UNIVERSIDADE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS – UNIPAC FACULDADE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DE BARBACENA-FADI CURSO DE DIREITO DANIELE APARECIDA COSTA A PENA DE CASTRAÇÃO QUÍMICA EM FACE DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA VEDAÇÃO DE PENAS CRUÉIS BARBACENA 2011 UNIVERSIDADE PRESIDENTE ANTÔNIO CARLOS – UNIPAC FACULDADE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS DE BARBACENA/FADI CURSO DE DIREITO DANIELE APARECIDA COSTA A PENA DE CASTRAÇÃO QUÍMICA EM FACE DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA VEDAÇÃO DE PENAS CRUÉIS Monografia apresentada ao curso de Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Me. Marco Antônio Xavier BARBACENA 2011 Daniele Aparecida Costa A PENA DE CASTRAÇÃO QUÍMICA EM FACE DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO DAS PENAS CRUÉIS Monografia apresentada à Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. BANCA EXAMINADORA Prof. Me. Marco Antônio Xavier de Souza Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC Prof(a). Me. Maria José Gorini Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC Prof(a). Me. Delma Gomes Messias Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC Aprovada em ____/____/________. Dedico este trabalho a todas as crianças que sofrem abusos sexuais e ao ilustre promotor de justiça Dr. Carlos José e Silva Fortes, grande colaborador da campanha “Todos contra a pedofilia”. AGRADECIMENTO Agradeço à Deus pela oportunidade dos estudos, a meus professores da graduação pelos anos de dedicação na arte de ensinar, ao meu marido pela paciência e compreensão, aos meus pais e familiares pela força sempre presente. Agradeço, ainda, ao Prof. Orientador Marco Antônio Xavier pela compreensão e tolerância, à Rosy Oliveira pela dedicação e aos demais membros da banca examinadora pela presença. Embora ninguém possa voltar atrás para fazer um novo começo, qualquer um pode recomeçar e fazer um novo fim. Chico Xavier RESUMO A pedofilia é um problema que afeta o Brasil e mundo de maneira alarmante há muito tempo. Segundo pesquisas realizadas ao longo deste trabalho, ficou demonstrado que a situação é grave, e só piora com o passar dos anos. O criminoso que comete tal delito é classificado como doente, existindo um transtorno em sua personalidade. O senador Gerson Camata, apresentou no Senado Federal um projeto de lei a fim de acrescentar ao Código Penal Brasileiro, o art. 216-B, que comina a pena de castração química aos agressores sexuais que são considerados pedófilos. O presente trabalho veio analisar esta pena, em seus métodos e finalidades, confrontando-a com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e vedação das penas cruéis, a fim de determinar a constitucionalidade do projeto de lei n.552/07 do Senado Federal. Restou demonstrado se tratar de sanção inconstitucional, que não deve ser abraçada pelo ordenamento jurídico, pois fere princípios basilares da nossa Constituição, além de não ser eficaz no que tange às finalidades de retribuição e prevenção da pena. Palavras-chave: Pedofilia, castração química, Constituição Federal da República Ferativa do Brasil, direitos humanos, penas cruéis. ABSTRACT Pedophilia is a problem that affects the world of Brazil and alarmingly long. According to research conducted throughout this study, it was shown that the situation is serious, and only gets worse over the years. The criminal who commits such an offense is classified as a patient, there is a disorder in his personality. Senator Camata Gerson, introduced in the Senate a bill to add to the Brazilian Penal Code, art. 216-B, which is worth Comina chemical castration for sex offenders who are considered pedophiles. This work has come to analyze this sentence, in its methods and purposes, comparing it with the constitutional principles of human dignity and sealing of the cruel, in order to determine the constitutionality of the bill the Senate n.552/07 . Left shown it is unconstitutional punishment, which should not be embraced by the legal system, since it wounds the fundamental principles of our Constitution, and not be effective with respect to the purposes of retribution and prevention of the sentence. Keywords: Pedophilia, chemical castration, federal constitution of Brazil, human rights, cruel. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................09 2 PEDOFILIA ............................................................................................................11 2.1 Pedofilia no Brasil .............................................................................................11 3 A CASTRAÇÃO QUÍMICA EM HUMANOS...........................................................15 3.1 Projeto de Lei n. 552/07 ....................................................................................15 3.2 Contexto histórico da castração como penalidade........................................16 3.3 O método da castração química.......................................................................18 3.4 Castração química e sua aplicabilidade no mundo ......................................20 4 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ..........................................23 4.1 Direitos fundamentais ......................................................................................23 4.2 Direitos humanos ..............................................................................................26 4.3 A dignidade da pessoa humana ......................................................................27 5 PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DAS PENAS CRUÉIS ...............................................31 6 CONCLUSÃO ........................................................................................................33 REFERÊNCIAS ........................................................................................................36 APÊNDICE ...............................................................................................................39 Entrevista ................................................................................................................40 9 1 INTRODUÇÃO A pena de castração química em humanos trata-se de procedimento sobre o qual recaem inúmeras controvérsias entre os juristas do mundo inteiro acerca de sua legalidade e constitucionalidade. Tal medida já vem sendo utilizada em alguns países, dentre os quais podemos citar os estados da Califórnia e Flórida, nos Estados Unidos, Alemanha, Itália, França, Espanha e Inglaterra. No Brasil o procedimento entrou em discussão com a apresentação do Projeto de Lei n.552/07 do Senado Federal, que foi proposto pelo Senador Gerson Camata. O projeto visa acrescentar o art. 216-B ao Código Penal Brasileiro, para cominar a pena de castração química nas hipóteses em que o autor de crimes sexuais for considerado pedófilo. Conforme dito, o projeto de lei do Senado Federal causou grande discussão, uma vez que, para alguns, tal sanção seria inconstitucional por ferir princípios como o da dignidade da pessoa humana e vedação das penas cruéis, garantidos pela Carta Magna Brasileira, além de tratados firmados com entes internacionais, como o Pacto de São José da Costa Rica. Há os que defendem a aprovação da medida, alegando que tal método punitivo deveria levar em consideração a segurança da população, que é um bem jurídico tão importante quanto o da inviolabilidade física do pedófilo. Diante deste choque entre bens jurídicos de suma importância, este trabalho busca analisar o método consistente na castração química realizada em humanos, tal como a medicação utilizada e os efeitos físicos e psicológicos que pode acarretar, em face dos princípios constitucionais que poderiam por ele serem violados, sua eficácia em nosso ordenamento jurídico e na sociedade brasileira, se o método, como sanção, seria eficaz para a proteção da sociedade, de forma a se chegar a um convencimento sobre a constitucionalidade da pena, demonstrando se a sanção em questão será benéfica ou não para a sociedade e para os condenados pela prática de crimes sexuais contra menores e adolescentes. 