- Repositório Científico da Escola Superior de

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 _____________________________________________________________________________ CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM
ÁREA DE ESPECIALIZAÇÃO GESTÃO DE UNIDADES DE CUIDADOS
Literacia em Saúde
no
Doente Coronário
Isabel Gaspar Pereira
Orientador: Professora Doutora Maria Manuela Frederico Ferreira Professora na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra
Dissertação apresentada à Escola Superior de Enfermagem de Coimbra para obtenção do grau de Mestre em Enfermagem na Área de Especialização em Gestão de Unidades de Cuidados Coimbra, novembro de 2013
4
PENSAMENTO
"Quanto mais conhecimento, mais vida."
Pirkei Avot
5
AGRADECIMENTOS
Esta dissertação contou com a ajuda e colaboração de amigos, colegas de trabalho e
familiares. Gostaria de expressar toda a minha gratidão e o reconhecimento a todos
que tornaram possível a sua concretização, a todos eles deixo aqui o meu
agradecimento muito sincero.
Ao Henrique, meu marido pelo carinho, compreensão, companheirismo, que me
proporcionou, ajuda, incentivo, mesmo com as minhas ausências.
Ao Bernardo, ao Tomás e à D. Maria, meus filhos e sogra pelo afeto, compreensão e
encorajamento e disponibilidade em todos os momentos.
O
meu
reconhecimento
à
Professora
Doutora
Manuela
Frederico,
pela
compreensão, disponibilidade, e paciência que não só se disponibilizou a orientar
esta tese, como ao longo de todo o trabalho me incentivou.
Este trabalho não teria sido possível sem a autorização do Dr. João Morais e
colaboração do Serviço de Cardiologia, consentidas para a aplicação dos
questionários e sem a valiosa colaboração dos doentes coronários participantes neste
estudo.
A todos
O MEU MUITO OBRIGADO
6
LISTA DE SIGLAS
ACSS- Administração Central do Sistema de Saúde
ALL- Adult Literacy and Life-skills Survery
AVC- Acidente Vascular Cerebral
CABG- Cirurgia de Revascularização Miocárdio
CHD- Coronary Heart Disease
CI- Confidence Interval
CK-Creatinina Quinase
Conh.FRG- Conhecimento dos fatores de risco gerais
Conh.FRP- Conhecimento dos fatores de risco presentes
CT- Colesterol Total
DAC- Doença Arterial Coronária
DC- Doença Coronária
DCV- Doença Cardiovascular
DGS- Direção Geral Saúde
DIC- Doença Isquémica do Coração
DM- Diabetes Mellitus
DMV- Doença Multivaso
DP- Desvio Padrão
DR- Diário da República
EACTS- European Association for Cardio-Thoracic Surgery
EAM- Enfarte Agudo Miocárdio
EAS-European Atherosclerosis Society
ECG- Eletrocardiograma
ESC- European Society of Cardiology
FPC- Fundação Portuguesa de Cardiologia
FR- Fatores de Risco
FRCV- Fatores de Risco Cardiovascular
FRG- Fatores de risco gerais
7
FRP- Fatores de risco presentes
GDH- Grupos Diagnóstico Homogéneo
HDL- Lipoproteínas de Alta Densidade
HTA- Hipertensão Arterial
IALS- International Adult Literacy Survey
ICP- Intervenção Coronária Percutânea
IECA- Inibidores da Enzima Conversora Angiotensina
IMC- Índice Massa Corporal
INE- Instituto Nacional Estatística
INEM- Instituto Nacional de Emergência Médica
INR- International Normalised Ratio
IqNS- Inquéritos Nacionais de Saúde
LDL- Lipoproteínas de Baixa Densidade
M- Média
MS- Ministério da Saúde
OE- Ordem Enfermeiros
OECD- Organization for Economic Co-operation and Development
OMS- Organização Mundial de Saúde
QM- Quilomicra
RNSCA- Registo Nacional Síndrome Coronário Agudo
RR- Relative Risk
SCA- Síndrome Coronário Agudo
SCA-NSTE=EAMSST-Enfarte Agudo Miocárdio Sem Elevação do Segmento ST
SCA-STE=EAMCST- Enfarte Agudo Miocárdio Com Elevação Segmento ST
SPC- Sociedade Portuguesa de Cardiologia
TG- Triglicéridos
TMO- Terapêutica Médica Otimizada
UE- União Europeia
VLDL- Lipoprotéinas de Densidade muito Baixa
WHO- World Health Organization
8
RESUMO
A literacia em saúde envolve a capacidade que os doentes têm em comunicar com os
profissionais de saúde, ler informação, seguir recomendações e decidir como e
quando procurar ajuda destes. Muitos doentes com doença coronária não entendem a
melhor maneira de cuidar de si mesmos e prevenir a doença, desconhecem a relação
entre os clássicos fatores de risco e a eclosão da doença. Alguns não estão sequer
conscientes de que a doença cardíaca é evitável, através duma atuação efetiva sobre
os fatores de risco modificáveis.
Este estudo, descritivo correlacional, tem como objetivos avaliar e caracterizar os
níveis de literacia em saúde em doentes com doença coronária, avaliar a influência da
procura de folhetos/informação escrita e explorar a efetividade nas mudanças dos
hábitos de vidas. O questionário é o instrumento de colheita de dados utilizado. A
amostra é constituída por 51 doentes internados no serviço de Cardiologia, com
diagnóstico de doença coronária. Destacam-se os seguintes resultados: A maioria dos
sujeitos é do sexo masculino sendo 48, (94,1%), a média de idade é de 61 anos, estes
indivíduos vivem com o cônjuge, estão reformados, auferem rendimentos entre os
500-1500€ e cerca de metade têm como habilitações o ensino secundário. A aquisição
de conhecimento provém informações vindas de enfermeiro/médico. Os fatores de
risco gerais mais referenciados para a doença coronária são os elevados níveis de
colesterol, o hábito de fumar, a obesidade e a tensão arterial elevada. Por sua vez, a
tensão arterial elevada, o hábito de fumar e o stress, são os fatores de risco mais
presentes na sua doença coronária. O valor médio do nível de literacia é de 41,37 com
desvio padrão de 8,78, numa escala de 0 a 72. Há valores acima de 60% de respostas
negativas nas mudanças de hábito de vida. Apenas 13,7% dos inquiridos efetivaram
quatro mudanças nos seus hábitos de vida.
Os resultados permitem afirmar que, a idade não tem uma relação estatisticamente
significativa com o nível de literacia em saúde, as habilitações literárias não
influenciam o nível de literacia em saúde, este não difere consoante a procura de
folhetos/informação escrita e que apenas uma pequena percentagem (7,45%) de
mudanças nos hábitos de vida têm a ver com o nível de literacia em saúde.
Palavras-chave: literacia em saúde, doença coronária, fatores de risco
9
ABSTRACT
Health literacy involves the ability that patients have in communicating with health
professionals, reading information, following recommendations and deciding how and
when to seek their help. Many patients with coronary heart disease do not understand
the best way to take care of themselves and prevent the disease, they are unaware of
the relation between classic risk factors and the outbreak of the disease. Some patients
are not even aware that heart disease can be prevented, through an effective action on
the modifiable risk factors.
This descriptive correlational study, aims to evaluate and characterize the levels of
health literacy in patients with coronary disease, evaluate the influence of the demand
for brochures / written information and explore the effectiveness of changes in their life
habits. The questionnaire is the instrument used to collect information. The sample
consists of 51 patients admitted to the cardiology service with a diagnosis of coronary
heart disease. The study highlights the following results: The majority of subjects 48
(94.1%) are male, their average age is 61, these individuals live with their spouse, are
retired, receive income between 500 - 1,500€ and about half of them have secondary
scholarity. The acquisition of knowledge comes from information gathered from a nurse
/ doctor. The general risk factors most referenced for coronary heart disease are high
cholesterol, smoking, obesity and high blood pressure. In turn, high blood pressure,
smoking and stress are risk factors of most of their coronary disease. The level of
literacy average is 41.37 with a standard deviation of 8.78 on a scale from 0 to 72.
There are values above 60% of negative responses to changes in life habits. Only
13.7% of respondents conducted four changes in their lifestyle.
The results indicate that age has no statistically significant relation with the health
literacy level, educational attainment does not influence the level of health literacy,
which does not differ depending on the search for flyers / written information and that
only a small percentage (7.45%) changes in the patients' life habits have to do with the
level of health literacy.
Keywords: health literacy, coronary disease, risk factors
10
INDICE DE QUADROS
Quadro 1- Caracterização da amostra quanto à idade……………………………
69
Quadro 2- Nível de literacia em saúde baseado no conhecimento dos fatores
de risco gerais e conhecimento dos fatores de risco presentes………………….
Quadro 3- Mudanças nos hábitos de vida………………………………………….
75
77
Quadro 4- Coeficiente de correlação de Pearson entre o nível de literacia e a
idade……………………………………………………………………………………
79
Quadro 5- Resultados da aplicação de t de Student à Literacia consoante as
habilitações literárias………………………………………………………………….
80
Quadro 6- Resultados da aplicação de t de Student à literacia consoante a
procura de folhetos/informação escrita…………………………………………….
81
Quadro 7- Coeficiente de correlação de Pearson entre o nível de literacia e as
mudanças de hábitos de vida……………………………………………………….
82
11
INDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Caracterização da amostra quanto ao sexo…………………………
69
12
INDICE DE TABELAS
Tabela 1- Distribuição da amostra segundo, com quem vive…………………….
69
Tabela 2 - Distribuição da amostra quanto às habilitações literárias……………
70
Tabela 3 - Distribuição da amostra quanto à situação laboral……………………
70
Tabela 4 - Distribuição da amostra quanto ao rendimento……………………….
70
Tabela 5 - Distribuição da amostra quanto ao tempo de diagnóstico……………
71
Tabela 6 - Distribuição da amostra quanto ao cateterismo cardíaco,
angioplastia (ICP) e cirurgia cardíaca (CABG)…………………………………….
Tabela 7 - Distribuição da amostra relativamente à medicação que toma……...
Tabela 8 - Distribuição da amostra quanto ao modo de aquisição de
conhecimento…………………………………………………………………………
Tabela 9 - Distribuição da amostra quanto ao conhecimento dos Fatores de
Risco Gerais (FRG)…………………………………………………………………..
Tabela 10 - Distribuição da amostra quanto ao conhecimento dos Fatores de
Risco Presentes (FRP)……………………………………………………………….
Tabela 11 – Distribuição da amostra quanto às vertentes de adesão nas
mudanças nos hábitos de vida………………………………………………………
Tabela 12- Distribuição da amostra quanto ao número de mudanças nos
hábitos de vida……………………………………………………………………….
71
72
72
73
74
75
77
Tabela 13 - Distribuição da amostra quanto à identificação dos medicamentos.
78
Tabela 14 - Distribuição da amostra quanto ao manuseamento da medicação.
78
13
14
SUMÁRIO
Pág
.
INTRODUÇÃO………………………………………………………………………...
17
1- LITERACIA………………………………………………………..………….
22
1.1-Literacia em saúde...........................................................................................
22
1.2-Literacia na doença cardiovascular.................................................................
24
2- PATOLOGIA CARDÍACA………………………………………………….
28
2.1-Fatores de Risco.............................................................................................
30
2.2-Adesão Terapêutica........................................................................................
44
2.3-Doença coronária..........................................................................................
47
3- PAPEL DO ENFERMEIRO.....................................................................
56
4- METODOLOGIA……………………………………………………………
58
4.1-Enquadramento ao tema...............................................................................
58
4.2-Tipo de Estudo..............................................................................................
59
4.3-Variáveis........................................................................................................
59
4.4-Hipóteses.......................................................................................................
61
4.5-População/amostra........................................................................................
63
4.6-Instrumento de colheita de dados.................................................................
64
4.7-Considerações éticas....................................................................................
66
4.8-Colheita de Dados.........................................................................................
67
4.9-Processamento e análise de dados..............................................................
67
4.10-Discussão dos resultados............................................................................
83
CONCLUSÃO......................................................................................................
93
BIBLIOGRAFIA...................................................................................................
97
ANEXOS
Anexo I- Instrumento de colheita de dados
Anexo II- Pedido de autorização dirigido ao Presidente do Conselho de
Administração e respetivo deferimento
Anexo III- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
15
16
INTRODUÇÃO
A literacia refere-se a um processo dinâmico, que não se esgota na alfabetização, mas
na capacidade de usar determinadas competências, implicando que o indivíduo
questione e assume um papel ativo a nível pessoal, social e profissional (Loureiro et
al, 2012).
As intervenções protagonizadas em termos de literacia têm como objetivos produzir
resultados, quer em termos de saúde (redução da morbilidade), quer sociais
(qualidade vida) (Loureiro et al, 2012). Os mesmos autores, baseados em diferentes
estudos, referem algumas consequências do fato dos indivíduos, possuírem um
reduzido nível de literacia em saúde, nomeadamente: custos acrescidos nos cuidados
de saúde; reduzido ou falso conhecimento sobre as doenças e tratamentos; menores
competências de autogestão; menor capacidade para cuidar de pessoas em
condições crónicas; erros de medicação; incapacidade para lidar, de forma adequada
com os serviços de saúde.
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte entre nós e são, também,
uma das mais importantes causas de morbilidade, de incapacidade, invalidez e de
anos potenciais de vida precocemente perdidos. Em Portugal, as doenças
cardiovasculares foram responsáveis por cerca de 40% dos óbitos, atingindo valores
de 44,2% de óbitos por doença do aparelho circulatório, em 1990. Em 1960, 29,5% de
óbitos e em 2011,30,7%. (INE – DGS/MS, INE, PORDATA). A prevalência de
hipertensão arterial é,
em Portugal de 42,1 %, sendo superior a 70 % nos homens
entre 55 e 64 anos. O impacto económico e social da DIC e do AVC é, por isso,
imenso (DR, nº 175, Setembro de 2005).
Paradoxalmente, embora o número de mortes por doença cardiovascular esteja a
diminuir em grande parte da União Europeia (U.E), exceto Europa de leste e central, o
número de doentes cardiovasculares está a aumentar, relacionado com o aumento de
longevidade e sobrevida destes doentes. Em 2007, de acordo com dados resultantes
do Agrupamento em Grupos Diagnóstico Homogéneo (GDHs), ocorreram em Portugal
11.909 episódios de internamento hospitalar por enfarte agudo do miocárdio.
17
De acordo com a Carta Europeia do Coração (2008), “o peso associado da doença
cardiovascular estabelecida pode ser reduzido com um diagnóstico precoce,
tratamento adequado da doença, reabilitação e prevenção, nomeadamente através do
aconselhamento em prol de um estilo de vida mais adequado”.
Ao melhorar o processo de comunicação com os doentes, o profissional de saúde
pode ser capaz de melhorar os resultados nas DCV. Há evidências de que um melhor
conhecimento de sua condição pode melhorar a adesão do doente às mudanças de
estilo de vida e medicamentos (Safeer et al, 2006).
A doença cardiovascular é cada vez mais reconhecida como um problema de saúde
pública, aumento das taxas de mortalidade e a prevalência de fatores de risco
lentamente tornaram-se um problema que exige a intervenção de profissionais de
saúde e diligências governamentais. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima
que cerca de 17 milhões de pessoas morrem a cada ano de doenças cardiovasculares
em todo o mundo. Níveis adequados de literacia em saúde parecem resultar em
melhorias da saúde e em mais qualidade de vida; por outro lado, níveis inferiores de
literacia em saúde estão associados a saúde mais precária e mesmo a mais
mortalidade. Aqueles que experienciam um enfarte do miocárdio podem passar por
procedimentos como a angioplastia coronária (ICP) ou revascularização do miocárdio
(CABG). Para garantir uma gestão otimizada destes ou qualquer outro procedimento
na doença cardíaca, os doentes são obrigados aderir a mudanças na dieta e estilo de
vida, os quais exigem um bom nível de literacia em saúde (Kilonzo et al, 2011).
Há evidências de que um melhor conhecimento da sua condição pode melhorar a
adesão a mudanças de estilo de vida e medicação. Existe, ainda, correlações
estatisticamente significativas entre o conhecimento geral dos doentes sobre fatores
de doença cardíaca coronária e fatores de risco e melhorias na perda de peso,
atividade física, gestão de stress, mudanças na dieta (Safeer apud Alm-Roijer et al,
2004).
Acresce que as intervenções para prevenir a doença cardiovascular são altamente
rentáveis, de acordo com a declaração da American Heart Association. Uma análise
de custo-efetividade mostra que programas de exercícios físicos e dieta, estratégias
de controlo do tabagismo, planos de gestão da obesidade, e outras iniciativas
acumulam valor ou poupam dinheiro ao longo do tempo, pois traduzem-se em ganhos
de saúde, representados por indicadores subjetivos como seja a auto perceção de
saúde quer por indicadores objetivos como seja a morbilidade.
18
Está a nossa população consciente desta realidade?
Os indivíduos e os grupos estão capacitados para assumirem um maior controlo sobre
fatores pessoais, sócio-económicos e ambientais, com a finalidade de melhorar a
saúde?
O que pensam quando se fala em determinantes da saúde, nomeadamente em fatores
de risco, no âmbito das doenças cardiovasculares?
Pessoas com baixo nível de literacia em saúde podem não ter a capacidade de autogerir a sua saúde e prevenir o desenvolvimento de doenças crónicas, através de
adoção de estilo de vida saudáveis e modificação dos fatores de risco. Na medida em
que os níveis gerais de saúde da população dependem de escolhas individuais
relativamente à alimentação e ao estilo de vida, a literacia pode assumir um papel
significativo, permitindo às pessoas aceder a informação que seja relevante para a sua
saúde.
Os baixos níveis de literacia têm sido responsáveis pela criação de grande parte da
desigualdade social que se encontra em muitos dos resultados que os cidadãos
portugueses mais valorizam – boa saúde física, capacidade de aceder a
oportunidades de aprendizagem, confiança na participação social e na vida
democrática e oportunidade de beneficiar de empregos estáveis e com salários
elevados (Lima e Brum, 2009).
O desafio essencial e fundamental é o de “criar uma dinâmica de interrelações de
produção e partilha constante de informação e de conhecimento (literacia em saúde),
de pro-actividade, de auto-controlo (capacitação) e da máxima autonomia possível no
que respeita à saúde individual e colectiva (“empowerment” ou empoderamento) – a
que corresponde também uma quota-parte de responsabilidade de cada um pela sua
saúde e por extensão, pelo estado de saúde da sua comunidade” (Gonçalves e
Ramos, 2010).
Ao elaborar um estudo sobre “Literacia em Saúde no Doente Coronário”, na
população com necessidade de intervenção hospitalar, existe como motivação, a
experiência profissional de 10 anos de exercício profissional em Cardiologia. É patente
a dificuldade que os doentes apresentam na compreensão das informações que lhes
são transmitidas, quer sejam elas sobre a própria doença durante o internamento,
como, com a necessidade de cumprir medidas farmacológicas (adesão terapêutica) e
19
não farmacológicas (alterar hábitos de vida) que são essenciais na evolução favorável
do seu estado de saúde e prevenção de novos eventos, após a alta clínica.
Num estudo efetuado no serviço de Cardiologia sobre a prevalência dos fatores de
risco, verificou-se que a hipertensão arterial está presente em 68% dos indivíduos,
56,1 % tem dislipidémia, 32% diabetes, 17,2% tabagismo e 3,8% tem história familiar
de doença coronária. Ainda nesse mesmo estudo, ao analisar a distribuição dos
fatores de risco em função do género, verificou-se que existe pelo menos dois fatores
de risco presentes com 36% nos homens e 36,6% nas mulheres e 28% dos homens
têm três ou mais fatores de risco presentes e 29% das mulheres. Esta realidade
presente leva a refletir sobre o papel dos profissionais de saúde nesta problemática
nomeadamente, os enfermeiros. Estes são os profissionais que, ao passarem grande
parte do tempo com os indivíduos e famílias, assumem um papel primordial na
deteção dos problemas. Ao atender o indivíduo e família de uma forma global, os
enfermeiros enfatizam sempre a manutenção e promoção da saúde, através da
adoção e manutenção de comportamentos saudáveis, dentro do processo de cuidar
que, segundo a Teoria do Cuidar de Swanson, inclui conhecer, estar com, fazer por,
possibilitar e manter a crença. Pelo que foi referido, reveste-se de importância extrema
a sua participação em programas de intervenção pluridisciplinares, na promoção da
saúde.
Neste contexto, e por todas estas razões, formulou-se a seguinte questão de
investigação: Qual o nível de literacia em saúde no doente coronário e em que
medida é influenciada pela procura de folhetos/informação escrita e pelas
mudanças de hábitos de vida?
Assim, os objetivos deste estudo são:
* Avaliar e caracterizar os níveis de literacia em saúde em doentes com doença
coronária
* Avaliar a influência da procura de folhetos/informação escrita
* Explorar a efetividade nas mudanças dos hábitos de vidas
Tendo em conta a temática desta investigação, optou-se por um estudo descritivo
correlacional, de abordagem quantitativa, cuja população são indivíduos internados no
serviço de Cardiologia, por evento de DC ou SCA.
20
O instrumento de colheita de dados utilizado neste estudo é um questionário,
disponível na tese- “Tradução, adaptação e validação de um questionário de
conhecimento de fatores de risco cardiovascular para pacientes com doença arterial
coronariana”, constituído por quatro partes distintas:
Perguntas relativas ao grau de conhecimento geral dos fatores de risco na doença
coronária
Perguntas relativas ao grau de conhecimento e presença de fatores de risco
específicos na sua doença coronária
Perguntas relativas ao grau de adesão dos doentes nas mudanças de estilo de vida e
tratamento
Perguntas relativas à adesão dos doentes no manuseamento dos fármacos prescritos.
Este trabalho está estruturado em duas partes. A primeira é dedicada à
fundamentação teórica, de forma a constituir um enquadramento teórico e conceptual,
que integram a problemática da literacia em saúde, a patologia cardíaca e o papel do
enfermeiro. A segunda parte aborda a metodologia utilizada, descrevendo o tipo de
estudo, as variáveis consideradas e a sua operacionalização, o processo de seleção
da amostra, o instrumento de colheita de dados elaborado, o processo de colheita de
dados e os pressupostos éticos considerados bem como as técnicas e medidas
estatísticas utilizadas para o procedimento estatístico, com a interpretação e discussão
dos mesmos, e respetivas conclusões do trabalho, tecendo algumas considerações
que possam motivar para a reflexão dos profissionais empenhados em colaborar com
os doentes com doença coronária. Não se pretende encontrar respostas definitivas e
absolutas, apenas uma reflexão que possa ser aperfeiçoada pela partilha e por outros
estudos que se possam seguir.
