Brasil Ano 12 - no 5 ISSN 1518-9740 Envelhecimento • Função cognitiva e capacidade funcional em idosos Incontinência urinária • Ginática hipopressiva e propriocepção do assoalho pélvico Physical Therapy Brazil Fisioterapia Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - Setembro/Outubro de 2011 Setembro / Outubro de 2011 13 anos Esporte • Lesões musculoesqueléticas em karatê Neurologia • Cicloergometria e hemiparesia • Funcionalidade de pacientes hemiparéticos História • Evolução da fisioterapia www.atlanticaeditora.com.br Fisioterapia Brasil Physical Therapy Brazil (vol. 12, nº 5 setembro/outubro 2011 - 321~400) EDITORIAL Se ninguém me perguntar, eu sei. Se me perguntarem, ignoro, Marco Antonio Guimarães da Silva......................................... 323 ARTIGOS ORIGINAIS Efeito imediato da técnica de compressão isquêmica na inibição de pontos gatilhos, Raphaela Farias Teixeira, Robéria Santos de Albuquerque, Vivianne de Lima Biana, Geraldo Magella Teixeira............................. 324 Abordagem da funcionalidade de pacientes hemiparéticos crônicos através da Classificação Internacional de Funcionalidade, Luciana Castaneda, Heitor Silveira, Fernanda Guimarães de Andrade, José Vicente Martins.................................................................................................................................................................... 330 Efeitos de uma intervenção fisioterapêutica em grupo na sobrecarga e qualidade de vida de cuidadores familiares de pessoas com deficiência, Midiã Lins Silva Coutinho, Domingos Belasco Junior............................ 336 Lesões musculoesqueléticas em atletas de elite do karatê: modalidade katá e kumitê, Alessandra Caribé Moura, Alexandre Sabbag da Silva, Angélica Castilho Alonso.......................................................................... 342 Relação entre função cognitiva e capacidade funcional em idosos institucionalizados de Caxias do Sul/RS, Fernanda Cechetti, Cristiane Reis, Tiago Cabral, Fernanda Bett, Laís Rodrigues, Renata Bortolini, Fernanda Simioni, Aline Zanonato, Gislaine Schmitt, Nathalia Guazzelli, Gleice Vigolo, Tiago Lopes, Francine Finger, Rosane Bolfe, Franciele Roth, Luciano Puhl............................................................ 347 Avaliação da resistência imposta pelos filtros trocadores de calor e umidade às vias aéreas de pacientes com suporte ventilatório mecânico, Nayala Lirio Gomes Gazola, Fernando Osni Machado, Walter Celso de Lima, Humberto Pereira da Silva, Juliana El Hage Meyer de Barros Gulini......................................................... 353 Correlação entre fleximetria e goniometria radiológica para avaliações da amplitude articular estática do cotovelo, Rodrigo Luis Ferreira da Silva, Renato Ramos Coelho, Rodrigo Gomes de Souza Vale, Estélio Dantas.............................................................................................................................. 359 Ginástica hipopressiva como recurso proprioceptivo para os músculos do assoalho pélvico de mulheres incontinentes, Thaís F Costa, Ana Paula M Resende, Maura R Seleme, Liliana Stüpp, Rodrigo A Castro, Bary Berghmans, Marair GF Sartori................................................................................................................ 365 RELATO DE CASO Estudo da função pulmonar, postura e equilíbrio durante a gestação, Maria Elaine Trevisan, Cecília Rossatto Facco, Juliana Corrêa Soares, Elhane Glass Morari Cassol................................................................................... 370 REVISÕES Intervenção precoce em lactentes prematuros, Regiane Briques Alves, Denise Campos............................................................. 374 Particularidades clínicas e fisioterapêuticas de crianças submetidas à cirurgia de cardiopatias congênitas, Angela Sachiko Inoue, Filomena Regina Barbosa Gomes Galas, Emilia Nozawa.............................. 379 Evolução histórica da fisioterapia: da massagem ao reconhecimento profissional (1894-2010), Daniela Simoni Espíndola, Miriam Süsskind Borenstein.............................................................................................................. 389 NORMAS DE PUBLICAÇÃO................................................................................................................................................ 395 EVENTOS. ................................................................................................................................................................................ 397 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 322 Fisioterapia Brasil www.fisioterapiabrasil.com.br Editor Marco Antônio Guimarães da Silva (UFRRJ – Rio de Janeiro) Conselho científico Abrahão Fontes Baptista (Universidade Federal da Bahia – BA) Anamaria Siriani de Oliveira (USP – Ribeirão Preto) Dirceu Costa (Uninove – São Paulo) Elaine Guirro (Unimep – São Paulo) Espiridião Elias Aquim (Universidade Tuiuti – Paraná) Fátima Aparecida Caromano (USP – São Paulo) Guillermo Scaglione (Universidade de Buenos Aires – UBA – Argentina) Hugo Izarn (Universidade Nacional Gral de San Martin – Argentina) Jamilson Brasileiro (UFRN) João Carlos Ferrari Corrêa (Uninove – São Paulo) Jones Eduardo Agne (Universidade Federal de Santa Maria – Rio Grande do Sul) José Alexandre Bachur (Universidade Católica de Petrópolis – RJ, Universidade de Franca -SP) José Rubens Rebelatto (UFSCAR – São Paulo) Lisiane Tuon (Universidade do Extreme Sul Catarinense – UNESC) Marcus Vinícius de Mello Pinto (Universidade Católica de Petrópolis – RJ) Margareta Nordin (Universidade de New-York – NYU – Estados Unidos) Mario Antônio Baraúna (Universidade do Triângulo Mineiro – UNIT – Minas Gerais) Mario Bernardo Filho (UERJ – RJ) Neide Gomes Lucena (UFPB) Nivaldo Antonio Parizotto (UFSCAR – São Paulo) Norberto Peña (Universidade Federal da Bahia – UFBA – Bahia) Roberto Sotto (Universidade de Buenos Aires – UBA – Argentina) Victor Hugo Bastos (UFVJM – Diamantina – MG) Grupo de assessores Jorge Tamaki (PUC – Paraná) Antonio Coppi Navarro (Gama Filho – São Paulo) Marisa Moraes Regenga (São Paulo) Antonio Neme Khoury (HGI – Rio de Janeiro) Luci Fabiane Scheffer Moraes (Univ. do Sul de Santa Catarina) Carlos Bruno Reis Pinheiro (Rio de Janeiro) Philippe E. Souchard (Instituto Philippe Souchard) João Santos Pereira (UERJ – Rio de Janeiro) Solange Canavarro Ferreira (HFAG – Rio de Janeiro) José Roberto Prado Junior (Rio de Janeiro) Lisiane Fabris (UNESC – Santa Catarina) Revista Indexada na LILACS - Literatura Latinoamericana e do Caribe em Ciências da Saúde, CINAHL, LATINDEX Abreviação para citação: Fisioter Bras Atlântica Editora e Shalon Representações Praça Ramos de Azevedo, 206/1910 Centro 01037-010 São Paulo SP E-mail: [email protected] www.atlanticaeditora.com.br Editor assistente Guillermina Arias [email protected] Atendimento (11) 3361 5595 / 3361 9932 E-mail: [email protected] Assinatura 1 ano (6 edições ao ano): R$ 240,00 Editor executivo Dr. Jean-Louis Peytavin [email protected] Diretor Antonio Carlos Mello [email protected] Direção de arte Cristiana Ribas [email protected] Todo o material a ser publicado deve ser enviado para o seguinte endereço de e-mail: [email protected] I.P. 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Se me perguntarem, ignoro Marco Antonio Guimarães da Silva Há três meses, recebi um e-mail me convidando para participar, como conferencista, do XIX Congresso Brasileiro de Fisioterapia, realizado em Florianópolis, entre os dias 9 e 12 de outubro. Não fosse pelo tema que me propuseram - Estratégias de Marketing - o convite não deveria ter me causado surpresa, porque, ainda que já estivesse aposentado, participei, no passado, de muitos congressos nas áreas de fisioterapia, de educação física e de medicina. Imaginei a pergunta que as pessoas que me conheciam fariam ao me ver falando sobre Marketing em um congresso de fisioterapia ou fosse lá onde fosse. Afinal, dediquei todos os meus quarenta anos de vida acadêmica à pesquisa, ao ensino da biomecânica e da epidemiologia, e nunca havia tido contato com áreas afins ao marketing. O óbvio apontava para uma recusa imediata ao convite. Mas, como ao longo de minha vida aprendi que a obviedade esconde algumas armadilhas, e, às vezes, é mais burra do que a própria unanimidade, resolvi me conceder um par de dias, antes de me pronunciar sobre o tema. Após algumas ponderações, vi que havia três maneiras de responder ao citado convite. A primeira delas, já citada aqui, seria a recusa, justificada pelo fato de não reunir as habilidades necessárias. A segunda alternativa seria a de aceitar o convite amparando-me no que disse Santo Agostinho: “O que é o tempo? Se não me perguntarem, eu sei. Se me perguntarem, ignoro.” Essa alternativa caiu por terra, por motivos muito claros, que não merecem aqui uma abordagem. A terceira e ultima opção também seria a de aceitar, buscando socorro no meu novo ofício: o de escritor ficcionista. Há alguns anos já havia penetrado no mundo ficcional, e agora, no terceiro romance, com contrato com uma editora de São Paulo, já me sentia seguro para criar um personagem, por acaso um fisioterapeuta, cuja trajetória de sucesso, consolidada em ações previamente estabelecidas, seria analisada na conferência. Convenci-me de que seria capaz de criar uma ou duas situações que envolvessem estratégias de um marketing mínimo, entendendo-se aqui como marketing mínimo o marketing sujeito aos códigos de ética dos Conselhos e Colégios profissionais. *Professor Associado