10 O estudo referente ao tema foi realizado através de levantamento bibliográfico, utilizando-se livros, artigos e jurisprudência em formato impresso e online, assim como pesquisa de campo, que consiste em entrevista pessoal com médico urologista, que seria o profissional responsável por este tipo de intervenção médica, caso ela fosse praticada em nosso território. Gráficos e estatísticas estão expostos de forma a esclarecer a amplitude do problema da pedofilia, não só no Estado brasileiro, como em todo o globo. Estudo comparado com o direito de países onde a sanção foi aceita também ajudará a formar uma visão com relação à eficácia da medida, principalmente no que diz respeito à reincidência, o que é de suma importância para a análise do equilíbrio entre o bem jurídico da dignidade da pessoa do condenado e o bem da sociedade como um todo. Por fim, o presente trabalho tem por objetivo analisar o Projeto de Lei em questão, buscando analisar a possibilidade ou não de sua aplicação no cenário jurídico brasileiro diante dos princípios amplamente garantidos por nossa Constituição Federal. 11 1 PEDOFILIA Segundo Croce (1995), pedofilia é o desvio sexual, caracterizado pela atração por crianças, com os quais os portadores dão vazão ao erotismo pela prática de obscenidades ou de atos libidinosos. De acordo com o entendimento de Oliveira (2011), a pedofilia encontra-se inserida no gênero das parafilias, que são classificadas como distorções da preferência sexual, estando inserida no CID10 (Código Internacional de Doenças), na classe F65.4, dentro de F60, elencada dentro dos transtornos específicos de personalidade. Ainda segundo a autora, o CID10, da Organização Mundial de Saúde, define a pedofilia como a preferência sexual por crianças, quer se trate de meninos, meninas ou de crianças de um ou de outro sexo, geralmente pré-púberes. Diante do exposto, pode-se afirmar que a pedofilia trata-se de um distúrbio de personalidade e, embora seja uma prática desprezível, que causa enorme repulsa entre pessoas consideradas normais psicologicamente, é uma prática que deve ser repelida com muito cuidado, uma vez que nem sempre os meios punitivos convencionais podem ser suficientes para que se evite uma reincidência por parte do criminoso doente. 1.1 Pedofilia no Brasil Em entrevista à Revista Veja, DINIZ (2009)1, informou o alarmante aumento no número de casos de violência sexual contra crianças nos cinco anos anteriores a data da publicação. A reportagem, traz como amostragem o aumento relacionado à vítimas de classe média que subiu zero para 22% nos registros médicos oficiais da cidade de São Paulo. Os fatores que contribuíram para o aumento deste índice, segundo a autora, seriam a disseminação de informações sobre o tema, como as campanhas que têm ganhado bastante espaço na mídia, assim como a aplicação de algumas normas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, principalmente o art. 245 que obriga professores, profissionais da saúde e responsáveis por creches a notificar aos conselhos tutelares suspeitas de maus tratos que observarem. Este artigo impõe sanção ao profissional que deixar de relatar a suspeita: 1 Disponível em< http://veja.abril.com.br/180309/p_112.shtml> 12 Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, préescola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. A autora nos traz, ainda, gráficos com a estimativa do aumento de abusos ocorridos no território nacional, elaborados através de um estudo conduzido pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, cujo responsável é o psicólogo Antônio Serafim: Fortes (2011)2 nos traz em seu artigo dados do Hospital Perola Byngton, de São Paulo, o maior centro de atendimento às vítimas de abuso sexual da América Latina, que apresentam estatísticas estarrecedoras, que confirmam o aumento do número de casos de abusos em nosso país. Estes dados são resultados de um estudo realizado pelo Centro de Referência da Saúde da Mulher, no ano de 2009: 2 Disponível em http://todoscontraapedofilia.ning.com/profiles/blog/show?id=4788078%3ABlogPost%3A18&commentI d=4788078%3AComment%3A9576 13 14 Mais da metade do número de criminosos condenados por crimes sexuais reincidem no mesmo crime antes de completarem um ano em liberdade. Em dois anos, esse percentual sobe para 77,9%. A taxa de reincidência varia entre 18% e 45%. Quanto mais violento o crime, maior a probabilidade de o criminoso repeti-lo. (SERAFIM, 2009) Diante desta estatística, podemos observar a real relevância no trato com os criminosos sexuais. As notícias relativas a tais crimes só fazem aumentar com o passar do tempo, motivo pelo qual a sociedade busca uma forma de reprimi-los. O Projeto de Lei 552/07 foi uma das ferramentas utilizadas pela sociedade, por meio de seus representantes, como forma de combate aos crimes ligados à pedofilia, não somente para punir os criminosos, mas tratá-los, de forma a proteger nossas crianças, adolescentes e a própria sociedade em geral. 15 2 A CASTRAÇÃO QUÍMICA EM HUMANOS 2.1 O projeto de Lei 552/2007 O Projeto de Lei 552/2007, de autoria do Senador Gerson Camata, visa acrescentar o artigo 216-B ao Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o Código Penal Brasileiro, para cominar a pena de castração química nas hipóteses em que o autor de crimes sexuais for considerado pedófilo. (Brasil, 2007). O senador, autor do projeto, analisa a problemática envolvendo a pena e, de maneira ponderada, conclui que os direitos não são absolutos e exemplifica, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Melo, os casos onde sujeitos são “obrigados a se submeterem a vacinas e testes de verificação de doenças quando em jogo a saúde pública e a segurança da população”. Reforça, ainda, que a terapia química não seria uma pena cruel, mas daria de volta ao condenado a possibilidade de reinserção social, uma vez que, superada a sua patologia, pode voltar às suas atividades sem colocar em risco a sociedade. O projeto foi analisado pela Comissão de Constituição e Justiça em 20 de abril e 07 de julho de 2009, onde foi aprovado o requerimento n. 33, de 2010 CDH, de autoria do Senador José Nery, para realizar audiência pública para instrução da matéria. (Pereira, 2010) Em relatório da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, datado de 13 de abril de 2010, tendo como relator o Senador Marcelo Crivella, o Projeto de Lei foi aprovado, com a seguinte emenda: Art. 226-A. Em relação aos crimes tipificados nos arts. 217-A e 218, observar-se-á o seguinte: I – o condenado não-reincidente poderá submeter-se, voluntariamente, sem