No final faz-se referência à bibliografia consultada, e são apresentados os anexos, que
complementam a apresentação do trabalho.
21
1- LITERACIA
Este “rótulo”, entrou no vocabulário português recentemente, para uns tem uma
transparência inquestionável, até invejável, para outros acaba por ser mais um termo,
(Pinto apud Martins, 2005).
No primeiro Estudo Nacional de Literacia, levado a cabo por uma equipa coordenada
por Ana Benavente em 1996, explicava que, se o conceito de alfabetização traduz o
ato de ensinar e de aprender (a leitura, a escrita e o cálculo), o conceito literacia
“traduz a capacidade de usar as competências (ensinadas e aprendidas) de leitura, de
escrita e de cálculo”.
Apesar de ser consensual que o conhecimento relacionado com aspetos de saúde não
é uma condição suficiente para a mudança comportamental, este tipo de
conhecimento é entendido como condição necessária de utilização. O reportório de
conhecimentos
necessário
para
maximizar
a
probabilidade
de
adoção
de
comportamentos saudáveis (nomeadamente, o de adesão terapêutica a novos hábitos
alimentares e de exercício físico) é amplo e complexo. Para além dos conhecimentos
factuais (por exemplo, acerca do que faz mal ou bem para a saúde – o que nem
sempre é consensual mesmo em meio cientifico), a adoção de comportamentos de
saúde implica também um conjunto de competências emocionais, cognitivas e
comportamentais que permitem a utilização desses conhecimentos nos contextos em
que importa serem aplicados (Santos, 2010).
1.1-
Literacia em saúde
"Literacia em saúde representa as habilidades cognitivas e sociais que determinam a
motivação e a capacidade dos indivíduos para ter acesso a, compreender e utilizar a
informação de forma a promover e manter uma boa saúde “ (OMS, 2009).
22
Nesta perspetiva mais abrangente, a alfabetização de saúde é vista como um
resultado da promoção de saúde e os esforços de educação para a saúde como
benefícios pessoais e sociais.
Monteiro (2009) refere que a literacia em saúde inclui a capacidade que os doentes
têm em comunicar com os profissionais de saúde, ler informação médica, tomar
decisões acerca de tratamentos, seguir recomendações médicas e decidir como e
quando procurar ajuda médica. Vários estudos demonstraram que a baixa literacia em
saúde, embora mais prevalente em populações com fracos recursos, afeta pessoas de
todas as idades, raças e estratos económicos.
Para Zarcadoolas apud Santos (2010) sistemas de saúde centrados no doente exigem
um papel ativo por parte dos indivíduos, tornando-os parte integrante dos processos
de tomada de decisão em áreas que tem a ver com a saúde. É assim fundamental
munir o doente com competências para lidar com o sistema de saúde e com a gestão
da sua saúde e doença.
Uma das competências fundamentais passa pelo conhecimento sobre diferentes
aspetos de saúde (e de cuidados de saúde), bem como pela capacidade de utilização
desse conhecimento. Ao nível da literacia em saúde essas competências incluem a
recolha, avaliação e análise da informação, a procura de ajuda, e ainda a capacidade
para se movimentar e negociar dentro do sistema de saúde (Loureiro, 2012).
Rothman et al citados por Santos (2010) referem que os conhecimentos em saúde
fazem parte de um conceito mais abrangente, usualmente referido como literacia em
saúde. Há bastante evidência, em como pessoas com baixa literacia em saúde
(incluindo competência numérica em saúde) têm menor capacidade de compreensão
dos conteúdos em folhetos informativos sobre alimentos ou sobre fármacos, bem
como menos facilidade em movimentar-se no sistema de saúde.
Baixa literacia em saúde é, também a dificuldade dos indivíduos em compreender qual
é o seu estado de saúde e quais são as necessidades de mudança de
comportamentos, planos de tratamentos e de auto-cuidados, podendo relacionar-se
com baixa literacia no geral, baixo nível de conhecimentos sobre saúde ou inibição
resultante do embaraço e medo do ridículo (Teixeira, 2004); relaciona-se igualmente
com perceção de baixa auto-eficácia na prevenção e gestão de problemas de saúde,
bem como com comportamentos ineficazes de saúde: uso inadequado de
23
medicamentos, uso excessivo dos serviços de saúde, ou ineficácia em lidar com
situações de emergência (Zarcadoolas apud Santos, 2010).
Numa meta-analise, Dewalt et al citados por Santos (2010) verificaram que uma baixa
literacia está também associada a maiores taxas de hospitalização, diminuição na
utilização de medidas preventivas, e pobre adesão aos regimes terapêuticos.
Não admira assim que a baixa literacia em saúde tenha sido identificada em diversos
estudos como um fator de risco para diversas patologias nomeadamente as que têm o
comportamento como agente patogénico relevante e que implicam auto-gestão da
patologia, como por exemplo: obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares, cancro,
etc.
1.2-
Literacia na doença cardiovascular
Perante o aumento das doenças cardiovasculares, surgiram soluções relacionadas
com o avanço da tecnologia, tratamentos biomédicos, cirúrgicos e farmacológicos, que
pretendem, não só proporcionar uma cura, mas pelo menos promover situações de
melhorias; a pessoa que vive essa situação de saúde muitas vezes espera respostas
da medicina para melhorar o seu estado. Mas a realidade é diferente, a doença
fornece uma visão geral de cronicidade cardiovascular caracterizada pelo desequilíbrio
e incerteza, onde a pessoa é a grande responsável pela sua saúde. O desafio para
essas pessoas "é a capacidade de cuidar de si, reconhecer e controlar seus sintomas,
aderir a um regime de tratamento muito complexo, e ajustar ou estabelecer novos
comportamentos ou prevenir agudizações da doença” (...). O auto-cuidado, torna-se
assim uma medida promissora e eficaz para prevenir e tratar a doença (Fernandez et
al, 2012).
Existe uma crescente consciência de que a literacia em saúde e saúde estão
fortemente ligadas e como os tratamentos vão-se tornando cada vez mais
diversificados, existe uma maior necessidade de indivíduos com doença arterial
coronária (DAC) para serem alfabetizados (Kilonzo et al, 2011).
Safeer (2006) refere que há evidências de que um melhor conhecimento da sua
condição pode melhorar a adesão do doente às mudanças de estilo de vida e
terapêuticas. Citando Alm-Roijer et al (2004) , aponta correlações estatisticamente
significativas entre o conhecimento dos doentes em geral sobre a doença cardíaca
coronária, fatores de risco e melhorias na perda de peso (p = 0,040), atividade física (p
= 0,005), gestão do stress (p = 0,004), mudanças na dieta (p <0,001), e os objetivos
24
de tratamento de longo alcance para os níveis lipídicos (p = 0,018). O autoconhecimento também foi positivamente relacionado com a adesão às drogas antihipertensivas (p = 0,003).
Adelsward e Sachs citados por Safeer (2006) referem ainda, que muitas doenças
cardiovasculares são doenças de números: leituras de valores de tensão arterial, os
resultados analíticos dos níveis lipídicos e valores de INR (International Normalised
Ratio). Os doentes entendidos serão capazes de perceber como as implicações de
seus resultados podem influenciar a sua adesão à terapêutica. Os números também
podem ser um poderoso motivador para a mudança, especialmente em termos de
doenças "silenciosas" como hipertensão e dislipidemia em que uma pessoa pode não
se sentir doente.
Para haver eficácia, os doentes devem conhecer e entender a
normalidade de valores e perante os seus resultados, saber como estes se desviam
da norma.
Sem um nível de aritmética básica, não se pode identificar quantos comprimidos são
para tomar, quando são agendadas as consultas médicas, e como usar um registo de
números de telefone para chamar um profissional de saúde. Sem a capacidade
aritmética computacional, a determinação da quantidade de sódio de um rótulo de um
determinado alimento é difícil, se não impossível. A matemática analítica permite que
as pessoas compreendam se a tensão arterial ou os níveis de colesterol estão dentro
da normalidade, a necessidade de efetuar rastreios, e a monitorização dos níveis de
açúcar no sangue. Finalmente, o cálculo estatístico de saúde, o maior nível da
numerácia, permite que as pessoas possam decidir sobre os riscos e benefícios de
várias opções de tratamento, como por exemplo, o de fazer angioplastia ou bypass
coronário (Golbeck et al apud Safeer 2006).
Muitos doentes não entendem a melhor maneira de cuidar de si mesmos e prevenir a
doença. Alguns não estão sequer conscientes de que a doença cardíaca é evitável.
A compreensão da doença e o conhecimento geral de como cuidar de si mesmo para
manter a doença controlada são muitas vezes problema em doentes com baixa
literacia em saúde.
Há doentes que admitem não entender o suficiente sobre a sua condição física e a
toma de medicamentos (incluindo a finalidade e possíveis efeitos colaterais) afetando
a sua adesão ao tratamento (Simpson et al citados por Safeer, 2006).
25
Segundo Monteiro (2009), muitos estudos demonstraram que a idade avançada pode
ser uma barreira à literacia em saúde, confirmando um estudo efetuado por Ávila
(2005), sobre literacia em adultos revelando que a relação entre literacia e idade tornase ainda mais nítida, à medida que aumenta a idade diminuem regularmente as
competências de literacia.
Os portugueses constam-se entre os piores informados no que respeita à patologia
cardiovascular. (…) Um dos maiores fatores de risco das doenças cardiovasculares é
a ignorância das populações, Serra e Silva (2009), na carta europeia do coração.
Ávila (2005), no seu estudo sobre a Literacia dos Adultos concluiu que o único domínio
da literacia, em que a vida profissional da maioria dos portugueses parece requerer é
o cálculo. Essa pode mesmo ser uma das razões que justifica que, em Portugal, os
resultados da literacia quantitativa sejam um pouco mais elevados do que os da
literacia documental e em prosa, não só no conjunto da população, mas também na
maioria dos grupos profissionais. Com isto não se está a querer sugerir que as
práticas de cálculo sejam especialmente elevadas, nem especialmente complexas
(uma vez que remetem quase sempre para operações aritméticas simples), mas sim
que a sua utilização no quotidiano profissional torna ainda mais nítida a escassez do
exercício da leitura e da escrita.
O cenário modifica-se um pouco perante situações que remetem para o
relacionamento dos cidadãos com as instituições, ou quando estão em causa cuidados
de saúde. Tarefas como a leitura de folhetos de medicamentos, a leitura de
informação institucional e ainda o preenchimento de formulários, implicam, com maior
frequência, o apoio de terceiros. Neste último caso, perto de 40% dos indivíduos com
reduzidas competências de literacia afirmam necessitar, com alguma frequência, de
ajuda.
Segundo a mesma autora, se a perspetiva adotada for centrada não nos indivíduos e
no plano pessoal, mas antes na sociedade como um todo, os dados analisados ao
longo do estudo permitem avançar um conjunto de fatores históricos e estruturais que
ajudam a perceber o fraco perfil de literacia do país. Meios familiares de origem
extremamente carenciados de habilitações literárias, insuficiente expansão do sistema
de ensino, modos de vida quotidiana pobres em práticas de literacia e tecido
económico e profissional muito pouco qualificado e mesmo desqualificante quanto á
competências de leitura, escrita e cálculo, são alguns dos fatores que convergem na
26
produção dos fracos níveis de literacia encontrados entre a população adulta
portuguesa.
Infelizmente, os dados sobre o nível de literacia em Portugal mantém-se em
concordância com o Estudo Nacional de Literacia de 1994, verificando-se que a maior
parte dos inquiridos situa-se em níveis de literacia baixos ou muito baixos, sendo
bastante reduzidas as percentagens correspondentes aos níveis superiores de
literacia. No Nível 0 situam-se 10,3% dos inquiridos, cujo posicionamento revela a
incapacidade de resolver corretamente qualquer das tarefas. Os Níveis 1 e 2
englobam as maiores percentagens (37,0% e 32,1%, respetivamente). Finalmente, no
Nível 3 localiza-se 12,7% da população e no Nível 4 surge apenas 7,9%. Mais tarde,
em 1998, confirmado através do International Adult Literacy Survey (IALS), o retrato
que emerge quanto à distribuição das competências de literacia na sociedade
portuguesa é bastante negativo: quase metade dos inquiridos revela acentuadas
dificuldades no uso de informação escrita na vida quotidiana (Nível 0 e 1) e apenas
uma minoria se localiza nos níveis mais altos (Níveis 3 e 4).
No entanto, Monte (2011), no seu estudo sobre “Efeito das Habilitações Académicas
no Risco de Doença Cardiovascular de uma População de Alto Risco Cardiovascular
da USF Gualtar” com recurso ao “10 - year risk of cardiovascular disease by
Framingham risk-score”, identificou o valor máximo de risco de DCV (45) encontrado
para o nível correspondente a menos habilitações académicas (nível 1), mas também
para o nível de maiores habilitações (nível 4). Parece existir uma associação inversa
entre habilitações académicas do nível 1, 2 e 3 e risco de DCV, não acontecendo o
mesmo para o nível mais elevado de habilitações académicas (nível 4). A frequência
do ensino superior não parece ser um fator de proteção para os FRCV e
consequentemente para o risco de DCV.
A literacia em saúde varia com o contexto e com o ambiente e não está
necessariamente relacionada com os anos de escolarização ou a capacidade de
leitura. Uma pessoa que “funciona” adequadamente em casa ou no trabalho, pode ter
literacia inadequada num ambiente hospitalar (Monteiro, 2009).
27
2- PATOLOGIA CARDÍACA
As doenças cardiovasculares, nomeadamente os Acidentes Vasculares Cerebrais
(AVC) e a Doença Coronária (DC) ou Doença Isquémica do Coração (DIC), são a
principal causa de mortalidade em Portugal, tal como se verifica em muitos países
ocidentais, sendo considerada, no entanto, das mais elevadas da Europa e do Mundo.
Estas doenças são responsáveis por perto de 50% das mortes ocorridas em 1999 (42
998 num total de 100 252 mortes), contando-se, também, entre as principais causas
de morbilidade, invalidez e anos potenciais de vida perdidos na população portuguesa,
segundo a circular normativa da DGS Nº: 03/DSPCS de 06/02/06.
Estas doenças são, assim, a principal causa de morte em Portugal em ambos os
sexos (39% de todos os óbitos observados em 1999). Observa-se, no entanto, uma
tendência decrescente a nível nacional e em todos os grupos etários, sendo que 52%
destes óbitos correspondem a doenças cerebrovasculares e 22% a doença isquémica
do coração.
Segundo a OECD (2010) as doenças cardiovasculares são a principal causa de
mortalidade em quase todos os países da União Europeia (UE). Juntos, Doença
Isquémica Cardíaca (DIC) e Acidente Vascular Cerebral (AVC) compreendem 60% de
todas as mortes cardiovasculares, e causou um quarto de todas as mortes nos países
da UE em 2008. A DIC sozinha foi responsável por 15% de todas as mortes.
Além da Holanda, os países com as mais baixas taxas de mortalidade por DIC são
quatro, os países localizados no Sul da Europa: França, Portugal, Espanha e Itália.
Isso dá suporte à hipótese comum de que há fatores de risco subjacentes, como a
dieta, que explicam as diferenças de mortalidade por DIC nesses países.
Não são conhecidas causas precisas. Julga-se, pois, que a etiologia destas doenças é
multifactorial, não passível de uma identificação precisa e unívoca.
Trigo et al (2001) refere que neste sentido, o modelo monoetiológico, de cariz médico,
tem vindo a ser substituído por concepções mais complexas, em que se pondera a
ação conjugada de micro- e macro-processos, na manutenção da saúde e na eclosão
da doença.
28
Neste esquema entram em diálogo, por um lado, o sistema nervoso central, o
endócrino, o imunitário e, por outro, o sistema psicológico, social e cultural.
Assim, em termos de causalidade, definiu-se o conceito de fator de risco, para
designar, quer um aspeto do comportamento individual ou do estilo de vida, quer a
exposição ambiental ou uma característica herdada que, com base nos resultados de
estudos epidemiológicos, se sabe estarem associados à ocorrência de uma ou mais
doenças e que, portanto, se julga importante evitar.
O mesmo autor descreve ainda, que, quando falamos em fatores de risco se possam
definir não só diferentes tipos de exposição, mas também diferentes direções do seu
impacto. Quanto aos tipos de exposição ao risco, podemos distinguir, quer os riscos
genéticos (história familiar), constitucionais (sexo) e biológicos (colesterol), quer os
psicológicos (comportamento tipo A), sociais (pobreza) ou psicossociais. Por outro
lado, em relação à direção do impacto destas exposições, devem ser genericamente
concebidas como tendo um sentido bi-direccional – do biofisiológico ao psicossocial e
vice-versa. Contudo, é particularmente elevada a frequência com que as pessoas
estão expostas aos riscos psicossociais (ira, comportamento tipo A, adversidade
social), os quais se traduzem por um aumento na perceção de stress. Esta, por seu
turno, parece ter consequências negativas sobre os mecanismos homeostáticos do
organismo, conduzindo frequentemente à perturbação e à doença (cefaleias, dores
lombares e dorsais, alergias, hipertensão essencial, estados depressivos e ansiosos,
alterações dos sistemas nervoso central, endócrino e imunológico) ou mesmo a
estados de exaustão vital (burnout, esgotamento e episódios agudos de doença).
Em reforço deste argumento é conhecida a íntima relação entre os clássicos fatores
de risco (hipertensão arterial, dislipidémia, diabetes mellitus, sedentarismo, obesidade,
menopausa, hábitos tabágicos e história familiar) e a eclosão da DAC. Esta relação,
por sua vez, depende diretamente de padrões comportamentais e reações emocionais
aprendidas (excetuando o caso da menopausa e da história familiar), os quais se
constituem como estilos de vida regulares em resposta às agressões e pressões do
meio ambiente. Segundo este ponto de vista, os próprios fatores clássicos de risco
resultam, em parte significativa, do comportamento, designadamente dos hábitos
alimentares, onde se inclui o álcool e o tabaco, bem como da atividade física.
Outros riscos para a saúde, em particular para a DAC, não dependem da vontade, da
iniciativa ou da motivação das pessoas expostas. Resultam antes de condições
completamente involuntárias, como sejam a idade, o sexo ou o nível sócio-económico,
29
incluindo-se também neste aspeto a menopausa e a história familiar. Pela
classificação proposta pela 27th Bethesda Conference, citado por Trigo et al (2001),
em que estes riscos são definidos como não modificáveis, a profilaxia ou a redução do
risco está particularmente posta em causa. Por inerência, qualquer medida de
intervenção deverá centrar-se na prevenção da doença nos grupos identificados como
mais vulneráveis, ou na alteração da exposição a outros riscos modificáveis (fatores
clássicos e psicossociais de risco).
2.1-Fatores de Risco (FR)
De acordo com Colombo e Aguillar (1997) os Fatores de Risco (FR) podem ser
classificados em modificáveis e não modificáveis. Os últimos incluem idade, sexo, raça
e história familiar de doença aterosclerótica (hereditariedade). Os FR modificáveis, ou
seja, aqueles sobre os quais o doente e mesmo a equipe de saúde podem atuar, são
dislipidemia,
hipertensão
arterial
(HTA),
diabetes
mellitus
(DM),
tabagismo,
sedentarismo, stress e obesidade.
Aconselha-se a modificação radical dos fatores de risco e do estilo de vida em todos
os doentes após o diagnóstico de doença coronária. A prevenção secundária é
essencial porque a incidência de eventos isquémicos continua a aumentar
significativamente após a fase aguda. A inscrição num programa de reabilitação
cardíaca após a alta poderá ajudar o doente a aderir ao regime terapêutico e contribuir
para a alteração dos fatores de risco, nomeadamente nos que apresentam múltiplos
fatores de risco modificáveis, sendo essenciais para reduzir o risco de reestenose da
artéria revascularizada e a progressão da doença coronária.
Considera-se, Fator de Risco “ uma característica ou um traço de um individuo ou
população que está presente precocemente na vida e associa-se ao aumento do risco
de desenvolver uma doença futura” Pires (2009).
Os estudos epidemiológicos na área da medicina que estudam as possíveis relações
dos vários fatores determinam a frequência e a distribuição da doença. Pollock e
Wilmore (1990) contribuíram bastante para a identificação e o conhecimento de
condicionantes intrínsecas e extrínsecas aos indivíduos com doença coronária.
Condicionantes essas definidas como fatores de risco (FR) para a doença coronárias
podem ser utilizadas como preditores no desenvolvimento do quadro da doença,
30
desempenhando um papel importante na prevenção primária e secundária, American
Heart Association, (1989).
Segundo
as
recomendações
europeias
para
a
prevenção
das
doenças
cardiovasculares (2007), o termo “síndrome metabólica” refere-se a uma combinação
de vários fatores que tendem a agrupar-se – obesidade, hipertensão, colesterol HDL
baixo, triglicerídeos elevados e glicémia elevada – e a provocar um aumento do risco
de diabetes e DCV. Isto significa que, se um componente é identificado, está
recomendada a avaliação sistemática dos restantes em simultâneo com uma
abordagem ativa de gestão de todos estes fatores de risco. A atividade física e o
controlo do peso permitem reduzir significativamente o risco de aparecimento de
diabetes nos indivíduos com síndrome metabólica.
São fundamentais intervenções no estilo de vida, incluem a cessação do tabagismo e
controle rigoroso da tensão arterial, aconselhamento sobre dieta e controle de peso, e
incentivo à atividade física. Estas intervenções terão uma maior possibilidade de
serem implementadas se iniciadas o mais precocemente possível, nomeadamente
durante o internamento.
Abordando os fatores de risco um a um, verifica-se a sua importância na doença
coronária.
Dislipidémia
De entre os fatores de risco modificáveis, a dislipidemia em geral e a
hipercolesterolemia em particular tem uma relação com a doença aterosclerotica bem
demonstrada em numerosos estudos e, no seu controle, uma correspondente redução
das doenças cardiovasculares (Perdigão et al, 2010).