da UFRRJ e de Doutorado no exterior. Contei então a historia de Dr. X., fisioterapeuta que queria viajar para a Europa mas não possuía recursos. Ele começou então a definir as metas e a produzir os planos de ações que o permitissem atingir os seus objetivos. Pensou consigo mesmo: “Poderia oferecer meus serviços em troca da passagem aérea, hospedagem e alimentação. Mas o que oferecer?” Após uma análise de seu potencial, concluiu que poderia ministrar um curso na sua área de competência; afinal, ele vislumbrara, há alguns anos atrás, um campo de conhecimento ainda pouco explorado e se preparara para um dia utilizar aquela formação. Ele tivera uma visão do futuro e se aproveitaria dela agora. O próximo passo seria identificar os nichos de mercado. No seu caso, locais onde poderia oferecer o seu curso. Uma vez identificado o mercado, teria que abordar esse mercado, fazendo a sua proposta. Conseguiu os endereços de Universidades, Faculdades e Associações que poderiam se interessar pelo seu tema e elaborou um documento com o programa do curso e a sua proposta. Ouviu muitas críticas de colegas que lhe diziam: “Você está louco homem? Acha que vão dar importância para um curso de alguém que não conhecem e que ainda por cima está na América do Sul”. Para esses sempre dizia: “o máximo que pode ocorrer é que digam não.” Dois meses após o envio da primeira proposta, o Dr. X estava viajando para Barcelona onde ministraria o seu primeiro curso. Daí por diante, ele teve oportunidade de estar em várias cidades da Europa, ministrando cursos e participando de outros eventos similares. Na palestra, abordei outros casos de sucesso; mas a falta de espaço não me permite trazê-los aqui. Não se pode deixar de considerar que o sucesso duradouro de uma estratégia de marketing está condicionado a um bom planejamento da carreira profissional e sobretudo a confiança que cada um tem de si mesmo. Para a reflexão de meus queridos leitores, termino com Bergson: “Tem-se, portanto, razão em dizer que o que fazemos depende daquilo que somos; mas deve-se acrescentar que, em certa medida, somos o que fazemos e que nos criamos continuamente a nós mesmos.” 324 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Artigo original Efeito imediato da técnica de compressão isquêmica na inibição de pontos gatilhos Immediate effect of ischemic compression technique in trigger points inhibition Raphaela Farias Teixeira*, Robéria Santos de Albuquerque*, Vivianne de Lima Biana**, Geraldo Magella Teixeira, M.Sc.*** *Bacharel em Fisioterapia pela Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas, **Professora da Faculdade de Fisioterapia da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas, Especialista em Saúde da Família pela Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas, ***Professor da Faculdade de Fisioterapia da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas Resumo Abstract Introdução: Os pontos gatilhos são manifestações comumente encontradas na Síndrome Dolorosa Miofascial, associados à presença de músculos em estado de encurtamento ou contratura, com aumento do tônus e rigidez. A técnica de compressão isquêmica é um dos vários tratamentos propostos para inibir os pontos gatilhos. Objetivo: Avaliar o efeito imediato da técnica de compressão isquêmica na inibição de pontos gatilhos do músculo trapézio superior, através da percepção dolorosa subjetiva e da análise eletromiográfica do referido músculo. Método: Participaram do presente estudo 24 indivíduos com presença de ponto gatilho latente ou ativo. Foram analisados os dados coletados na escala visual analógica adaptada e os valores médios das aquisições RMS (Root Mean Square) da eletromiografia de superfície, antes e após a aplicação da técnica, pelo teste de Wilcoxon, considerando-se um nível de significância p ≤ 0,05. Resultados: Houve diferença estatisticamente significante na avaliação da escala visual analógica (p = 0,0002), porém a análise do sinal eletromiográfico do músculo trapézio superior não revelou diferenças com significância estatística (p = 0,4772). Conclusão: A técnica de compressão isquêmica foi eficaz apenas em reduzir imediatamente o quadro álgico provocado pelo ponto gatilho, sem alterações significantes no sinal eletromiográfico do músculo trápezio superior. Introduction: Trigger points are manifestations commonly found in Myofascial Pain Syndrome, associated to the presence of muscles in a state of shortening or contraction, with increased tone and stiffness. The ischemic compression technique is one of several treatments proposed to inhibit trigger points. Objective: To evaluate the immediate effect of ischemic compression technique in the inhibition of upper trapezius muscle trigger points, through the subjective pain perception and muscle electromyographic analysis. Method: The study included 24 subjects with presence of latent or active trigger point. Data collected were analyzed using the adapted visual analogue scale and the RMS (Root Mean Square) average acquisition of surface electromyography before and after using the technique, through Wilcoxon test, considering a significance level of p ≤ 0.05. Results: There was a statistically significant difference in visual analogue scale evaluation (p = 0.0002), but the electromyographic signal analysis of the upper trapezius muscle revealed no differences with statistical significance (p = 0.4772). Conclusion: The ischemic compression technique was effective only in reducing immediately the trigger point pain, with no significant changes in the electromyographic signal of the upper trapezius muscle. Key-words: myofascial pain syndromes, ischemic compression, electromyography, pain measurement. Palavras-chave: síndromes da dor miofascial, compressão isquêmica, eletromiografia, medição da dor. Recebido em 29 de julho de 2011; aceito em 5 de outubro de 2011. Endereço para correspondência: Vivianne de Lima Biana, Avenida Maceió, 60 Tabuleiro dos Martins, 57061-110 Maceió AL, Tel: (82) 3352-0029, E-mail: [email protected] Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução As Síndromes Dolorosas Miofasciais (SDM) são caracterizadas pela presença de músculos em estado de encurtamento ou contratura, com aumento do tônus e rigidez, e que contenham pontos gatilhos miofasciais (PGs) [1], sendo o músculo trapézio um dos mais frequentemente acometidos por PGs. Os pontos gatilhos podem ser classificados, de acordo com o seu grau de irritabilidade, como latentes e ativos. Os pontos ativos são um foco de hiperirritabilidade sintomático no músculo e/ou fáscia, causando um padrão de dor referida específico para cada músculo. Produzem dor espontânea, à palpação ou ao movimento, restrição da amplitude de movimento, sensação de diminuição da força muscular e bandas musculares tensas palpáveis, podendo ainda produzir sintomas autonômicos [2,3]. Um PG latente está clinicamente em “silêncio” com respeito à dor, mas pode causar restrições de movimentos e fraqueza no músculo afetado [4]. Há diversas hipóteses sobre a patogenia e a fisiopatologia dos PGs. A teoria mais recente e mais documentada sobre a geração de PGs é a apresentada por Simons que defende a hipótese dos botões terminais disfuncionais e da crise de energia [5]. O dano ao músculo ocorre primariamente no nível das placas motoras, onde uma disfunção local do botão terminal produz uma liberação contínua e excessiva de acetilcolina (Ach) na fenda sináptica levando a uma atividade contrátil máxima e sustentada dos sarcômeros, enquanto ocorre constrição dos capilares locais. Cria-se então uma crise de energia intensa no local, responsável pela liberação de substâncias que sensibilizam os nociceptores locais [5,6]. O tratamento da dor miofascial baseia-se na inibição dos PGs, no restabelecimento da função muscular normal e na eliminação ou correção dos fatores desencadeantes ou perpetuantes [2,7]. Vários tipos de intervenção para inibir os PGs e aliviar a dor são propostos na literatura, dentre eles, a técnica de compressão isquêmica, que consiste na aplicação de uma pressão local sobre o PG por um tempo prolongado [6,8]. Apesar de ser comumente aplicada, ainda há poucas evidências conclusivas que atestem a eficácia dessa técnica. De maneira geral, as revisões sistemáticas criticam a qualidade metodológica dos trabalhos realizados e enfatizam a necessidade de novos estudos mais aprofundados, com o adequado rigor metodológico e que utilizem um método de avaliação validado e padronizado [9,10]. A eletromiografia de superfície (EMG-S) é um método biomecânico não invasivo que permite o estudo em tempo real da função muscular pela análise do sinal elétrico gerado durante a contração muscular [11]. Possibilita analisar quando o músculo se torna ativo, por quanto tempo fica ativo e se há pouca ou muita atividade contrátil do músculo [12], sendo considerado um instrumento de avaliação muito útil em pesquisas com PGs [13]. 