139 International Journal of Cardiovascular Sciences. 2016;29(2):139-148 ARTIGO DE REVISÃO Cardiomiopatia Cirrótica Cirrhotic Cardiomyopathy Jessica Bicca, Luiza Porto Jarske, Thamires Oliveira Silva, Ronaldo Gismondi, Luís Otávio Mocarzel, Pedro Gemal Lanzieri Universidade Federal Fluminense – Faculdade de Medicina – Curso de Graduação em Medicina – Niterói, RJ - Brasil Resumo A cardiomiopatia cirrótica (CMC) é uma disfunção cardíaca crônica que acomete pacientes cirróticos sem doença cardíaca prévia. Trata-se de uma doença inicialmente assintomática que se manifesta em situações de maior demanda metabólica, devido a menor capacidade cardíaca em aumentar seu inotropismo. O diagnóstico é pautado em alterações eletrocardiográficas e ecocardiográficas. Ainda não há tratamento específico para a CMC, sendo instituídas medicações sintomáticas semelhantes ao tratamento da insuficiência cardíaca. Esta revisão tem por objetivo descrever os aspectos fisiopatológicos, clínicos e diagnósticos da CMC, evidenciando as características clínicas, laboratoriais e eletro e ecocardiográficas no rastreio da disfunção cardíaca nos pacientes cirróticos. Palavras-chave: Cardiomiopatias; Cirrose hepática; Insuficiência cardíaca; Insuficiência hepática Abstract (Full texts in English - www.onlineijcs.org) Cirrhotic cardiomyopathy (CCM) is a chronic cardiac dysfunction that affects cirrhotic patients without history of heart disease. It is an initially asymptomatic disease that appears in situations of increased metabolic demand due to lower cardiac capacity to increase inotropism. Diagnosis is based on disorders revealed by electrocardiography and echocardiography. There is no specific treatment for CCM. Similar symptomatic medications are established to treat heart failure. This review aims to describe the pathophysiological, clinical and diagnostic aspects of CCM, showing the clinical, laboratory, electrocardiographic and echocardiographic characteristics in assessing cardiac dysfunction in cirrhotic patients. Keywords: Cardiomyopathies; Liver cirrhosis; Heart failure; Hepatic insufficiency Introdução A cirrose é uma doença crônica que acomete o fígado, caracterizada pela modificação da estrutura do parênquima e distorção da arquitetura vascular hepática em resposta à lesão crônica ao tecido.1,2 A alteração da estrutura é causada por fibrose sustentada do tecido e formação de nódulos de regeneração. A cirrose evolui de duas maneiras: inicialmente o paciente se encontra assintomático, fase denominada compensada; com a progressão da doença, cujo período de evolução se modifica de acordo com o paciente, há a descompensação da cirrose, caracterizada por sintomatologia sistêmica.3 Os principais órgãos acometidos pela doença hepática crônica são: coração, pulmão, rins, adrenais, cérebro e sistema imunológico, sendo o mais importante mecanismo fisiopatológico a alteração do equilíbrio hemodinâmico sistêmico.2 Entre as principais etiologias associadas à cirrose hepática estão os vírus da hepatite B e C. A etiologia alcoólica também é muito comum e sua relevância em comparação com as etiologias virais como causa de cirrose hepática varia de acordo com o país estudado.4 Outras etiologias Correspondência: Jessica Bicca Rua Marquês do Paraná, 303 – Centro – 24033-900 – Niterói, RJ – Brasil E-mail: [email protected] DOI: 10.5935/2359-4802.20160022 Artigo recebido em 28/01/2016, aceito em 21/02/2016, revisado em 19/05/2016. 140 Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica ABREVIATURAS E ACRÔNIMOS •AE – átrio esquerdo • BNP – peptídeo natriurético do tipo B Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão associadas à cirrose hepática são: doença de Wilson, esteatohepatite não alcoólica, hepatites autoimunes e cirrose criptogênica.5 Os homens são mais acometidos por doenças do aparelho digestivo que as •DC – débito cardíaco mulheres (razão homens/ •ECG – eletrocardiograma mulheres: 1,6), e a cirrose •FE – fração de ejeção hepática é a doença prevalente.6 No Brasil, os dados •HUAP – Hospital Universitário Antônio epidemiológicos são escassos Pedro devido à ineficiência na •IECA – inibidor da enzima notificação. No banco de conversora de angiotensina dados do DATASUS 7 , em •ON – óxido nítrico 2002, a taxa de mortalidade •RM – ressonância específica por cirrose hepática magnética foi 7,79 para cada 100 mil •SRAA – sistema reninahabitantes, sendo São Paulo angiotensina-aldosterona (10,31:100 mil hab.) e Rio de •TIPS – shunt portosJaneiro (8,80:100 mil hab.) dois sistêmico intra-hepático dos estados com maior taxa de transjugular mortalidade; estados como •VE – ventrículo esquerdo Pará (3,52 mortes específicas por cirrose hepática em 100 mil hab.) e Tocantins (3,64 em 100 mil hab.) estão entre os de menor taxa de mortalidade específica para cirrose hepática.7 Esses dados geram questionamento no que se refere à subnotificação de casos, tendo em vista que, em relação à hepatite B crônica, a região norte foi a que apresentou maior prevalência, de 630:100 mil hab., enquanto a região sudeste apresentou a menor prevalência, de 291:100 mil habitantes. 