As dislipidemias podem ser primárias ou secundárias. Designam-se como primárias as
dislipidemias de origem genética ou familiar que resultam de perturbações herdadas
que podem ocorrer na síntese, degradação ou remoção das partículas lipoproteicas.
As causas de dislipidemias secundárias são a diabetes mellitus, o hipotiroidismo, o
síndrome de cushing, o síndrome nefrótico, a insuficiência renal, a hepatite e o
alcoolismo (Fernandes, 2011).
O colesterol elevado é o fator de risco mais comum na doença cardiovascular, que
está relacionada com a morte de cerca de 17 milhões de pessoas anualmente (Carta
Europeia do Coração, 2009).
31
Desde
há
algumas
décadas,
múltiplos
estudos,
epidemiológicos,
clínicos,
anatomopatológicos e de experimentação animal, confirmam a importância dos níveis
plasmáticos elevados de colesterol e, mais especificamente, do colesterol das LDL, na
etiologia da aterosclerose, e portanto, existindo uma forte relação entre os níveis de
colesterol e a morte por doença coronária.
Peritos em cardiologia preventiva estabeleceram que, em termos fisiológicos, os níveis
de colesterol normais encontram-se entre 140 a 180 mg/dl (3.6 a 4.7 mmol/L).
Estes níveis agravam-se com a idade ou em indivíduos que apresentem outros fatores
de risco como o tabaco, diabetes ou hipertensão. Pesquisas efetuadas com seres
humanos demonstraram que uma dieta rica em colesterol promove enfarte do
miocárdio,
bem
como
constitui
em
si,
um
grande
perigo
para
a
saúde
independentemente do seu efeito em termos de colesterol no sangue. No caso de
existir uma elevação de colesterol no sangue o risco aumenta uma vez que o
colesterol é o maior componente das placas que se formam nas paredes das artérias.
O impacto que os níveis de colesterol podem ter em termos do desenvolvimento ou
reincidência da doença coronária é normalmente analisado pela relação existente
entre o colesterol total e as proporções de LDL e HDL, sendo este o indicador
individual de risco (Pires, 2009).
Citando Byrne e Leren (1991), o mesmo autor refere ainda que, os estudos realizados
com indivíduos em fase de reabilitação, indica que a diminuição do colesterol sérico
reduz os riscos de reincidência, abrandando a progressão de doença coronária. A
aplicação de dietas específicas em conjugação com a ausência do tabaco pode
resultar numa diminuição de 47% dos enfartes do miocárdio.
Segundo as recomendações da ESC/EAS para a abordagem clínica das dislipidemias
(2011), o metabolismo lipídico pode estar alterado de várias maneiras, levando a
alterações na função e/ou níveis das lipoproteínas plasmáticas. Este facto, por si só e
através da interação com outros fatores de risco cardiovasculares, pode condicionar o
desenvolvimento da aterosclerose.
As dislipidemias abrangem um largo espectro de anomalias lipídicas, algumas das
quais são de grande importância na prevenção da DCV. A elevação do colesterol total
(CT) e do colesterol das lipoproteínas de baixa densidade (C-LDL) recebeu a maior
parte das atenções, particularmente porque pode ser modificada com alterações do
estilo de vida e da terapêutica medicamentosa.
32
Os triglicéridos, outro tipo de lípidos são os que resultam fundamentalmente da
ingestão alimentar e compõem 95% dos lípidos do tecido adiposo, sendo também
partes essenciais das lipoproteinas VLDL e QM. No que respeita às funções que
desempenham no organismo, os triglicéridos são fontes energéticas através dos seus
ácidos gordos.
Segundo as recomendações portuguesas para a prevenção primária e secundária da
aterosclerose (2009), a relação entre o colesterol total (CT), o colesterol das LDL (CLDL) e das HDL (C-HDL) e a doença aterosclerótica assenta em bases científicas
inquestionáveis. A doença aterosclerótica pressupõe a deposição de colesterol da
parede arterial, no espaço subendotelial, pelo que pode afirmar-se que o colesterol e o
“principal” fator de risco pois, sem esse mecanismo, não há aterosclerose. Os
triglicéridos (TG) estão também relacionados com um maior risco de doença coronária,
no entanto, particularidades metabólicas, que os relacionam com outros fatores e
marcadores de risco, têm dificultado a compreensão do seu papel na doença
cardiovascular aterosclerótica, tornando menos enfáticas as respetivas indicações
terapêuticas.
O perfil lipídico deve incluir obrigatoriamente o doseamento do colesterol total, do CHDL e dos triglicéridos, após o cumprimento de um jejum de 12 horas.
Com base nestes valores pode determinar-se o C-LDL e o índice aterogénico, que
corresponde à relação CT/C-HDL. Este índice tem um relevante significado prático,
pois, com exceção dos doentes em prevenção secundaria, com história familiar de
risco cardiovascular precoce ou com evidência de aterosclerose subclínica, os
indivíduos que apresentem uma relação CT/C-HDL < 5 não necessitam de tratamento
farmacológico.
Hipertensão Arterial
A hipertensão arterial (HTA) constitui um dos maiores e atuais problemas de saúde
pública, sendo a doença cardiovascular mais comum e o fator de risco mais
significativo no desenvolvimento da doença aterosclerótica cerebral e coronária,
representa inúmeras complicações nomeadamente tromboses, acidentes vasculares
cerebrais, enfartes do miocárdio, angina de peito, problemas renais e perda gradual de
visão, entre outros. A hipertensão arterial (HTA) obriga o coração a exercer mais força
para conseguir levar o sangue arterial a todo o corpo. Este esforço leva a um aumento
do músculo cardíaco (hipertrofia) e à dilatação do coração. Como consequência o
33
coração deixa de ser capaz de bombear o sangue necessário ao organismo e mesmo
ao músculo cardíaco, podendo originar angina de peito (Pires, 2009).
Segundo Perdigão (2010), a prevalência da HTA em Portugal Continental, em
indivíduos com mais de 18 anos, verificada no Inquérito Nacional de Saúde de
2005/2006, foi de 20%. No estudo AMALIA (2008), a prevalência da HTA referida
pelos 38.893 indivíduos inquiridos e que expressam uma amostra representativa da
população portuguesa com idade igual ou superior a 40 anos, foi de 23,5%.
Quando as medidas não farmacológicas são insuficientes há que recorrer aos
fármacos, no entanto, dever-se-á ter presente que os fármacos não curam a
hipertensão, somente a controlam. Assim, uma vez iniciado o tratamento
medicamentoso deverá, em princípio, ser continuado e mantido por toda a vida. Os
objetivos da terapêutica farmacológica são controlar a pressão arterial com o menor
número e a menor dose de fármacos e também prevenir a incidência das
complicações cardiovasculares causadas pela hipertensão arterial (Pires, 2009).
Segundo as recomendações de 2007 para o Tratamento da Hipertensão Arterial, em
doentes que sobrevivem a um enfarte do miocárdio, a administração precoce de antihipertensores reduz a incidência de recorrência de enfarte recorrente do miocárdio e a
mortalidade. Estes efeitos benéficos podem ser atribuídos às propriedades protetoras
específicas destes fármacos, mas também possivelmente à pequena redução da
pressão arterial associada. O tratamento anti-hipertensor é também benéfico nos
doentes hipertensos com doença coronária crónica.
O objetivo da terapêutica em termos tensionais deverá ser o de obter valores iguais ou
inferiores a 140/90 mm Hg, embora nos indivíduos idosos se possam aceitar valores
um pouco mais elevados.
Podemos referir que a HTA é conhecida como “doença silenciosa”, por não apresentar
sintomas. Assim sendo, a única forma de saber se tem hipertensão é a avaliação da
pressão arterial. Esta deve ser controlada mais precocemente em indivíduos obesos,
diabéticos, fumadores ou com história de doença cardiovascular na família.
Vários estudos têm vindo a evidenciar que mudanças de alguns estilos de vida, como
o exercício físico e a perda de peso são de grande importância na diminuição dos
valores da pressão arterial (Gaziano apud Pires, 2009).
34
Diabetes Mellitus
Segundo
as
recomendações
relativas
a
diabetes,
pré-diabetes
e
doenças
cardiovasculares (2007), a diabetes e as doenças cardiovasculares surgem
frequentemente como os dois lados de uma mesma moeda: a diabetes mellitus (DM)
foi considerada como equivalente a doença das artérias coronárias e, inversamente,
muitos doentes diagnosticados com doença das artérias coronárias sofrem igualmente
de diabetes ou das suas alterações percursoras. A diabetes é considerada um dos
fatores de risco para a doença coronária.
Para Duarte apud Pires (2009), a sua combatividade faz-se notar quando se constata
que os indivíduos jovens com doença coronária são muito frequentemente diabéticos.
Citando agora Ridker (2003) a pessoa diabética tem um risco acrescido de morbilidade
e mortalidade, sendo que 75% de todas as mortes entre as pessoas diabéticas
resultam de DC. Este facto poderá ter relação direta com outros fatores de risco que
estão associados à diabetes.
Segundo
as
recomendações
relativas
a
diabetes,
pré-diabetes
e
doenças
cardiovasculares (2007), a diabetes não tem uma definição única. É uma doença
crónica complexa, que se caracteriza por uma perturbação metabólica caracterizada
por hiperglicemia crónica com perturbação do metabolismo dos hidratos de carbono,
gorduras e proteínas, que resulta da secreção ou ação deficitárias da insulina, ou
ambas. A diabetes tipo 1 deve-se essencialmente à ausência de produção endógena
de insulina pancreática, enquanto na diabetes tipo 2 o aumento de glicemia resulta de
processos mais complexos. Tradicionalmente, a diabetes era diagnosticada com base
em sintomas devidos a hiperglicemia, mas nas últimas décadas a tónica tem sido
colocada na necessidade de identificar a diabetes e outras formas de alterações da
glicose em indivíduos assintomáticos.
Segundo Carneiro (2004), citando vários autores, a doença coronária constitui uma
causa major de mortalidade em diabéticos, expressa – entre outros – pelos seguintes
factos objetivos:
• Quando comparados com doentes não-diabéticos, os diabéticos apresentam uma
incidência superior de doença coronária – DC (55%), um quadro isquémico mais grave
e uma taxa superior de isquemia silenciosa;
35
• Estudos epidemiológicos confirmam que a presença de diabetes duplica a taxa de
mortalidade, mesmo após ajustes para outros fatores de risco cardiovascular, quer na
DM tipo I como tipo II;
• A extensão e a gravidade da doença coronária em diabéticos são superiores aos não
diabéticos, com taxa superior de doença multivaso;
• O risco de enfarte agudo do miocárdio (EAM) é superior nos diabéticos, sendo que a
presença de DM só por si coloca os doentes no grupo de alto risco para DC;
• As complicações pós-EAM são mais frequentes em doentes diabéticos, com taxas
superiores de angina e insuficiência cardíaca;
• Existe uma relação linear entre a intolerância à glucose e a incidência de eventos
cardiovasculares.
A causa de morte mais comum em adultos europeus com diabetes é a doença das
artérias coronárias (DAC). O risco de DAC que apresentam é duas a três vezes
superiores ao de indivíduos sem diabetes. A combinação de diabetes tipo 2 e DAC
prévia identifica doentes com risco especialmente elevado de mortalidade coronária.
Doentes com Síndromes Coronárias Agudas (SCA) e diabetes mellitus concomitante
enfrentam um risco elevado de complicações. A sua mortalidade absoluta é elevada,
correspondendo a 7-18% ao fim de 30 dias e 15-34% ao fim de 1 ano, e o risco
relativo ajustado de mortalidade varia entre 1,3 e 5,4, sendo ligeiramente superior nas
mulheres do que nos homens, o que é revelador da importância do papel
desempenhado pelas alterações gluco-metabólicas.
Os doentes com diabetes apresentam mortalidade e morbilidade mais elevadas após
cirurgia de bypass (CABG) ou em doentes sujeitos a intervenções coronárias
percutâneas (ICP) do que os não diabéticos (Recomendações relativas a diabetes,
pré-diabetes e doenças cardiovasculares, 2007).
Tabagismo
Para Pires (2009), o tabaco contém substâncias, das quais grande parte tem efeitos
nefastos em diversos aparelhos e sistemas do corpo humano. Neste conjunto
evidenciam-se pela importância dos seus efeitos: a Nicotina, o Alcatrão e o Monóxido
de Carbono. A nicotina é um alcalóide e é o principal responsável pela grande
dependência dos seus consumidores. Esta substância provoca um aumento do
36
trabalho cardíaco e, simultaneamente provoca a diminuição do calibre dos vasos
reduzindo a chegada de sangue em quantidades necessárias para o bom
funcionamento cardíaco. Os enfartes do miocárdio resultam desta carência de sangue
e oxigénio nas células do miocárdio.
A nicotina é também responsável por um aumento da capacidade de coagulação do
sangue, podendo originar a formação espontânea de coágulos (ou trombos).
O monóxido de carbono é um gás e a sua ação exerce-se pela diminuição de
transporte de oxigénio pelo sangue.
A incidência de enfarte do miocárdio aumenta seis vezes nas mulheres e três vezes
nos homens que fumam pelo menos 20 cigarros por dia (em comparação com os
indivíduos que nunca fumaram) segundo as recomendações portuguesas para a
prevenção primária e secundária da aterosclerose (2009).
Vários investigadores referem que os fumadores sofrem um aumento dos níveis de
fibrinogénio no plasma e como consequência é aumentada a probabilidade de
isquémia silenciosa e de arritmias (Barry, et al citados por Pires, 2009). O coração é
um dos principais órgãos atingidos pelo tabaco. A Organização Mundial de Saúde
desde 1985 que indica que um quarto das doenças cardiovasculares é provocado pelo
uso do tabaco e que, entre os 45 e os 54 anos, a mortalidade dos fumadores por
enfarte é tripla em relação à dos não fumadores.
A carta europeia do coração (2009) refere igualmente que os fumadores têm, em
média, menos dez anos de vida do que os não fumadores. O tabaco é responsável por
20% da mortalidade por doença coronária.
Sedentarismo
Segundo as recomendações portuguesas para a prevenção primária e secundária da
aterosclerose (2009) a epidemia de sedentarismo crescente das populações nas
últimas décadas, por ser contrária à natureza humana, dificulta a expressão de genes
protetores, os quais só se conseguem exprimir em contextos de maior atividade.
Surgem assim as doenças hipocinéticas, de que a aterosclerose e seus fatores de
risco são exemplos,
O sedentarismo revela-se como o fator de risco com maior prevalência, na aquisição
de doenças cardiovasculares, independentemente do sexo. É evidente a importância
37
de se adotar um estilo de vida ativo que, de alguma forma, também ajude a controlar e
a diminuir outros fatores de risco como a obesidade (Gaspar, 2004).
Rocha (2012) reforça a ideia sobre os perigos da inatividade física, a que é atribuída
6% da carga da doença coronária, 7% da carga da diabetes tipo 2 e um em cada 10
cancros da mama e do colon. A inatividade física, em 2009, foi inclusivamente
identificada como o quarto fator de risco das doenças não transmissíveis.
Gaspar (2004) refere ainda que, a inatividade física reduz a normal e fisiológica
circulação sanguínea porque os músculos não exercem o seu importante papel
(contração muscular) que permite o retorno venoso. Ao comprometer o trabalho
conjunto dos músculos e das válvulas venosas, a inatividade atrasa o retorno venoso e
favorece a formação de trombos (massa de plaquetas, globos brancos, vermelhos, e
fibrina). Por sua vez, os trombos são responsáveis por muitos dos distúrbios
cardiovasculares mais graves, onde se destacam a doença cardíaca isquémica e os
acidentes vasculares cerebrais isquémicos.
Entre os fatores predisponentes para a formação de trombos encontram-se, para além
das perturbações da circulação sanguínea, o stress hemodinâmico, as lesões na
parede interna dos vasos sanguíneos (íntima), e a hipertensão arterial.
Apenas meia hora de exercício físico por dia pode levar a um decréscimo de 50% dos
riscos de se contrair uma doença cardíaca, diabetes e obesidade. Assim, por exemplo,
uma pequena quantidade de atividade física pode influenciar positivamente o sistema
fibrinolítico, reduzindo o risco de problemas cardíacos. Porém, se aumentarmos a
quantidade ou intensidade da atividade física podemos, para além disso, fortalecer o
miocárdio e melhorar a aptidão cardíaca e hipóteses de sobreviver a um ataque
cardíaco.
Obesidade
A obesidade é um estado, que se desenvolve sempre que existe um balanço positivo
de energia; em alguns casos porque a energia ingerida é superior à despendida e
noutros por excesso de ingestão alimentar (de calorias, sódio, gorduras e álcool,
doces e açúcar), ou por incapacidade do organismo se adaptar à energia (Pires,
2009).
38
Também a Organização Mundial de Saúde (2005), refere a obesidade como uma
doença em que o excesso de gordura corporal acumulada pode atingir graus capazes
de afetar a saúde.
A prevalência da obesidade, a nível mundial, é tão elevada que a OMS considerou
esta doença como a epidemia global do século XXI. Diz ainda que, neste século a
obesidade tem uma prevalência igual ou superior à da desnutrição e das doenças
infeciosas; e que a não serem tomadas medidas para prevenir e tratar a obesidade,
mais de 50% da população mundial será obesa em 2025.
A prevalência da pré-obesidade e da obesidade na população portuguesa adulta tem
sido avaliada através do Índice de Massa Corporal (IMC), com uma prevalência média
de cerca de 34% para a pré-obesidade e de 12% para a obesidade, sendo de realçar a
grande percentagem de homens com pré-obesidade e obesidade, em relação às
mulheres (Programa de combate à obesidade, 2005).
A população portuguesa, avaliada em idade pediátrica dos 6 aos 18 anos e na idade
adulta dos 18 aos 65 anos apresenta cerca de um terço de crianças e jovens e cerca
de metade da população adulta com peso excessivo, incluindo obesidade e préobesidade segundo estudos da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade,
da Faculdade de Antropologia da Universidade de Coimbra, da Escola Nacional de
Saúde Pública e da Childhood Obesity Surveillance Initiative, divulgados pela
Direcção-Geral da Saúde em 2011.
O peso excessivo pode ser um fator que traz prejuízos para a saúde. Está
comprovado cientificamente, através de estudos epidemiológicos e clínicos, que o
peso excessivo, e particularmente quando atinge o grau II de obesidade, é um
importante fator de risco para a diabetes tipo 2 (cerca de 80% dos doentes diabéticos
tipo 2 tem excesso de peso), de hipertensão arterial e outras doenças
cardiovasculares, de doenças osteo-articulares e mesmo de alguns tipos de cancro.
Pires (2009), citando vários autores, refere que no estudo Framigham, verificou-se que
as pessoas com excesso de peso (mais de 20% do peso considerado normal),
apresentam uma taxa de mortalidade, relacionada com a doença coronária, duas
vezes e meia maior, comparada com pessoas de peso normal.
Em relação a vários destes fatores de risco persiste um desconhecimento estrutural na
população, pouco preparada para assumir a sua quota-parte de responsabilidade na
defesa da sua própria saúde. A nossa população, na sua maior parte, ingere cinco
39
vezes mais sal do que devia, come gordura em quantidades enormes, usa e abusa do
açúcar, tem peso para além do desejável e por vezes, clara obesidade, não
encontrando motivação ou condições para fazer exercício (Madeira, 2009) in destaque
da SPC sobre a Carta Europeia do Coração.
Stress
Nos nossos dias está comprovada a correlação entre emoção, razão e corpo físico
(psicossomática). Uma outra conceção ainda mais abrangente combina uma visão da
doença assente numa dinâmica de fatores originários da interação do corpo com a
mente que engloba uma dimensão ecológica e social da mesma (doença
sociossomática) (Recomendações portuguesas para a prevenção primária e
secundária da aterosclerose, 2009).
Segundo Carlos Manso (1987) o stress é a resposta generalizada inespecífica,
induzida por estímulos físicos, sociais e psicológicos vulnerabilizantes.
Define-se então, o stress por um conjunto complexo de acontecimentos presentes no
ambiente com os quais a pessoa interage. Estes acontecimentos põem em jogo
perícias individuais de adaptação que, por fim, são invertidas em respostas fisiológicas
construtivas ou destrutivas (Pires, 2009).
Segundo Nogueira (2010), stress pode ser definido como um conjunto de fatores
externos ou ambientais aos quais as pessoas estão expostas e a reação
comportamental ou biológica a estes. O stress psicossocial pode ser definido como um
evento psicossocial com consequências fisiopatológicas.
Pires (2009) considera stress agudo, situações em que a atuação biológicocomportamental induzida pelo estímulo provocador do stress se manifesta
rapidamente e dura pouco tempo, com retorno às condições basais.
Nogueira (2010) descreve ainda, que em situações de stress agudo, a ativação do
sistema nervoso simpático medeia o aumento da frequência e do débito cardíaco e da
pressão arterial condicionando uma maior turbulência junto de lesões ateroscleróticas
obstrutivas e com isso um maior stress hemodinâmico que pode influenciar a
estabilidade da placa de ateroma. Os doentes que tiveram como precipitante no
evento cardíaco um fator emocional, parecem ter respostas biológicas prolongadas e
mais intensas a esse tipo de estímulos. Se essa resposta coincide com lesão da placa
aterosclerótica pode resultar no aparecimento de uma SCA.
40
Enquanto, o stress agudo pode causar manifestações de doença coronária em
indivíduos que têm já patologia aterosclerótica de base mais ou menos intensa, o
stress crónico o stress psicossocial pode iniciar a DCV (Nogueira, 2010). Também, o
stress favorece os comportamentos de adição e influencia os comportamentos de risco
na doença cardiovascular (tabagismo, obesidade, sedentarismo, etc.).
Segundo as recomendações portuguesas para a prevenção primária e secundária da
aterosclerose (2009), um qualquer episódio de doença cardiovascular é, também ele,
um fator de stress adicional importante para todas as pessoas e para as suas famílias;
o stress e os diversos processos mentais associados alicerçam a adesão à terapêutica
e determinam o envolvimento na prevenção e reabilitação cardiovascular.
Depressão
A depressão é uma síndrome, que se traduz pela expressão verbal e não-verbal de
sentimentos tristes, muitas vezes acompanhada de ansiedade, irritação, ou mesmo
cólera. A OMS classifica a depressão como uma das doenças emergentes a nível
mundial.