325 O objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito imediato da técnica de compressão isquêmica na inibição de PGs no músculo trapézio superior, através da percepção dolorosa subjetiva e da análise eletromiográfica do referido músculo. Outro objetivo foi verificar se há diferença na eficácia da técnica aplicada sobre um PG ativo ou latente. A partir dos resultados deste estudo, espera-se verificar as seguintes hipóteses: a) a percepção dolorosa subjetiva ao pressionar o PG diminuirá após a aplicação da técnica de compressão isquêmica; b) a atividade muscular do trapézio superior na presença de PG diminuirá após a aplicação da técnica de compressão isquêmica. Material e métodos Participaram do presente estudo indivíduos de ambos os sexos, com idade de 18 a 30 anos e presença de PG latente ou ativo no músculo trapézio superior, recrutados na Clínica Escola de Fisioterapia Delza Gitaí da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Maceió/AL) no período de julho a outubro de 2009. Foram excluídos os indivíduos submetidos a procedimentos cirúrgicos em ombro, pescoço ou coluna nos últimos seis meses; com evidência clínica de doenças ortopédicas, reumáticas e neurológicas em ombro ou coluna cervical; déficits cognitivos; ou submetidos a qualquer tratamento para a SDM no último mês. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas. Todos os sujeitos foram devidamente informados sobre o estudo e a técnica envolvida e aqueles que concordaram em participar assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Inicialmente, os sujeitos foram submetidos a um exame de identificação dos PGs. Os PGs foram marcados com lápis dermatográfico preto por um X, sendo selecionado o PG central 1 do músculo trapézio localizado no meio das fibras verticais da parte superior do músculo trapézio, que é o PG mais frequentemente encontrado no corpo humano [14]. A presença de PG foi determinada usando os critérios diagnósticos descritos por Simons [14]: 1) Presença de uma banda tensa palpável no músculo esquelético; 2) Presença de um ponto hipersensível (doloroso) na banda tensa; 3) Fasciculação muscular local em resposta à contração da banda tensa provocada por um estímulo mecânico (deslizamento rápido dos dedos); 4) Reprodução do padrão típico de dor referida do ponto gatilho em resposta à compressão; 5) Presença espontânea de um padrão típico de dor referida e/ou reconhecimento da dor referida como familiar pelo paciente. O PG era considerado latente, se estivessem presentes os quatro primeiros requisitos. Se todos os critérios fossem atendidos, o PG era considerado ativo [15]. O padrão de dor referida do PG central 1 do músculo trapézio propaga-se pela região 326 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 póstero-lateral ipsolateral do pescoço, por trás da orelha até o processo mastoide do osso temporal [14]. Na primeira etapa, realizada pelo examinador 1, os pacientes foram submetidos a uma avaliação que incluía: ficha de coleta de dados (idade, sexo, membro superior dominante, tipo de PG, localização do PG e presença de dor em região do pescoço), avaliação da percepção dolorosa subjetiva ao pressionar o PG e análise do sinal eletromiográfico do músculo trapézio superior. A avaliação da percepção dolorosa subjetiva ao pressionar o PG foi realizada através da Escala Visual Analógica (EVA) adaptada, que consistia de uma linha horizontal de 10 cm, graduada de 0 (ausência total de dor) a 10 (dor máxima suportável pelo paciente) [16]. A análise do sinal eletromiográfico do músculo trapézio superior foi avaliada por meio da EMG-S com o aparelho Miotec de 02 canais e eletrodos de superfície de cloreto de prata, circulares e pré-geldados da marca Meditrace. O modelo utilizado foi o Miotool200 USB, com 14 bits de resolução, ruído < 2 LSB, taxa de aquisição por canal de 2000 amostras/segundo, rejeição de modo co­mum de 110db, isolamento de 3000 volts, impedância de entrada de 1010 Ω||2pF e filtro But­terworth passa alta 1 pólo de 0,1 Hz + Butterworth passa baixa 2 pólos de 500 Hz, com ganho fixo de 100x. Seguindo o protocolo recomendado por SENIAM [17], após assepsia da região com álcool a 70% e abrasão da pele com uma lixa, o primeiro eletrodo foi posicionado no ponto mediano entre a vértebra C7 e o acrômio e o segundo, eletrodo de referência, no processo espinal da vértebra C7. Solicitouse ao sujeito que realizasse elevação da extremidade acromial da clavícula e da escápula associada à extensão e rotação da cabeça e do pescoço em direção ao ombro elevado com a face rodada para direção oposta, contra uma força aplicada pelo examinador 1 no ombro na direção da depressão e na cabeça na direção da flexão anterolateralmente. A contração isométrica foi mantida por 30 segundos. O sinal eletromiográfico obtido passou por um filtro analógico passa-banda de 20-450Hz [18], e, em seguida, foi transformado analogicamente em valores RMS (Root Mean Square), de onde se extraiu o valor médio da amplitude do sinal processado, representado por microvolts (µV). Convém ressaltar que não houve qualquer interesse em fazer estudo inter-indivíduos e sim intra-indivíduos, de modo que nenhuma normalização foi necessária. Na segunda etapa, realizada pelo examinador 2 após a retirada dos eletrodos, foi aplicada a técnica de compressão isquêmica sobre o PG marcado, o qual não coincidia com a localização do eletrodo de captação. A aplicação da técnica seguiu o protocolo padronizado por Simons [14], sendo realizada com o paciente em decúbito dorsal, com o músculo em uma posição alongada. A técnica consiste em aplicar-se uma pressão no PG, aumentado-a gradualmente até a sensação de pressão se tornar a mesma que a sensação de dor. A pressão é mantida até o desconforto e/ou a dor aliviar em torno de 50%, percebido pelo próprio paciente, momento em que a pressão é aumentada até o desconforto aparecer novamente. Este processo é repetido durante os 90 segundos da técnica. Após 5 minutos, o paciente foi submetido à terceira etapa, que consistiu em uma nova avaliação, pelo examinador 1, da percepção dolorosa subjetiva e da análise do sinal eletromiográfico do músculo trapézio superior. O cálculo do tamanho da amostra foi estimado em 24 sujeitos; tendo como referência a média das diferenças de 1%; o desvio padrão do erro de 0,95; o poder do teste de 90% e um valor de p de 0,05. Para realização do cálculo utilizou-se a calculadora eletrônica Bioestat® versão 5.0. Para análise das variáveis foi realizado o cálculo da média/ desvio-padrão e teste de normalidade Komogorov-Sminorf para verificar se as váriaveis apresentavam distribuição normal. Como as variáveis não apresentaram distribuição normal, foi utilizado o teste não-paramétrico de Wilcoxon. Os testes estatísticos foram realizados através do programa Bioestat® versão 5.0, definindo-se um nível de significância de 0,05 (5%). Resultados Dos 24 indivíduos avaliados, 79,16% eram do sexo feminino e 20,83% eram do sexo masculino, com idade média de 22,66 ± 2,14 anos. Destes, 10 (41,66%) apresentaram PG ativo, acompanhado de padrão de dor referida do PG central 1 do músculo trapézio superior. Não houve predominância quanto ao dimídio em que o PG estava localizado (Tabela I). Tabela I - Características da amostra estudada. Características da Amostra Idade Gênero MS dominante Tipo de PG Localização do PG Presença de dor em região do pescoço Masculino Feminino Direito Esquerdo Ativo Latente Direito Esquerdo Sim Não 22,66 ± 2,14 20,83% 79,16% 91,66% 8,33% 41,66% 58,33% 50% 50% 41,66% 58,33% Os dados são apresentados em média ± desvio padrão ou porcentagem. MS: Membro Superior. PG: Ponto Gatilho. Fonte: Dados da pesquisa. Houve diferença estatisticamente significante na avaliação da perpepção dolorosa subjetiva antes e após a aplicação da técnica de compressão isquêmica (p = 0,0002), havendo redução do quadro álgico provocado pelo PG em 79,16% dos casos (Figura 1). Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 A análise do sinal eletromiográfico do músculo trapézio superior não revelou diferenças com significância estatística (p = 0,4772) nos valores médios das aquisições RMS após a aplicação da técnica (Figura 2), sendo observada diminuição da atividade muscular em apenas 45,83% dos indivíduos. Figura 1 - Análise da Escala Visual Analógica adaptada antes (EVAi) e após (EVAf ) a aplicação da técnica de compressão isquêmica. (*) Diferença estatisticamente significante, p > 0,05. cm 10 * 8 6 4 2 0 EVAi EVAf Figura 2 - Análise dos Valores Médios das Aquisições RMS do músculo trapézio superior antes (RMSmed i) e após (RMSmed f ) a aplicação da técnica de compressão isquêmica. Microvolts (µV) 400 300 200 100 0 RMSmed i RMSmed f Dos indivíduos com PG ativo, 70% apresentaram diminuição na percepção dolorosa subjetiva, dos quais 57,14% vieram acompanhados de redução na atividade muscular. Dos indivíduos com PG latente, 85,71% apresentaram diminuição na percepção dolorosa subjetiva, dos quais 66,66% vieram acompanhados de redução na atividade muscular. Discussão Os resultados obtidos demonstraram que a técnica de compressão isquêmica foi eficaz em promover alívio imediato da dor e redução da sensibilidade dos PGs, corroborando com 327 os achados descritos por Hong, Hanten, Hou, Fryer, De las Peñas e Gemmell [19,20,13,21-23]. No entanto, a partir da análise eletromiográfica do músculo trapézio superior, obtida pelos valores médios das aquisições RMS, a técnica de compressão isquêmica não foi eficaz em reduzir imediatamente a atividade muscular do trapézio superior com PGs centrais 1. Contudo, houveram muitos relatos de sensação de dormência e relaxamento muscular na região póstero-lateral ipsolateral do pescoço e sobre o PG. A EMG-S tem sido, recentemente, muito valorizada como um sinal que permite avaliar a função muscular, possibilitando uma avaliação da melhora da função do músculo decorrente de tratamento fisioterapêutico [24]. Os PGs estão associados à alteração da atividade muscular, o que pode ser proveniente de disfunção neuromuscular [25], representando uma área focal de distonia, que pode ser revelada pela EMG-S [26]. Simons [6] defende que o PG é gerado por um ciclo de feedback positivo que começa com a liberação