prejuízo da pena aplicada, a tratamento químico hormonal de contenção da libido, durante o período de livramento condicional, que não poderá ser inferior ao prazo indicado para o tratamento; 15 II – o condenado reincidente em qualquer dos crimes referidos no caput deste artigo será obrigado a submeter-se a tratamento químico hormonal, sem prejuízo da pena aplicada, durante o período de livramento condicional, que não poderá ser inferior ao prazo indicado para o tratamento; III – a Comissão Técnica de Classificação especificará, na elaboração do programa individualizador da pena, tratamento de efeitos análogos aos do hormonal, durante o período de privação de liberdade, cujos resultados constituirão condição para a realização ou não do tratamento de que tratam os incisos I e II deste artigo; 16 IV – o condenado referido no inciso I deste artigo que se submeter voluntariamente ao tratamento químico hormonal, após os resultados insatisfatórios obtidos com o tratamento de que trata o inciso III, terá a sua pena reduzida em um terço; V – o condenado referido no inciso II deste artigo que já tiver se submetido, em cumprimento anterior de pena, ao tratamento de que trata o inciso III não se submeterá a ele novamente; VI – o tratamento químico hormonal de contenção da libido antecederá o livramento condicional em prazo necessário à produção de seus efeitos e continuará até a Comissão Técnica de Classificação demonstrar ao Ministério Público e ao juiz de execução que o tratamento não é mais necessário.’” No mesmo relatório da Comissão que foi citado, o Senador fala sobre a penalidade, explicando porque não se trata de pena desumana e degradante e explica que o bem de um indivíduo não deve ser colocado acima do bem da sociedade. A aprovação do projeto tem por finalidade a proteção social, assim como a proteção do próprio indivíduo, que passaria a viver como um cidadão normal. Em janeiro do presente ano, o projeto foi arquivado ao final da legislatura, nos termos do art. 332 do regimento Interno do Senado Federal. 2.2 Contexto histórico da castração como penalidade A imposição de castigos ao homem como conseqüência de seus atos advém da antigüidade. De acordo com Boldeck (2010), a castração química remonta do período da Lei do Talião e era uma técnica que consistia no esmagamento, que caracterizava-se por submeter o corpo do condenado a pressões que acabavam por romper ossos do esqueleto ou triturar órgãos essenciais do corpo humano. Segundo Marques (2010), a técnica da castração química, era utilizada para castigos contra agressores sexuais e consistia em colocar os testículos do condenado em local rígido para serem esmagados com um golpe certeiro, efetuado por um grande pau roliço, fabricada com madeira de lei. Além de ser utilizada como pena, a castração era utilizada também por motivos religiosos e como forma de imposição de humilhação aos inimigos vencidos em guerra. Já durante o século XX, foi utilizada para esterilizar criminosos, com o objetivo de purificação de raças. No Brasil, mesmo em período pós-dependência, a técnica da castração era amplamente utilizada como forma de castigo aos criminosos sexuais. A esse respeito, explica Marques (2010, p.1): 17 O homem que praticasse determinados atos sexuais considerados imorais ou criminosos poderia ser condenado à castração, então conhecida por capação que podia ser concretizada por várias maneiras, contanto que com o castigo o agressor não tivesse mais possibilidade de voltar a delinqüir devido a perda total do seu apetite sexual. O autor, ainda, nos traz uma sentença proferida em 15 de outubro de 1883, de forma a exemplificar a forma como era utilizada a castração em nosso Estado: SENTENÇA DO JUIZ MUNICIPAL EM EXERCÍCIO, AO TERMO DE PORTO DA FOLHA – 1883. SÚMULA: Comete pecado mortal o indivíduo que confessa em público suas patifarias e seus boxes e faz gogas de suas víctimas desejando a mulher do próximo, para com ella fazer suas chumbregâncias. O adjunto Promotor Público representou contra o cabra Manoel Duda, porque no dia 11 do mês de Senhora Sant´Anna, quando a mulher de Xico Bento ia para a fonte, já perto dela, o supracitado cabra que estava de tocaia em moita de matto, sahiu dela de sopetão e fez proposta a dita mulher, por quem roía brocha, para coisa que não se pode traser a lume e como ella, recusasse, o dito cabra atrofou-se a ella, deitou-se no chão deixando asencomendas della de fora e ao Deus dará, e não conseguio matrimônio porque ella gritou e veio em amparo della Nocreyo Correia e Clemente Barbosa, que prenderam o cujo flagrante e pediu a condenação delle como incurso nas penas de tentativa de matrimônio proibido e a pulso de sucesso porque dita mulher taja pêijada e com o sucedido deu luz de menino macho que nasceu morto. As testemunhas, duas são vista porque chegaram no flagrante e bisparam a pervesidade do cabra Manoel Duda e as demais testemunhas de avaluemos. Dizem as leis que duas testemunhas que assistem a qualquer naufrágio do sucesso faz prova, e o juiz não precisa de testemunhas de avaluemos e assim: Considero que o cabra Manoel Duda agrediu a mulher de Xico Bento, por quem roía brocha, para coxambrar com ella coisas que só o marido della competia coxambrar porque eram casados pelo regime da Santa Madre Igreja Cathólica Romana. Considero que o cabra Manoel Duda deitou a paciente no chão e quando ia começar as suas coxambranças viu todas as encomendas della que só o marido tinha o direito de ver. Considero que a paciente estava pêijada e em consequência do sucedido, deu a luz de um menino macho que nasceu morto. Considero que a morte do menino trouxe prejuízo a herança que podia ter quando o pae delle ou mãe falecesse. Considero que o cabra Manoel Duda é um suplicado deboxado, que nunca soube respeitar as famílias de suas vizinhas, tanto que quis também fazer coxambranças com a Quitéria e a Clarinha, que são moças donzellas e não conseguio porque ellas repugnaram e deram aviso a polícia. Considero que o cabra Manoel Duda está preso em pecado mortal porque nos Mandamentos da Igreja é proibido desejar do próximo que elle desejou. Considero que sua Majestade Imperial e o mundo inteiro, precisa ficar livre do cabra Manoel Duda, para secula, seculorum amem, arreiem dos deboxes praticados e as sem vergonhesas por elle praticados e apara as fêmeas e machos não sejam mais por elle incomodados. Considero que o Cabra Manoel Duda é um sujeito sem vergonha que não nega suas coxambranças e ainda faz isnoga das incomendas de sua víctima e por isso deve ser botado em regime por esse juízo. 18 Posto que: Condeno o cabra Manoel Duda pelo malifício que fez a mulher de Xico Bento e por tentativa de mais malifícios iguais, a ser capado, capadura que deverá ser feita a macete. A execução da pena deverá ser feita na cadeia desta villa. Nomeio carrasco o Carcereiro. Feita a capação, depois de trinta dias o Carcereiro solte o cujo cabra para que vá em paz. O nosso Prior aconselha: Homine debochado debochatus mulherorum inovadabus est sentetia qibus capare est macete macetorim carrascus sine facto nortre negare pote. Cumpra-se a apregue-se editaes nos lugares públicos. Apelo exofficio desta sentença para juiz de Direito deste Comarca. Porto da Folha, 15 de outubro de 1833. Assinado: Manuel Fernandes dos Santos, Juiz Municipal suplente em exercício. Atualmente, tais métodos não podem ser utilizados em nosso país, em razão de nossas Leis internas e Tratados internacionais por nós ratificados, que não permitem a imposição de penas cruéis em nosso Estado. A grande questão, que está sendo abordada neste trabalho é se, a castração, em sua modalidade química, consiste em pena cruel, desumana ou degradante, de forma a ferir a dignidade da pessoa humana. Para um melhor entendimento desta questão, passamos ao estudo do método consistente na chamada castração química. 