8 O mesmo problema é observado em relação à hepatite C crônica, que também é mais prevalente na região norte (1.421:100 mil hab.).8 •CMC – cardiomiopatia cirrótica A progressão da fibrose característica da cirrose hepática culmina em hipertensão portal e shunt portossistêmico, principais causas da alteração do equilíbrio hemodinâmico. A perda da função hepática prejudica o metabolismo de substâncias vasoativas, como peptídeo natriurético atrial, adrenalina, noradrenalina, renina, angiotensina II, substância P, ADH e aldosterona. Concomitante, há aumento significativo da produção de óxido nítrico (ON), um vasodilatador potente, e uma redução da resposta vasoconstritora devido à contrarregulação dos receptores beta-adrenérgicos, alteração na afinidade desses receptores e na cascata de sinalização, favorecendo a vasodilatação arterial.3 Há maior produção de ON pelas células endoteliais decorrente da hipertensão portal, a fim de promover aporte adequado do fluxo sanguíneo e consequente vasodilatação esplâncnica. O aumento do ON decorre também do processo inflamatório crônico causado pela cirrose, bem como de bacteremias transitórias que cursam com o aumento de citocinas e endotoxina.3,5 A associação dessas alterações causa diminuição da resistência vascular sistêmica e vasodilatação esplâncnica, fatores importantes para o acometimento sistêmico causado pela cirrose. A vasodilatação sistêmica ocasiona redistribuição da circulação e hipovolemia central que, por sua vez, acarretam a ativação de mecanismos compensatórios sistêmicos, como o sistema renina-angiotensinaaldosterona (SRAA), além do aumento da liberação de vasopressina e da atividade do sistema nervoso simpático. Assim, esses fatores se agrupam para ocasionar estado hiperdinâmico e de hiporreatividade vascular que, associados à disfunção endotelial sistêmica e disfunção autonômica, culmina em danos cardiovasculares.3 A disfunção cardíaca relacionada à cirrose é denominada cardiomiopatia cirrótica (CMC). Antigamente, acreditavase que as alterações cardíacas aconteciam apenas na cirrose alcoólica, por toxicidade direta do álcool. Atualmente sabe-se que a disfunção cardíaca está presente na cirrose independente da sua etiologia.3 Esta revisão tem por objetivo descrever os aspectos fisiopatológicos, clínicos e de diagnóstico da CMC, evidenciando as características clínicas, laboratoriais e eletro e ecocardiográficas no rastreio da disfunção cardíaca nos pacientes cirróticos. Cardiomiopatia cirrótica A CMC se caracteriza por disfunção cardíaca crônica no paciente portador de cirrose hepática, na ausência de doença cardíaca prévia, com redução da resposta contrátil cardíaca ao estresse, seja ele fisiológico ou farmacológico, porém com débito cardíaco (DC) normal no repouso. Os aspectos relacionados à disfunção cardíaca incluem: disfunção sistólica e diastólica e alterações eletrofisiológicas e no cronotropismo.9–11 Fisiopatologia Diversos são os mecanismos envolvidos na patogênese da cardiomiopatia cirrótica, destacando-se o aumento do débito cardíaco relacionado ao estado hiperdinâmico da circulação 9 .No paciente com cirrose hepática, independente da etiologia, há um aumento na Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão produção e da atividade de vasodilatores, como ON, endocanabinoides e monóxido de carbono, e uma diminuição da metabolização de outros vasodilatadores devido à insuficiência hepática e ao shunt portossistêmico. Todos esses aspectos contribuem para redução da resistência vascular periférica, circulação hiperdinâmica e débito cardíaco insuficiente para a demanda metabólica.3 Além disso, há disfunção do cronotropismo e do inotropismo, que está relacionada ao comprometimento dos receptores beta-adrenérgicos. No paciente cirrótico há redução do número desses receptores, distúrbio da via de sinalização do cálcio e alterações da permeabilidade da membrana (aumento dos fosfolipídeos e do colesterol). Essas modificações contribuem para um distúrbio na contratilidade miocárdica, em detrimento da força de contração e da frequência cardíaca. A exposição prolongada à noradrenalina e a hiperatividade simpática, além de causarem danos diretos ao cardiomiócito, também