Segundo Esteves (2010), a depressão constitui um fator de risco independente para o
desenvolvimento de doença coronária em pessoas saudáveis e pode mesmo
despoletar síndromes coronárias agudas, tendo ainda um impacto negativo no
prognóstico. Para Nogueira (2010) a prevalência de depressão major ao longo da vida
é de 16,2%. Em indivíduos com patologias de outro foro orgânico, esse valor sobe
para 20-50% e para os sintomas depressivos moderados esta percentagem é ainda
maior. Muitas vezes ocorre de forma insidiosa, levando a que a pessoa não distinga a
situação como doença mas sim como parte da sua própria personalidade.
Rugulies et al apud Nogueira (2010) publicaram uma metanálise de 11 estudos
prospetivos de indivíduos assintomáticos onde se observou um RR (Relative Risk) de
1,49 (CI 95% 1,16-1,92) de doença coronária na presença de sintomas depressivos,
aumentando este valor para 2,69 (CI 95% 1,63-4,43) no caso de depressão
clinicamente diagnosticada. Isto sugere uma associação “dose resposta” entre
depressão e SCA. Neste estudo os autores mostraram que quanto maiores os scores
de sintomas depressivos, maior a frequência, gravidade e precocidade de eventos
cardíacos. De notar que indivíduos com patologia depressiva, mesmo que ligeira,
tinham maior probabilidade de desenvolver doença cardíaca isquémica do que
aqueles sem essa sintomatologia. Esse aumento de risco era independente de fatores
41
de risco convencionais, o que aponta para a depressão como fator de risco primário
para o desenvolvimento de patologia coronária com manifestações clínicas.
A depressão também tem impacto negativo no prognóstico da DC, influenciando a
mortalidade cardíaca e total, a ocorrência de eventos cardíacos adversos, a
necessidade de procedimentos cirúrgicos de revascularização e ainda a capacidade
funcional e a qualidade de vida do doente (Esteves, 2010).
Acresce, infelizmente, que muitas pessoas têm, não apenas um, mas dois ou mais
fatores de risco, os quais se potenciam na agressão ao aparelho cardiovascular, Hugo
Madeira (2009) em Carta Europeia do Coração.
Idade e Sexo
Pires (2010) refere que a idade e o sexo são dois fatores de risco, sobre os quais
ainda não há muita informação.
Relativamente à idade, a causa deve-se ao processo de envelhecimento e
consequente endurecimento progressivo das artérias, denominado por arteriosclerose,
por isso, em todos os estudos realizados até à data observou-se que a doença
coronária, seja qual for a sua manifestação, é muito rara abaixo dos trinta e cinco anos
de idade. A partir deste momento, a frequência de aparecimento vai aumentando
progressivamente.
A relação de frequência de aparecimento da doença entre homens e mulheres é de 6
a 1 antes dos cinquenta, já que os estrogénios (hormonas femininas) possuem um
papel protetor das artérias coronárias. Após a menopausa, a incidência desta doença
aumenta nas mulheres devido a uma diminuição, normal, das ditas hormonas. Assim
sendo existe um retardamento de dez a quinze anos no aparecimento de doença
coronária comparativamente com os homens.
A diminuição dos níveis de estrogénio durante o processo de menopausa, que começa
por volta dos 50 anos, está associada a maiores níveis de lipoproteína de alta
densidade (HDL) e baixos níveis de lipoproteína de baixa densidade (LDL). De acordo
com Ferreira (2012), a diminuição do estrogénio natural que ocorre na menopausa
leva a um menor HDL e maior LDL aumentando assim o risco de doença cardíaca.
42
Hereditariedade
Segundo Tavares (2008), o reconhecimento da natureza familiar da DC tem ganho
preponderância ao longo dos anos. O final da década de 1970 e início da década de
1980 testemunharam a emergência dos primeiros grandes estudos da potencial
utilidade clínica da história familiar. O aumento do risco de morte cardiovascular em
homens jovens com história familiar de DC é de 5 vezes mais, independente dos
principais fatores de risco, sustentando a ideia de que fatores hereditários são
determinantes importantes.
Para Pires (2009), a hereditariedade representa igualmente outro fator de risco para a
aterosclerose e para a doença coronária. Em certas famílias, muitas pessoas
apresentam angina de peito, enfarte, morte súbita ou acidente vascular cerebral, em
idades bastante jovens. Esta tendência familiar pode resultar da transmissão
hereditária de uma suscetibilidade essencial para o desenvolvimento das lesões
arteriais;
da
transmissão
hereditária
dos
fatores
de
risco,
tais
como
hipercolesterolémia ou hipertensão; da influência do meio ambiente sobre os hábitos e
sobre o comportamento das crianças.
Em relação à história familiar, constata-se que os descendentes em primeiro grau de
pessoas com doença coronária prematura (antes dos 50 anos nos homens e dos 65
nas mulheres) têm um maior risco cardiovascular, considerando o risco tanto mais
significativo quanto mais precoce é a ocorrência de enfarte do miocárdio nos
familiares, idem.
Outros fatores determinantes
Outros há que, embora indiretamente, influenciam a saúde cardiovascular. Estão neste
caso o rendimento disponível nas famílias, a educação, as condições de vida e de
trabalho, pois que são as populações que vivem em piores condições socioeconómicas as mais afetadas pela doença cardiovascular (Carta Europeia do
Coração, 2009).
Segundo Perdigão (2011), apesar das taxas de mortalidade cardiovascular que variam
com a idade, sexo, condição sócio-económica, etnia e região geográfica tenham vindo
a diminuir de modo consistente, nas últimas décadas, em Portugal e na Europa
Ocidental, só recentemente diminuíram nos países da Europa Central e de Leste. Para
esta evolução têm contribuído tanto as alterações dos estilos de vida que se
43
relacionam com os fatores de risco convencionais, tais como tabagismo, pressão
arterial e colesterol, como as terapêuticas médicas baseadas na evidência.
A abordagem das questões inerentes à promoção de estilos de vida saudáveis e
ativos deve implicar, desde logo, uma reflexão acerca do significado desta expressão
tão comummente utilizada. De acordo com a Organização Mundial de Saúde a
expressão estilo de vida remete para o agregado de decisões individuais que afetam a
vida (e a saúde) do indivíduo, e que dependem dele. Esta componente de decisão
individual é fundamental, salientando-se paradigma da escolha em comportamentos
de saúde (Silva, 2012).
Para Teixeira (2011), segundo uma perspetiva popular no estudo e promoção de
comportamentos ligados a saúde, o ser humano é orientado e impelido para agir
essencialmente em função de metas e benefícios antecipados, da auto-avaliacão das
suas próprias capacidades para as atingir, e da eficácia da sua função executiva, a
que vulgarmente se designa “forca de vontade”. E sabe-se quanto isto pode ser difícil
em doentes polimedicados, com dificuldades económicas e muitas vezes pouco
informados sobre os objetivos e benefícios da prevenção (Perdigão, 2009).
2.2-Adesão terapêutica
Em instituições hospitalares, aproximadamente 100% dos doentes cumprem o regime
terapêutico prescrito. Apesar do referido regime se mostrar na maioria dos casos
(cerca de 90%) adequado e eficaz e de contribuir para o alívio da sintomatologia,
quando regressam a casa, muitos doentes deixam de seguir o tratamento
recomendado (Dunbar-Jacob e Mortimer-Stephens apud Dias et al 2011).
Para Cardoso (2010), a adesão terapêutica assume um papel de particular importância
nos indivíduos portadores de doenças crónicas e tem vindo a merecer grande atenção
por parte da comunidade científica pelo impacto na qualidade da saúde das
populações, através da eliminação de comportamentos de risco, difusão de meios de
prevenção e a adoção de comportamentos de saúde a par dos avanços, na
terapêutica.
Antunes (2011) de acordo com vários autores, cita que na atualidade, as reduzidas
taxas de adesão aos tratamentos de longo prazo, constituem um dos grandes
problemas de saúde no mundo, atendendo à elevada prevalência de doenças crónicas
44
e têm vindo a ocupar um lugar cada vez mais importante nas preocupações dos
profissionais de saúde, particularmente dos enfermeiros, bem como, dos doentes e
famílias, ao percecionarem as graves repercussões da não adesão, quer ao nível
pessoal, como social e económico. Este fenómeno afeta cerca de 50% dos indivíduos
nos países mais desenvolvidos e esta percentagem é ainda maior nos países em
desenvolvimento, contribuindo significativamente para o aumento de hospitalizações,
diminuição da qualidade de vida e consequente aumento da morbilidade e
mortalidade.
Cardoso (2010), de acordo com vários autores, refere que as consequências da não
adesão terapêutica incluem resultados desfavoráveis nos indicadores de saúde, ao
interferir negativamente no tratamento das doenças crónicas, com repercussões na
sua incidência e prevalência e na utilização e otimização dos recursos do sistema de
saúde representando assim um importante problema de saúde pública.
Segundo o mesmo autor e de acordo com as Guidelines da Sociedade Europeia de
Cardiologia e da Associação Americana de Cardiologia, o prognóstico da doença
coronária depende, não somente da terapêutica farmacológica, como também de
aspetos não farmacológicos, nomeadamente alteração do estilo de vida (alimentação
saudável, perda de peso, restrição de sal, exercício físico, cessação tabágica e
limitação na ingestão de bebidas alcoólicas).
No contexto das doenças cardiovasculares a adesão é fundamental para o sucesso da
terapêutica proposta pois dela depende a cura, o controle e prevenção da doença. A
não adesão à terapêutica e às medidas não farmacológicas diminui a eficácia do
tratamento e expõe o indivíduo à instabilidade clínica o que pode levar para a
recorrência ou agravamento dos sintomas da doença coronária (Van Der Wal; Lunelli;
e Santos apud Cardoso 2010).
A Organização Mundial de Saúde (OMS) define adesão à terapêutica de longa
duração “(…) como o grau de coincidência do comportamento de um indivíduo - toma
da medicação, seguimento da dieta ou alterações do estilo de vida - com as
recomendações acordadas com os profissionais de saúde (…)” esta definição é
reforçada e citada por vários autores que defendem o papel ativo do doente e a
importância da existência de concordância deste com os profissionais de saúde (Lima;
Soler; Meiners apud Antunes, 2011).
45
Gama
(2010),
diz
que
conceitualmente,
o
não
seguimento
ao
tratamento
medicamentoso precisa ser assumido, como um problema de múltiplas dimensões,
pois vários fatores podem estar envolvidos, como: características sócio-demográficas
(idade, escolaridade e nível socioeconómico); doenças (cronicidade, sintomatologia);
crenças, hábitos culturais e de vida; tratamento (custo, reações indesejáveis,
esquemas complexos); instituição (acesso, atendimento) e o relacionamento com os
profissionais de saúde.
O conceito de não adesão terapêutica ocorre então quando se verifica um desvio do
comportamento do doente em relação às recomendações do profissional de saúde.
Este desvio não se refere apenas à medicação prescrita, mas inclui também o não
seguimento das indicações relacionadas com hábitos de saúde e estilos de vida
saudáveis, a não comparecência nas consultas médicas, ou a não realização de
exames de diagnóstico, (Antunes, 2011). A não adesão terapêutica pode ser
considerada como um processo ativo, intencional, em que o doente toma
conscientemente a opção de não cumprir o regime terapêutico, ou não intencional, no
caso de ser devido a descuido ou negligência por parte do doente, não cumprindo
assim o tratamento, omitindo doses e horários, idem.
Nesta perspetiva, a adesão é vista como uma alternativa, em que o indivíduo tem
liberdade de escolha e assume a responsabilidade sobre o seu tratamento. Neste
processo de tomada de decisão estão presentes conceitos de concordância,
cooperação e parceria entre doente e profissional de saúde (Machado, 2009).
Maia (2008) de acordo com vários autores refere que, este fenómeno constitui um
problema da prática clínica diária de enorme complexidade, que durante bastante
tempo foi negligenciado, mas que atualmente, devido ao seu impacto negativo no
sistema de saúde e pelas suas implicações económicas e sociais, tem vindo a ser alvo
de uma crescente atenção da comunidade científica, dos profissionais de saúde, de
políticos e dirigentes.
Bugalho e Carneiro (2004) advogam que, a não adesão terapêutica afeta os esforços
terapêuticos, diminuindo os benefícios clínicos da medicação e aumentando a
utilização desnecessária de meios de diagnóstico e tratamentos. Na perspetiva destes
autores, a falta de um controlo efetivo da terapêutica em qualquer doença, leva a
custos diretos três a quatro vezes superiores aos custos decorrentes de um controlo
eficaz e a custos indiretos (por diminuição da produtividade, reforma antecipada e
morte) igualmente significativos. De modo que, intervenções para melhorar a adesão
46
terapêutica beneficiam o sistema de saúde e consequentemente contribuem para a
melhoria da saúde da população.
O seguimento do tratamento medicamentoso e a educação em saúde são questões
indissociáveis.2 A doença cardiovascular assume atualmente uma importância única
na sociedade, na medida em que se assume como uma das principais causas de
morte e de morbilidade na Europa e no Mundo.
Em alguns países da União Europeia a mortalidade por doença coronária representa
cerca de 65% de toda a mortalidade. De acordo com a WHO (2011), em 2030, caso se
mantenham as mesmas condições, morrerão 23,3 milhões de pessoas devido a
alguma forma da doença cardiovascular, este aumento será mais evidente nos países
mediterrâneos.
2.3-Doença Coronária
A patologia cardíaca é de um modo geral, o conjunto de doenças que afetam o
aparelho cardiovascular, designadamente o coração e os vasos sanguíneos, neste
caso concreto, aborda-se a doença coronária.
Para Carneiro (2011), Doença Coronária (DC) é o termo habitualmente utilizado para
descrever a acumulação de depósitos de gordura e de tecido fibroso (placas) no
interior das artérias que fornecem sangue ao coração, ou seja, as artérias coronárias.
Esta formação de placas nas artérias coronárias é denominada de aterosclerose
coronária e pode levar a que estes vasos sanguíneos se tornem significativamente
mais estreitos. Em consequência, verifica-se uma diminuição do fornecimento de
sangue a determinadas zonas do músculo cardíaco, o que desencadeia um tipo de dor
no tórax designado por angina de peito. A aterosclerose pode igualmente conduzir à
formação de um coágulo de sangue dentro de uma artéria coronária estreitada. Este
evento é responsável pela ocorrência de um ataque cardíaco, o qual pode causar uma
lesão significativa do músculo cardíaco.
Enfarte Agudo do Miocárdio (EAM)
Segundo Leon et al, (1996), Enfarte Agudo do Miocárdio (EAM) corresponde ao
desenvolvimento agudo ou súbito de uma área localizada ou circunscrita de necrose
miocárdica devido a isquemia grave, secundária a um fluxo sanguíneo e/ou uma
oxigenação inadequada. Um enfarte do miocárdio em evolução é um processo no qual
47
um segmento do miocárdio se encontra em progressão de isquemia por necrose
efetiva e que geralmente corre em oclusão de uma artéria coronária. Este conceito
implica que o processo pode ser parado antes que chegue ao estádio final.
Devido a grandes mudanças nos biomarcadores disponíveis para o diagnóstico, os
critérios de enfarte agudo do miocárdio foram revistos (Guidelines em European Heart
Journal, 2012). Nos atuais estados de consenso internacional, a definição de "enfarte
agudo do miocárdio" o termo (EAM) deve ser usado quando há evidência de necrose
miocárdica numa clínica consistente com isquemia do miocárdio.
Síndrome Coronário Agudo (SCA)
O Registo Nacional de Síndrome Coronária Aguda (RNSCA) da Sociedade
Portuguesa de Cardiologia (SPC), constata que as doenças cardiovasculares
permanecem no topo da lista de causas de morte, e embora o seu peso relativo tenha
sofrido um decréscimo gradual passando de 44,2% em 1990, para 32,2% no ano de
2006, a taxa de mortalidade por doença cardiovascular permanece inaceitavelmente
elevada, sendo considerada uma das mais elevadas da Europa e do mundo. De entre
as mortes por doença cardiovascular, 23% são devidas a doença cardíaca isquémica,
com destaque evidente para a Síndrome Coronária Aguda (SCA), que compreendem
um grupo de condições clínicas que resultam da doença aterotrombótica coronária em
fase instável. As SCA incluem o EAM com ou sem supradesnivelamento do segmento
ST e a angina instável (Santos, 2009).
Distinguir doentes com SCA de entre o grande número de doentes com suspeita de
dor torácica/cardíaca, representa um desafio diagnóstico.
O diagnóstico de SCA é definido como a presença de angor em repouso nas últimas
48 horas associada a 1) alterações eletrocardiográficas isquémicas – desvios do
segmento ST ou ondas T negativas; e/ou 2) elevação de biomarcador (troponina
cardíaca ou CK-MB) acima do valor de referência.
Para o diagnóstico de SCA com supradesnivelamento de ST considera-se a elevação
persistente (> 30 minutos) do segmento ST. Os restantes serão considerados como
SCA sem supradesnivelamento de ST.
Angina Instável é, segundo Théroux (1998), a transição de uma fase crónica para uma
fase aguda de patologia das coronárias e de condições de estabilidade clínica para
48
condição de instabilidade, como decorrência do desencadeamento de agregação
plaquetária local e formação de trombo pela ativação de uma placa aterosclerótica.
Segundo as recomendações para o diagnóstico e tratamento de síndromes coronárias
agudas em doentes que não apresentam elevação persistente do segmento ST
(2011), os biomarcadores, nomeadamente, as troponinas cardíacas desempenham um
papel fundamental de diagnóstico e estratificação de risco, tornando possível distinguir
entre EAMSST (enfarte do miocárdio sem elevação do ST) e angina instável.
O principal sintoma que desencadeia o desenrolar do diagnóstico e a cascata
terapêutica é a dor torácica, mas a classificação dos doentes é baseada no
eletrocardiograma (ECG). Podem encontrar-se duas categorias de doentes:
1. Doentes com dor torácica aguda e elevação persistente (>20 min) do segmento ST.
Denomina-se Síndrome Coronária Aguda com elevação do ST (SCA-STE), reflete
geralmente uma oclusão coronária total aguda. O objetivo terapêutico é conseguir uma
reperfusão rápida, completa e mantida através de angioplastia primária ou terapêutica
fibrinolítica.
2. Doentes com dor torácica aguda, mas sem elevação persistente do segmento ST.
Estes doentes podem apresentar depressão do segmento ST persistente ou transitória
ou inversão da onda T, ondas T planas, pseudo-normalização das ondas T ou
ausência de alterações no ECG na apresentação inicial. A estratégia inicial para estes
doentes consiste em aliviar a isquemia e os sintomas, monitorizar o doente com ECG,
seriar dados e repetir as medições dos marcadores de necrose miocárdica. O
diagnóstico inicial da SCA sem elevação do ST, baseado na medição das troponinas,
deverá ser posteriormente classificado como EM sem elevação do ST ou angina
instável. Nalguns doentes, a doença coronária será posteriormente excluída como
causa dos sintomas.
Sintomatologia/manifestações clínicas
Os sinais que devem levantar a suspeita de se tratar de um EAM são, para Gavina e
Pinho (SD):
49
- Desconforto ou dor torácica: geralmente surge no meio do peito, sobre a zona do
esterno, e pode ser sentido como aperto, pressão, ardência ou peso, geralmente
durando mais de 30 minutos;
- Desconforto noutras áreas do tronco como um ou ambos os braços, pescoço,
mandíbula, entre as omoplatas ou imediatamente abaixo do esterno (zona do
estômago);
- Falta de ar, que geralmente também se associa a mal-estar torácico;
- Outros sinais e sintomas como hipersudorese (“suores frios”), náuseas e vómitos,
que geralmente surgem em associação aos anteriores, mas que podem surgir
isoladamente, principalmente nos doentes idosos ou nos diabéticos.
Para Cavagnoli e Peruzzolo (SD), os doentes com Enfarte Agudo do Miocárdio (EAM)
apresentam pulso rápido e fraco e, com frequência, diaforese. A dispneia, ocasionada
pelo comprometimento da contratibilidade do miocárdio isquémico, é comum e
acompanhada de congestão e edema pulmonar. O diagnóstico de Enfarte Agudo do
Miocárdio pode ser firmado tardiamente, ou até mesmo passar despercebido, porque o
doente idoso não apresenta os sinais e sintomas comuns do EAM. Esses sinais e
sintomas incluem: temperatura corporal baixa, redução da pressão arterial, queixas de
desconforto e transpiração, sintomas semelhantes a outras doenças. Geralmente, não
há dor e, além disso, o idoso é mais suscetível a sofrer um EAM silencioso.
Dor no meio do peito, descrita como um aperto, um peso ou opressão - por vezes com
irradiação ao braço esquerdo, costas e pescoço - podendo ser acompanhada de
suores, náuseas, vómitos, falta de ar e ansiedade. São estes os sintomas mais
comuns de um Enfarte Agudo do Miocárdio (EAM) para o INEM (2012).
Também a Fundação Portuguesa de Cardiologia (2011), descreve alguns sinais de
aviso de ataque cardíaco, que são:
* Mal-estar no peito, incluindo sensação de compressão ou dor no meio do peito, por
de trás do esterno.
* Mal-estar e/ou dor que alastra a outras áreas da parte de cima do corpo, como um ou
ambos os braços, as costas, o pescoço, o maxilar ou o estômago.
* Falta de ar, com ou sem mal-estar no peito.
50
Outros sinais incluem: fraqueza ou fadiga inexplicáveis, ansiedade ou nervosismo
pouco habitual, indigestão ou dor como se tivesse gases, ou suores frios súbitos,
náuseas, vómitos, tonturas e colapso.
Nas recomendações para o diagnóstico e tratamento de síndromes coronárias agudas
em doentes que não apresentam elevação persistente do segmento ST (2011), a
manifestação clínica engloba uma grande variedade de sintomas. A manifestação
clínica típica é a pressão ou peso retroesternal (“angina de peito”), irradiando para o
braço esquerdo, pescoço ou maxilar, que pode ser intermitente (normalmente com a
duração de alguns minutos) ou persistente.
Estas queixas podem ser acompanhadas de outros sintomas tais como diaforese,
náusea, dor abdominal, dispneia e síncope. No entanto, não são raras as
manifestações atípicas. Estas manifestações podem incluir dor epigástrica, indigestão,
dor torácica penetrante, dor torácica de características pleuríticas ou dispneia
crescente. As queixas atípicas são mais frequentemente observadas em doentes mais
idosos (>75 anos),em mulheres, em doentes com diabetes, insuficiência renal crónica
ou demência. A ausência de dor torácica leva à sub-identificação e ao sub-tratamento
da doença.