2.2 O método da castração química Para melhor compreensão da constitucionalidade da Lei que implementaria a pena de castração química, é necessário entender do que se trata tal procedimento, quais são os efeitos que acarretam ao organismo do apenado e se tais efeitos são de caráter transitório ou permanente. Em breve entrevista com médico urologista atuante na cidade de Barbacena/MG (apêndice), ficou claro como é realizado o procedimento da castração química e quais efeitos possuem sobre o organismo humano. Para o profissional, a castração química consiste no uso de determinados medicamentos que irão causar uma diminuição importante nos níveis testosterona no organismo do paciente. A principal indicação do uso deste método atualmente no Brasil, não esta ligado diretamente ao direito, mas sim ao tratamento do câncer de próstata. Ainda segundo o médico, as principais medicações utilizadas neste procedimento são os análogos GHRH (goserelina, triptorelina e leuprolida), embora no Brasil a mais utilizada para esse fim seja a goserelina. Sua aplicação é intramuscular e pode ser mensal ou trimestral. 19 O profissional continua explicando sobre os principais efeitos colaterais observados em pacientes submetidos ao tratamento, quais sejam, a libido deprimida, potência deprimida, ginecomastia, ondas de calor (fogachos) osteoporose e aumento de risco de doenças cardiovasculares. Além disso, pode causar: irritabilidade, perda de força muscular, dificuldade de concentração e todas as manifestações possíveis da deficiência de testosterona no corpo. Tais efeitos tendem a melhorar ou diminuir com a suspensão do medicamento, porém, seu uso prolongado pode causar danos permanentes por atrofia dos testículos. Para Aguiar (2007, p.1): A castração pode ser física ou química. A primeira consiste na simples retirada dos órgãos reprodutores( no homem, o pênis e os testículos). Tem a característica marcante de ser irreversível, ou seja, o castrado fica permanentemente incapacitado. Já a castração química consiste na aplicação de hormônios femininos (o mais usado é o acetato de medroxiprogesterona) que diminuem drasticamente o nível de testosterona. Nesse caso, os efeitos só se mantém enquanto durar o tratamento. Pode-se concluir que o procedimento da castração é invasivo, traz efeitos e pode comprometer a saúde do condenado. No entanto, deve-se pensar no bem geral, na sociedade como um todo que sofre com os abusadores. São bens protegidos pelo direito que devem ser levados em consideração de maneira equilibrada para que seja feita a verdadeira justiça ao se aplicar a penalidade. Tendo em vista tais pesquisas e declarações de especialistas, pode-se observar que os efeitos, em geral, são reversíveis, mas pode ocorrer que se tornem irreversíveis devido a determinadas condições, como o uso prolongado da medicação utilizada no tratamento. Desta forma, faz-se necessária a observação criteriosa da penalidade no momento de sua aprovação como parte do nosso ordenamento jurídico. Cabe lembrar que a pena de castração química não teria caráter obrigatório, sendo que, o condenado teria a opção de se submeter ao tratamento a fim de conseguir benefícios penais. O condenado teria a opção de cumprir a pena nos termos da lei atual ou de submeter-se ao tratamento durante todo o período em que ele não estivesse encarcerado. Obviamente esse tratamento semente poderia ser feito após laudo médico que comprovasse sua necessidade e com permanente apoio psicológico. (MAGNO, 2007, p.2) O argumento mais favorável à aprovação do projeto seria o que, sendo a pedofilia uma doença, o simples encarceramento não seria suficiente para banir da sociedade este mal. Com a terapia a ser utilizada concomitantemente ao tratamento químico, o apenado 20 poderia se ressocializar e a sociedade estaria protegida. Tal argumento é louvável e muito interessante na teoria, mas não há garantia da eficiente fiscalização do tratamento, uma vez que as políticas públicas do nosso Estado, no que se refere tanto à saúde quanto ao sistema penitenciário são precárias. 3.1 A castração química e sua aplicabilidade no mundo De acordo com Heide (2007), o mundo tem assistido atônito ao crescente número de casos de agressões sexuais ocorridas ao longo dos anos, mas o crime contra crianças passou a ter um espaço mais relevante nas políticas mundiais. Segundo o autor, tal preocupação e conseqüente combate a esse tipo de prática por parte das autoridades públicas, tem seu fundamento na crescente utilização da internet para a disseminação desta prática: Como dito, a internet também é responsável pelo tema estar na mídia, pois tem se verificado um sem número de ocorrências envolvendo pedófilos, seja uma simples troca de imagens, comércio de filmes com atos sexuais envolvendo crianças. O contato e aliciamento de crianças através das salas de bate-papo, blogs, etc.; até mesmo o seqüestro e a escravização sexual engendrados com o emprego desse mesmo. (Heide, 2007, p.1) As redes sociais também têm interferido nos números relacionados à pedofilia no mundo: Nos primeiros seis meses de 2008, foram feitas 114.961 denúncias anônimas de casos de pedofilia no site de relacionamento Orkut. Os casos envolvem 22.761 endereços diferentes, sendo 2.551 comunidades da página e 20.210 perfis de usuários. A maioria deles -15.138- já foi removida pelo próprio Google e 4.389 estão sob investigação. Sustenta ainda que os dados da Interpol, de que a pornografia infantil virtual movimenta cerca de US$ 5 bilhões anualmente. O Brasil, em 2004, já ocupava o quarto lugar no ranking mundial de sites com pornografia infantil. Este número pode dobrar se não forem tomadas medidas imediatas que inibam este crime horrendo, pois é somente uma estimativa, com base na internet, sem considerar clubes e entidades que reúnem pedófilos no mundo inteiro. (Boldeke, 2009,p.1) Diante deste quadro, pode-se perceber que as autoridades têm buscado, com razão, meios para combater esta prática, cada vez mais constante. Um dos meios a que têm recorrido, é a aplicação da castração química nestes criminosos, obrigatória ou facultativamente. 