provocam as alterações nos receptores betaadrenérgicos. Essa hiperatividade simpática ocorre via barorreceptor em decorrência da diminuição da resistência vascular periférica e da redução da pressão arterial.9 Alterações esplâncnico-circulatórias O desenvolvimento da hipertensão portal em pacientes cirróticos acarreta duas consequências sistêmicas, na tentativa de compensar essa alteração. A primeira é a maior produção de vasodilatadores para corrigir a hipertensão portal que, associado a menor degradação de fatores vasodilatadores pelo fígado doente, acarreta uma vasodilatação arterial esplâncnica que repercute sistemicamente.3 Queda na resistência vascular sistêmica, hipotensão arterial e hipovolemia central são suas principais repercussões.3 A resposta a essa vasodilatação é a segunda consequência do desenvolvimento da hipertensão portal. Há hiperativação reflexa do sistema nervoso simpático, aumentando o débito cardíaco e levando a uma condição conhecida como circulação hiperdinâmica.12 Inicialmente, esse sistema compensa a vasodilatação provocada primariamente na circulação esplâncnica. Com a progressão da cirrose, no entanto, é necessário maior atividade de sistemas vasoconstritores para manter o volume efetivo e a pressão arterial, levando então à ativação do SRAA. Esse efeito causa uma vasoconstrição sistêmica mais intensa e pode contribuir para complicações da cirrose, como ascite e síndrome hepatorrenal.12 O estado hiperdinâmico e a elevação dos fatores vasoconstritores causam redução na resposta vascular e Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica cardíaca à noradrenalina e angiotensina II. 12-14 A exposição prolongada aos níveis altos desses fatores leva à exaustão dos receptores beta-adrenérgicos, bem como reduz a expressão de proteína G, fatores que diminuem a resposta miocárdica esperada. 12,15,16 O coração do cirrótico apresenta maior depósito de colesterol, o que contribui para a alteração do funcionamento desse processo por mudança na estrutura da membrana do miócito, tornando-o rígido. 12,15,17 Os canais iônicos também têm seu funcionamento alterado, contribuindo para o estado hiporrensponsivo do cardiomiócito ao estímulo beta-adrenérgico e explicando a progressão da disfunção cardíaca.12 O ON, além de potente vasodilatador, tem papel importante na sinalização para alterar a membrana dos miócitos, pois gera inibição dos mediadores dos receptores beta-adrenérgicos, como a proteína cGMP.18,19 No paciente cirrótico, há um estado inflamatório constante que serve de base para as alterações sistêmicas apresentadas. Essas citocinas inflamatórias, especialmente TNF-α e IL-1, estimulam a síntese de ON, aumentando seus níveis sistemicamente.20 O ON, então, realiza sua função vasodilatadora e contribui para a diminuição da resposta dos miócitos às catecolaminas. Associado a isso, há estudos demonstrando que o ON se acumula no tecido cardíaco, chegando à alta concentração no músculo papilar, o que inverte o padrão de contratilidade miocárdica, causando redução da resposta contrátil.12,20 Outros componentes envolvidos na alteração da resposta cardíaca beta-adrenérgica são os endocanabinoides. O aumento no nível dos endocanabinoides cardíacos acompanha o aumento sérico de TNF-α. 12 Esses endocanabinoides inibem os receptores beta-adrenérgicos, tendo ação semelhante ao ON na inibição da resposta contrátil do miocárdio.21,22 Além dos mecanismos já citados, há aumento de endotoxinas bacterianas – pois a hipertensão portal favorece a translocação bacteriana intestinal e aumenta a reação sistêmica inflamatória.5 Essa condição aumenta o TNF-α circulante, favorecendo as alterações já citadas. Além disso, estudos comprovam que essas endotoxinas bacterianas têm interferência direta na função miocárdica, independente dos níveis de TNF-α.22,23 A membrana do cardiomiócito alterada também por aumento do depósito de fosfolipídeos apresenta diminuição na densidade dos canais de cálcio e de potássio, o que gera contração cardíaca insuficiente e prolongamento do intervalo QT.24,25 141 142 Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica O paciente cirrótico apresenta diversos componentes que alteram seu estado circulatório, levando a um desequilíbrio entre a vasodilatação esplâncnica e sua compensação vasoconstritora simpática e do SRAA, e possibilita que o estado de vasodilatação predomine na fase terminal da doença. O resultado final é um estado de reduzido volume arterial efetivo, baixa pressão arterial e hipovolemia central com disfunção cardíaca de contratilidade miocárdica insuficiente para manter o equilíbrio homeostase.3 Alterações na condução elétrica