As cores da alma de Malangatana

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Sábado
10 de Abril de 2010
OPINIÃO
A BOLA
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47
Porque hoje é sábado
As cores da alma de Malangatana
D. R.
Por
VÍTOR SERPA
«Criem em vós
a alma e o espírito
de ainda fazerem
as coisas por amor»
(Malangatana,
no XIII Congresso
das Ciências do
Desporto, em Maputo)
A
promessa pareceu-me
insólita. Na mesa de
honra do anfiteatro do
Centro de Congressos
Joaquim Chissano, Malangatana divagava do desporto
para a música e para os cantares
dos velhos escravos que rumavam a S. Tomé para as roças do
patrão branco. Para não sentirem
as dores do corpo cantavam, então, as mais belas cantigas da mãe
África, numa nostalgia doce e sonhadora.
Malangatana começara, lentamente, a entoar um cântico negro,
os seus dedos, habituados ao ritmo
frenéticodacordosseusquadros,que
ganharam dimensão universal, batiam o ritmo no tampo da mesa de
honra presidida pelo Magnífico Reitor da Universidade Pedagógica de
Moçambique. Contagiada, a plateia
cheia de figuras proeminentes da investigação e das ciências do desporto, de Portugal, Brasil, Angola e Moçambique, acompanhava em palmas
solidárias. O velho pai da moderna
pintura africana levantara-se num
vagar moçambicano, a cada passo
seu se notava um admirável swing e,
estranhamente, o seu corpo volumoso tornava-se leve e expressivo.
É um momento admirável e inesquecível.
Antes, Malangatana falara-nos
nos jogos do seu tempo de menino
pobre e dos rituais de sedução, que
serão jogos, também. Tem uma voz
forte e intensa, que o microfone amplia. Porém, calma. Surpreende-nos
com uma pergunta:
— Vocês sabem quantos tons de
verde há em S. Tomé?
É a sua alma intensa de pintor
que responde numa vivacidade incontida:
— Noventa e dois tons de verde!
Humor ardente
Por
LUÍS AFONSO
A voz da sabedoria na voz de Malangatana, aqui ao lado de Vítor Serpa, director de A BOLA
Logo depois do almoço, enquanto o acompanhamos, logo alguém
surge a afirmar, com entusiasmo, a
sua admiração pela imensa obra de
pintor. Surge, porém, um momento de hesitação, quando é referido o
tempo em que Malangatana trabalhava em casa de patrão. O mestre rise do constrangimento e desanuvia
a cena:
— Pode dizer exactamente o que
eu era nesse tempo. Um empregado
doméstico. E tenho orgulho nisso.
Pouco depois, no seminário que
encerrou o belíssimo Congresso de
Desporto dos países de língua portuguesa, organizado pela Faculdade
de Educação Física e Desporto de
Maputo, dirigida pelo professor António Prista, Malangatana deixava
uma bela mensagem a todos os docentes universitários:
— Criem, em vós, a alma e o espírito de ainda fazerem as coisas por
amor.
Ao mesmo tempo que deixava
toda a gente admirada pelo vigor da
sua defesa pública da importância
do desporto:
—Temosdechamaraatenção,aos
políticos deste país, sobre a verdadeira importância do desporto. Fazê-los ver como o desporto pode dignificar as pessoas.
E a seguir:
— O desporto fica sempre em úl-
timo lugar na palavra dos senhores
ministros. Eles não sabem como o
desporto é importante para o homem. Dizem sempre que não há dinheiro. Se for preciso, para desenvolverem o desporto, guardem o
dinheiro com que costumam pagar
os banquetes oficiais. Dêem ao desporto o que o desporto merece ter.
Isto talvez seja uma forma de rezar.
Digo-ocomoumaimploração.Dêem
força ao desporto. Espalhem o desporto pelas escolas e por todos os
lugares de Moçambique.
Será de pé, e num ambiente verdadeiramente solar, que a plateia lhe
tributará a maior ovação do Congresso.
DENTRO DA ÁREA
f
O congresso
de Maputo
A
Universidade do Porto viu reconhecida a sua importância
fundamental no apoio académico que ao longo dos anos tem dispensado à Universidade Pedagógica
de Moçambique na área do ensino da
EducaçãoFísicaedasCiênciasdoDesporto.Porisso,aFaculdadedeDesporto
do Porto e alguns dos seus docentes,
entre os quais o presidente do ConselhoDirectivo,JorgeOlímpioBento,receberam medalhas de mérito da UniversidadePedagógicadeMoçambique.
Igual distinção para algumas individualidades académicas de prestigiadasuniversidadesbrasileiraseque
formam, especialmente com a Universidade do Porto, o baluarte de um
movimento lusófono de educação física e desporto nos países de língua
portuguesa.
OXIIICongresso,realizadoemMaputo,decidiuqueapróximaediçãoserá
em Belo Horizonte (Brasil), terá como
lema Desporto - cultura, estética e
excelência eapresentou,noessencial
das suas conclusões, o pedido oficial
paraqueosgovernoseparlamentosda
CPLP criem e promovam efectivos
programasdemobilidadededocentes,
pesquisadoreseestudantesdoensinosuperiornoespaçolusófonoeque
asentidadesfinanciadorasdeprojectos de pesquisa avaliem os respectivos autores em função do mérito do
seu trabalho e não discriminando os
que são publicados em língua portuguesa.
PAULO ESTEVES/ASF
Jorge Olímpio Bento
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