Diagnóstico
Segundo as recomendações para o diagnóstico e tratamento de síndromes coronárias
agudas em doentes que não apresentam elevação persistente do segmento ST
(2011), distinguir doentes com SCA de entre o grande número de doentes com
suspeita de dor cardíaca, representa um desafio diagnóstico, especialmente nos casos
em que não existem sintomas claros ou alterações eletrocardiográficas. Apesar dos
tratamentos modernos, as taxas de mortalidade, e o reinternamento de doentes com
SCA continuam a ser elevados.
O sintoma mais comum de SCA é a dor torácica típica. O fluxograma diagnóstico
inicial de SCA-NSTE é um diagnóstico feito por exclusão de partes, com base no ECG,
ou seja, ausência de elevação persistente do segmento ST. Os biomarcadores
(troponinas) permitem distinguir o NSTEMI da angina instável. Diferentes modalidades
de exames imagiológicos, permitem excluir ou confirmar diagnósticos diferenciais. O
diagnóstico e a estratificação do risco estão intimamente ligados.
51
Tratamentos
Uma estratificação de risco precoce é essencial para a seleção da estratégia de
tratamento médico e de revascularização. Os grandes objetivos da angiografia
coronária e da revascularização são o alívio sintomático e a melhoria do prognóstico a
curto e a longo prazo. Restabelecimento do fluxo coronário e reperfusão do tecido
miocárdico.
Ainda, segundo as recomendações para o diagnóstico e tratamento de síndromes
coronárias agudas em doentes que não apresentam elevação persistente do
segmento ST (2011), existem vários tipos de tratamento a efetuar, que são:
- Agentes anti-isquémicos
Os fármacos anti-isquémicos diminuem a procura de oxigénio miocárdico (ao reduzir a
frequência cardíaca, diminuir a pressão arterial, reduzir a pré-carga e a contractilidade
do miocárdio) ou aumentam o fornecimento de oxigénio miocárdico (ao induzir a
vasodilatação coronária).
Os fármacos anti-isquémicos disponíveis para o tratamento, são os nitratos,
betabloqueadores e antagonistas dos canais de cálcio.
- Agentes antiplaquetares
A ativação plaquetar e a subsequente agregação, desempenham um papel dominante
na propagação da trombose arterial e, consequentemente, são o alvo terapêutico
chave no tratamento de SCA. A terapêutica antiplaquetar deve ser instituída o mais
cedo possível com vista a reduzir o risco de complicações isquémicas agudas e
eventos aterotrombóticos recorrentes.
- Anticoagulantes
Os anticoagulantes utilizados para inibir a produção e/ou a atividade da trombina,
reduzindo assim os eventos relacionados com trombos. Existe evidência de que a
anticoagulação é eficaz quando combinada com inibição plaquetar e que a
combinação das duas é mais eficaz do que qualquer dos tratamentos isoladamente.
Revascularização coronária
A revascularização contribui para o alívio dos sintomas, reduz o tempo de
internamento e melhora o prognóstico. As indicações e o timing para a
52
revascularização miocárdica e a escolha da abordagem preferencial (ICP ou CABG),
dependem de vários fatores, incluindo a condição do doente, a presença de fatores de
risco, as co-morbilidades e a extensão e gravidade das lesões identificadas na
angiografia coronária.
Cateterismo cardíaco
Realizado num laboratório de hemodinâmica, este é um exame invasivo, com uma
abordagem não cirúrgica que utiliza o Rx, para avaliar o coração e as artérias
coronárias, podendo em caso de EAM ajudar a determinar a localização da obstrução.
Procedimento que envolve a passagem de um tubo oco de pequeno diâmetro
(cateter), fino e flexível, através de um vaso (habitualmente na artéria da virilha ou do
pulso) até ao coração, com o doente acordado usando apenas anestesia local.
Este cateter vai progredir ao longo da artéria picada até ao local das artérias
coronárias, as quais após injeção de produto de contraste para os raios x, são
visualizadas podendo analisar-se o local de obstrução e sua gravidade. A este
procedimento dá-se o nome de angiografia.
Quando estas obstruções/estreitamentos são significativas existe a possibilidade de se
efetuar um procedimento de dilatação da artéria com um balão que quando
posicionado dentro da artéria e junto do aperto da artéria é insuflado durante alguns
segundos de forma a dilatá-la e restaurar o fluxo sanguíneo. Este processo é
denominado de angioplastia ou Intervenção Coronária Percutânea (ICP). Na maioria
das vezes, este procedimento é complementado com a colocação/implantação de uma
malha metálica (stent) que permite manter a permeabilidade da artéria.
Segundo as recomendações para o tratamento do enfarte agudo do miocárdio em
doentes com elevação persistente do segmento ST (2008), em doentes que se
apresentem com sintomas clínicos no prazo de 12 horas após a primeira
sintomatologia e com elevação persistente do segmento ST ou de novo ou suspeita do
mesmo, bloqueio do ramo esquerdo, devem realizar reperfusão mecânica (ICP) ou
farmacológica o mais rapidamente possível.
Cirurgia Coronária
Em alguns casos, mesmo após se identificarem as obstruções coronárias, pode não
ser tecnicamente possível efetuar a angioplastia. Neste caso, o tratamento pode
passar apenas pelo uso de medicamentos específicos para a prevenção do enfarte e
53
suas complicações, ou por uma cirurgia coronária. A Cirurgia de Revascularização
Miocárdica (CABG) cria caminhos alternativos à passagem de sangue, estabelecendo
uma ponte (bypass) que contorna a estenose da artéria que impedia o fluxo de sangue
normal. Isso é conseguido através da utilização de uma artéria saudável, mais
frequentemente a artéria mamária interna, que se localiza atrás do esterno. Outras
pontes podem ser construídas utilizando a veia safena ou artéria radial.
Segundo as recomendações conjuntas da ESC/EACTS para a revascularização do
miocárdio (2010), a revascularização do miocárdio, quer por cirurgia de pontagem
coronária (CABG), quer por intervenção coronária percutânea (ICP), é uma pedra
angular bem estabelecida no tratamento da doença coronária (DC), há quase meio
século. Os dois tipos de revascularização têm sido protagonistas de avanços
tecnológicos significativos, em particular no que diz respeito à utilização de stents
cobertos com fármaco na ICP e de enxertos arteriais na CABG, mas o seu papel no
tratamento de doentes com DC estável tem sido desafiado pelos avanços no
tratamento médico, referido como terapêutica médica otimizada (TMO) e que inclui
abordagens intensivas a nível farmacológico e no estilo de vida. As duas estratégias
de revascularização apresentam diferenças que devem ser reconhecidas. Na CABG,
são colocados enxertos que promovem derivações aos vasos coronários de médio
lúmen, a jusante da(s) lesão(ões) crítica(s), que asseguram um acréscimo de fluxo
sanguíneo com nutrientes para o miocárdio e garantem proteção contra novas lesões
proximais, obstrutivas. Pelo contrário, os stents coronários pretendem restaurar o fluxo
normal dos vasos epicárdicos nativos, sem oferecer proteção contra novas lesões
proximais ao stent. Os melhores resultados da revascularização do miocárdio são
obtidos quando a mesma é orientada para a redução da isquemia. Em situações
agudas, as estenoses coronárias críticas são facilmente identificáveis por angiografia,
enquanto, que em doentes com DC estável e doença multivaso (DMV), a identificação
da lesão culpada necessita de uma avaliação anatómica e funcional.
Diversas situações clínicas, estáveis ou agudas, podem ser tratadas de modo
diferente, incluindo por ICP ou revascularização cirúrgica. Os riscos previstos e a
morbilidade após CABG ou ICP são diferentes. Desta forma, os doentes e médicos
precisam de “equacionar a conveniência a curto prazo da ICP, menos invasiva, contra
a durabilidade de uma abordagem cirúrgica mais invasiva.”
54
Por sua vez, os enfermeiros precisam desenvolver uma confiança no relacionamento
com seus doentes a fim de, efetivamente avaliar os seus níveis de conhecimento
sobre a doença e seus tratamentos. Devem proporcionar um ambiente confortável
onde os doentes são capazes de os consultar para esclarecer quaisquer malentendidos, expor suas dúvidas e equacionar mudanças nos seus hábitos de vida,
para serem mais saudáveis e melhorar o seu estado de saúde.
55
3- PAPEL DO ENFERMEIRO
Existe uma consciência crescente de que a literacia em saúde e saúde estão
fortemente ligados, e como os tratamentos se tornaram mais diversificados, existe
uma maior necessidade de alfabetizar os doentes com doença arterial coronária
(DAC). Muitos doentes com doença coronária estão dependentes de uma gestão
farmacológica. Anteriormente, as prescrições baseavam-se apenas nos antagonistas
dos canais de cálcio. Hoje, o regime de medicação estabelecido na doença
cardiovascular (DCV), consiste em medicamentos anticoagulantes, betabloqueadores,
inibidores da enzima conversora angiotensina (IECA), antiplaquetares e uma estatina
(Sociedade Europeia de Cardiologia, 2007).
Literacia em saúde é uma questão que pode ter um impacto considerável sobre os
tratamentos dos doentes, exigindo uma adesão à medicação e mudanças de estilo de
vida. Doentes com baixos níveis de literacia em saúde fazem menos perguntas e
consequentemente, estão mais propensos a erros. Isso pode ter consequências
importantes para os doentes, familiares e profissionais de saúde.
Sendo um conceito útil e presente no atendimento e prestação de cuidados, os
enfermeiros devem estar cientes das estratégias e devem considerar a sua aplicação
continua na melhoria da "literacia em saúde” aos doentes. Sabe-se que os baixos
níveis de literacia em saúde afetam a perceção de saúde das pessoas e a deficiente
literacia em saúde afeta todos os setores da sociedade. Kilonzo (2011) refere que a
falta de alfabetização em saúde pode resultar na não-adesão medicamentosa ou
sobredosagem acidental com implicações para os próprios doentes, para a família e
os serviços de saúde.
Aqueles que sofrem um enfarte do miocárdio podem passar por procedimentos como
a angioplastia (ICP) ou revascularização do miocárdio, através de cirurgia. Para
garantir uma gestão otimizada destes ou qualquer outro procedimento ou doença
cardíaca, os doentes são obrigados a aderir a mudanças na dieta e estilo de vida, os
quais exigem um bom nível de literacia em saúde.
A literacia em saúde apresenta muitos desafios na linha da frente de atendimento ao
doente. Para os enfermeiros de cardiologia ao educar doentes todos os dias, a tomada
56
de consciência deste fator na educação não pode ser subestimada. Rabelo et all
(2007) referem que com a chegada da epidemiologia clínica, foi possível conhecer a
DAC e a possibilidade de intervenções por meio de prevenção primária, secundária e
terciária. No contexto de uma equipe multidisciplinar, o enfermeiro tem o papel de
identificar e realizar ações educativas e efetivas na busca de resultados para a
promoção, proteção e recuperação de saúde do indivíduo e da comunidade.
Os achados epidemiológicos sobre a doença arterial coronária (DAC) que sinalizam
essa doença é multifatorial e permitem o direcionamento das políticas em cardiologia
preventiva, visando a redução da incidência de enfarte e de suas consequências de
mortalidade e morbidade, através do controle efetivo dos fatores de risco (FR)
identificados. A atualização e o conhecimento da prevalência desses fatores, isolados
ou combinados, são essenciais para que os profissionais de saúde envolvidos no
cuidado desses indivíduos possam estabelecer estratégias de educação, seguimento
e reavaliação.
A Enfermagem é por sua vez, uma profissão que não existe sem a cooperação
coletiva e sem trabalho em equipa. Os profissionais de enfermagem trabalham para
prestar cuidados de saúde e ajudam os seres humanos, por isso, o constante
aperfeiçoamento nas relações humanas, comunicação e capacitação tecnológica são
fundamentais. Estes deverão ainda, reconhecer componentes da comunicação
promotoras de maior literacia em saúde para, avaliar quais os problemas existentes
entre os utentes/clientes e os técnicos de saúde, usar ferramentas para alterar
situações de défice no empoderamento do cidadão no domínio da literacia em saúde e
intervir no campo da comunicação em saúde , gerir conflitos e desenvolver
competências de relacionamento através da linguagem assertiva.
Kilonzo (2011) de acordo com vários autores refere que um baixo nível de literacia em
saúde limita o envolvimento do doente na tomada de decisão e de comportamentos de
auto-cuidados que sejam necessárias em doenças cardíacas crónicas. Doentes com
níveis ótimos na gestão de auto-cuidado têm geralmente uma melhor qualidade de
vida, evitando a re-hospitalização, reduzindo assim os custos de saúde. Ainda o
mesmo autor refere que, indivíduos com baixos níveis de literacia em saúde são
muitas vezes relutantes em procurar ajuda ou fazer perguntas, a menos que tenham
um "confidente" para pedir. Os doentes com doença cardíaca precisam sentir-se
confortáveis, solicitando e confiando em profissionais de saúde aptos na gestão da
sua terapêutica e na prestação de todos os tipos de cuidados.
57
4 – METODOLOGIA
Neste capítulo são expostas as opções metodológicas relativas à justificação dos
instrumentos e procedimentos para a recolha e análise dos dados obtidos neste
estudo. A metodologia é caracterizada por Fortin (2009), como o conjunto das técnicas
e métodos utilizados para a elaboração do processo de investigação científica onde se
expõem os objetivos da investigação, a questão de investigação, as variáveis
consideradas e a sua operacionalização, o processo de seleção da amostra, o
instrumento de colheita de dados elaborado; o processo de colheita de dados e os
pressupostos éticos considerados; bem como as técnicas e medidas estatísticas
utilizadas para o procedimento estatístico.
4.1-Enquadramento ao tema
O conhecimento sobre fatores que promovem e defendem a saúde e sobre os fatores
de risco para a saúde, bem como a capacidade de utilizar e aplicar de forma efetiva
esse mesmo conhecimento, é determinante para adoção de comportamentos e estilos
de vida saudáveis.
A literacia em saúde inadequada ou de baixo nível associa-se a cuidados de saúde de
pior qualidade e maior custo.
As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte entre nós e são, também
uma das mais importantes causas de morbilidade: incapacidade e invalidez, anos
potenciais de vida precocemente perdidos.
O peso associado à doença cardiovascular pode ser reduzido com um diagnóstico
precoce, tratamento adequado, reabilitação e prevenção, nomeadamente através do
aconselhamento em prol de um estilo de vida mais adequado.
Tendo por base estes pressupostos, é pertinente estudar a literacia em saúde em
doentes com doença coronária e por sua vez, as evidências indicam uma correlação
entre o conhecimento dos fatores de risco cardiovascular, mudanças de estilo de vida
e adesão ao tratamento. Neste sentido, formulou-se a Questão de Investigação: Qual
58
o nível de literacia em saúde no doente coronário e em que medida é influenciada pela
procura de folhetos/informação escrita e pelas mudanças de hábitos de vida?
Para resposta à questão de investigação, foram traçados os seguintes objetivos:
* Avaliar e caracterizar os níveis de literacia em saúde em doentes com doença
coronária
* Avaliar a influência da procura de folhetos/informação escrita
* Explorar a efetividade nas mudanças dos hábitos de vidas
A escolha de doentes coronários deve-se ao fato de estar a exercer funções no
internamento do serviço de Cardiologia, possibilitando melhor acesso aos doentes
internados, minimizando o tempo gasto na distribuição e esclarecimento na entrega
dos questionários.
4.2-Tipo de Estudo
A investigação proposta caracteriza-se por um estudo descritivo correlacional, de
abordagem quantitativa.
Segundo Fortin (2009), a investigação é descritiva correlacional, quando num dado
momento são medidos vários conceitos e se tenta descobrir os que têm relações entre
si, tem por objetivo explorar relações entre variáveis e descrevê-las. Um quadro
teórico guia o investigador na associação dos conceitos entre si. À descrição dos
fatores segue-se a verificação das relações e esta é feita quando há uma boa razão
para crer que essa relação existe. A explicação consiste em determinar as razões
pelas quais tal e tal variável estão associadas entre si.
Tratando-se de descrever conceitos, fatores ou uma população, usa-se um método
quantitativo, porque se pretende obter informações exprimindo-as em valores
numéricos (Fortin, 2009).
4.3-Variáveis
As variáveis são as unidades de base da investigação. Elas são qualidades,
propriedades ou características de pessoas, objetos de situações suscetíveis de
59
mudar ou variar no tempo. As variáveis tomam diferentes valores que podem ser
medidos, manipulados ou controlados (Fortin, 2009).
A mesma autora caracteriza a variável independente como sendo um elemento que é
introduzido numa situação de investigação com vista a exercer um efeito sobre uma
outra variável. Esta variável é considerada como a causa do efeito produzido na
variável dependente.
Neste estudo foram definidas, as seguintes variáveis independentes:
- Idade: medida numa escala numérica, em anos
- Habilitações Literárias: medida numa escala ordinal por categorias de ensino,
primário (até ao 4º ano), secundário (do 5º ao 12º ano) e superior (bacharelato,
licenciatura, mestrado, doutoramento)
- Aquisição de conhecimentos através de folhetos/informação escrita: medida
através de resposta/escolha dirigida aos folhetos/informação escrita, relativamente a
“onde adquiriu o conhecimento que tem sobre a doença cardíaca”.
- Grau de adesão nas mudanças de hábitos de vida: medido através de resposta
dicotómica (sim/não) nas perguntas relativas ao grau de adesão nas mudanças dos
hábitos de vida e tratamento, considerando valor nulo o “não” e valor 1 o “sim”.
Variável dependente é a que sofre o efeito da variável independente; é o resultado
predito pelo investigador. Variáveis independentes e variáveis dependentes estão em
correlação: a variável independente, produz um determinado efeito sobre a variável
dependente (Fortin, 2009).
A variável dependente deste estudo é o nível de literacia em saúde no doente
coronário. Esta variável representa o conhecimento dos fatores de risco gerais e a
forma como estão presentes no doente coronário. Os conhecimentos dos fatores de
risco foram divididos em dois grupos, um avalia o grau de conhecimento geral dos
fatores de risco para a doença coronária e o outro avalia o grau de conhecimento e
presença desses fatores de risco específicos para a sua doença coronária. As
questões foram avaliadas através de um score que, quanto maior é o seu valor maior
é o grau de conhecimento. O primeiro grupo, fatores de risco gerais (FRG) contém dez
perguntas em que o doente sabe reconhecer determinados fatores de risco na doença
coronária (obesidade, elevados níveis de colesterol, elevados níveis de diabetes,
hábitos de exercício físico, stress, hábito de fumar, alimentação, hereditariedade,
60
tensão arterial elevada e tristeza/humor deprimido) e o segundo, fatores de risco
presentes (FRP) com oito perguntas (obesidade, elevados níveis de colesterol,
elevados níveis de diabetes, hábitos de exercício físico, alimentação, stress, hábito de
fumar e tensão arterial elevada) em que o doente aplica ou reconhece em si mesmo
esses mesmos fatores. As possibilidades de resposta foram: muitíssimo, muito, um
pouco, nada e não sei.
A literacia em saúde no doente coronário foi considerada como variável dependente
considerando os conhecimentos dos fatores de risco gerais mais os presentes. O
conhecimento dos fatores de risco gerais tem score mínimo de 0 (todas as respostas
“Não sei”) e score máximo de 40 (todas as respostas “muitíssimo”). Por sua vez, o
conhecimento dos fatores de risco presentes apresenta um score mínimo de 0 (todas
as respostas ”não sei”) e um score máximo de 32 (todas as respostas “muitíssimo”).
Tratada como sendo a soma do conhecimento dos fatores de risco gerais e o
conhecimento dos fatores de riscos presentes, cujo valor mínimo é de 0 e valor
máximo de 72.
As variáveis atributo são características pré-existentes dos participantes num estudo.
Elas são geralmente constituídas por dados demográficos (Fortin, 2009).
Assim, as variáveis socio-demográficas representadas neste estudo, são:
- Idade, Sexo, Com quem vive, Habilitações literárias, Situação laboral, Rendimentos.
Apesar de a idade e as habilitações literárias serem características dos participantes,
foram identificadas como sendo variáveis independentes.
4.4-Hipóteses
A hipótese é um enunciado formal sobre as relações antecipadas entre variáveis, que
necessita de verificação empírica, tendo como ponto de partida o quadro teórico
(Fortin, 2009). Neste sentido, as hipóteses formuladas foram de encontro ao
enquadramento teórico sobre literacia em saúde.
Segundo Monteiro (2009), muitos estudos demonstraram que a idade avançada pode
ser uma barreira à literacia em saúde. Um outro estudo efetuado por Ávila (2005)
revelou que a relação entre literacia e idade torna-se ainda mais nítida, à medida que
esta aumenta diminuem as competências de literacia. Tendo por base estas
61
conclusões, surgiu a hipótese 1: O nível de literacia em saúde no doente coronário
correlaciona-se negativamente com a idade.
Monte (2011) no seu estudo sobre “Efeito das Habilitações Académicas no Risco de
Doença Cardiovascular de uma População de Alto Risco Cardiovascular da USF
Gualtar” com recurso ao “10 – year risk of cardiovascular disease by Framingham riskscore”, identificou o valor máximo de risco de DCV (45) encontrado para o nível
correspondente a menos habilitações académicas (nível 1), mas também para o nível
de maiores habilitações (nível 4). Parece existir uma associação inversa entre
habilitações académicas do nível 1, 2 e 3 e risco de DCV, não acontecendo o mesmo
para o nível mais elevado de habilitações académicas (nível 4). A frequência do ensino
superior não parece ser um fator de proteção para os FRCV e consequentemente para
o risco de DCV.
Também, Ávila (2005) no seu estudo sobre a “Literacia dos Adultos”, concluiu que
“…meios familiares carenciados de habilitações literárias…convergem na produção
dos fracos níveis de literacia…”. Estes resultados levaram à formulação da hipótese 2:
O nível de literacia em saúde no doente coronário difere consoante as habilitações
literárias.
Uma das competências fundamentais passa pelo conhecimento sobre diferentes
aspetos de saúde, bem como pela capacidade de utilização desse conhecimento.