Na CMC, o músculo cardíaco apresenta como principais alterações elétricas o desacoplamento eletromecânico, a incompetência cronotrópica e o prolongamento do intervalo QT. 26 As anormalidades observadas no eletrocardiograma dos pacientes cirróticos, independentemente de sua etiologia, são secundárias à hipertensão portal, disfunção autonômica, circulação hiperdinâmica e à presença de fatores pró-inflamatórios a que está submetido o miocárdio do paciente.27,28 - Prolongamento do intervalo QT A repolarização ventricular é sensível a pequenas modificações na pressão portal, sendo, portanto, a primeira observada em pacientes com CMC,29 por meio do eletrocardiograma (ECG). É causado, provavelmente, por lentificação da repolarização dos cardiomiócitos, devido a anormalidades nos canais de potássio e redução na concentração desses canais na membrana plasmática, essenciais para a repolarização das células do músculo cardíaco, além de hiperativação simpática, que inibe a ativação desses canais. Disfunções nos canais iônicos provocam prolongamento do potencial de ação de células miocárdicas, resultando em sístole ventricular arrastada e prolongamento de QT.29-31 Maior tempo de contração implica prejuízo no relaxamento, provocando disfunção diastólica.32,33 - Dessincronia eletromecânica O desacoplamento eletromecânico é definido por dessincronia entre o estímulo elétrico e a resposta mecânica sistólica do músculo cardíaco, que parece se relacionar também à disfunção de canais de potássio, e ocorre mais frequentemente em pacientes que já apresentam alteração do intervalo QT prolongado. Essa dessincronia ocasiona a perda progressiva da função miocárdica, culminando em insuficiência cardíaca congestiva. Pacientes que realizam tratamento com vasopressina durante sangramento de varizes esofagianas ou que recebem transfusão sanguínea parecem ser mais acometidos pela anomalia.30 Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão - Incompetência cronotrópica Em pacientes com incompetência cronotrópica o nó sinusal é incapaz de responder a estímulos fisiológicos ou farmacológicos.30 Pacientes cirróticos apresentam índice sistólico, ou seja, relação do débito cardíaco com sua massa corporal, reduzido; mostram também menor capacidade de resposta a estímulo físico (exercício, infusão de medicamentos ou modificação postural), com aumento ineficiente da frequência cardíaca e da fração de ejeção (FE) do ventrículo esquerdo. Essa frequência cardíaca alcançada é inferior à frequência máxima em pacientes sem acometimento cardíaco. Disfunção sistólica e diastólica As disfunções cardíacas são consequentes a alterações estruturais e da contratilidade,9 e estão associadas com a gravidade da cirrose hepática.30 Frequentemente são assintomáticas e podem estar presentes no paciente com cirrose compensada. Mesmo com a progressão da doença hepática, muitas vezes o paciente só manifesta sintomas quando é submetido a uma situação de estresse fisiológico e/ou farmacológico. Também vale ressaltar que a redução das funções sistólica e diastólica pode levar à insuficiência cardíaca, com redução da fração de ejeção ventricular e ser determinante para o desenvolvimento de síndrome hepatorrenal, o que agrava o prognóstico.9,30 A disfunção diastólica costuma preceder a disfunção sistólica, sendo esta observada em situações em que há aumento da demanda do DC associada à diminuição da contratilidade miocárdica, como nas situações de estresse hemodinâmico - processos infecciosos, exercícios físicos, uso de determinados fármacos e cirurgias.2,9,29 O exercício físico nos pacientes cirróticos, por exemplo, transcorre com o aumento da pressão diastólica final no ventrículo esquerdo (VE), porém sem o apropriado aumento da fração de ejeção do VE, o que permite extrair que há um déficit na capacidade de contração ventricular, ou seja, que o coração na cirrose está sob condições máximas de trabalho devido à circulação hiperdinâmica, não havendo reserva ventricular para as situações de estresse. Alguns aspectos observados ao ecocardiograma são: aumento do diâmetro do VE ao final da diástole, diminuição do pico de velocidade sistólica e da taxa de deformidade sistólica.9 A disfunção diastólica se caracteriza por diminuição da capacidade de relaxamento ventricular precoce passivo (E) e tardio (A) na fase de enchimento ventricular, com consequente aumento da pressão atrial e do tempo de relaxamento isovolumétrico.9,30 Esse distúrbio ocorre devido ao aumento da rigidez miocárdica causada por Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica hipertrofia, fibrose e edema subendotelial, ocasionando alta pressão de enchimento no átrio e no ventrículo esquerdo.3,9 Os achados histopatológicos da disfunção diastólica revelam que, além da hipertrofia do cardiomiócito e da fibrose intersticial, há alteração da pigmentação e vacuolização do miócito. 