21 O método da castração química originou-se nos Estados Unidos, sendo a Califórnia o primeiro estado a utilizá-la, seguindo-se por Geórgia, Montana, Oregon e Wisconsin. Há estados como Flórida, Iowa e Louisiana que, além de aplicarem o método químico, também fazem uso da modalidade cirúrgica voluntária, onde há remoção dos testículos. (Salomão, 2011) Segundo Pitanga (2008), a Suécia, Noruega, Alemanha, Dinamarca e Polônia também se encontram no rol dos países adotantes da prática. Em todos os casos, a aplicação do método deve ser realizada com o consentimento do paciente. Pesquisas indicam que a reincidência de crimes sexuais contra crianças e adolescentes caem de 75% para 2% após a aplicação do hormônio feminino. Esse número tem justificado em alguns países a aplicação da castração química. (Magno, 2007). A Polônia é um dos países que recentemente entraram para o rol dos que recepcionaram a castração química em sua legislação. Em defesa da nova Lei o Ministro da Justiça afirma: “Estamos na linha da frente daqueles que na Europa não estão dispostos a tolerar a pedofília e este tipo de crimes contra as nossas crianças(...). (Euronews, 2009). A proposta de aplicaçao da sanção se deu após o caso do homem de 45 anos que, por um período de 6 anos sequestrou e violentou a própria filha. (Euronews, 2009). Como podemos notar, o método é aceito em diversos países, e tem demonstrado bons resultados no que diz respeito à diminuição dos crimes sexuais. Ocorre que, cada país possui sua própria legislação, sua própria carta constitucional que pode ou não permitir o uso do método como forma de punição ao criminoso. O caso brasileiro é complexo, uma vez que temos uma constituição-garantia (Moraes, 2009), repleta de direitos e garantias que devem ser observadas para a aprovação de leis. Existem, ainda, tratados internacionais que podem interferir na adoção da medida. Podemos citar a Convencão contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, que foi ratificado no Brasil por meio do decreto n.40 de 1991. (Cardoso, 2009) O art. 16 da citada Convenção aduz: Cada Estado-parte se comprometerá a proibir, em qualquer território sob a sua jurisdição, outros atos que constituam tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes que não constituam tortura tal como definida no artigo 1, quando tais atos forem cometidos por funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua 22 instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência. Aplicar-se-ão, em particular, as obrigações mencionadas nos artigos 10, 11, 12 e 13, com a substituição das referências a outras formas de tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. O Tratado da Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecido como Pacto de São José da Costa Rica, também é um importante instrumento a ser observado, uma vez que trata diretamente acerca dos direitos humanos. Foi assinado pelo Brasil em 1992, que se comprometeu a basear seus ideais de justiça social e liberdade nos direitos humanos. (Cardoso, 2009) Sendo assim, há muito que se analisar antes de optar pela aprovação do projeto de Lei, objeto deste trabalho. Há princípios constitucionais envolvidos, que não podem ser violados, sob pena de ferir a legislação interna e desrespeitar acordos internacionais firmados. A esse respeito nos pronunciaremos com maior ênfase no próximo tópico, ao tratarmos do princípio da dignidade da pessoa humana. 23 4 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 4.1 Direitos fundamentais O ilustre doutrinador Paulo (2006), diz que os primeiros direitos fundamentais surgiram como forma de limitar os abusos de poder por parte do Estado e suas autoridades. As normas que vieram a consagrar tais direitos eram de cunho negativo, uma vez que impunha um dever de não-fazer por parte do Estado em face da liberdade do indivíduo. Somente a partir da consagração dos direitos fundamentais de segunda geração que surgiu para o Estado um dever de agir em favor do bem-estar dos seus cidadãos. Para o referido autor, os direitos fundamentais, distinguem-se dos direitos humanos, apreciados por este trabalho no sentido de que, os direitos humanos seriam aqueles reconhecidos e positivados na ordem interna de cada Estado, variando segundo sua ideologia, sua modalidade e seus valores. Por outro lado, os direitos humanos são aqueles reconhecidos em documentos vinculados a entes internacionais, independente de vinculação entre o indivíduo com qualquer ordem constitucional, sendo assim, seriam direitos ligados unicamente ao indivíduo como ser humano, independentemente do Estado a que pertenceria como cidadão. Canotilho (1994, apud PAULO, 2006, p. 103) também faz esta distinção: As expressões ‘direito do homem’ e ‘direitos fundamentais’ são frequentemente utilizadas como sinônimas. Segundo a sua origem e significado, poderíamos distingui-las da seguinte maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos (dimensão jusnaturalista-universalista); direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espaço-temporalmente.os direitos do homem arrancariam da própria natureza humana e daí o seu caráter inviolável, intemporal e universal; os direitos fundamentais seriam os direitos objectivamente vigentes numa ordem jurídica concreta. Os direitos fundamentais de primeira geração, ligados à vida e à liberdade do indivíduo devem ser analisados, uma vez que são as defesas do indivíduo frente ao poder do Estado. Tais direitos limitam-se às restrições com relação ao agir do Estado. (Paulo, 2006) Tal restrição encontra-se em foco na problemática da castração química, uma vez que para a aplicação da sanção, o Estado interviria na individualidade da pessoa. 24 O artigo 5º da Constituição federal de 1988 estabelece que estejam protegidos pelos direitos fundamentais os brasileiros e os estrangeiros residentes no país, arrolandoos em cinco grupos diferentes: direitos individuais, de nacionalidade, sociais, políticos e direitos à existência, organização e participação em partidos políticos. (PAULO, 2006). MORAES (2009, p.32) nos fala sobre a relatividade dos direitos e garantias individuais e coletivos: Os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no artigo 5º da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração do desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito (...) portanto, não são ilimitados, uma vez que encontram seus limites nos demais direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas.) O ilustre doutrinador continua explicando que, quando há conflito entre dois ou mais direitos fundamentais, deve ser utilizado o princípio da concordância prática, coordenando os bens jurídicos em conflito, evitando o sacrifício total de uns com relação a outros, devendo buscar sempre a finalidade principal da norma constitucional. (Moraes, 2009). O referido autor cita, ainda, o art. 29 da Declaração de Direitos Humanos das Nações Unidas, que trata dos deveres do cidadão para com a comunidade, sujeitando-se, para isso, às limitações estabelecidas pelo Estado para o bem da sociedade como um todo: Art. 29- Toda pessoa tem deveres para com a comunidade, posto que, somente nela pode-se desenvolver livre e plenamente sua personalidade. No exercício de seus direitos e no desfrute de suas liberdades todas as pessoas estarão sujeitas às limitações estabelecidas pela lei com a única finalidade de assegurar o respeito dos direitos e liberdades dos demais, e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. Estes direitos e liberdades não podem, em nenhum caso, serem exercidos em oposição com os propósitos e princípios das Nações Unidas. Nada na presente Declaração poderá ser interpretado no sentido de conferir direito algum ao Estado, a um grupo, ou a uma pessoa, para empreender e desenvolver atividades ou realizar atos tendentes à supressão de qualquer dos direitos e liberdades proclamados nessa Declaração. Como pode-se observar, ninguém pode se utilizar da proteção dos direitos individuais para contrariar a legislação interna caso o interesse da sociedade democrática seja preponderante. 