Rothman RL, et al citados por Santos (2010) referem que os conhecimentos em saúde
fazem parte de um conceito mais abrangente, usualmente referido como literacia em
saúde. Há bastante evidência, em como pessoas com baixa literacia em saúde
(incluindo competência numérica em saúde) têm menor capacidade de compreensão
dos conteúdos em folhetos informativos sobre alimentos ou sobre fármacos…”. Cerca
de 40% dos indivíduos com reduzidas competências de literacia necessitam do apoio
de terceiros em tarefas como a leitura de folhetos de medicamentos ou leitura de
informação institucional (Ávila, 2005). Por conseguinte, foi formulada a hipótese 3: O
nível de literacia em saúde no doente coronário difere consoante a procura de
folhetos/informação escrita.
Safeer (2006) refere que há evidências de que um melhor conhecimento da sua
condição pode melhorar a adesão do doente às mudanças de estilo de vida e
terapêuticas. Outros autores apontam correlações estatisticamente significativas entre
o conhecimento dos doentes em geral sobre a doença cardíaca coronária, fatores de
risco e melhorias na perda de peso (p = 0,040), atividade física (p = 0,005), gestão do
62
stress (p = 0,004), mudanças na dieta (p <0,001), e os objetivos de tratamento de
longo alcance para os níveis lipídicos (p = 0,018). O auto-conhecimento também foi
positivamente relacionado com a adesão às drogas anti-hipertensivas (p = 0,003).
Por outro lado, Teixeira (2004) refere que baixa literacia em saúde é, também a
dificuldade dos indivíduos em compreender qual é o seu estado de saúde e quais são
as necessidades de mudança de comportamentos, planos de tratamentos e de autocuidados. Santos (2010) reforça essa ideia, com a perceção de baixa auto-eficácia na
prevenção e gestão de problemas de saúde, bem como com comportamentos
ineficazes de saúde.
Há doentes que admitem não entender o suficiente sobre a sua condição física e a
toma de medicamentos (incluindo a finalidade e possíveis efeitos colaterais) afetando
a sua adesão ao tratamento (Safeer, 2006). Neste sentido, foi formulada a hipótese 4:
A adesão nas mudanças dos hábitos de vida relaciona-se positivamente com o nível
de literacia em saúde no doente coronário.
4.5-População/amostra
A população-alvo é definida por Fortin (2009), como sendo um grupo de pessoas ou
de elementos que têm características comuns.
A população deste estudo é constituída pelos doentes internados no serviço de
Cardiologia (internamento e Unidade de Cuidados Intensivos) por evento de DAC ou
SCA. A amostra é constituída por 51 indivíduos, tendo sido excluídos os que não
soubessem ler nem escrever, que tivessem uma acuidade visual inadequada para
auto-preencher o questionário, demência ou patologia psiquiátrica. O diagnóstico de
doença coronária foi previamente efetuado por médico cardiologista. A determinação
dos critérios de exclusão prendem-se com razões metodológicas, de forma a eliminar
a possibilidade de haver interferência de outra patologia e garantir a colaboração e
compreensão dos indivíduos para procederem ao correto preenchimento do
instrumento de colheita de dados.
63
4.6-Instrumento de colheita de dados
Dadas as características do instrumento de medida – questionário, e pensando ser o
que mais se adequa à amostra em estudo, foi o método de colheita de dados
escolhido.
Fortin (2009) refere que o questionário é um instrumento de medida que traduz os
objetivos de um estudo com variáveis mensuráveis e que ajuda a organizar, normalizar
e controlar os dados de tal modo que as informações procuradas possam ser colhidas
de forma rigorosa.
A escolha incidiu, sobre um questionário disponível na tese - “Tradução, adaptação e
validação de um questionário de conhecimento de fatores de risco cardiovascular para
pacientes com doença arterial coronariana”- artigo original inglês- “ Transcultural
adaptation and validation of a questionnaire about the knowledge of cardiovascular
risks factors”.
Para efetuar a colheita de dados e medir as variáveis definidas foi construído um
instrumento de colheita de dados (Anexo I), de forma a delimitar a informação
pertinente a recolher, através da formulação das perguntas, obedecendo a uma
ordem, organizadas em 4 grupos:
o
Perguntas relativas ao grau de conhecimento geral dos fatores de risco na
doença coronária
o
Perguntas relativas ao grau de conhecimento e presença de fatores de risco
específicos na sua doença coronária
o
Perguntas relativas ao grau de adesão dos doentes nas mudanças de estilo de
vida e tratamento
o
Perguntas relativas à adesão dos doentes no manuseamento dos fármacos
prescritos. O questionário original atribui pontos de 0 a 9, sendo 0 menos importante e 9 muito
importante. Após uma reflecção ponderada e minuciosa, a opção foi transformar os
pontos em escalas de Likert mais simples de entender, adaptando-se melhor à
realidade portuguesa.
Nas perguntas relativas ao grau de conhecimento geral dos fatores de risco na doença
coronária e ao grau de conhecimento e presença de fatores de risco específicos na
64
sua doença coronária, a escala escolhida foi: Muitíssimo/ Muito/Um pouco/Nada/Não
sei.
Nas perguntas relativas ao grau de adesão dos doentes nas mudanças de estilo de
vida e tratamento. Resposta dicotómica: Não/Sim e se Sim de que forma,
especificando que mudanças se efetuaram concretamente.
Nas perguntas relativas à adesão dos doentes no manuseamento dos fármacos
prescritos, duas partes:
- Quatro perguntas- Sobre a identificação dos medicamentos que toma habitualmente,
prescrita para a dislipidémia, anti-diabéticos orais, anti-hipertensores e antitrombóticos. Se resposta positiva, por nomeação ou reconhecimento, “Sim nomeação”,
“Sim reconhecimento”. Se não sabe identificar a resposta, é negativa, ou ainda com a
possibilidade de resposta “Não se aplica”.
- Quatro perguntas- Sobre alteração da dose prescrita por sua iniciativa, deixar de
comprar por ser demasiado caro, necessidade de ajuda na compreensão das
prescrições/receitas e se toma medicação prescrita a outros, com opção de resposta:
Muitíssimo/Muito/Um pouco/Nada.
Para facilitar a recolha de dados, pretendendo uma quantidade de informação o mais
completa possível, dividiu-se o questionário em 4 partes, são elas:
Parte I - Elementos sócio-demograficas - pretende-se avaliar aspetos sóciodemográficos, nomeadamente elementos de natureza pessoal: idade, sexo, com quem
vive, habilitações literárias, situação laboral e rendimentos.
Parte II - Elementos relacionados com a doença cardíaca - pretende-se conhecer o
tempo de diagnóstico e a realização de cateterismo cardíaco, angioplastia/tratamento
ou cirurgia cardíaca e, no caso de a resposta ser afirmativa/positiva, foi questionado a
quanto tempo, sendo uma resposta aberta. Ainda, nesta parte, é assinalada qual a
medicação que toma atualmente e onde adquiriu o conhecimento que tem sobre a
doença cardíaca, podendo ser de escolha múltipla.
Parte III - Questões respeitantes às variáveis relacionadas com o conhecimento dos
fatores de risco, contendo perguntas relativas ao grau de conhecimento geral dos
fatores de risco para a doença coronária e perguntas relativas ao grau de
conhecimento e presença de fatores de risco específicos para a sua doença coronária.
Na escala de Likert escolhida, foi atribuído um valor de acordo com a sua ponderação
65
(score) em termos de nível de conhecimento sobre os fatores de risco: Muitíssimo=4,
Muito=3, Um pouco=2, Nada=1 e Não sei=0.
Parte IV - Questões dirigidas ao conhecimento sobre hábitos de vida e adesão ao
tratamento, contendo perguntas relativas ao grau de adesão nas mudanças dos
hábitos de vida e tratamento e perguntas relativas ao conhecimento/manuseamento e
adesão dos medicamentos.
As primeiras, direcionadas ao conhecimento sobre hábitos de vida e adesão ao
tratamento, com resposta dicotómica (sim/não) e no caso de a resposta ser afirmativa,
foi questionado “de que forma” ou “de quanto para quanto”, pretendendo avaliar a
efetividade das mudanças, com resposta aberta. Foi atribuída uma ponderação de um
valor á resposta “sim” e valor nulo ao “não”, certificando a efetividade das mudanças
de hábitos de vida. A quantidade mínima de mudanças será nenhuma (zero) com a
totalidade de respostas “não” e a quantidade máxima de mudanças será todas (oito)
com a totalidade de respostas “sim”.
As segundas, para averiguar o grau de conhecimento/manuseamento e adesão dos
medicamentos, foram criadas duas possibilidades de respostas afirmativas com a
nomeação (dizer o nome correto do medicamento) e o reconhecimento (identificar a
embalagem sem saber o nome), uma resposta negativa e uma quando não se aplica a
toma desse medicamento. Foram atribuídos valores de acordo com o grau de
importância: Sim nomeação=3, Sim reconhecimento=2, Não=1 e Não se aplica=0.
As terceiras, relativas ao manuseamento e adesão dos medicamentos, foram
consideradas quatro respostas numa escala de Likert e atribuída pontuação (score) de
acordo com a sua importância: Muitíssimo=1, Muito=2, Um pouco=3 e Nada=4.
4.7-Considerações éticas
Para realização deste estudo foram tidas em consideração os aspetos ético-legais
referenciados por Fortin (2009): o respeito pelo consentimento livre e esclarecido, o
respeito
pelos
grupos
vulneráveis,
o
respeito
pela
vida
privada
e
pela
confidencialidade das informações pessoais, o respeito pela justiça e pela equidade e
o equilíbrio entre as vantagens e os inconvenientes.
Neste
trabalho
foram
cumpridas
as
normas
e
orientações
referentes
aos
procedimentos éticos tais como, pedido de autorização para a realização do estudo e
66
aplicação do questionário dirigido ao Presidente do Conselho de Administração da
instituição envolvida, assim como, ao Diretor de Serviço de Cardiologia (Anexo II). Foi
entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo III) aos participantes
antes do preenchimento do questionário, explicando-lhes o objetivo do estudo e a
importância da necessidade da sua participação.
4.8-Colheita de dados
Os questionários foram distribuídos a todos os doentes internados no serviço de
Cardiologia (Internamento e Unidade de Cuidados Intensivos), de abril a junho de
2013, que cumprissem com os critérios de inclusão e que aderiram livremente ao
estudo com o seu consentimento.
4.9-Processamento e análise de dados
Após a colheita de dados, foi efetuada uma primeira análise e seleção de todos os
questionários, no intuito de eliminar aqueles que porventura se encontrassem
incompletos ou mal preenchidos. Posteriormente, processada a sua codificação e
inserção em base de dados e aplicação dos procedimentos de estatística descritiva e
inferencial, com recurso à IBM Software Package for Social Sciences (SPSS) Statistics
versão 20 para Microsoft Windows. A parte descritiva da estatística tem por objetivo
destacar o conjunto dos dados brutos tirados de uma amostra de maneira que sejam
compreendidos (Fortin, 2009). Para a análise exploratória de dados foi utilizada
estatística descritiva (distribuição de frequências -absolutas (nº) e relativas (%), média,
desvio padrão, mínimo, máximo, percentis) para descrever o comportamento das
variáveis. A estatística inferencial foi usada para determinar a relação entre elas e
verificação de hipóteses, servindo para generalizar os resultados de uma amostra de
sujeitos, ao conjunto da população (Fortin, 2009).
O nível de significância adotado como estatisticamente significativo para todos os
testes utilizados no estudo das hipóteses, foi considerado para valores de p ≤0,05.
Nas variáveis a estudar, antes da utilização dos testes estatísticos, aplicou-se o teste
de Kolmogorov-Smirnov e Shapiro-Wilk (dependendo se o valor de N ser superior ou
inferior a 30) com a correção de Lilliefors, para avaliar a normalidade das variáveis em
estudo tendo em conta a hipótese: H0-a distribuição é normal; se p≤0,05 rejeito H0,
67
(Laureano, 2011). Aplicado teste de Levene para comparação de variâncias,
considerando haver diferenças significativas se o valor de prova for inferior a 5%.
O teste revelou que a variável nível de literacia apresenta distribuição normal com
valores de p=0,2. Por esse motivo, foram aplicados testes paramétricos, que foram:

Teste
t
de
Student
para
comparação
entre
médias
em
amostras
independentes, aceitando-se haver diferenças significativas se o valor de prova
for inferior a 5%.

Coeficiente de Pearson que é uma medida de associação linear entre variáveis
quantitativas, que varia entre -1 e 1. Quanto mais próximo dos extremos se
encontrar maior é a associação linear. O nível de significância utilizado neste
teste de hipóteses foi estabelecido para valores de p<0,05, valores mais usuais
em ciências sociais. A consistência interna designa a concordância existente entre todos os enunciados
individuais que constituem o instrumento de medida. Ela refere-se à homogeneidade
de um conjunto de enunciados que servem para medir diferentes aspetos de um
mesmo conceito (Fortin, 2009). Assim para verificar a consistência interna das escalas
relativas ao grau de conhecimento dos fatores de risco gerais, dos fatores de risco
presentes e ao grau de adesão das mudanças de hábitos de vida foi utilizada o cálculo
do coeficiente de Alfa (α) Cronbach. Fortin (2009) refere que o valor dos coeficientes
varia entre 0.00 e 1,00; um valor elevado indica uma grande consistência interna.
Segundo vários autores, considera-se Alfa (α) Cronbach aceitável e adequado com
valor superior a 0,7.
Neste estudo, para o conjunto de perguntas relativas ao conhecimento dos fatores de
risco gerais obteve-se o valor de α=0,705. Para o conjunto de perguntas relativas ao
conhecimento dos fatores de risco presentes obteve-se o valor de α=0,560 e para o
conjunto de perguntas relativas ao grau de adesão nas mudanças de hábitos de vida
obteve-se o valor de α=0,735.
Como se pode confirmar pelos resultados de α, os valores foram α>0,7 em duas
escalas. No entanto, obteve-se um valor baixo, relativamente ao conjunto de
perguntas sobre o conhecimento de fatores de risco presentes (α=0,560), mas que foi
considerado adequado mantê-las no estudo. Assim sendo considera-se existir
homogeneidade dos enunciados de um mesmo conceito, medidos por uma escala.
68
Características sócio-demográficas
A população em estudo caracteriza-se por ser maioritariamente masculina 48 homens
(94,1%), (gráfico1).Os indivíduos têm idades compreendidas entre os 32 anos (Mín.) e
84 anos (Máx.),com uma média de idade de 61,04 anos, 75% dos indivíduos têm 69
anos, (quadro 1). 42 (82,4%) Indivíduos vivem com o cônjuge (tabela 1), 22 (43,1%)
têm ensino primário e 25 (49%) o ensino secundário (tabela 2), 31 (60,8%) está
reformado (tabela 3) e 29 (56,9%) indivíduos auferem rendimentos entre os 500 e
1500 €, (tabela 4).
Gráfico 1- Caracterização da amostra quanto ao sexo
Quadro 1- Caracterização da amostra quanto à idade
Idade
Mín.
Máx.
Valor médio
Percentil 75
Desvio padrão
32
84
61,04
69,00
9,67
Tabela 1 - Distribuição da amostra segundo, com quem vive
Com quem vive
nº
%
Sozinho
6
11,8
Cônjuge
42
82,4
Filhos/parentes
3
5,9
Total
51
100
69
Tabela 2 - Distribuição da amostra quanto às habilitações literárias
Habilitações Literárias
nº
%
Ensino Primário
22
43,1
Ensino Secundário
25
49,0
Ensino Superior
4
7,8
Total
51
100
Tabela 3 - Distribuição da amostra quanto à situação laboral
Situação laboral
nº
%
Empregado
16
31,4
Desempregado
4
7,8
Reformado
31
60,8
Total
51
100
Tabela 4 - Distribuição da amostra quanto ao rendimento
Rendimento
nº
%
<500€
12
23,5
> 500 <1500€
29
56,9
>1500 <2500€
4
7,8
> 2500€
4
7,8
Total
51
100
70
Elementos relacionados com a sua doença cardíaca
O tempo de diagnóstico da doença foi há menos de 1 ano para 24 inquiridos (47,1%) e
mais de 3 anos para 22 (43,1%), (tabela 5). 46 Indivíduos foram submetidos a
cateterismo cardíaco (90,2%) e 35 fizeram angioplastia (68,6%), apenas 3 foram
sujeitos a cirurgia cardíaca (5,9%), (tabela 6)
Tabela 5 - Distribuição da amostra quanto ao tempo de diagnóstico
Tempo de diagnóstico
nº
%
< 1 ano
24
47,1
>1 ano<3anos
5
9,8
> 3 anos
22
43,1
Total
51
100
Tabela 6 - Distribuição da amostra quanto ao cateterismo cardíaco, angioplastia (ICP)
e cirurgia cardíaca (CABG)
Sim
Não
Total
Intervenção
nº
%
46
90,2
Angioplastia (ICP)
35
Cirurgia cardíaca CABG)
3
Cateterismo cardíaco
nº
%
nº
%
5
9,8
51
100
68,6
13
25,5
48
94,1
5,9
41
80,4
44
86,3
Relativamente às respostas da pergunta sobre “há quanto tempo” foi submetido a
cateterismo cardíaco, angioplastia e cirurgia cardíaca, não foram possíveis de serem
tratadas por heterogeneidade das mesmas.
A medicação que os doentes mais tomam é para a hipertensão 38 (74,5%), para a
dislipidémia 35 (68,6%) e antitrombóticos 31 (60,8%), (tabela 7).
71
Tabela 7 - Distribuição da amostra relativamente à medicação que toma
Sim
Não
Total
Medicação
Tensão
nº
38
%
74,5
nº
13
%
25,5
nº
51
%
100
Ritmo cardíaco
12
23,5
39
76,5
51
100
Diabetes
20
39,2
31
60,8
51
100
Colesterol
35
68,6
16
31,4
51
100
Circulação
31
60,8
20
39,2
51
100
Dores no peito
8
15,7
43
84,3
51
100
Falta de ar
1
2,0
50
98,0
51
100
Ansiedade
10
19,6
41
80,4
51
100
Depressão
2
3,9
49
96,1
51
100
Dormir
7
13,7
44
86,3
51
100
O conhecimento adquirido, sobre doença cardíaca foi, maioritariamente, através de
palavras de enfermeira/médico com 47 (92,2%) de respostas, 11 (21,6%) foram ainda
adquirir conhecimentos em folhetos/informação escrita, 6 (11,8%) com pessoas com a
mesma doença e 5 (9,8%) com familiares/vizinhos, (tabela 8).
Tabela 8 - Distribuição da amostra quanto ao modo de aquisição de conhecimento
Aquisição de conhecimento
nº
%
Palavras enfª/médico
47
92,2
Folhetos/informação escrita
11
21,6
Pessoa com mesma doença
6
11,8
Familiares/Vizinhos
5
9,8
Total
51
100
72
Conhecimento dos fatores de risco
Relativamente ao conhecimento dos fatores de risco gerais e presentes foram
consideradas apenas as respostas “muitíssimo” e “muito”, fazendo um “Total”, visto
que, são as mais importantes e maior influência têm na doença coronária.
Verificou-se que os fatores de risco gerais mais identificados são, os níveis elevados
de colesterol e o hábito de fumar com 46 (90,2%) de respostas, seguido da obesidade
e tensão arterial elevada com 42 (82,3%) e 41 (80,4%) de respostas respetivamente.
Os fatores de risco menos referenciados foram a tristeza/humor deprimido e o hábito
de exercício físico com 15 (29,5%) e 7 (13,7%) de respostas, (tabela 9).
Tabela 9 - Distribuição da amostra quanto ao conhecimento dos Fatores de Risco
Gerais (FRG)
Fatores de risco gerais
(FRG)
Muito
Muitíssimo
Total
nº
%
nº
%
nº
%
Obesidade
22
43,1
20
39,2
42
82,3
Níveis elevados colesterol
27
52,9
19
37,3
46
90,2
Níveis elevados diabetes
22
43,1
10
19,6
22
62,7
Hábito exercício físico
5
9,8
2
3,9
7
13,7
Stress
25
49,0
9
17,6
34
66,6
Fumar
17
33,3
29
56,9
46
90,2
Alimentação
26
51,0
9
17,6
35
68,6
Hereditariedade
17
33,3
4
7,8
21
41,1
Tensão arterial elevada
28
54,9
13
25,5
41
80,4
Tristeza/humor deprimido
14
27,5
1
2,0
15
29,5
Verificou-se que os fatores de risco presentes mais referenciados foram a tensão
arterial elevada, o hábito de fumar e o stress, com 28 (54,9%), 27 (52,9%) e 24
(47,1%) respostas respetivamente, sendo que o hábito de fumar foi o mais identificado
com 17 respostas “muitíssimo”. O fator de risco menos referenciado foi o hábito do
73
exercício físico com apenas 3 (5,9%) de respostas. A obesidade, os elevados níveis
de colesterol e a alimentação foram referenciados com 43,1; 43,2 e 41,2%
respetivamente. A diabetes foi apontada como sendo fator de risco presente em 33,3%
das respostas, (tabela 10).
Tabela 10 - Distribuição da amostra quanto ao conhecimento dos Fatores de Risco
Presentes (FRP)
Fatores de risco presentes
(FRP)
Muito
Muitíssimo
Total
n
%
n
%
n
%
Obesidade
17
33,3
5
9,8
22
43,1
Níveis elevados colesterol
11
21,6
11
21,6
22
43,2
Níveis elevados diabetes
15
29,4
2
3,9
17
33,3
Hábito exercício físico
3
5,9
0
0
3
5,9
Alimentação
15
29,4
6
11,8
21
41,2
Stress
16
31,4
8
15,7
24
47,1
Hábito fumar
10
19,6
17
33,3
27
52,9
Tensão arterial elevada
21
41,2
7
13,7
28
54,9
Neste estudo, o conhecimento sobre os fatores de risco gerais (conhFRG) apresenta
um valor médio de 25,08 com um desvio padrão de 5,81. 75% Dos doentes têm um
valor de conhecimento sobre fatores de risco gerais de 29,00, quando o valor máximo
de conhecimento registado foi de 35 e o mínimo de 9, (quadro 2). Quanto ao
conhecimento sobre os fatores de risco presentes (conhFRP), este apresenta um valor
médio de 16,54 com um desvio padrão de 4,51. 75% Dos doentes apresentaram um
valor de conhecimento dos fatores de risco presentes em si de 19, quando o valor
máximo de conhecimento foi de 25 e o mínimo de 7, (quadro 2). Como a literacia em
saúde nos doentes coronários (literacia), foi considerada a soma do conhecimento dos
fatores de risco gerais e presentes. Estes apresentam um nível de literacia em saúde
74
com valor mínimo de 18 e máximo de 57, com valor médio de 41,37 e 75% dos
doentes apresentam um nível de literacia em saúde de 48,25; (quadro 2).