10,34 É fundamental ressaltar que a disfunção diastólica, por comprometer o enchimento ventricular com consequente aumento do volume atrial, pode precipitar a fibrilação atrial.30 Os achados ecográficos que podem ser observados na disfunção diastólica da CMC são: redução da capacidade de relaxamento ventricular precoce (E) e tardio (A) e diminuição da taxa E/A com prolongamento do tempo de desaceleração da onda E.2,3,9,28,30,35 Destaca-se aqui a importância da ascite no comprometimento ainda maior da função cardíaca 9,28,36,37 visto que a elevação do diafragma associado ao aumento da pressão intratorácica diminui a complacência ventricular e atrial direita provocando a disfunção diastólica do ventrículo direito.9 Além disso, os pacientes com ascite apresentam maior redução da taxa E/A.36 A paracentese mostrou ser um método que melhora a função diastólica cardíaca,9,28 pois melhora o enchimento ventricular por reduzir a pré-carga e por diminuir a atividade do SRAA e dos agentes adrenérgicos (adrenalina e noradrenalina). Em contrapartida, a colocação de um shunt portossistêmico intra-hepático transjugular (TIPS) agrava a função cardíaca por aumentar a pré-carga, ocasionando o esgotamento cardíaco, o que aumenta o risco de insuficiência cardíaca e, consequentemente, a mortalidade.3,9,38-40 Diagnóstico Em 2005, um grupo de especialistas, durante o Congresso Mundial de Gastroenterologia, em Montreal, reuniu-se para determinar os critérios que definem a CMC (Quadro1).9,10 Esses critérios são divididos em disfunções sistólicas, diastólicas e critérios de suporte, mas podem ser didaticamente separados em alterações laboratoriais, alterações do ECG e de exames de imagem (ecocardiograma, ressonância magnética e cintilografia). Como essas alterações estruturais ocorrem em pacientes ainda assintomáticos, as manifestações clínicas não definem o diagnóstico, mas se associam ao quadro de CMC. Quadro 1 Critérios para o diagnóstico de CMC definidos no Congresso Mundial de Gastroenterologia, 2005 Disfunção sistólica Disfunção diastólica Critérios de suporte FE< 55% E/A <1,0 Cronotropismo ineficiente Diminuição da contração em resposta ao estresse fisiológico ou farmacológico Tempo de desaceleração >200 ms Desacoplamento eletromecânico Tempo de relaxamento isovolumétrico >80 ms Prolongamento do intervalo QT Alterações estruturais Dilatação de AE e hipertrofia de VE Elevação de BNP ou Troponina I Fonte: Gassanov et al.9 FE – fração de ejeção; E/A – relação entre o tempo de enchimento ventricular passivo e o tempo de enchimento ventricular ativo; AE – átrio esquerdo; VE – ventrículo esquerdo; BNP – peptídeo natriurético do tipo B; CMC – cardiomiopatia cirrótica Manifestações clínicas As repercussões clínicas da CMC aparecem em situações de estresse, estado que exige maior atividade cardíaca para manter o equilíbrio hemodinâmico. 3 Não há trabalhos que comprovem que a disfunção cardíaca tenha um quadro clínico definido a ser abordado nem que seja um fator preponderante ou determinante em alguma apresentação clínica. Há relatos de casos de pacientes cirróticos que provavelmente manifestaram o quadro de CMC por meio da síndrome hepatorrenal e/ou insuficiência adrenal, sendo um deles no serviço do Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP). Esses pacientes foram abordados com tratamento para insuficiência cardíaca e apresentaram melhora do quadro renal, o qual era refratário ao tratamento de síndrome hepatorrenal conhecido na literatura.41 143 144 Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica Já é consagrado, em diversos artigos, que procedimentos como transplante hepático e TIPS podem evoluir com insuficiência cardíaca súbita e edema pulmonar agudo no pós-operatório, caso a disfunção diastólica e sistólica não seja identificada antes da cirurgia.42,43 O prolongamento do intervalo QT visto no ECG também é marcador de mau prognóstico e de descompensação clínica pósprocedimentos.44 No caso do TIPS, o desvio do sangue do sistema porta para a circulação sistêmica exige um aumento da performance miocárdica; não havendo essa melhora do desempenho miocárdico, ocorrerão as complicações cardiopulmonares.43 A síndrome hepatorrenal pode ser precipitada pelo estado de vasodilatação do paciente cirrótico, tendo a incompetência cronotrópica do coração e a disfunção sistólica um envolvimento importante na sua patogênese.42 Em vigência desse quadro, as alterações de funcionamento