anormal de grande quantidade de Ach na placa motora pelo nervo terminal. Isto leva a criação de um nó contraturado e possibilita outros efeitos contráteis que causam isquemia local e hipóxia, as quais estão associadas a um grande aumento no metabolismo e consumo energético (atividade contrátil máxima e localizada do sarcômero). Esta combinação de permanente aumento na demanda energética com baixo suprimento energético gera a crise de energia, que causa a liberação de substâncias neurovasoreativas sensibilizadoras. Essas substâncias levam a ativação das fibras nervosas autonômicas locais, que por sua vez induz a contínua liberação excessiva de Ach nas placas motoras, completando a alça de feedback. Hubbard [27] e Simons [25] propuseram que a razão para essa liberação excessiva de Ach deve-se à modulação autonômica. Ao modificar o estímulo do sistema nervoso simpático, ocorreriam contrações com baixo grau de tensão muscular involuntária, provocando alterações no tônus muscular e, consequentemente, elevando a atividade eletromiográfica. O nó contraturado é o resultado do encurtamento regional dos sarcômeros de numerosas fibras musculares envolvidas na banda tensa, que estão contraídos ao máximo (hipercontraídos), enquanto os demais sarcômeros da fibra muscular envolvida estão visivelmente alongados para compensar a falta de estiramento dos sarcômeros encurtados [6]. Segundo Prudden [8] e Simons [6], a pressão por tempo prolongado exercida sobre o PG durante a técnica de compressão isquêmica leva à redução da altura dos sarcômeros do nó contraturado, tornando-os mais longos, tendendo a normalizar o estiramento de todos os sarcômeros naquela fibra muscular. Dessa forma, o consumo energético seria reduzido, diminuindo a liberação de substâncias sensibilizadoras, e por sua vez levando a inibição do PG. Diante disso, esperava-se que, após a aplicação da técnica, além da diminuição do quadro álgico, a EMG-S demonstrasse uma redução imediata da atividade muscular, já que a inibição 328 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 do PG resultaria em uma normalização do tônus muscular. No entanto, essa situação foi observada apenas em 45,83% dos indivíduos. Tal fato pode ter ocorrido devido ao curto espaço de tempo (5 min) entre a aplicação da técnica, bastante dolorosa, e uma nova aquisição eletromiográfica. Talvez o curto espaço de tempo não tenha permitido uma recuperação muscular eficaz. Vale salientar ainda que como o objetivo do nosso trabalho foi avaliar a eficácia da técnica em promover a normalização do tônus em todo o músculo, a captação do sinal eletromiográfico não se deu exatamente sobre o PG. Não foram encontrados na literatura relatos sobre haver diferença no efeito da aplicação da técnica em PGs ativos ou latentes, contudo, neste estudo os sujeitos com PG latente apresentaram uma melhor resposta a técnica aplicada, tanto para diminuição da percepção dolorosa subjetiva quanto para diminuição da atividade muscular. Nenhum dos trabalhos consultados que avaliou o efeito imediato da técnica de compressão isquêmica [13,19,21-23] utilizou a EMG-S como método de avaliação. Em geral, os métodos avaliativos utilizados foram EVA, limiar de dor à pressão com um algômetro e goniometria. Também não há consenso com relação a quantidade de pressão a ser aplicada durante a técnica. Acredita-se que este seja o primeiro estudo a utilizar a EMG-S para avaliar o efeito imediato da técnica de compressão isquêmica. Estudos posteriores podem ser realizados aumentando o espaço de tempo entre a aplicação da técnica e a nova aquisição do sinal, avaliando o sinal eletromiográfico exatamente sobre o PG, e comparando os resultados obtidos com um grupo controle. Além disso, esse estudo limitou-se a avaliar o efeito imediato da técnica. Outros estudos são necessários para avaliar as repercussões a longo prazo da técnica aplicada. Conclusão A partir dos resultados encontrados no presente estudo, pode-se concluir que a técnica de compressão isquêmica foi eficaz apenas em reduzir imediatamente o quadro álgico provocado pelo PG, sem alterações significantes na análise do sinal eletromiográfico do músculo trápezio superior. Referências 1. Wheeler AH, Aaron GW. Muscle pain due to injury. Curr Pain Headache Rep 2001;5:441-6. 2. Musse CAI. Síndrome dolorosa miofascial. In: Lianza S. Medicina de Reabilitação. 3a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2001. p.151-69. 3. Balbinot LF. 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Para efetividade da reabilitação neurológica é necessário um modelo avaliativo que não se restrinja somente ao escopo biomédico. Nesse sentido, pode-se pensar na Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) como ferramenta ideal para acesso às informações, pois apresenta caráter biopsicossocial e linguagem universal e unificada. Para a operacionalização da classificação foram desenvolvidos os core sets, além disso, a descrição da funcionalidade através da CIF envolve a presença de um qualificador que funciona com uma escala genérica de 0 a 4. Objetivo: Aplicar as categorias de atividade e participação e fatores ambientais do core set abreviado para AVE em pacientes hemiparéticos crônicos. Material e métodos: A amostra foi composta por 16 pacientes. As categorias do core set abreviado para AVE da CIF utilizadas foram associadas a perguntas. Para análise de significância e descrição das médias foi realizado um one way-anova. Resultados: Para esta população, em relação às categorias de atividade e participação, os pacientes relataram Fala (d330) como a categoria de maior dificuldade. Para os fatores ambientais, o apoio dos Profissionais de saúde (e355) foi considerado como o mais facilitador. Houve diferenças significativas entre a funcionalidade de homens e mulheres. Conclusão: A CIF parece uma ferramenta promissora para o levantamento de informações referentes à funcionalidade de pacientes hemiparéticos crônicos, no entanto, seus qualificadores requerem padronização e há necessidade de futuros estudos para conclusão dos achados. Introduction: Stroke is a major public health problem in industrialized societies. The most common sequela is hemiparesis that exert a negative influence on functioning. The effectiveness of evaluation in neurological rehabilitation depends not only of outcomes of biomedical scope. In this way, International Classification of Functioning (ICF) advances as an ideal tool. ICF presents a biopsychosocial model and universal language. In order to perform, the Classification Core Sets were developed. In addition, the description of the functioning through the ICF involves the presence of a qualifier that works with a generic scale 0-4. Objective: To apply the categories of activity and participation and environmental factors of the brief core set for stroke in patients with chronic hemiparesis. Methods: The sample consisted of 16 patients. The core set categories of ICF used were associated with questions. For analysis and description of significance of means a one way ANOVA was performed. Results: For this population, in relation to the categories of activities and participation, the patients reported Speech (d330) as the most difficult task and for environmental factors they support the Health professionals (e355) the major facilitator. Significant differences were observed between men and women. Conclusion: The ICF looks like a promising tool for a collection of information regarding the functioning of patients with chronic hemiparesis, however, their qualifiers require standardization. There is a need of further studies to the completion of the findings. Key-words: hemiparesis, International Classification of Functioning. Palavras-chave: hemiparesia, Classificação Internacional de Funcionalidade. Recebido em 7 de janeiro de 2011; aceito em 1 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Luciana Castaneda, Instituto de Neurologia Deolindo Couto, Avenida Vencelaus Brás 95, 22290-140 Rio de Janeiro RJ, E-mail: [email protected], [email protected], [email protected] Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução O acidente vascular encefálico (AVE) é uma das causas mais comuns de incapacidade e é considerado atualmente um problema de saúde pública. Do início de 1970 até meados de 1990, o número estimado de sobreviventes do AVE aumentou de 1,5 para 2,4 milhões de pessoas e em 2005 a doença foi responsável por cerca de 10% de todos os óbitos no mundo [1]. Globalmente, o AVE é a segunda causa mais comum de morte [2], representando um alto custo social e econômico que justifica a crescente demanda por reabilitação [3]. Devido às consequências de longo prazo da doença, o foco em medidas de mensuração funcional, acesso a informações de qualidade de vida e satisfação do paciente no campo da reabilitação neurológica são atualmente bem justificadas na literatura [4]. Nos últimos anos, desenvolveu-se o consenso de que o acesso a informações sobre o AVE não devem se restringir a medidas tradicionais, como mortalidade e sintomas neurológicos. A abordagem deve conter informações sobre funcionalidade, aspectos psicossociais e qualidade de vida [5]. Recentemente, houve avanços importantes em se publicar e obter as melhores medidas de mensuração que examinem a efetividade das práticas em reabilitação no campo do AVE [6]. Essa necessidade levou ao desenvolvimento de inúmeras medidas de resultado (índice de Barthel [7], escala de Berg [8] e Medida de Independência Funcional [9]). No entanto, cada medida tem sua própria linguagem e pontuação, além de