Núcleo de Educação Popular 13 de Maio - São Paulo, SP . CRÍTICA SEMANAL DA ECONOMIA www.criticadaeconomia.com.br EDIÇÃO Nº 1208 – Ano 28; 4ª Semana Setembro 2014. China: capítulos finais da longa marcha da globalização . Pequim tem plena consciência que deve ser evitada qualquer barbeiragem política na solução da tensa situação política em Hong Kong. Mas não basta a consciência do perigo para evitar as barbeiragens. JOSÉ MARTINS. 1º de Outubro de 2014: em Pequim, a cúpula militar e burocrática do governo chinês organiza pomposa, meticulosa e bem comportada comemoração do “65º Aniversário da Fundação da República Popular da China”; ou, como aparece no grande placar que encima o enorme palco dos dirigentes supremos no Palácio do Povo: “Celebration of the 65º Anniversary of the Founding of the People’s Republique of China”. De passagem por Pequim, Adam Smith deve ter sorrido feliz. E pensado: se o destino da China era mesmo ser civilizada, é claro que ela não poderia satisfazer esse ideal se não fosse capaz pelo menos de amar a língua dos seus civilizadores. No mesmo dia, em Hong Kong, sete milhões de habitantes, a bandeira chinesa é hasteada constrangedoramente ao som furioso da multidão nas ruas do centro da cidade. Ruas entupidas por dezenas de milhares de manifestantes fortemente mobilizados há mais de duas semanas. Eles juram que vão ocupar o centro financeiro e administrativo da cidade enquanto não obtiverem as reformas políticas prometidas por Pequim no tratado de devolução desta antiga colônia inglesa para a China, em 1997. Liberdade de eleger seus próprios dirigentes. Eleições por sufrágio direto universal é a principal reivindicação dos cidadãos de Hong Kong. Agora, depois da repressão às manifestações dos últimos dias, com prisões e bombas de gás, os revoltosos exigem também o afastamento do governador da cidade, nomeado como de praxe por Pequim, figura particularmente odiada pela população. O braço de ferro entre cidadãos e burocracia armada aumenta e se torna mais ameaçador para a ordem. Pequim não quer (ou não pode) dar sinais de fraqueza. O medo de contágio de revolta para outras grandes cidades ou províncias do continente é a principal razão para que não recue na sua imposição renovada no último mês de nomear os dirigentes de Hong Kong. O nervosismo das autoridades de Pequim pode ser visto no seu esforço para censurar notícias dos protestos ao resto da China. As mídias do governo repetem que há incidentes provocados por alguns opositores radicais, não patriotas, e palavras como Hong Kong, barricadas, Occupy, e ainda “guarda-chuva”, um dos símbolos dos revoltosos, foram bloqueadas no maior site de microbloging do país. Diz o The New York Times: já houve também detenção de ativistas – Wang Long., em Shenzen, por ter postado noticia sobre os protestos numa rede social; e Shen Ianqiu em Shangai, por ter postado fotografias da cabeça raspada, que seria um símbolo de apoio aos manifestantes 1 de Hong Kong, e ter uma t-shirt com a frase “Quando o povo teme o governo há tirania”. A organização imperialista norte-americana Anistia Internacional denuncia que mais de vinte ativistas chineses apoiando reivindicações democráticas foram detidos na China continental e sessenta outros estavam sendo interrogados pela polícia. As manifestações continuam levando cada vez mais gente às ruas. Só serão retirados com uma grande ação militar de Pequim, com numero incalculável de mortos e prisioneiros. Algo parecido com a recente operação militar-imperialista para massacrar a “primavera árabe” no Egito, porém com dimensões chinesas, muito maiores. Mas essa seria uma solução de riscos enormes. No início da semana, Pequim havia retirado das ruas a polícia antimotim, na esperança que um possível cansaço das massas fizesse as coisas voltarem à normalidade. Aconteceu exatamente o contrário: cada vez mais pessoas aderem às manifestações. O The Wall Street Journal, repercutindo preocupações do capital financeiro internacional na Ásia, analisa que essa indecisão dos militares chineses para reprimir os cidadãos revoltosos deve-se principalmente à importância de Hong Kong como centro financeiro na China e palco de experiências no mercado de capitais que as autoridades de Pequim não se atrevem a fazer em outras cidades do país. E qualquer aventura armada interferindo no sistema legal da cidade pode afastar empresas financeiras globais para outros centros como Singapura. Isso seria desastroso para a economia. E o significado simbólico seria enorme. Sepultaria em definitivo as ilusórias reformas liberalizantes prometidas por Pequim do defunto modelo keynesiano-marxista dos últimos quarenta anos de crescimento econômico acelerado e de integração às cadeias produtivas globais. São exatamente essas reformas que se aguarda no mercado global De todo modo, deve-se evitar a qualquer custo novas fontes de instabilidade financeira na árdua tarefa atual de neutralizar fortíssimas tendências depressivas que atingem perigosamente a economia e a governabilidade política do país. Chegamos, portanto, ao núcleo mais profundo das causas e das perspectivas das atuais turbulências políticas no país mais populoso do mundo e, por isso mesmo, variável de alta densidade estratégica nos diversos cenários da próxima crise global. Pequim tem plena consciência que deve ser evitada qualquer barbeiragem política na solução da tensa situação política atual em Hong Kong e de outras ainda mais tensas que necessariamente se manifestarão nos próximos doze meses. Mas não basta a consciência do perigo para evitar as barbeiragens. Acontece que, em qualquer lugar do mundo, a administração da ordem politica e social depende muito mais da evolução da ordem econômica do que da ação dos grandes homens (“estadistas”) ou de governos com maior ou menor competência administrativa. Nos período de crise econômica essa regra fica mais evidente. E vale principalmente para os capitalistas chineses. Neste momento, as perspectivas políticas e sociais na China no curto e médio prazo são determinadas mais que nunca pelas regras de ferro da acumulação do capital. E esses sinais não são nada tranquilizadores para seus capitalistas. Devemos, então, concluir a investigação destas realidades materiais que compõem os capítulos finais da longa marcha da globalização iniciada na virada dos anos 1970/1980. É o que faremos a seguir. 2 Em 2014, estamos completando 27 ANOS DE VIDA. Vinte e sete anos informando e educando a classe trabalhadora! ASSINE AGORA A CRÍTICA ENTRE EM CONTATO CONOSCO NO NOSSO SITE www.criticadaeconomia.com.br e saiba as condições para a assinatura! 3