cardíaco citadas como parte da patogênese servem também como agravantes da complicação desenvolvida, pois o débito cardíaco mantido pelo coração é insuficiente para suprir as necessidades hemodinâmicas apresentadas num quadro de estresse oxidativo.45 O mesmo ocorre em sepse grave, quando o aumento das citocinas inflamatórias em um coração já afetado pela cirrose piora o quadro de base e leva o paciente à falência circulatória.42 No paciente cirrótico, essa condição de sepse é geralmente causada por peritonite bacteriana espontânea. Essa condição de estresse metabólico em virtude do quadro infeccioso gera uma queda no débito cardíaco pelos mecanismos elucidados, manifestando-se clinicamente por queda de pressão arterial.3,42 A morte súbita é uma condição rara em pacientes cirróticos, mesmo quando associada ao prolongamento do intervalo QT – clinicamente, a maior repercussão dessas alterações elétricas são as arritmias.42 O aumento do QT influencia na mortalidade por predispor a arritmias graves. O uso de alguns medicamentos como macrolídeos, quinolonas e domperidona favorece a descompensação; o mesmo se observa em situações de estresse metabólico. 42 Há um estudo que associa sangramento gastrointestinal – que cursa com aumento de citocinas inflamatórias e hiperativação do sistema nervoso simpático – com maior prolongamento do intervalo QT e aumento da taxa de mortalidade em seis semanas.46 Altas taxas de aldosterona – seja pela menor degradação hepática seja pela hiperativação do SRAA – podem acarretar hipertrofia cardíaca, disfunção diastólica ventricular esquerda e hipertensão de átrio esquerdo, o que se manifesta clinicamente com uma arritmia de Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão origem atrial. Essa hipertensão é transmitida à circulação pulmonar, causando hipertensão arterial pulmonar que evolui com congestão venosa hepática – diminuindo ainda mais as taxas de degradação da aldosterona, o que determina aumento em suas taxas sanguíneas e favorece as arritmias clínicas. Pacientes cirróticos também apresentam maior índice de desenvolvimento de câncer47 pelas alterações com repercussão sistêmica, constante estado inflamatório e funcionamento hemodinâmico prejudicado em função da cardiomiopatia. A CMC causa ao coração incompetência para lidar com situações que exigem aumento de débito cardíaco, bem como predispõe a complicações da condição base da cirrose. Nos estágios finais, a disfunção diastólica, sistólica e do cronotropismo são tão pronunciadas que repercutem sistemicamente mesmo sem condições de estresse que as desencadeiem. Elas se manifestam clinicamente como agravante das complicações da cirrose, quando já existentes, ou predispondo-as, quando ausentes.3,12,42 Achados laboratoriais Alguns marcadores séricos podem estar elevados na CMC e, portanto, passam a fazer parte dos critérios para suporte do diagnóstico. O peptídeo natriurético atrial, por exemplo, é secretado em resposta a estiramento do átrio, refletindo sobrecarga de volume, e está presente em pacientes com cirrose; sua liberação culmina na redução da pressão arterial e da pré-carga.48 O peptídeo natriurético do tipo B (BNP) é secretado pelos ventrículos em resposta à sobrecarga volumétrica ou pressórica, ou isquemia miocárdica, sendo um hormônio compensatório à ação do SRAA, por meio da eliminação renal de sódio e água.49,50 Age também na redução de hipertrofia e fibrose do músculo cardíaco – quanto maior a espessura do septo interventricular e da parede ventricular, maior a dosagem sérica do BNP. Seus níveis são tão maiores quão mais graves forem as doenças hepática e cardíaca, relacionando-se com o grau de hipertrofia miocárdica e disfunção diastólica.28 BNP pode estar alterado mesmo na CMC em estágio inicial, tratando-se, portanto, de um marcador precoce de acometimento cardíaco.51 A elevação de troponina 1 cardíaca é também observada, por ser um marcador de lesão miocárdica.28 A adrenomedulina é outra substância que pode ser destacada por estar elevada nos casos de cirrose com ou sem clínica de acometimento cardíaco (desde assintomáticos até pacientes com hipertrofia ventricular Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão e/ou falência cardíaca).28 Esse hormônio, produzido no tecido cardíaco, regula o tônus vascular e a natriurese52 e influencia no inotropismo por meio da adenosina monofosfato cíclica (AMPc), que aumenta a produção de ON. Este vasodilatador é liberado com a finalidade de reduzir a pós-carga e dilatar os vasos coronarianos. Um biomarcador recentemente identificado, galectina-3, tem sido associado à fibrose do miocárdio e se apresenta elevado em pacientes