25 Os direitos fundamentais são amplamente protegidos pela Constituição Federal de 1988, sendo vedada ao poder constituinte derivado a introdução de emendas que tendam a aboli-los. Desta forma dispõe o art. 60, parágrafo 4º, IV da CF/88: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV os direitos e garantias individuais”. Desta forma dispões Costa (2010, p.02): Para além dessas considerações, cumpre ainda ressaltar que a vedação contida no art. 5º, XLVII, da CF/88 conta com status de cláusula pétrea (art. 60, §4º, IV, da CF), razão pela qual não poderá ser objeto de emenda que tenda a abolir as garantias que contém. E, frise-se, qualquer alteração que mitigue as garantias previstas no dispositivo em questão é, desde início, tendente a aboli-las, devido a seu conteúdo valorativo de forte limitação ao poder de punir, o qual tem por fim último preservar a dignidade da pessoa humana, que é o marco zero, a pedra angular, absoluto ponto de orientação e fechamento da construção do ordenamento jurídico brasileiro (art. 1º, III, da CF). A proibição da tortura e a liberdade do indivíduo, que será privado de sua vida sexual, são algumas garantias fundamentais que poderiam estar sendo violadas com a aprovação da castração química como sanção. Em ambos os casos percebemos afronta à dignidade humana, descrita no art. 5º, inciso III da carta magna brasileira: Art. 5º Todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; O inciso XLIX do art. 5º da CF/88, assim como o art. 38 do Código Penal e o art. 40 da Lei de Execuções Penais asseguram aos presos o direito a integridade física e moral, impondo-se às autoridades o respeito a esse direito. Este é um ponto de extrema importância e foco de enormes discussões acerca do PL 552/07, sob o enfoque da legalidade de sua apreciação pelo Estado, pois se a pena de castração química for considerada desumana, degradante, cruel ou ameaçadora da integridade do inconstitucional. apenado, ferindo sua dignidade humana, será tida como 26 4.2 Direitos Humanos O século XX foi um século marcado por inúmeras contradições acerca dos direitos humanos. De um lado tínhamos os revolucionários franceses de 1789, que universalizaram a idéia do ser humano como um sujeito de direitos anteriores e superiores a qualquer organização estatal. De outro, porém, se encontravam os governos totalitários, de inspiração leiga ou totalitária que vieram como meio de supressão dos direitos humanos. No período pós-guerra, vislumbrou-se o surgimento do Estado do bem-estar social, onde parecia concretizar-se, definitivamente, o ideal de uma igualdade nas condições de vida de todos os humanos. Por outro lado, o fim do mesmo século nos mostra o quão precário se encontra o princípio da solidariedade social, base dos princípios dos chamados direitos do homem. (Comparato,1997) Para Bobbio (1997), a ligação entre os direitos do homem ao direito natural não é aceitável e é difícil conseguir uma definição para eles. Segundo o autor, a própria expressão “direitos do homem” leva a uma compreensão equivocada, pois leva a um homem “essencial e eterno”, asseverando que tais direitos não derivam da natureza, mas sim da civilização humana, sendo suscetíveis de transformação e ampliação. No entanto, o art. 1º da Declaração Universal dos Direitos do Homem aduz: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.” Deste modo, é nítida a correlação entre o próprio homem com os referidos direitos, embora eles tenham ganhado importância no cenário internacional com as arbitrariedades ocorridas na 2ª Guerra Mundial. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de dezembro de 1948, levou o humanismo político da liberdade a seu ápice no século XX: Trata-se de um documento de convergência e ao mesmo passo de uma síntese. Convergência de anseios e esperanças, porquanto tem sido, desde sua promulgação, uma espécie de carta de alforria para os povos que a subscreveram, após a guerra de extermínio dos anos 30 e 40, sem dúvida o mais grave duelo da liberdade coma servidão em todos os tempos(...) Erra todo aquele que vislumbra no valor das Declaraçoes de Direitos Humanos uma noção abstrata, metafísica, puramente ideal, produto da ilusão ou do otimismo ideológico. A verdade é que, sem esse valor nao se explicaria a essência das Constituições e dos tratados, que objetivamente compõe as duas faces do direito público- a interna e a externa.”(BONAVIDES,2010, p.574) 27 Destarte, essa declaração, como marco da luta pelo respeito aos direitos do homem, deve ser respeitada e observada tanto para a aplicação de normas de direito interno, quanto para relações com Estados estrangeiros. 4.3 A dignidade da pessoa humana A Constituiçao Federal do Brasil, de 1988, em seu art. 1º, inciso III, traz a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado brasileiro: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III- a dignidade da pessoa humana.” Segundo Lenza (2009), tal característica de nossa constituição, além de dar o devido reconhecimento do valor do homem no que tange à sua liberdade, está no fato de que o Estado também se baseia neste princípio, devendo respeitá-lo, de forma a não ferir sua Constituição. Para ele, o princípio abrange os direitos de natureza econômica, social e cultural além dos direitos individuais. Como o que nos interessa neste momento são os últimos, que estão reforçados no art. 5º incisos III (ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante), X (garante a inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas), e no inciso XLI , que prevê a punição, por Lei, de qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais. Tais garantias, portanto, são abrangidas pelo princípio da dignidade da pessoa humana e devem ser observadas para que ele seja respeitado. Se o texto da Constituição traz a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado, conclui-se que o Estado existe em função das pessoas, e não as pessoas em função do Estado, uma vez que, o que caracteriza o ser humano e o faz dotado de dignidade especial, é que ele nunca pode ser considerado meio para os outros, mas sim, fim em si mesmo. Sendo assim, toda ação deve ser analisada sob pena de ser considerada inconstitucional e violadora da dignidade da pessoa humana. (SANTOS, 1998). Para o autor, a pessoa é, nesta perspectiva, o “valor supremo da democracia, que a dimensiona e a humaniza”. Deste modo, o Estado deve tê-la como um ponto principal 28 a ser observado e levado em consideração ao tomar qualquer atitude que possa afetálo. Por se tratar de um núcleo da Carta Magna brasileira, do princípio da dignidade da pessoa humana surgem os demais princípios constitucionais que servem para nortear a legislação interna e sua aplicação. Moraes (2009, p.37) explica que a dignidade da pessoa humana visa garantir unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerentes à personalidade humana. O autor explica, ainda, o principio da dignidade da pessoa humana sob dois aspectos: O principio fundamental consagrado pela Constituição Federal da dignidade da pessoa humana apresenta-se em uma dupla concepção. Primeiramente, prevê um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Esse dever configura-se pela exigência do individuo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição federal exige que lhe respeitem a própria. A Concepção dessa noção de dever fundamental resume-se a três princípios do direito romano: honestere (vive honestamente), alterum nonlaedere ( não prejudique