não existir consenso sobre qual das medidas é mais efetiva para utilização no escopo da reabilitação de pacientes que sofreram AVE. Estas limitações levam a dificuldades para a transferência de resultados de pesquisas para a prática clínica e estatísticas insuficientes e com baixa confiabilidade [10]. Considerações como aspectos de validade, confiabilidade e sensibilidade são importantes critérios para a seleção de qual medida é a mais apropriada dentro da vasta gama de ferramentas disponíveis [11]. Um conceito de grande relevância diz respeito à validade. Questões como: A ferramenta utilizada cobre o espectro dos problemas de saúde que clínicos, cientistas, pacientes, agências reguladoras esperam que cubra?, são questões recorrentes que afetam a credibilidade das medidas de mensuração [12]. Tentando reduzir tal disparidade a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou no ano de 2001 a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) [13]. A CIF foi uma ferramenta criada para fornecer uma linguagem comum para descrição dos fenômenos relacionados aos estados de saúde [14] e é o mais recente e abrangente modelo taxonômico para a funcionalidade e incapacidade dentro de uma perspectiva universal e unificada. O novo modelo propõe um novo olhar sobre a deficiência e a incapacidade que supere o modelo biomédico predominante [15-16]. A informação é organizada em duas partes com dois componentes cada. A parte 1 (funcionalidade e incapacidade) consiste dos domínios de Funções do Corpo, Estruturas do Corpo 331 e Atividades & Participação. Já a parte 2 (fatores contextuais) é formada pelos Fatores Ambientais e pelos Fatores Pessoais (não cobertos pela classificação até o momento)[17]. A descrição da funcionalidade envolve a presença de um qualificador (que funciona com uma escala genérica de 0 a 4, onde 0 é nenhuma deficiência e 4 uma deficiência completa). Os qualificadores demonstram a magnitude da deficiência, limitação, restrição, barreiras ou facilitadores das condições de saúde [13]. Os domínios de Funções, Estruturas, Atividade & Participação e Fatores Ambientais são representados respectivamente pelas letras minúsculas b, s, d e e. Figura 1 - Perspectiva baseada no modelo biomédico (traço pontilhado) vs. A perspectiva biopsicossocial baseada no modelo integrativo da CIF (toda a figura). Condição de Saúde Funções/ Estruturas Corporais Atividades Fatores Ambientais Participação Fatores Pessoais Fonte: adaptado de Stucki et al. [15]. A CIF complementa os indicadores que tradicionalmente tem seu foco em óbitos ou doenças. Apesar dos indicadores de mortalidade, diagnósticos, morbidades serem importantes, eles não capturam adequadamente as consequências da doença nos indivíduos e nas populações [18]. É apontado que a CIF é uma ferramenta útil e que facilita a comunicação entre a equipe multidisciplinar, assim como tem a capacidade de estruturar programas de tratamento para pacientes que sofreram AVE [19]. Cieza et al. [4], ao realizarem um estudo multicêntrico internacional aplicando a CIF na prática clínica, concluíram que é possível se incorporar a ferramenta na rotina dos serviços de reabilitação. No entanto, uma futura mudança para implementação da classificação diz respeito à operacionalização das categorias e o incremento das propriedades de validade e confiabilidade interavaliador dos qualificadores [20]. Stucki et al. [21] identificaram que a classificação em seu formato original com aproximadamente 1500 categorias era muito lenta e impraticável para uso cotidiano. Eles sugeriram que listas resumidas com conceitos relevantes deveriam ser desenvolvidas para condições específicas de saúde e situações crônicas. Os core sets, como são denominados, têm o intuito de encorajar os profissionais de saúde a utilizarem a ferramenta e de tornar mais prático e fácil o acesso a CIF. Existem duas versões do documento: abrangente e abreviada, sendo a primeira recomendada para fins de investigação e a segunda para utilização na prática clínica [22]. Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 332 O core set abreviado para AVE consiste em um total de 18 categorias que representam 14% das categorias disponíveis no formato abrangente, sendo 6 categorias para Funções do Corpo (15%), 2 para Estruturas Corporais (40%), 7 para Atividades e Participação (14%) e 3 para Fatores Ambientais (9%) [23]. Apesar do grande interesse em adoção do modelo da CIF, poucos estudos até o momento aplicaram a ferramenta na prática clínica da reabilitação do AVE. Portanto, o objetivo do presente trabalho é aplicar as categorias de atividade e participação e fatores ambientais do core set abreviado para AVE em pacientes hemiparéticos crônicos. Material e métodos Sujeitos Trata-se de estudo seccional realizado no Instituto de Neurologia Deolindo Couto da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Todos os pacientes estavam em tratamento ambulatorial no serviço de reabilitação neurofuncional do hospital. Os critérios de inclusão utilizados foram: apresentar hemiparesia em decorrência de AVE há mais de um ano, entender as propostas e razões do estudo e concordar com o termo de consentimento. Os critérios de exclusão utilizados foram apresentar dificuldades severas para comunicação e alterações cognitivas importantes. As características da amostra são apresentadas na tabela I. Tabela I - Características da amostra (n = 16). Homens Idade (anos) (Desvio Padrão) Sexo Comorbidade (HAS, Diabetes, Cardiopatia) Lado afetado (direito, esquerdo) Mulheres 65,62 (±6,54) 10 (62,5%) 6 (37,5%) 10;2;1 3;3;1 6;4 4;2 Procedimentos A abordagem aos pacientes era realizada por um fisioterapeuta com experiência na utilização da CIF nos dias de atendimento ambulatorial. As entrevistas tinham duração de cerca de 30 minutos e eram realizadas de maneira individualizada. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética do Instituto de Neurologia Deolindo Couto da Universidade Federal do Rio de Janeiro (nº 002/09) e todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. A entrevista seguiu um roteiro com questões de identificação pessoal, como, idade, sexo, grau de escolaridade, além das categorias de atividade e participação e fatores ambientais. As categorias de funções do corpo e estruturas corporais não foram utilizadas pela dificuldade em analogia para escolha dos qualificadores. A categoria d310 (Comunicação – recepção de mensagens orais) foi excluído por não contemplar o escopo da prática da fisioterapia. Análise estatística Para análise estatística foi utilizado o software SPSS 15. Foi realizada uma one-way anova para verificar a significância das variáveis sexo e idade, além da média e desvio-padrão. Resultados A categoria de Atividades e Participação referente à Fala (d330) foi apontada por quase 20% da amostra como uma dificuldade completa. Além disso, 50% dos pacientes relataram Andar (d450) como uma dificuldade moderada. Cerca de 60% dos entrevistados classificaram como nenhuma dificuldade as categorias de Lavar-se (d510) e Cuidados relacionados aos processos de excreção (d530). Para as categorias de Vestir-se (d540) e Comer (d550), 37,5% da amostra apontou como uma dificuldade leve. Tabela II - Porcentagem de limitação a Atividades, restrição a participação e facilitadores dos fatores ambientais (n =16). Limitação a atividades e restrição a Participação (%) Nenhuma Leve Moderada d330 - Fala 31,25 31,25 6,25 d450 - Andar 6,25 18,75 50 d510 - Lavar-se 56,25 25 6,25 d530 - Cuidados relacionados aos processos de excreção 62,5 18,75 18,75 d540 - Vestir-se 25 37,5 25 d550 - Comer 25 37,5 37,5 Facilitadores dos fatores ambientais (%) Categoria Nenhum Leve Moderado e310 - Família imediata --6,25 18,75 e355 - Profissionais de saúde ----25 e580 - Serviços, sistemas e políticas de saúde 18,75 18,75 37,5 Categoria Grave 12,5 25 12,5 --12,5 --- Completa 18,75 ----------- Considerável 50 50 18,75 Completo 25 25 6,25 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Em relação aos fatores ambientais, 25% dos pacientes hemiparéticos entrevistados consideram o apoio da Família imediata (e310) e dos Profissionais de saúde (e355) como um facilitador completo e 50% da amostra como facilitador considerável. Já para a categoria de Serviços, sistemas e políticas de saúde (e580), quase 20% considera como nenhum facilitador e 37,5% como facilitador moderado. Para as categorias referentes à Fala (d330), Andar (d450), Vestir-se (d540) e Comer (d550), as mulheres apresentaram melhores resultados com associação estatisticamente significativa (p ≤ 0,005) em relação aos homens. Em relação à variável idade, os pacientes com mais de 70 anos tiveram pior funcionalidade em todas as categorias de atividade e participação classificadas (p ≤ 0,005). As Figuras 2 e 3 tratam da distribuição por médias dos qualificadores para as categorias de Atividade e Participação (d) e Fatores Ambientais (e), respectivamente. A distribuição do gráfico foi feita por gênero. A Figura 2 demonstra o qualificador de extensão da incapacidade que reflete o desempenho (o que os indivíduos fazem no seu ambiente habitual incluindo o aspecto do envolvimento de uma pessoa nas situações da vida) e na Figura 3 foram utilizados os facilitadores (são fatores ambientais que, através da sua ausência ou presença, melhoram a funcionalidade e reduzem a incapacidade de uma pessoa) como qualificadores. Figura 2 - Média de funcionalidade das categorias de atividade e participação do Core Set abreviado para AVE. Qualificadores 4 3 2 1 0 d330 d450 Masculino d540 d550 Feminino d330 – falar; d450 – andar; d540 – vestir-se; d550 – comer. Os valores foram estatisticamente significativos (p ≤ 0,005). Figura 3 - Média de funcionalidade dos fatores ambientais do Core Set abreviado para AVE. Qualificadores 4 3 2 1 0 e355 Masculino e380 Feminino e355 – Profissionais de saúde; e380 – serviços, sistemas e políticas relacionados com a saúde. Os valores foram estatisticamente significativos (p ≤ 0,005). 