cirróticos.49 Essas alterações podem ser observadas por meio de exame do sangue do paciente e auxiliam no diagnóstico e estratificação de gravidade da doença cardíaca causada por cirrose. Eletrocardiograma (ECG) As alterações encontradas no ECG que auxiliam no diagnóstico são inicialmente prolongamento de QT, aparecimento de múltiplas extrassístoles e, em fases mais avançadas, bloqueio de ramo, depressão do segmento ST e dissociação eletromecânica. Ecocardiograma Fundamenta-se como um método não invasivo e de grande valia no diagnóstico da CMC. Assim, acredita-se que sirva como uma ferramenta de rastreio da doença cardíaca no paciente com cirrose hepática. Os principais achados descritos na literatura são: aumento da pressão diastólica final no VE, sem o apropriado aumento da FE do VE; aumento do diâmetro do VE ao final da diástole; diminuição do pico de velocidade e da taxa de deformidade sistólica. Pode ocorrer ainda dilatação do átrio esquerdo, evidenciando disfunção diastólica crônica.9,10 O ecoDoppler cardíaco em pacientes com CMC pode evidenciar diminuição e/ou inversão da taxa E/A (<1)2,3,9,10,28,30,35 e prolongamento do tempo de desaceleração da onda E e do tempo de relaxamento isovolumétrico. Estes achados são sugestivos de atraso do relaxamento ventricular e, portanto, de comprometimento diastólico.9 Estudos iniciais a respeito do strain longitudinal global (GLS) têm demonstrado que este parâmetro é eficiente na detecção das disfunções sistólicas e diastólicas, mostrando-se muito superior na detecção das alterações sistólicas em repouso.10 Atualmente, determinou-se que o marcador mais específico para detecção de disfunção diastólica é a velocidade anular mitral diastólica precoce (e’) que pode ser identificada através do ecoDoppler tecidual. A disfunção diastólica do ventrículo esquerdo é caracterizada, neste caso, por: e’ septal <8 cm/s; e’ lateral <10 cm/s; e ampliação do átrio esquerdo (AE>= 34 mL/m2), sendo que a avaliação do AE pode ser feita através de ecocardiograma 3D e speckle tracking.10 Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica A fração de ejeção é uma medida fundamental para avaliar a função sistólica, porém a ecografia bidimensional mede a FE linear, cujo cálculo depende de suposições geométricas. Atualmente dispõe-se de métodos que calculam a FE de forma mais aperfeiçoada, como o método de Simpson e, principalmente, o speckle tracking, que avalia a deformação do miocárdio ventricular passo a passo nos eixos radial, longitudinal e circunferencial, sendo um método ecocardiográfico muito sensível na avaliação da função sistólica ventricular.30 Ressonância magnética (RM) Sabe-se que a RM do coração define com precisão os bordos do epicárdio e endocárdio, superando a ecocardiografia nesse aspecto por não depender da “janela acústica”. É considerada hoje o padrão-ouro na determinação da morfologia cardíaca.53 Através desse método é possível determinar a FE, o volume das câmaras cardíacas (aumento da massa do VE e dos volumes diastólicos finais no AE e VE) e alterações morfológicas miocárdicas, incluindo as teciduais (áreas de edema e fibrose), com a identificação da lesão por meio do uso de contrastes, como o gadolíneo.54 Nos pacientes cirróticos foram descritos na RM cardíaca aumento da massa de VE, aumento do volume do VE ao final da diástole e aumento do volume atrial esquerdo.9 Cintilografia Os dados cintilográficos podem revelar menor elevação da FE nos pacientes cirróticos após o exercício físico quando comparados aos pacientes não cirróticos.55 A cintilografia pode fornecer dados muito confiáveis sobre a FE ventricular esquerda, que é um preditor da função sistólica, quando não há dados confiáveis oriundos do ecocardiograma.30 Tratamento A CMC ainda não tem tratamento específico. Atualmente o tratamento é o mesmo instituído para insuficiência cardíaca, independentemente de sua etiologia, o qual inclui restrição de água e sódio, uso de diuréticos, inibidores do SRAA e betabloqueadores.56 Estudos com betabloqueadores não seletivos demonstraram redução do prolongamento do intervalo QT e melhora no desacoplamento eletromecânico, além de promover redução na pressão portal e prevenção do sangramento de varizes esofagianas. A associação de nitrato com betabloqueadores mostrou ter efeito vasodilatador venoso e coronariano, o que reduz a pré-carga, um dos objetivos no tratamento das disfunções diastólicas de VE.9,57 145 146 Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica O uso de diuréticos é benéfico em caso de retenção de fluidos, porém quando são usados por longo período estão associados à síndrome hepatorrenal, presença de distúrbios