ninguém) e suum cuique tribuere (dê a cada um o que lhe é devido) O autor continua explicando sobre tão importante princípio: A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. Neste sentido também explica Carvalho (2003), que a dignidade da pessoa humana deve ser que deve ser tratado e considerado com um fim em si mesmo, e não para a obtenção de algum resultado. A dignidade da pessoa humana seria decorrente de sua racionalidade, sendo a pessoa capaz de guiar-se com autonomia, obedecendo suas próprias leis, tendo limitado o seu livre-arbítrio ao tomar suas decisões. Como observamos, o principio da dignidade da pessoa humana está intrínseco no indivíduo, apesar de ter sido criado a partir da civilização. Qualquer tipo de 29 violência que possa ferir este mandamento da nossa constituição, em regra, deve ser rechaçada. No entanto, conforme já observado anteriormente, há dois lados a serem levados em conta: o bem social e o bem do apenado, analisado individualmente. De acordo com o que foi demonstrado acerca deste princípio, a sanção a ser cominada, caso seja aceita a castração química em nosso Estado, objetivaria, justamente, dar dignidade ao condenado, que poderia retornar a uma vida social, o que seria excelente para ele bem como para as crianças e adolescentes, que ao invés de se tornarem vítimas, estariam protegidas, pelo menos deste mal dentre tantos outros que poderiam assolá-las. Por outro lado, deve-se perguntar se esta pena ajudaria o condenado a viver em condições de autonomia. Talvez no que diz respeito ao convívio sim, mas há outras questões a serem analisadas, pois a pena pode acarretar esterilidade. Este indivíduo, não poderia constituir uma família, por exemplo, quando estivesse curado desta doença. A prisão, por outro lado, acompanhada de regular tratamento psiquiátrico também teria o objetivo de retornar o indivíduo ao círculo social, como uma pessoa que já pagou pelos seus delitos e busca uma nova vida, sem ter nenhuma reação física que possa deixá-lo diferente dos demais. Pereira (2009, p.1) explica: Apesar de cerceadora da liberdade, a prisão permite o retorno do apenado à vida em sociedade de maneira digna e normal. Tal não ocorre no caso de uma castração química, em que os efeitos, apesar de se diminuírem com o tempo (pois o tratamento ocorre apenas durante a prisão), continuarão a afetar a vida sexual daquele que tomou os medicamentos, suprimindo seu direito de constituir família (art. 226 da CRFB/88), e de ter uma vida normal em sociedade. Observando tal princípio sob a ótica do professor Alexandre de Moraes, que o observa através dos três princípios do direito romano: viver honestamente, não prejudicar ninguém e dar a cada um o que lhe é devido, a castração química como pena seria mais eficaz do que o encarceramento. Por outro lado, temos a liberdade do individuo, que também é um pilar da dignidade da pessoa humana e caracterizase como direito fundamental de primeira geração (Moraes, 2009). Neste caso, como visto, o criminoso estaria impedido de ter uma vida sexual, teria suprimida sua liberdade sexual, mesmo que fosse para manter relação com uma pessoa adulta e com seu consentimento, sem envolver crianças e 30 adolescentes, uma vez que o procedimento interfere na sua capacidade sexual. Seria necessário partirmos para o relativismo dos direitos fundamentais, que deve dosar cada bem a ser protegido e agir de acordo com o principio da relatividade, devendo-se evitar o sacrifício total de alguns bens em relação a outros. (Moraes, 2009) A compatibilidade ou não da pena de castração química está intimamente ligada ao principio da dignidade da pessoa humana. Frazão (2010, p.1) explica que “para a delimitação do conteúdo fundamental da dignidade da pessoa humana, entende-se que tal princípio acarreta, primordialmente, a igualdade de direitos entre todos os homens, a garantia de independencia e autonomia do ser humano, além da proteçao de seus direitos fundamentais e da garantia de não-submissao a situações degradantes” (grifo nosso) Este ponto toca a polêmica, objeto deste estudo, uma vez que o princípio se estende à não-submissão a situações degradantes. Seria a técnica um procedimento degradante para o condenado? Se observado no sentido fisiológico, certamente sim, uma vez que, como visto, o tratamento traz reações adversas ao organismo. Neste sentido, a castração química certamente viria a ferir um dos princípios constitucionais de nosso Estado, qual seja, o da dignidade da pessoa humana. Mas o bem da sociedade, deve ser ser preterido a fim de dar ao apenado um direito absoluto? Percebe-se que não, pois um indivíduo pode ter seu direito individual relativizado para o bem da sociedade como um todo. No Projeto de Lei n. 552 de 2007, o Senador Marcelo Crivella, em seu Relatório da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, datado de 13 de abril de 2010, cita Celso Antônio Bandeira de Melo, sob a ótica do princípio da proporcionalidade, a partir de onde deve-se analisar os bens jurídicos que se encontram em choque: (...)já é pacificado em nossa doutrina jurídica e na jurisprudência que os direitos individuais não são absolutos. Ou seja, não formam fronteiras que impedem de forma absoluta a imposição da vontade do Estado. Portanto, deve-se observar o princípio da convivência das liberdades. Celso Ribeiro de Bastos cita o caso dos cidadãos obrigados a se submeterem a vacinações ou a testes de verificação da existência de doença quando em jogo a saúde pública ou a segurança da população. (BASTOS, Celso Ribeiro.MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. V.2. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 37-38). Sendo assim, mais uma vez resta demonstrada a relativização dos direitos fundamentais individuais quando em choque com o interesse social. 31 5 PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DAS PENAS CRUÉIS O art. 5º, inciso XLVII, alínea “e”, é claro ao dispor que não haverá penas cruéis no Estado brasileiro. Este dispositivo encontrado na nossa Carta Magna é o que caracteriza o princípio da vedação das penas cruéis. Ferreira (2005) define cruel como algo “pungente, doloroso e desumano”, sendo assim será considerada pena cruel, a que carrega em si tais características. A imposição da proibição das penas cruéis, como visto, expressa na Constituição Federal de 1988, legitimou-se lentamente através da evolução histórica de nosso país. Veio como forma a evitar os abusos bárbaros lançados contra o ser humano numa época em que não havia limite no poder punitivo estatal. (Costa, 2010) Presentes nos antigos ordenamentos arcaicos, desde o Código de Hamurabi, a Lei do Talião amparava o princípio do “olho por olho, dente por dente”, onde o indivíduo deveria pagar pelo crime na qualidade do crime que cometeu. Assim, se furtasse, teria sua mão decepada, se cometesse adutério, era castrado, e assim por diante. Ferrajoli (2006), trata do assunto: [...] Se as penas devem ter a mesma qualidade que os delitos, seguese que tendencialmente devem ser de tantos tipos quantos sejam os delitos. Ainda que isto resulte impossível e de fato jamais tenha ocorrido, é certo que a pretensão de equiparar a qualidade das penas à qualidade do delito tem sido o principal fator de legitimação da multiplicidade, variedade e atipicidade das penas na época prémoderna: desde as penas infamantes, como a argola e a marca, até as