Quadro 2- Nível de literacia em saúde, baseado nos conhecimentos dos FRG e FRP
Mín.
Máx.
Valor médio
Percentil 75
Desvio padrão
ConhFRG
9
35
25,08
29,00
5,81
ConhFRP
7
25
16,54
19,00
4,51
Literacia
18
57
41,37
48,25
8,78
Conhecimento sobre hábitos de vida e adesão ao tratamento
Os indivíduos foram questionados quanto ao grau de adesão nas mudanças de
hábitos de vida, feita uma análise descritiva com distribuição de frequências, a
resposta dominante foi o “não” com número de respostas superiores a 30, ou seja,
uma média de 65,43% de respostas negativas em todas as vertentes, com exceção na
alteração da alimentação com 26 (51%) de respostas afirmativas, (tabela 11).
Tabela 11 – Distribuição da amostra quanto às vertentes de adesão nas mudanças
nos hábitos de vida
Mudanças nos
hábitos de vida
Não
nº
Sim
%
n º
Total
%
nº
%
Perda peso
34
66,7
17
33,3
51
100
Redução níveis colesterol
35
68,6
15
29,4
50
98
Redução níveis glicose
38
74,5
12
23,5
50
98
Aumento exercício físico
37
72,5
13
25,5
50
98
Redução stress
35
68,6
15
29,4
50
98
Alteração hábito fumar
31
60,8
18
35,3
49
96
Alteração alimentação
24
47,1
26
51,0
50
98
Redução tensão arterial
33
64,7
17
33,3
50
98
75
Nas respostas afirmativas, referentes às mudanças nos hábitos de vida, analisadas as
respostas abertas que pretendem evidenciar a sua efetividade, verificou-se o seguinte:
- Relativamente à perda de peso, em 17 respostas obtidas, 3 perderam menos de 3kg,
5 entre 5kg a 10kg e 7 mais de 10kg.
- Relativamente à redução dos níveis de colesterol, em 15 respostas obtidas,10
referiram atingir os valores normais, ou seja valores inferiores a 190 mg/dl
- Relativamente à redução dos níveis de glicose, em 12 respostas obtidas, 6 referiram
conseguir valores inferiores a 110 mg/dl
- Relativamente ao aumento da frequência de exercício físico, em 13 respostas
obtidas, 9 fazem caminhadas, 2 hidroginástica e 1 anda no ginásio
- Relativamente à redução de stress, em 15 respostas obtidas, 5 referiram terem-se
reformado, 5 conseguiram uma vida mais calma e 5 alteraram sua forma de pensar
- Relativamente à alteração do hábito de fumar, em 18 respostas obtidas, 17 disseram
que deixaram de fumar
- Relativamente à alteração na alimentação, em 26 respostas obtidas, 12 referiram
comer menos gorduras, 5 mais peixe, 3 mais legumes e 2 menos carne.
- Relativamente à redução dos valores de tensão arterial, em 17 respostas obtidas,
todas elas referiram ter conseguido valores normais.
O número de mudanças dos hábitos de vida variou entre zero e oito, sendo que houve
9 (17,6%) de indivíduos que não efetuaram qualquer mudança e que apenas 2 (3,9%)
efetuaram todas elas. O maior número de mudanças efetuado pelo maior número de
indivíduos foi num total de quatro efetuado por 7 indivíduos (13,7%). Acima de cinco
mudanças, apenas 9 (17,6%) indivíduos as efetivaram na sua vida. (tabela 12).
A média de mudanças nos hábitos de vida efetuadas foi de 2,65, com desvio padrão
de 2,22. 75% Dos indivíduos de efetivaram mudanças nas suas vidas, fizeram-no em,
pelo menos quatro itens, (quadro 3).
76
Tabela 12- Distribuição da amostra quanto ao número de mudanças nos hábitos de
vida
MHV
nº
%
Zero
9
17,6
Uma
9
17,6
Duas
9
17,6
Três
6
11,8
Quatro
7
13,7
Cinco
2
3,9
Seis
4
7,8
Sete
1
2,0
Oito
2
3,9
Total
49
96,1
Quadro 3 - Mudanças nos hábitos de vida (MHV)
MHV
Mín.
Máx.
Valor médio
Percentil 75
Desvio padrão
0
8
2,65
4
2,22
Conhecimento/manuseamento e adesão dos medicamentos
Questionados os doentes sobre o saber identificar qual o medicamento prescrito para
diminuir níveis de colesterol, diminuir níveis de glicose, diminuir níveis de tensão
arterial e diminuir formação de trombos, as respostas foram:
Para o colesterol, 21 (41,2%) indivíduos nomeiam corretamente o medicamento, assim
como 19 (37,3%) para a tensão arterial e trombos. Por sua vez, 15 (29,4%) apenas
reconhece a medicação para a tensão arterial e 11 (21,%) não sabem identificar a
77
medicação dos trombos. A maioria, 31 (60,8%) não toma qualquer medicação para a
diabetes, (tabela 13).
Tabela 13 - Distribuição da amostra quanto à identificação dos medicamentos
Identificação
medicamentos
Sim por
nomeação
Sim por
reconhecimento
nº
Não Sabe
nº
nº
%
Colesterol
21
41,2
14
27,5
6
Diabetes
8
15,7
6
11,8
Tensão arterial
19
37,3
15
Trombos
19
37,3
6
Não se
aplica
%
Total
nº
%
19,6
51
100
31
60,8
51
100
9,8
12
23,5
51
100
21,6
15
29,4
51
100
%
nº
%
11,8
10
6
11,8
29,4
5
11,8
11
Questionados os doentes, sobre a alteração da dose de medicamento prescrito
aumentando ou diminuindo por sua vontade, o deixar de comprar os medicamentos
por serem demasiado caros, o pedir ajuda para compreender as prescrições/receitas e
sobre as vezes que toma medicamentos prescritos de outras pessoas, confirmou-se
que a alteração da dose não se verifica para a maioria dos indivíduos, 43 (84,3%),
assim como, 45 (88,2%) não deixam de comprar a medicação por ser demasiado cara
e por sua vez 49 (96,1%) não toma medicação prescrita de outra pessoa. Por outro
lado há 16 (31%) indivíduos que pedem “um pouco” de ajuda na compreensão das
prescrições/receitas e 10 (19,6%) pedem “muito”, (tabela 14).
Tabela 14 - Distribuição da amostra quanto ao manuseamento da medicação
Manuseamento
medicação
Muitíssimo
Muito
%
Um Pouco
nº
%
Nada
nº
%
Total
nº
%
nº
nº
%
Altera dose
1
2,0
0
0,0
7
13,7
43
84,3
51
100
Deixa de comprar
2
3,9
0
0,0
4
7,8
45
88,2
51
100
Pede ajuda
2
3,9
10
19,6
16
31,4
23
45,1
51
100
Toma de outros
0
0,0
0
0,0
2
3,9
49
96,1
51
100
78
Análise do nível de literacia em saúde no doente coronário consoante a idade
Hipótese 1: O nível de literacia em saúde no doente coronário correlaciona-se
negativamente com a idade
Para analisar a correlação entre o nível de literacia e a idade, foi utilizado o teste de
correlação linear de Pearson (r), porque segundo Laureano (2011), este aplica-se
quando se pretende testar a existência de relação entre duas variáveis quantitativas.
Existe relação linear se o coeficiente de correlação de Pearson (r) ≠0 e se p≤0,05,
rejeito H0, (não existe relação entre o nível de literacia e a idade).
Após aplicação do teste verificou-se que Pearson (r) = -0,232 e com sig. (2
extremidades) p=0,112, sendo p>0,05, revelou existir correlação não estatisticamente
significativa entre o nível de literacia e a idade, (quadro 4). O nível de literacia não
apresenta diferenças significativas com a idade, ou seja, o avanço da idade não
interfere negativamente com o nível de literacia.
Quadro 4 - Coeficiente de correlação de Pearson entre o nível de literacia e a idade
Variáveis
r de Pearson
Nível de significância (p)
Literacia e idade
- 0,232
0,112
Análise do nível de literacia em saúde no doente coronário consoante as
habilitações literárias
Hipótese 2: O nível de literacia em saúde no doente coronário difere consoante as
habilitações literárias
Para testar a diferença de nível de literacia em saúde consoante as habilitações
literárias, pretendeu-se utilizar o teste paramétrico ANOVA. Este aplica-se quando se
tem uma variável quantitativa (dependente) e se pretende comparar a sua média em
dois
ou
mais
grupos
populacionais
definidos
por
uma
variável
qualitativa
(independente) (Laureano, 2011). No entanto, como o número de indivíduos com
ensino superior é <5, considerado apenas dois grupos de ensino. O ensino primário
com N=21 e o secundário/superior com N=27, resultante da soma de N=23 (ensino
79
secundário) e N=4 (ensino superior). Assim foi utilizado o Teste t de Student cuja
aplicação é justificada quando se tem uma variável quantitativa (dependente) e se
pretende comparar a sua média em dois grupos populacionais independentes
definidos por uma variável qualitativa (independente) (Laureano, 2011). Foram tidos
em conta os pressupostos (normalidade e homogeneidade das variâncias).
Relativamente ao primeiro pressuposto, ao aplicar teste da normalidade foi
considerado na estatística segundo Shapiro-Wilk, por ter n <30 nas diferentes classes,
que demonstrou resultados de p=0,838 no ensino primário e p=0,884 no ensino
secundário/superior. Como p>0,05 nos dois grupos, verifica-se que a distribuição é
normal. Para o segundo pressuposto, teste da homogeneidade das variâncias, foi
baseado no teste de levene com resultados de F=0,269 e p=0,607. Com estes valores
assume-se que as variâncias de nível de literacia são iguais nos dois grupos, porque
p>0,05, aceita-se H0 (a média de literacia é igual consoante as habilitações literárias).
Pressupostos verificados e efetuado Teste t de Student à literacia consoante ás
habilitações literárias, e de forma geral, verificou-se que existe uma melhor média do
nível de literacia nos indivíduos com ensino secundário/superior (42,11), no entanto
estas diferenças não são estatisticamente significativas, (quadro 5). Como os valores
de t=-0,654 e p=0,516, então aceita-se H0. Não existem evidências estatísticas para
se afirmar que o nível de literacia na análise dos dados seja significativamente
diferente nos 2 grupos de habilitações literárias, ou seja, as habilitações literárias não
influenciam o nível de literacia.
Quadro 5 - Resultados da aplicação de t de Student à Literacia consoante as
habilitações literárias
nº
Média
Desvio
padrão
Ensino primário
21
40,42
9,65
Ensino secundário/superior
27
42,11
8,16
t
p
-0,654
0,516
80
Análise do nível de literacia em saúde no doente coronário consoante a procura
de folhetos/informação escrita
Hipótese 3: O nível de literacia em saúde no doente coronário difere consoante a
procura de folhetos/informação escrita.
Para analisar o nível de literacia em saúde nos doentes coronários com a procura de
folhetos/informação escrita, foi utilizado o teste paramétrico Teste t de Student, cuja
aplicação é justificada na hipótese 2.
Foram tidos em conta e verificados os pressupostos. Existe distribuição normal entre
as amostras, dos indivíduos que procuraram os folhetos/informação escrita e dos que
não procuraram. Feito pelo teste da normalidade (Kolmogorov-Smirnov, por ter n>30),
com valores de p=0,200.
Não existem evidências estatísticas para se afirmar que a média do nível de literacia é
diferente com a procura de folhetos /informação escrita. Como no teste de levene o
valor de F=2,694 e p=0,108; sendo p>0,05, assume-se H0 (a média de literacia em
saúde é igual consoante a procura de folhetos/informação escrita), ou seja não existe
diferença de variância entre os grupos. Por outro lado, como o valor t=0,090 e de
p=0,929, então aceita-se H0. Não existem diferença estatisticamente significativa entre
a média do nível de literacia entre os que procuram e os que não procuram os
folhetos/informação escrita.
A média do nível de literacia com procura de folhetos/informação escrita é de 41,60,
valor semelhante sem procura (41,31), (quadro 6). Por isso conclui-se que o nível de
literacia em saúde não difere consoante a procura de folhetos/informação escrita.
Quadro 6 - Resultados da aplicação de t de Student à literacia consoante a procura de
folhetos/informação escrita
Folhetos/informação
escrita
nº
Média
Desvio
padrão
Sim
10
41,60
5,92
Não
38
41,31
9,46
t
p
0,090
0,929
81
Análise da correlação da adesão nas mudanças de hábitos de vida e o nível de
literacia em saúde no doente coronário
Hipótese 4: A adesão nas mudanças dos hábitos de vida relaciona-se positivamente
com o nível de literacia em saúde no doente coronário
A regressão linear simples aplica-se quando se tem duas variáveis quantitativas, uma
dependente (explicada) e outra independente (explicativa) e se pretender descrever a
relação linear entre elas, (Laureano, 2011).
A relação linear entre a adesão nas mudanças de hábitos de vida e os níveis de
literacia é verificada através do coeficiente de correlação linear de Pearson.
Como Pearson (r)=0,273 e nível de significância p=0,066 constata-se a existência de
uma relação linear positiva e fraca entre o nível de literacia e as mudanças de hábitos
de vida, (quadro 7).
Quadro 7 - Correlação entre o nível de literacia e as mudanças de hábitos de vida
Variáveis
r de Pearson
Nível de significância (p)
Literacia e MHV
0,273
0,066
A avaliação do valor da regressão, é calculado pelo quadrado do valor da correlação,
isto é (0,273)2. Assim, verifica-se por estes resultados que, apenas 7,45 % das
mudanças de hábitos de vida são explicados pelo nível de conhecimentos de fatores
de risco gerais e presentes, ou seja, pelo nível de literacia.
82
4.10- Discussão dos resultados
Nesta etapa, é feita uma reflexão sobre a investigação realizada, dando ênfase aos
dados considerados mais significativos, confrontados com a literatura científica
consultada.
Esta investigação é constituída por 51 indivíduos, em que a maioria dos sujeitos é do
sexo masculino sendo 48, (94,1%). As mulheres, apenas 3 (5,9%), com idades entre
50 e 60 anos, não estão em número significativo para serem estudadas. Este fato não
exclui a existência de um maior número de mulheres com diagnóstico de doença
coronária, até porque, vários estudos têm demonstrado que após a menopausa, as
mulheres experimentam um aumento do risco de doença cardíaca. Neste estudo, não
existem dados suficientes para se caraterizar a amostra por sexo. As mulheres não
possuíram critérios de inclusão na amostra devido à idade avançada, com evidentes
incapacidades na compreensão do instrumento de colheita de dados.
Esta realidade não confirma a investigação de Coelho (2010), que ao estudar o perfil
de doentes com enfarte do miocárdio num hospital universitário, verificou que, de
todos os doentes estudados, 28,9 e 71,1% eram do género feminino e masculino
respetivamente. Do mesmo modo, num estudo de Damásio (2012) os diagnósticos de
SCA existem em maior número nos homens do que nas mulheres. Nos SCA-NSTE
69,7% nos homens contra 30,3% nas mulheres e nos SCA-STE 74% nos homens
contra 25% nas mulheres.
No presente estudo, a média de idade é de 61,04 anos com DP=9,67. 75% Dos
indivíduos tem 69 anos, distinguindo-se um pouco do RNSCA (2ª fase), em que a
idade média é de 66 anos.
A maioria dos indivíduos, 42 (82,4%) vive com o cônjuge, estando de acordo com os
censos 2011, a maioria da população residente em Portugal está casada (87,09%). De
igual modo, no estudo realizado por Lunelli et al (2009), em doentes com doença
arterial coronária, 78,3% eram casados,
Dos inquiridos, 25 (49,0%) têm ensino secundário, 31 (60,8%) está reformado e com
um rendimento entre 500 a 1500€ para 29 inquiridos (56,9%). Estes dados não estão
de acordo com o Estudo Amália (2011), visto que nele há uma maioria de indivíduos
(37%) com o ensino primário e estão no ativo (54,8%). Por outro lado aproxima-se do
estudo de Lunelli et al (2009), que mostra 47,8% da sua população aposentada e
66,3% vive com um rendimento até dois salários mínimos com uma média de
83
escolaridade de 6,4 anos. Segundo o Censos de 2011, 50% da população portuguesa
tem pelo menos o 9º ano de escolaridade, o que vai de encontro à população em
estudo.
Relativamente à realização de cateterismo cardíaco/coronariografia, no estudo 46
(90%) indivíduos foram submetidos ao exame com 68,6% de ICP. A recolha dos dados
foi efetuada em 3 meses, pelo que o tempo não foi suficiente para confirmar dados já
existentes no próprio serviço, cujo valor percentual de ICP foi de 43,8 %, num período
de 3 anos (Maio 2010 a Maio 2013). Estes últimos vão de encontro com o RNSCA
(2ªfase) que revela valores de 43% de ICP.
O conhecimento adquirido sobre a doença cardíaca foi maioritariamente através de
palavras de enfermeira/médico com 47 (92,2%) respostas, o que está de acordo com o
4º inquérito nacional de saúde 2005/2006 em que o médico ou enfermeiro foi a fonte
da informação do diagnóstico de doença crónica mencionada por mais de 90%.
Relativamente ao conhecimento dos fatores de risco presentes, verificou-se que os
fatores mais referenciados e autorelatados foram a tensão arterial elevada, o hábito de
fumar e o stress com 54,9, 52,9 e 47,1% respetivamente. O fator de risco menos
referenciado foi o hábito de fazer exercício físico com apenas 5,9 %. Os resultados
diferem do estudo de Pires (2010) sobre fatores de risco da doença coronária e
qualidade de vida “estudo exploratório no concelho de Odivelas”, em que foi
constatada a existência de hipertensão arterial em 82% da amostra no diagnóstico
clínico e em 83% no diagnóstico clínico percebido. Verificou-se, igualmente que a
maioria das pessoas referiu nunca ter fumado (54%) contra 46% que se distribuíram
pelos itens (algumas vezes, regularmente, frequentemente e sempre).
Neste estudo, a percentagem de indivíduos que referiram o stress como fator de risco
presente é um valor significativo (47,1%), o que vai de encontro ao estudo de
Rodrigues (2010), sobre “impacto do stress e hostilidade na doença coronária”, em
que nos resultados obtidos, ressalva-se o impacto do stress na doença coronária, uma
vez que são os indivíduos com EAM os que apresentam maiores níveis de stress. Os
resultados obtidos na Perceived Stress Scale (PSS) mostram que o grupo clínico
(M=21.53, DP=5.69), comparativamente com o não clínico (M=17.26, DP=6.09),
apresentou níveis de stress mais elevados (t = 2.80, p<0.05). Vários estudos
existentes na literatura, Serra apud Rodrigues (2010), corroboram com estes
resultados, afirmando que elevados níveis de stress afetam o estado de saúde do
indivíduo, propiciam o aparecimento de doenças, tais como a HTA, diabetes e doença
84
cardíaca. Concluiu também que a única variável que contribui significativamente para
a diferenciação entre o grupo de doentes cardíacos e o grupo de indivíduos saudáveis
é a perceção de stress.
Os elevados níveis de colesterol, a obesidade e a alimentação foram referenciados em
43,2, 43,1 e 41,2 % respetivamente. A diabetes foi apontada como sendo fator de risco
presente em 33,3 % das respostas. Estes resultados diferem novamente do estudo de
Pires (2010), visto que em relação à hipercolesterolémia, os itens clínicos apresentam
um valor de 69%, em relação aos itens clínicos percebidos de 54%, em relação à
obesidade, verificou-se existir nesta amostra referenciação clínica em 36% dos
inquiridos e em ter mais peso para a sua altura, obesidade percebida 56% e que a
grande maioria dos indivíduos eram diabéticos tipo II, a fazer terapêutica antidiabética
oral, sendo 87,7%, utentes referenciados pelos seus médicos de família, dentro dos
quais existiram 3 indivíduos que negaram a patologia e 5 que disseram ignorar o
diagnóstico. No presente estudo, a diabetes foi dos fatores de risco presentes menos
referenciados e por isso, considerado, também, uma não prioridade com uma
correspondente não adesão nas mudanças de hábitos de vida com 38 respostas
(74,5%).
A dislipidémia é, um dos fatores de risco gerais mais referenciados (90,2%), e como
fator de risco presente (43,2%), é um conhecimento consistente, que faz parte do diaa-dia da população em estudo. Embora, este último com percentagens inferiores ao
estudo de Fernandez (2008), sobre “o conhecimento dos fatores de risco na doença
coronária após ICP: uma preocupação fundamental para a prática de enfermagem”, o
presente estudo corrobora com o segundo, onde a maioria dos inquiridos foi capaz de
identificar o colesterol elevado (87%), o tabagismo e a hipertensão com 83% e 82%
respetivamente, como fatores modificáveis. Dos inquiridos, 46% identificaram a
diabetes como sendo um fator de risco modificável. Apenas um terço dos participantes
reconheceram todos os seis fatores de risco modificáveis. Uma grande proporção de
doentes fumadores, com altos níveis de colesterol ou hipertensos, identificou estes
fatores como sendo de risco, por outro lado um terço dos diabéticos não
reconheceram essa condição como fator de risco para a doença cardíaca.
O conhecimento dos fatores de risco presentes, neste estudo, apresenta baixos
valores, com valor médio de 16,54 e DP=4,51. No entanto, também os fatores de risco
mais referidos como estando presentes foram a hipertensão arterial e o hábito de
fumar, com 54,9 e 52,9 % das respostas.
85
Esta investigação vai de encontro ao estudo sobre “Educação Alimentar na Formação
de Adultos Contributos para a Educação/Promoção da Saúde” efetuado por Augusto
(2011) onde se apurou que “alguns alunos apresentam diversas patologias. Metade
dos inquiridos refere a presença de níveis elevados de colesterol e de tensão arterial.
Constata-se ainda que uma percentagem significativa de indivíduos (10% a 55%) não
conhece a sua situação de saúde em relação às patologias apresentadas”.