333 Discussão É consenso na literatura que a CIF é uma ferramenta útil para facilitar a comunicação entre os profissionais e também para estruturação e planejamento de programas de reabilitação [24]. No campo da reabilitação neurológica a CIF vem ganhando importância. Além disso, a classificação não consiste somente uma ferramenta conceitual, como também funciona como uma classificação detalhada, universal e com uma perspectiva neutra [25]. O presente estudo, embora possua uma amostra pequena, preconizou a tentativa de utilização da classificação na prática clínica. No entanto, devido à escassez de trabalhos da mesma natureza na literatura a discussão externa do estudo ficou limitada. O objetivo do trabalho foi verificar a percepção do paciente em relação às experiências vivenciadas na funcionalidade e incapacidade em decorrência do AVE e consequente hemiparesia. É importante mencionar que as medidas autorreferidas fornecem informações sobre a limitação funcional dos pacientes em um determinado contexto social, as quais dificilmente podem ser obtidas a partir de medidas diretas do desempenho funcional [26]. O fato dos pacientes do sexo masculino terem apresentado piores resultados pode ser associado à amostra do sexo masculino ter idade mais avançada quando comparada a idade das mulheres. Indivíduos mais idosos que tem maiores prejuízos na mobilidade apresentam mais repercussões negativas nas atividades de vida diária. Em particular a capacidade de andar é associada com maior independência funcional, além do fato de pacientes hemiparéticos com paresia no membro inferior vivenciarem maiores limitações nas atividades [27]. Em relação à figura 2, os valores das médias de funcionalidade dos qualificadores (escala de 0 a 4), menores pontuações refletem melhor funcionalidade. Nos nossos resultados, as mulheres apresentaram melhor funcionalidade para todas as categorias de Atividade e Participação. A figura 3 demonstra as médias para as categorias dos Fatores Ambientais. Nesta escala também de 0 a 4, maiores pontuações refletem melhor funcionalidade. Uma vez que estamos utilizando os qualificadores de facilitadores e não os de barreiras. Mais uma vez as mulheres apresentaram melhores resultados, o que sugere que as mulheres têm melhor enfrentamento da doença. De acordo com Rodrigues et al. [28], papéis socialmente determinados dentro de algumas famílias colocam em pauta papéis com determinação social dentro da família e que demonstram a divisão sexual das tarefas como sendo tradicional e imutável. Desta forma, indivíduos do gênero feminino são responsáveis pela execução dos cuidados aos membros da família, estejam estes sadios ou doentes. Em relação às mulheres terem apresentado maior funcionalidade, isto pode estar relacionado ao fato delas estarem mais habituadas à realização de tarefas domésticas, o que poderia refletir em maior independência nas categorias de Atividades e Participação classificadas. 334 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Algurén et al. [29], em uma avaliação utilizando o core set abrangente para AVE, pontuam que a redução do número de categorias de funções corporais e atividades e participação do documento poderá viabilizar a utilização pela equipe multiprofissional e com isso haverá maior integração na prática clínica. Em um estudo multicêntrico utilizando a metodologia Delphi para verificar o conteúdo do core set para AVE por parte dos profissionais de saúde, foi concluído que futuras pesquisas são necessárias para aplicação da ferramenta na prática clínica e que os resultados de estudos que envolvam tanto pacientes quanto profissionais irão melhorar as questões referentes à validade e reprodutibilidade dos conteúdos do core set para AVE [30]. Outra questão que ainda é um desafio diz respeito às propriedades psicométricas dos qualificadores da CIF. Em nosso estudo tivemos dificuldades na análise estatística e uma grande variabilidade nos resultados quando foram analisadas as médias dos qualificadores. Embora a CIF tenha sido considerada um avanço na área de reabilitação e saúde funcional e venha sendo apontada como uma ferramenta essencial para a orientação dos processos, algumas dificuldades podem comprometer sua utilização e favorecer a baixa adesão por parte dos fisioterapeutas em implementar o novo modelo em sua prática clínica. Conclusão Nossos resultados apontam que a categoria de Atividade e Participação que os pacientes apresentaram pior funcionalidade foi a da Fala (d330), seguido da categoria Andar (d450) e em relação aos Fatores Ambientais, o apoio dos Profissionais de saúde (e355) aparece como maior facilitador. Além disso, os pacientes tiveram bom resultado para a categoria de Comer (d550) e os resultados referentes a Serviços, sistemas e políticas de saúde (e580) podem ser um indicador do serviço que diz respeito à satisfação e percepção com o Sistema de Saúde oferecido a essa população. A relevância da CIF na prática clínica da reabilitação do AVE se dá pelo fato da ferramenta ter um espectro de cobertura abrangente e permitir um novo olhar sobre a incapacidade e a funcionalidade, no entanto, sua utilização na prática clínica requer padronização dos qualificadores a fim de se aumentar as propriedades de validade e confiabilidade da ferramenta. Futuros estudos são necessários para conclusão dos achados pela amostra reduzida do estudo. Referências 1. Teixeira-Salmela L, Neto M, Magalhães L, Lima R, Faria C. Content comparisons of stroke-specific quality of life based upon the international classification of functioning, disability, and health. Qual Life Res 2009;18(6):765-73. 2. Lynch E, Butt Z, Heinemann A, Victorson D, Nowinski C, Perez L, et al. A qualitative study of quality of life after stroke: The importance of social relationships. J Rehabil Med 2008;40(7):518-23. 3. Massucci M, Perdon L, Agosti M, Celani M, Righetti E, Recupero E, et al. 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Objetivo: Analisar os efeitos de uma intervenção fisioterapêutica em grupo na sobrecarga e qualidade de vida de cuidadores familiares de pessoas com deficiência física, mental e/ou sensorial que praticam atividade motora adaptada. Material e métodos: Trata-se de um estudo quantitativo com desenho longitudinal do tipo coorte. Participaram do estudo 21 cuidadores. Foram aplicados dois instrumentos de avaliação (o Study 36-Item Short-Form Health Survey e o Caregiver Burden Scale) antes e após a intervenção. Os cuidadores foram acompanhados, durante 6 meses, com atividades que tiveram como objetivo a socialização e a percepção corporal através de exercícios respiratórios, associados ou não a movimentos ativos globais, alongamento da musculatura de tronco, cabeça e pescoço, membros superiores e inferiores e técnicas de relaxamento corporal. Resultados: Após a intervenção os cuidadores apresentaram melhora significativa nos domínios vitalidade (p = 0,016) e saúde mental (p = 0,00048) do SF-36, e na dimensão tensão geral (p = 0,02) do Caregiver Burden Scale. Conclusão: Os cuidadores apresentaram melhora significativa nos domínios vitalidade e saúde mental do SF-36, e na dimensão tensão geral do Caregiver Burden Scale. Background: The disease and/or disability in one family member can affect the family as whole, but most often the responsibility falls to just one family member in the family. Objective: To analyze the effects of group physical therapy in quality of life and burden of family caregivers of people with physical, mental and/or sensory disabilities who were engaged in an adapted motor activity. Methods: This is a quantitative cohort-study with longitudinal design. 21 family caregivers participated in this study. It was applied two evaluation instruments (Study 36-Item Short-Form Health Survey and Caregiver Burden Scale) before and after the intervention. The caregivers were followed up for 6 months, with activities aiming at socialization and breathing exercises to gain body awareness, in association or not with global movements, exercises for stretching the trunk, head and neck muscles, upper and lower body and relaxation techniques. Results: After intervention, caregivers showed improvement in the following areas: vitality (p = 0.016) and mental health (p = 0.00048) of the SF-36, and dimension general tension (p = 0.02) of the Caregiver Burden Scale. Conclusion: Caregivers showed significant improvement in the vitality and mental health domains of the SF-36, and in the dimension general tension of the Caregiver Burden Scale. Key-words: caregivers, quality of life, family. Palavras-chave: cuidadores, qualidade de vida, família. Recebido em 8 de fevereiro de 2011; aceito em 19 de julho de 2011. Endereço para correspondência: Midiã Lins Silva Coutinho, Avenida Teodoro Bernardo do Nascimento, 92B, Jardim Robru, 08150-000 São Paulo SP, E-mail: [email protected] Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução Nos últimos anos, a família tem sofrido muitas mudanças, seja em sua estrutura, função ou dinâmica familiar. A velocidade do processo de transição demográfica e epidemiológica tem sido um dos causadores dessa transformação, especialmente