hidroeletrolíticos e aumento da ativação neuro-hormonal. Portanto, deve ter seu uso sempre monitorado e com parcimônia.9 Antagonistas da aldosterona e inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA) reduzem a hiperatividade do SRAA dos pacientes cirróticos e diminuem a espessura da parede e a dilatação de VE, o que culmina em melhora da função diastólica.9 Deve-se atentar para o efeito vasodilatador promovido pelos IECA devido à possibilidade de agravamento da hipotensão nos pacientes cirróticos. Com relação aos antagonistas da aldosterona, o canreonato de potássio reduz o gradiente de pressão venosa hepática, bem como a espessura da parede de VE e o volume diastólico final esquerdo, nos pacientes cirróticos Child A.10,58 Não há estudos com eplerone e espironolactona na CMC.28 Os digitálicos não apresentam bom efeito no aumento da contração cardíaca nos pacientes cirróticos. Em estudo com pacientes com cirrose alcoólica, o uso de digitálicos não mostrou benefício na melhora da disfunção do ventrículo esquerdo.9,59 Assim, não são recomendados no tratamento de CMC. A disfunção adrenal, também relacionada à cirrose hepática, quando concomitante à CMC, agrava o déficit de contração miocárdica. Nesses casos, há estudos que demonstram que o tratamento com esteroides pode melhorar a função cardíaca sob estresse.57,60 Somente o transplante hepático foi definido como tratamento eficaz da cirrose e da CMC, por demonstrar melhora nas disfunções cardíacas. Contudo, tem limitações devido à baixa disponibilidade do órgão para doação e pelos riscos peri e pós-operatórios desse procedimento como os de falência cardíaca, infarto do miocárdio, arritmias e morte cardíaca. Os benefícios demonstrados pelo transplante no coração são regressão da espessura da parede ventricular, da disfunção diastólica e aprimoramento da resposta sistólica e da capacidade para realização de exercícios físicos quando submetido a estresse. Esses resultados foram observados após 6-12 meses do transplante.10,61 Há também redução do débito e frequência cardíacos, diminuição da pressão na artéria pulmonar e aumento da pressão arterial sistêmica. Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão Comentários Não existem evidências que determinem o rastreamento (screening) da investigação da cardiomiopatia cirrótica em pacientes assintomáticos. Além disso, não há quadro clínico patognomônico que sinalize o acometimento cardíaco nesses pacientes. Os estudos indicam que os sinais e sintomas de CMC se manifestam em caso de situações de estresse, quando se exige maior atividade cardíaca para manter o equilíbrio hemodinâmico. No HUAP, foram identificados dois pacientes que preencheram os critérios da síndrome hepatorrenal e foram tratados sem sucesso conforme protocolos consagrados na literatura.41,62 Nesses casos, entende-se a CMC como fator determinante da agudização da insuficiência renal. Optou-se por iniciar dobutamina com furosemida e, nesses dois pacientes, houve regressão da síndrome hepatorrenal, com melhora progressiva da função renal. Um destes casos já foi publicado e o segundo encontra-se em redação.41 O coração do paciente cirrótico trabalha sob regime máximo para manter o equilíbrio hemodinâmico no estado hiperdinâmico em que se encontra. Assim, a hipótese é que a constante exigência à qual é submetido o coração desse paciente faz com que haja necessidade de maior trabalho da musculatura cardíaca. Com o esgotamento da reserva ventricular, não se consegue ampliar essa função, causando a descompensação observada na síndrome hepatorrenal de origem cardíaca. Isso ocorre mesmo em casos em que não há disfunção sistólica observada ao ecocardiograma, conforme observado nos pacientes do HUAP citados anteriormente. Explica-se, dessa forma, a reversão do quadro com o uso de dobutamina, que serviu como estímulo exógeno para o coração. Com isso, entende-se que a CMC é uma entidade já conhecida e entendida, porém são necessários estudos para o entendimento das suas manifestações clínicas e tratamento. Supõe-se ter relevância a abordagem da CMC na suspeita clínica de síndrome hepatorrenal. Potencial Conflito de Interesses Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes. Fontes de Financiamento O presente estudo não teve fontes de financiamento externas. Vinculação Acadêmica O presente estudo não está vinculado a qualquer programa de pós-graduação. Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(2):139-148 Artigo de Revisão Bicca et al. Cardiomiopatia Cirrótica Referências 1. Schuppan D, Afdhal NH. Liver cirrhosis. Lancet. 2008;371(9615):838-51. 2. 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