. Uso de antibióticos em aquacultura e resistência bacteriana: Impacto em saúde pública. Acta Farmacêutica Portuguesa, v. 3, p. 29–45, 2014. PEREIRA, U. P.; MIAN, G. F.; OLIVEIRA, I C M; et al. Genotyping of Streptococcus agalactiae strains isolated from fish, human and cattle and their virulence potential in Nile tilapia. Veterinary Microbiology, v. 140, n. 1– 2, p. 186-192, 2010. SCHALCH, S. H. C. & MORAES, F. R. Distribuição sazonal de parasitos branquiais em diferentes espécies de peixes em pesque-pague 5 do município de Guariba - SP, Brasil. Revista Brasileira de Parasitologia Veterinária, v.14, n.4, p. 141-146, 2005. SCHALCH, S. H. C. 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