Este fato associa-se ao baixo nível de adesão nas mudanças de hábitos de vida, com
uma média de respostas negativas de 65,43% e visto em termos de número de
mudanças de hábitos de vida, quatro mudanças foi o maior número apresentado pelo
maior número de indivíduos, que são 7 (13,7%). Existem 9 indivíduos (17,6%) que não
efetuaram qualquer mudança, o mesmo número de inquiridos referiu ter efetivado
apenas uma e duas. O máximo de mudanças efetuadas, que são oito, fora referido por
apenas 2 indivíduos (3,9%).
Resultados semelhantes ao do estudo de Lunelli et al (2009), em que a “maioria dos
pacientes
não
aderiu
à
terapêutica
não
farmacológica
evidenciando
uma
subvalorização da necessidade da modificação preventiva dos hábitos de vida para
controlo dos fatores de risco. Por outro lado a maioria dos pacientes é mais aderente
ao manejo farmacológico dos que às medidas de autocuidado que compõe o manejo
não farmacológico da doença”.
Estas mudanças quando, efetivamente foram assinaladas revelaram-se em termos de
perda de peso, em 17 respostas obtidas, 3 perderam menos de 3kg, 5 entre 5kg a
10kg e 7 mais de 10kg; à redução dos níveis de colesterol, em 14 respostas obtidas,
10 referiram atingir os valores normais, ou seja valores inferiores a 190 mg/dl; à
redução dos níveis de glicose, em 11 respostas obtidas, 6 referiram conseguir valores
inferiores a 110 mg/dl; ao aumento da frequência de exercício físico, em 13 respostas
obtidas, 9 fazem caminhadas, 2 hidroginástica e 1 anda no ginásio; à redução de
stress, em 16 respostas obtidas, 5 referiram terem-se reformado, 5 conseguiram uma
vida mais calma e 5 alteraram sua forma de pensar; à alteração do hábito de fumar,
em 20 respostas obtidas, 17 responderam que deixaram de fumar; à alteração na
alimentação, em 26 respostas obtidas, 12 referiram comer menos gorduras, 5 mais
peixe, 3 mais legumes e 2 menos carne; à redução dos valores de tensão arterial, em
16 respostas obtidas, todas elas referiram ter conseguido valores normais.
86
Estes dados podem mostrar o desconhecimento do doente sobre a doença e a
desmotivação para a tratar quando assintomática e crónica, nomeadamente incidir em
mudanças de estilo de vida alterando os fatores de risco modificáveis.
Neste estudo, a medicação tomada autoreferida, é para a hipertensão com 74,5%,
para a dislipidémia (68,6%) e antitrombóticos (60,8%). Estes dados coincidem com os
apresentados no 4º inquérito nacional de saúde 2005/2006, em que o consumo de
medicamentos, nas duas semanas anteriores à entrevista, foi realizado por 52,8% da
população. Os principais motivos deste consumo estão associados à HTA (15,6%), à
dor nas articulações (10%) e à redução do nível de colesterol (9,5%). Há que referir
que a população inquirida não padecia apenas de doença cardíaca.
Relativamente à identificação dos medicamentos, a maioria sabe nomear o
medicamento que toma para o colesterol (41,2%), tensão arterial e trombos com
37,3%, à exceção dos diabetes cujas respostas foram maioritariamente o “não se
aplica” com 60,8%.
Perdigão
(2010)
no
estudo
Hipócrates
“Prevalência
e
caracterização
da
hipercolesterolémia em Portugal” concluiu que 56% da população avaliada tinha
Colesterol total >190 mg/dl e/ ou medicação hipolipemiante. Pode-se verificar que, a
apresentação de elevados níveis de colesterol (43,2%) e a toma de medicação
autoreferida em 68,6%, confirmam os resultados existentes no estudo Hipócrates com
um valor de 55,9%.
Quando questionados sobre o manuseamento da medicação, os inquiridos foram
perentórios em confirmar que não alteram a dose, não deixam de comprar nem tomam
medicação de outros, com 84,3, 88,2 e 96,1% respetivamente. Por outro lado pedem
ajuda na compreensão das prescrições/receitas “um pouco” com 31,4% e “muito” com
19,6%. O fato de pedir ajudar pode indiciar que o nível de literacia dos indivíduos em
estudo é baixo, também verificado num estudo de Bosworth (2010) sobre desafios e
estratégias para melhorar a literacia em saúde e competências do doente, tendo-se
verificado que, aproximadamente metade (46%) dos doentes do estudo era incapaz de
ler e indicar corretamente uma ou mais das instruções da bula em cinco prescrições
comuns. Segundo um estudo de Santos (2010) sobre “a adesão à terapêutica em
doentes com patologia cardíaca”, o nível de conhecimentos sobre a patologia, bem
como informação sobre os efeitos da medicação exercem uma influência considerável
na adesão à terapêutica, sendo que quanto mais conhecimentos e informações
possuírem maior adesão à terapêutica apresentam. Conseguiram aferir que mais de
87
metade da amostra (54,5 %) revela uma “boa adesão” à terapêutica, sendo que os
doentes com Doença Coronária (58,3 %) apresentam uma maior percentagem do que
os doentes com IC (50,0 %). Por sua vez, são os doentes com IC (35,0 %) que têm
maior percentagem na “baixa adesão”, comparativamente aos doentes com Doença
Coronária (29,2 %). Num estudo citado por Pina (2011), que incidiu sobre os fatores
de risco e adesão aos tratamentos em doentes com risco cardiovascular, concluiu que,
38% dos participantes não cumpriam o regime terapêutico, no entanto, no presente
estudo 90,8% dos inquiridos tomam medicação.
Visto que, também no presente estudo, existe uma “boa” adesão terapêutica, pode-se
inferir que os doentes, possivelmente, não estejam convencidos da real importância de
mudar alguns dos seus hábitos, esperando somente das medicações o controlo dos
fatores de risco e a prevenção de eventos coronários.
Para verificação da hipótese “O nível de literacia em saúde no doente coronário
correlaciona-se negativamente com a idade”, foi usado teste de correlação linear de
Pearson (r) e adotou-se como estatisticamente significativos resultados com valores
p≤0,05, pelo analisado, a correlação não é estatisticamente significativa, porque o
nível de sig. é p=0,112. Assim, o nível de literacia em saúde assume diferenças pouco
significativas independentemente da idade. Este resultado não corrobora com o estudo
de Ávila (2005), sobre “A Literacia dos Adultos: Competências-Chave na Sociedade do
Conhecimento ”na análise da composição etária dos vários níveis de literacia revela
diferenças significativas entre eles, com os mais jovens a serem maioritários nos
níveis de competências mais altos e os mais velhos a predominarem nos níveis mais
baixos. Se a análise for efetuada confrontando as competências de literacia (em
termos médios) obtidas em cada escalão etário, a relação entre literacia e idade tornase ainda mais nítida: à medida que aumenta a idade, diminuem regularmente as
competências de literacia. A quebra é especialmente acentuada para a literacia em
prosa e documental, e um pouco menor no caso da literacia quantitativa. Seja como
for, o padrão descendente mantém-se nas três escalas. Embora os níveis de literacia
mais baixos atinjam as maiores proporções entre os mais velhos, não deixam de ter
valores significativos em todos os grupos de idades, mesmo entre os mais jovens.
Para verificação da hipótese “O nível de literacia em saúde no doente coronário difere
consoante as habilitações literárias”, foi usado teste de correlação linear de Pearson
(r). Averigua-se que o nível de literacia não difere significativamente consoante as
habilitações. Os resultados obtidos têm nível de significância de p=0,516. Deduz-se
que, tanto nos indivíduos com baixa escolaridade como média e alta, não existe
88
diferença significativa no nível de literacia, visto que o valor médio encontrado é 40,42
para o ensino primário e 42,11 para o ensino secundário / superior.
Este fato também foi constatado no estudo de Ferreira (2012), sobre “a evolução dos
fatores de risco em Portugal”, onde se verificou que, nos indivíduos com nível de
ensino baixo, onde os fatores de risco cardiovascular foram mais prevalentes em todos
os IqNS. Contudo e apesar da prevalência dos fatores de risco cardiovasculares ser
maior nos indivíduos com níveis de ensino baixo, é de realçar o aumento gradual da
tendência dos fatores de risco cardiovasculares para indivíduos com níveis de ensino
médio alto e alto ao longo dos IqNS. Sugerindo que apesar da melhoria das condições
de vida e educação adquirida, a presença de comportamentos saudáveis nem sempre
é compreendida e adotada.
Ávila (2005) tornou claro que a posse de qualificações escolares mais elevadas não se
traduz forçosamente no domínio das competências de leitura, escrita e cálculo
consideradas necessárias para enfrentar as exigências das sociedades atuais.
Concluiu também, que os percursos escolares muito reduzidos (inferiores ao básico 2)
dificilmente possibilitam a aquisição dos instrumentos necessários ao desenvolvimento
de competências de literacia acima dos Níveis 1 e 2.
Uma vez mais, estas discrepâncias, ou desajustamentos, conduzem a que se
questione, não só o funcionamento da escola, mas também o modo como as
aquisições escolares podem sofrer, ao longo dos trajetos de vida, efeitos dos quadros
sociais de existência, tanto a nível profissional como extra profissional.
Monteiro (2009) ao estudar “A Literacia em Saúde” demonstrou que os indivíduos, que
responderam ter concluído o 1.º ano de escolaridade são os que mais dificuldades têm
em ler folhetos. Isto vai também de encontro à conclusão empírica de que a baixa
escolaridade tem consequências na vida das pessoas em múltiplos aspetos, criando
dificuldades e barreiras.
Assim, no essencial os resultados permitem concluir que a maioria dos utentes não
têm a literacia desejável mas apenas a minimamente adequada, ou seja, não estão
completamente ‘às escuras’ quando têm de interagir com informação escrita na área
da saúde mas apercebem-se das suas dificuldades quando têm de ler rótulos nos
frascos dos medicamentos, sentindo igualmente necessidade de recorrer a outras
pessoas para as ajudarem a ler folhetos hospitalares (Monteiro, 2009). Este autor,
refere ainda média de 18,22 para capacidade de leitura fácil, 11,48 para capacidade
de leitura difícil e 11,94 para dificuldade de compreensão- informação escrita.
89
Assim, para verificação da hipótese “O nível de literacia em saúde no doente coronário
difere consoante a procura de folhetos/informação escrita”, foi usado teste paramétrico
Teste t de Student, tendo-se verificado que também neste estudo, não houve diferença
de nível de literacia em saúde consoante a procura de folhetos/informação escrita,
visto que a sua média com procura ou sem procura de folhetos/informação escrita é
semelhante em ambos os casos, com médias de 41,60 e 41,31 respetivamente.
Ávila (2005), no seu estudo, refere que perante situações que remetem para o
relacionamento dos cidadãos com as instituições, ou quando estão em causa cuidados
de saúde, as tarefas como a leitura de folhetos de medicamentos e a leitura de
informação institucional implicam, com maior frequência, o apoio de terceiros. As
percentagens de respostas são de 25,4% e 34,4%, respetivamente, para níveis de
literacia 1e 2. Kilonzo (2011) refere que o uso continuado do jargão científico reduz
potencialmente a literacia em saúde do doente alfabetizado e pode aumentar o risco
de pouca procura de cuidados de saúde.
Pode-se deduzir que, o baixo nível de literacia em saúde é originado pela escassa
procura de folhetos/informação escrita e que também, a baixa procura de
folhetos/informação escrita é provocada pelo baixo nível de literacia, sendo necessário
a ajuda de terceiros no acesso a tarefas sociais, nomeadamente aos cuidados de
saúde.
Para verificação da hipótese “A adesão nas mudanças de hábitos de vida relaciona-se
positivamente com o nível de literacia em saúde no doente coronário”, foi utilizada a
regressão linear simples entre as mudanças de hábitos de vida e a literacia. A
qualidade do modelo é avaliada segundo o coeficiente de correlação linear de Pearson
(r), que revela uma relação de intensidade fraca entre a literacia e as mudanças de
hábitos de vida, com r=0,273, verificando-se que apenas 7,45% das mudanças de
hábitos de vida são explicados pelo nível de conhecimentos dos fatores de risco gerais
e presentes (literacia). Esta revelação vai de encontro ao estudo de Dosse (2009),em
que os resultados obtidos na sua pesquisa sobre adesão de pacientes hipertensos ao
tratamento
conclusões:
medicamentoso
61,76%
e
não
demonstraram
medicamentoso
assiduidade
às
permitiram
consultas;
as
seguintes
86,76%
não
apresentaram adesão ao tratamento medicamentoso de acordo com protocolo de
Morisky-Green; 85,29% têm pelo menos um hábito de vida não saudável, ou seja, não
aderiram totalmente ao tratamento não medicamentoso; os principais motivos referidos
90
pelos pacientes hipertensos para a sua não adesão ao tratamento foram: emocional
(69,1%), não souberam relatar o motivo (10,3%) e alimentação (8,8%).
Marques (2010), também no seu estudo sobre “Motivos da não adesão ao tratamento
médico” de entre os diversos motivos identificados destacam-se o fator económico e o
apoio familiar, que, associado a outros, como o estudo precário, analfabetismo, os
mitos, as crenças e as tradições vividas por eles no passado, exerceram grande
influência sobre suas decisões de acatarem ou não o tratamento médico prescrito.
Dewalt et al, citados por Santos (2010) numa meta-analise, verificaram que uma baixa
literacia está também associada a maiores taxas de hospitalização, diminuição na
utilização de medidas preventivas, e pobre adesão aos regimes terapêuticos.
Assim sendo, os doentes com patologia coronária crónica ou aguda, desconhecem a
existência dos fatores de risco, nomeadamente os modificáveis e não aplicam sobre
eles mudanças voluntárias e saudáveis, de forma a encontrar uma solução para
melhorar o seu estado de saúde. Perante esta realidade, quais são então as
consequências ou resultados advindos deste modo de perspetivar a literacia em
saúde? Mais do que isso, o que acontece quando o modo de intervenção/ação não é
pensado desta forma e os indivíduos possuem um reduzido nível de literacia em
saúde? Loureiro (2012) evidencia diferentes consequências: custos acrescidos nos
cuidados de saúde; reduzido ou falso conhecimento sobre as doenças e tratamentos;
menores competências de autogestão; menor capacidade para cuidar de pessoas em
condições crónicas; erros de medicação; incapacidade para lidar com sucesso com o
sistema de cuidados de saúde e utilização dos serviços de saúde de forma
desadequada. Vale a pena pensar nisso!
91
92
CONCLUSÃO
Chegado ao momento de conclusão do estudo sobre “A literacia em saúde no
doente coronário” que teve como objetivo entender mais profundamente, como os
doentes coronários conhecem os fatores de risco tanto a nível geral como presentes
nas suas vidas, por forma a relacionar esse conhecimento com eventuais mudanças
de hábitos de vida. Essa preocupação prende-se com o que, na literatura se diz, em
Portugal os níveis de literacia nos adultos é em média dos mais reduzidos. Por outro
lado, os fatores de risco cardiovasculares, nomeadamente, os modificáveis são uma
prioridade constante nos indivíduos que apresentam doença cardíaca, mais
especificamente, doença coronária.
Está provado que alterações voluntárias nos fatores de risco por parte dos doentes
têm um contributo muito positivo na melhoria da qualidade de vida como na prevenção
de novos eventos coronários e por sua vez, redução de cuidados de saúde tanto em
internamentos como em tratamentos invasivos ou farmacológicos.
Tendo esta doença surgido ligada a um leque infindável de problemas, os quais
ultrapassam o modelo biomédico, surge a necessidade de intervenção das várias
ciências humanas. Assim, estas têm uma importante contribuição a dar, quando da
mudança de comportamento e de estilos de vida. O sofrimento e os custos causados
pelas doenças cardiovasculares deram-lhes uma marcada preponderância, de tal
forma que estas doenças se podem considerar, hoje, como verdadeiras doenças
sociais: doenças com génese e com repercussão social.
De forma particular, os enfermeiros de cardiologia, enfrentam diariamente pessoas
que, muitas vezes desconhecem o motivo por que está a ser tratado. Como maior
grupo de prestadores de cuidados, são os primeiros e o ponto mais consistente de
contato nos cuidados de saúde. Na sua prática, têm a oportunidade e a
responsabilidade de educar para minimizar as complicações e promover linhas
orientadoras de adoção de comportamentos de adesão a tratamentos farmacológicos
que permite normalizar valores de tensão arterial, colesterol e diabetes, e formação de
93
trombos. Os tratamentos não farmacológicos incluem mudanças de estilos de vida,
como, alimentação melhorada, prática de exercício físico e cessação tabágica.
A pesquisa bibliográfica assentou na recolha e análise de algumas obras que
contribuíram no enriquecimento da pesquisa, tais como: livros, teses publicações
periódicas, artigos científicos. Para a recolha de dados, foi elaborado um questionário
baseado numa tradução, adaptação e validação de um questionário sobre o
conhecimento dos fatores de risco cardiovascular para doentes com doença coronária.
As limitações assentaram basicamente na preocupação de construir um instrumento
que ajudasse na recolha de dados mas que fosse também acessível aos doentes.
Inicialmente foi criado um questionário baseado e adaptado em questionários para a
recolha de dados com tradução, adaptação e validação, para a população portuguesa:
Test of Functional Health Literacy in Adults e Functional Health Literacy Measure:
REALM – Rapid Estimate of Adults Literacy in Medicine- teste , TOFHLA – Test of
Functional Literacy in Adults ou S-TOFHLA (versão reduzida), CARRF-KL –
Cardiovascular Disease Risk Factors- Knowledge level, MMARS - Morisky Medication
Adherence Scale, MARS - Medication Adherence Rating Scale, BMQ - Brief
Medication Questionnaire. Após pré teste, confirmou-se que o questionário era
demasiado comprido, os inquiridos demoravam cerca de uma hora a preenchê-lo e
solicitavam a presença da investigadora. As perguntas sobre hábitos de vida
saudáveis eram confusas no entender dos doentes.
Outra limitação prende-se com o tipo de amostragem não aleatória utilizada, o que
interfere na representatividade da amostra implicando que os resultados não possam
ser generalizados à população com doença coronária. Este método de amostragem
favorece a auto-selecção, podendo os doentes que participaram constituir uma
amostra enviesada.
Apesar das limitações existentes, cumpriu-se com os objetivos propostos, na avaliação
e caracterização dos níveis de literacia em saúde nos doentes coronários, na
identificação dos fatores de risco presentes e na efetividade das mudanças de hábitos
de vida no doente coronário.
Pela análise dos dados, chegou-se algumas conclusões, que caraterizam os doentes
do Serviço de Cardiologia. Estes são maioritariamente do sexo masculino, têm uma
média de idade de 61,04 anos, com um mínimo de 32 e máximo de 84 anos. Os
94
indivíduos vivem com cônjuge, estão reformados, com rendimentos entre os 5001500€ e cerca de metade têm ensino secundário.
A maioria realizou cateterismo cardíaco com ICP. Os conhecimentos adquiridos sobre
a doença e fatores de risco foram através de palavras de enfermeira/médico.
A tensão arterial elevada, o hábito de fumar e o stress, foram os fatores de risco mais
autorelatados como estando presentes nas suas vidas, no entanto, o seu nível de
conhecimento (literacia) é baixo, (média de 41,37), levando igualmente a baixos níveis
de adesão a mudanças de hábitos de vida, ficando aquém do que seria ideal, visto que
a maioria não efetuou qualquer mudança.
A toma da medicação apresenta altos valores de adesão, sabendo identificar os
medicamentos tanto através da nomeação como do reconhecimento. A terapêutica
antihipertensiva e hipolipemiante são a mais tomada e reconhecida. Deduz-se que os
fatores de risco da hipertensão arterial e dislipidémia estão bem assimilados pelos
doentes coronários. No entanto ainda existem outros fatores de risco modificáveis que
não estão tão bem assumidos, pelo que permanece ainda um empenho por parte dos
profissionais de saúde, principalmente, os enfermeiros na educação para as
mudanças de estilo de vida, para práticas de hábitos salutares como sejam a prática
de exercício físico, a cessação tabágica e uma alimentação saudável.
De encontro à questão formulada no início deste estudo, “Qual o nível de literacia em
saúde no doente coronário e em que medida é influenciada pela procura de folhetos/
informação escrita e pelas mudanças de hábitos de vida” verificou-se que o nível de
literacia em saúde apurado tem um valor baixo e por outro lado, tanto a procura de
informação
escrita
como
as
mudanças
de
hábitos
de
vida
têm
pouco
significado/importância no nível de literacia em saúde, nos doentes coronários,
internados neste Serviço de Cardiologia desta Instituição.
Para melhorar estes resultados, fica a proposta de se efetuar uma avaliação de
conhecimentos dos fatores de risco presentes na admissão do doente à unidade de
Cardiologia e de uma reavaliação desse conhecimento 3 ou 6 meses depois da alta. A
distribuição de folhetos/informação escrita adequada ao nível de escolaridade seria
uma mais-valia no ensino do doente/cuidadores ou outros potenciais doentes. Por
outro lado, saber que mudanças de hábitos de vida foram efetivadas após a alta e
apurar os benefícios sentidos que daí resultaram.
95
Sugere-se igualmente, a inclusão de um psicólogo na equipe multidisciplinar, a
introdução de medidas de organização de trabalho para facilitar a vigilância e
monitorização nas mudanças de hábitos de vida por forma a minimizar a presença de
fatores de risco modificáveis na vida das pessoas. A educação sobre os vários fatores
de risco, sempre prioridade dos enfermeiros porque têm um papel facilitador na
transição de saúde-doença, promove as disposições individuais necessárias à
mudança ou à consciencialização de um novo significado à transição e permite uma
integração à nova condição de saúde da pessoa.
Este trabalho poderá ser um ponto de partida para futuras investigações/estudos ou
instrumentos de medida no sentido de procura de soluções para a melhoria de
cuidados em doentes cada vez mais atentos e exigentes.
Seria igualmente interessante alargar o estudo a outros serviços/hospitais,
implementando uma cultura de educação ao doente coronário.
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110
ANEXOS
111
112
ANEXO I – Instrumento de colheita de dados
113
114
ANEXO II – Pedido de autorização dirigido ao Presidente do Conselho de
Administração e respetivo deferimento
115
116
ANEXO III – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
117
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