diversas penas corporais e capitais como as mutilações, os açoites e os suplícios. Todas estas penas consistem em aflições, ao mesmo tempo não taxativamente predetermináveis pela lei, desiguais segundo a sensibilidade de quem padece e da ferocidade dos que as impõem e não graduáveis de acordo com a gravidade do delito: nenhuma dor ou suplício físico é igual ao outro, e tampouco cabe preestabelecer, medir e, menos ainda, delimitar a aflição de uma pessoa A castração química entraria neste rol de penas qualitativas, onde a sanção estaria diretamente relacionada ao delito cometido. Com o passar dos tempos e com a evolução da sociedade, assim como a criação do Estado moderno, baseado na Constituição e a partir das Declarações de Direitos advindas dos séculos XVII e XVIII, ficaram consolidados uma série de 32 direitos, dentre eles o direito à integridade física, proibindo-se a submissão de qualquer indivíduo à tortura ou a tratamento cruel e degradante, dando um enorme salto para longe das barbáries que ocorriam nos sistemas penais de outros tempos, que envolviam e, em certos casos, ainda envolvem açoites, pena de morte e mutilações. A pena, em si, dentro de seu caráter retributivo e preventivo – Teoria mista ou unificadora das penas- prevista no art. 59 do Código Penal Brasileiro/40, deve ser aplicada sem originar intenso sofrimento físico e moral ou humilhação ao apenado, caso contrário, a pena será considerada cruel e conseqüentemente inconstitucional. 33 6 CONCLUSÃO A pena de castração química, que será acrescentada ao Código Penal Brasileiro em caso de aprovação do projeto de Lei n. 552/07, que tramita no Senado Federal, trata-se de procedimento invasivo, onde ao apenado serão ministradas altas doses de hormônios femininos com certa regularidade, a fim de que diminuam suas fantasias sexuais e conseqüentemente a prática dos crimes relacionados à sexualidade. A castração química, a princípio, pode trazer bons resultados no que diz respeito à reincidência e a diminuição da prática deste delito mas, para o apenado, traz conseqüências adversas como libido deprimida, perda de potencia, ginecomastia, osteoporose, aumento da incidência de doenças cardiovasculares, dificuldades de concentração e, se usado por um longo período, pode acarretar a atrofia dos testículos, que leva à esterilização do indivíduo. Assim, embora na maioria dos casos o tratamento seja reversível, em alguns casos pode levar a danos permanentes. Por outro lado, existe a clamor da sociedade para a punição desses criminosos e pela sua própria segurança, uma vez que nenhuma família gostaria de estar próxima de uma pessoa que pudesse fazer mal às suas crianças. É compreensível a repugnância que este delito causa, mas há que se atentar ao fato de que, conforme foi demonstrado ao longo deste trabalho, a pedofilia é uma doença, relacionada no Código Internacional de Doenças, estando relacionada como transtorno específico da personalidade, sendo certo que a técnica não curaria o sujeito. O que poderia ocorrer é a contenção da libido por um período em que esteja submetido ao tratamento, que logo teria que acabar, uma vez que não são toleradas penas de caráter perpétuo em nosso ordenamento jurídico, retornando, mais cedo ou mais tarde, a cometer os mesmos delitos ou até mesmo piores, pois o nível de testosterona ao fim do tratamento pode retornar em níveis muito superiores aos iniciais, aumentando, desta forma as fantasias e o numero de crimes. Desta forma, mesmo sob a ótica da sociedade, deixando de lado o bem-estar do indivíduo, a pena em si não seria satisfatória em longo prazo. Existe, ainda, a questão da fiscalização para a eficácia do tratamento, pelo menos pelo período correspondente à pena. Nosso Estado não tem, atualmente, condições de manter esta fiscalização constante sobre o acusado, uma vez que ele 34 poderia se comprometer a comparecer periodicamente em local adequado para receber a medicação, e não cumprir sua palavra, utilizando-se deste período de liberdade para agredir sexualmente outras crianças e adolescentes. Neste caso, esta pena seria uma espécie de válvula de escape para os criminosos, fugindo completamente de sua finalidade, que seria combater este crime odioso. Destarte, conclui-se que, no que tange aos objetivos da sanção, ela será ineficaz e até mesmo prejudicial à sociedade. Outra grande discussão acerca da referida pena é sua constitucionalidade no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que nossa Carta Magna veda penas cruéis, desumanas ou degradantes e aquelas que firam a dignidade da pessoa humana. A pena, devido aos efeitos colaterais que pode acarretar, trata-se de pena cruel e contrária à dignidade humana, uma vez que interfere no organismo do individuo podendo, inclusive, levá-lo à esterilidade, impedindo-o de formar uma família algum dia, quando estivesse supostamente tratado, o que o impediria de ter uma vida social normal após pagar pelos seus crimes, além de interferir na saúde do paciente, que sofrerá com várias reações em seu organismo. A dignidade da pessoa humana é princípio basilar da ordem jurídicoconstitucional do nosso Estado e jamais poderá ser descartada ao se impor sanções em nosso território. Isto seria uma afronta ao Estado Democrático de Direito, pois permitiria a imposição de penas cruéis e absurdas como as que vimos ao longo do nosso desenvolvimento histórico, como no período ditatorial. O Projeto de Lei n. 552/07 não deve ser aprovado por ferir princípios basilares da Constituição Federal, além de não alcançar sua finalidade de tratar o criminosodoente, mas somente minimizar os efeitos desta doença por um período prédeterminado, podendo, inclusive, potencializar seus efeitos após o tratamento químico. Além de invadir o organismo de um ser humano, causando traumas e seqüelas irreversíveis, caracterizando-se uma pena cruel, não vai dar à sociedade a resposta esperada, pois o criminoso continuará doente. O mais recomendado nestes casos, segundo especialistas em doenças mentais e transtornos de personalidade, seria um tratamento psiquiátrico e psicológico de longo prazo, onde o indivíduo poderia se curar verdadeiramente, retornando ao convívio social de forma digna, sem o estigma de ser apontado como um monstro que faz atrocidades contra inocentes, embora por determinado tempo e por conseqüência da sua doença, assim o seja realmente. 35 A melhor atitude a ser tomada seria a manutenção do encarceramento dos pedófilos, de forma a proteger as possíveis vítimas e, concomitantemente, aplicar tratamento psiquiátrico como parte da pena a fim de que o apenado se cure da doença e possa voltar ao seio da sociedade, resguardando assim os princípios constitucionais alcançados ao longo da história com muitas lutas e derramamento de sangue sem deixar que a sociedade pague pela moléstia de um criminoso-doente. 36 REFERÊNCIAS AGUIAR, Alexandre Magno Fernandes Moreira. 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Membro titular da Sociedade Brasileira de Urologia, atuante na cidade de Barbacena-MG: 1) Em que consiste o procedimento da castração química? 2) Quais substâncias/medicamentos são utilizados para a realização da castração química? 3) Quais reações a medicação pode desencadear no paciente? 4) Tais reações são transitórias ou definitivas? 5) O procedimento da castração química causa seqüelas? 6) A castração química é irreversível?