em um contexto com acentuada desigualdade social e fragilidade de órgãos e entidades públicas. O aumento da expectativa de vida e dos fatores de risco para as doenças crônico-degenerativas tem comprometido não somente a independência da população idosa, que se torna dependente de cuidados familiares, como a estrutura familiar, alterando o estilo de vida, as relações interpessoais, as finanças e, principalmente, o estado de saúde de seus membros [1-3]. Embora toda a família seja afetada pelo comprometimento de um parente, a responsabilidade principal do cuidado recai sobre um único familiar, denominado cuidador principal, que tem como objetivo prestar assistência ao mesmo, sem necessariamente possuir preparo técnico, emocional e/ou financeiro para desempenhar tal função [3]. Assumir esta responsabilidade pode gerar uma sobrecarga ao cuidador, pois muitas vezes o mesmo acaba abdicando da própria vida frente às necessidades do outro [3-4]. Estudos mostram que cuidadores que apresentam maior sobrecarga de cuidado avaliam menos satisfatoriamente sua saúde e qualidade de vida [5-8], podendo fornecer subsídios para a elaboração de intervenções para a prevenção, manutenção e/ou melhora na percepção da saúde e qualidade de vida dessas pessoas [9-13]. A Organização Mundial de Saúde definiu o termo qualidade de vida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. É uma definição ampla que compreende diferentes aspectos: capacidade física, habilidade funcional, aspecto emocional, social e econômico, função intelectual e percepção do estado geral de saúde [14]. O cuidado ao cuidador é um processo complexo que visa melhorar as condições físicas, sociais e emocionais. Assim, promover uma maior percepção corporal, melhorar a qualidade de vida, proporcionar um maior convívio social e diminuir a sobrecarga do cuidado contribuirá para um melhor desenvolvimento humano, acrescido de uma melhor relação entre o cuidador e o ser cuidado. Diante disso, o objetivo deste estudo foi verificar a efetividade de um tratamento fisioterapêutico sobre as variáveis: qualidade de vida e percepção da sobrecarga do cuidador. Material e métodos Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Metodista de São Paulo, nº do protocolo 284548-09, e todos os incluídos no estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. 337 Trata-se de um estudo quantitativo com desenho longitudinal do tipo coorte. O estudo foi realizado no Complexo Esportivo da Universidade, no período de outubro de 2009 a abril de 2010. Não foi realizado cálculo amostral, pela demanda, fizemos uma amostra por conveniência, convidando todos os cuidadores que tinham seus assistidos participando do Projeto Vida (um programa de extensão universitária que oferecia a prática esportiva para pessoas com deficiência), participaram do estudo apenas os interessados. O Projeto Vida tinha setenta e dois alunos e concordaram em participar do estudo vinte e quatro cuidadores familiares de pessoas com deficiência física, mental e/ou sensorial, que acompanhavam seus assistidos na atividade esportiva adaptada (natação). Três cuidadores desistiram de participar ao longo do programa. No início do estudo, todos os participantes preencheram uma ficha cadastral com os dados sociodemográficos. Foram aplicados dois questionários, antes e após a intervenção, o Study 36-Item Short-Form Health Survey (SF-36), que é um instrumento genérico de avaliação de qualidade de vida, composto por trinta e seis questões divididas em oito dimensões, com escores que variam entre 0 (pior estado) e 100 (melhor estado) [15]. Para avaliação da sobrecarga do cuidador foi utilizado o Caregiver Burden Scale (CB Scale) que é um questionário específico, composto por vinte e duas questões subdivididas em cinco dimensões, cujos escores variam entre 1 (menor sobrecarga) e 4 (maior sobrecarga) [16]. Ambos os instrumentos foram traduzidos e validados no Brasil. Os instrumentos utilizados, o SF-36 e o CB Scale, foram aplicados por um único e mesmo pesquisador através de entrevista que teve um tempo de aplicação entre 20 e 30 minutos. Os avaliados receberam informações de que deveriam responder da melhor forma possível. Caso houvesse alguma dúvida no entendimento da questão, o pesquisador repetiria pausadamente a alternativa, sem interpretar ou interferir no conteúdo. Foram incluídos no estudo somente pessoas com mais de 18 anos que participaram de 80% ou mais do programa. Estas pessoas deveriam ter a principal responsabilidade sobre o cuidado, ou esta responsabilidade deveria ser compartilhada com o cônjuge. O cuidador principal deveria ter algum grau de parentesco com o assistido e não deveria receber dinheiro para exercer tal função. Foram incluídos apenas os cuidadores com tempo de cuidado acima de dois anos. Foram excluídos do estudo aqueles que não preencheram tais quesitos. Os cuidadores foram convidados a participar de um programa de intervenção fisioterapêutica em grupo, as sessões foram comandadas pelo mesmo avaliador que aplicou os questionários. As atividades tiveram como objetivo a socialização e a percepção corporal através de exercícios respiratórios, exercícios de alongamento e técnicas de relaxamento. Os encontros foram realizados uma vez por semana, com duração de 40 minutos cada, totalizando 20 sessões consecutivas de atendimento. As estratégias terapêuticas utilizadas nos pri- Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 338 meiros minutos das sessões incluíram exercícios respiratórios, sendo realizadas respirações diafragmáticas, inspirações profundas e expirações lentas, exercícios respiratórios associados com movimentos ativos de membros superiores ou inferiores, sendo sempre solicitada a atenção do cuidador para os movimentos corporais realizados. Também foram realizados alongamentos musculares ativos da musculatura do tronco, cabeça e pescoço, membros superiores e inferiores, sendo que a manutenção do alongamento deveria ser de no mínimo 30 segundos, também sendo solicitada a atenção para a região a ser trabalhada. Os exercícios respiratórios, de alongamento e movimentos ativos foram realizados na posição deitada, sentada e em pé, procurando manter uma variação dos exercícios durante as sessões para evitar “repetições”, alguns materiais mecanoterápicos como colchonetes, bolas suíças e espaguetes foram utilizados para favorecer a variação e a realização destes exercícios. As sessões eram encerradas com técnicas de relaxamento corporal global, sempre utilizando música ambiente para induzir ao relaxamento, o Relaxamento Muscular Progressivo de Jacobson, que trabalha com a percepção dos estados de tensão via contração e relaxamento de grupos musculares em determinado período de tempo, mediante comandos verbais, foi realizado. Os dados quantitativos foram apresentados em média no caso de distribuição normal. Para analisar a qualidade de vida e sobrecarga de cuidado medidas no início e no final do estudo, foram realizadas comparações intragrupos (inicial versus final) através do Teste T Student. O nível de significância adotado foi p < 0,05. O programa estatístico para efetuar os cálculos foi o SPSS for Windows, versão 17.0. O teste de Kolgomorov foi utilizado para verificar a distribuição da amostra. Resultados Foram incluídos no estudo vinte e um cuidadores, sendo que destes, duas pessoas compartilhavam a responsabilidade do cuidado com o cônjuge. As características sociodemográficas dos cuidadores familiares são mostradas na Tabela I: Tabela I - Características sociodemográficas dos cuidadores familiares. Características Sexo Feminino Masculino Idade em anos Feminino Masculino Escolaridade Fundamental* Médio Superior* Renda familiar (reais) Cuidadores (n = 21) 19 (90,5%) 2 (9,5%) 51,63 ± 9,04 51 ± 2,83 15 (71,5%) 4 (19%) 2 (9,5%) 1108,10 ± 987,46 Características Grau de parentesco Mãe Pai Tia Apresentavam algum problema de saúde Faziam uso regular de medicações Tempo de cuidado** Integral Parcial (meio-período) Cuidadores (n = 21) 18 (85,7%) 2 (9,5%) 1 (4,8%) 13 (62%) 12 (57%) 9 (42,9%) 12 (57,1%) * Completo ou incompleto. **Tempo de cuidado acima de dois anos, seja integral ou parcial (meio-período). As características sociodemográficas dos assistidos pelos cuidadores são mostradas na Tabela II. Tabela II - Características sociodemográficas dos assistidos. Características Sexo Feminino Masculino Idade em anos Escolaridade Escola especial** Fundamental* Superior* Anos de escolaridade Tipo de deficiência Mental Física Mental e física Sensorial Participantes (n = 19) 8 (42,1%) 11 (57,9%) 19,24 ± 8,62 13 (68,4%) 4 (21,1%) 2 (10,5%) 10,53 ± 5,16 14 (73,7%) 1 (5,25%) 3 (15,8%) 1 (5,25%) *Ensino fundamental completo ou incompleto; **Não houve divisão. A avaliação da qualidade de vida dos cuidadores, por meio do SF- 36, no momento inicial do estudo e após a intervenção, está registrada na Tabela III: Os cuidadores apresentaram, em média, escores mais elevados nas dimensões: capacidade funcional, dor, estado geral de saúde e aspecto social, quando comparados ao momento inicial do estudo. Apresentando melhora significante entre a avaliação inicial e final nas dimensões vitalidade (p = 0,016) e saúde mental (p = 0,00048). A dimensão aspecto físico e aspecto emocional apresentaram redução no escore, porém não foi significativa. A avaliação da sobrecarga do cuidado, utilizando o CB Scale, no momento inicial do estudo e após a intervenção, está registrada na Tabela IV. Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 339 Tabela III - Escores da avaliação da qualidade de vida dos cuidadores familiares. Dimensões do SF-36 Capacidade funcional Aspecto físico Dor Estado geral de saúde Vitalidade Aspecto social Aspecto emocional Saúde mental Inicial 70,95 ± 22,34 67,86 ± 39,64 58,48 ± 23,94 63,24 ± 17,95 60 ± 15,25 70,10 ± 23,25 66,67 ± 43,49 60,38 ± 17,61 Cuidadores (n = 21) Final 73,81 ± 22,12 60,71 ± 39,49 63,05 ± 22,71 69,81 ± 18,15 65,95 ± 15,22 76,48 ± 23,74 63,48 ± 40,34 74,67 ± 18,62 Valor de P 0,300011 0,728596 0,175587 0,058775 0,014579§ 0,304013 0,691574 0,000481§ § p < 0,05 momento inicial versus final (mesmo grupo). Tabela IV - Escores da avaliação da sobrecarga de cuidado dos cuidadores familiares. Dimensões do CB Scale Tensão geral Inicial 1,85 ± 0,69 Isolamento Decepção Envolvimento emocional Ambiente 1,41 ± 0,52 1,63 ± 0,59 1,51 ± 0,63 1,70 ± 0,76 Cuidadores (n = 21) Final 1,57 ± 0,66 1,43 ± 0,57 2,03 ± 1,74 1,39 ± 0,56 1,55 ± 0,64 Valor de P 0,024223§ 0,898294 0,146052 0,262312 0,281847 § p < 0,05 momento inicial versus final (mesmo grupo). Os cuidadores apresentaram, em média, escores mais reduzidos nas dimensões: envolvimento emocional e ambiente quando comparados ao momento inicial do estudo. Apresentando melhora significante entre a avaliação inicial e final na dimensão tensão geral (p = 0,02). As dimensões de isolamento e decepção apresentaram aumento no escore, porém não foi significativo. Discussão As características sociodemográficas e econômicas dos cuidadores deste estudo foram semelhantes às encontradas em inúmeros estudos realizados com cuidadores, e incluíram basicamente mulheres, com baixo nível escolar e socioeconômico, que possuíam algum grau de parentesco e residiam com o assistido [17-18]. A média de idade dos cuidadores do gênero feminino e masculino foram 51,63 ± 9,04 e 51 ± 2,83 anos respectivamente. Hsieh et al. [19] estudaram cuidadores de crianças com traumatismo crânio-encefálico e observaram correlação negativa entre a sobrecarga de cuidado vivenciada pelos cuidadores e a idade dos mesmos e, ainda, sugeriram que os cuidadores conseguem se adaptar gradualmente às características funcionais da criança. Neste estudo, a maioria dos cuidadores apresentavam problemas de saúde e utilizavam alguns medicamentos, essa condição também foi evidenciada em pesquisas com cuidadores de pacientes com doenças crônicas [20]. No início do estudo, os cuidadores apresentaram menores valores nas dimensões dor e vitalidade do SF-36, respectivamente. Resultados semelhantes foram encontrados em uma pesquisa realizada com cuidadores de pessoas com paraplegia [18]. McPherson et al. [21] verificaram que cuidadores de pacientes com AVE tiveram uma menor qualidade de vida em todos os domínios do SF-36, quando comparados com a população geral dos EUA. Sendo que as maiores diferenças foram observadas no aspecto físico, na capacidade funcional e no aspecto emocional. Ao final do estudo, na avaliação da qualidade de vida, os cuidadores apresentaram melhora significativa em dois domínios: vitalidade e saúde mental. A vitalidade, segundo o SF-36, representa o sentimento e o estado de vigor, de vontade, força, energia, cansaço e desgaste. Acreditamos que a participação dos cuidadores em atividades terapêuticas, que exigiam a disposição, a força de vontade e o ânimo por parte dos participantes, tenham proporcionado este resultado. A saúde mental compreende o sentimento de depressão, estresse, desânimo e abatimento, calma ou tranquilidade e felicidade. Provavelmente observou-se melhora nesse domínio, porque os cuidadores puderam dedicar um tempo para si, através de atividades terapêuticas que envolveram técnicas de relaxamento e percepção corporal. Acreditamos também que os cuidadores tenham se sentido acolhidos e bem cuidados, o que pode ter desencadeado algumas emoções positivas, que antes estavam “esquecidas” ou que não eram “estimuladas” e se tornaram presentes com os encontros. Fan et al. [22] realizaram um estudo com cuidadores de pacientes em diálise peritonial e verificaram que cuidadores de pacientes altamente dependentes apresentaram piora significativa da sua saúde mental, quando comparados aos cuidadores de pacientes menos dependentes. Provavelmente isso ocorreu devido ao aumento da assistência fornecida pelo cuidador, que 340 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 teve que dedicar um tempo maior para o cuidado, deixando muitas vezes sua vida “de lado”, e se isolando do mundo para exercer o cuidado. Hatzmann et al. [23] mostraram que pais de crianças cronicamente doentes com baixa renda familiar, baixo nível de escolaridade, maiores níveis de dependência de cuidados, e a falta de pessoas para compartilhar o cuidado, levaram a uma redução na qualidade de vida dos cuidadores. Além disso, os cuidadores relataram não ter mais tempo para si, muito menos para a família, pois precisavam se envolver com o doente vinte e quatro horas por dia, quase que vivendo a vida por eles. No início do estudo, os cuidadores apresentaram maior sobrecarga na dimensão tensão geral. Ao final do estudo, essa dimensão apresentou redução significativa. A tensão geral, segundo o CB Scale, representa o grau de enfrentamento dos problemas, a aquisição de responsabilidades, a vontade de deixar toda a situação atual de lado, o cansaço e esgotamentos gerados, a falta de tempo em cuidar de si e os prejuízos gerados à própria saúde em razão do cuidar. Belle et al. [24] realizaram uma série de intervenções em cuidadores de pessoas com demência e verificaram que, quando comparadas a um grupo controle, as intervenções conduziram para melhoras significativas na qualidade de vida dos cuidadores. Eles também verificaram que a taxa de depressão entre os cuidadores no grupo de intervenção foi estatisticamente inferior ao do grupo controle. Acreditamos que pelo fato do estudo ter utilizado diversas estratégias, como fornecimento de informações para os cuidadores, técnicas de gerenciamento de estresse, de resoluções de problemas e treinamento de habilidades, os cuidadores do estudo tiveram como resultado um alívio emocional, ou seja, a diminuição dos sintomas de depressão, ansiedade e estresse, assim como a promoção do bem-estar. A dimensão do CB Scale que indicou menor sobrecarga no início deste estudo foi isolamento. Provavelmente devido ao fato dos assistidos participarem de atividades físicas em grupo, e, consequentemente, os seus respectivos cuidadores acabarem se relacionando com outros cuidadores, ou também, com outras pessoas. O isolamento, segundo o CB Scale, representa o tempo dispensado para a vida social com a família e os amigos e se o problema do parente interferiu ou interfere nos planos de vida do cuidador. Segundo estudo realizado com mães de deficientes mentais em Toronto, a inserção em programas de esporte participativo beneficia o ajustamento comportamental do doente e diminui a depressão e o isolamento social do cuidador [25]. Os nossos resultados sugerem que programas assistenciais devem ser direcionados a essa população, que também necessita de cuidados e atenção, mas que muitas vezes é esquecida pelos profissionais de saúde e pela população. Sendo fundamental fornecer acompanhamento de uma equipe multidisciplinar, a fim de serem realizadas intervenções com resultados possivelmente mais efetivos, buscando dessa maneira, melhorar a saúde e a qualidade de vida do cuidador. Conclusão Os cuidadores apresentaram melhora significativa na Qualidade de Vida, verificada em dois domínios do SF-36: vitalidade e saúde mental. Apresentaram também diminuição significante da sobrecarga no ato de cuidar, observada na dimensão tensão geral do CB Scale. Agradecimentos Ao programa PIBIC-CNPq/UMESP, por ter patrocinado este trabalho. Referências 1. Vieira CPB, Fialho AVM, Moreira TMM. Dissertações e teses de enfermagem sobre o cuidador informal do idoso, Brasil, 1979 a 2007. Texto Contexto Enfermagem 2011;20(1);160-6. 2. Veras R. Envelhecimento populacional contemporâneo: demandas, desafios e inovações. Rev Saúde Pública 2009;43(3);548-54. 3. Cruz MN, Hamdan AC. O impacto da doença de Alzheimer no cuidador. Psicologia em Estudo 2008;13(2);223-9. 4. Bandeira M, Calzavara MGP, Castro I. Estudo de validade da escala de sobrecarga de familiares cuidadores de pacientes psiquiátricos. J Bras Psiquiatr 2008;57(2):98-104. 5. Amendola F, Oliveira MAC, Alvarenga MRM. 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Apesar dos poucos estudos referentes a essa modalidade, o karatê apresenta uma incidência importante de lesões. Os objetivos desta pesquisa foram investigar a prevalência de lesões e o diagnóstico mais acometido entre os atletas, comparar o momento em que os atletas mais se predispõem a lesões, bem como a região anatômica mais afetada. Esta pesquisa contou com a participação de 31 atletas, sendo 16 atletas do gênero masculino e 15 do feminino, participantes de competições expressivas como campeonatos nacionais e internacionais. O questionário continha questões do tipo aberto e fechadas contendo dados pessoais, histórico do esporte e das lesões. Foram relatadas 38 injurias, com prevalência das fraturas 34,21% seguidas por contusão e entorse, ambas com 15,79% e as lesões musculares e tendinite com 13,15% cada uma. As áreas mais afetadas foram os membros inferiores com 44,71%, seguidos pela região do tronco com 34,20% e por último, a região dos membros superiores com 21,04% das lesões encontradas. O período de treinamento sobrepôs ao da competição em ocorrência de injurias e os atletas mais experientes foram mais susceptíveis a lesões desportivas. Karate, also known as the art of empty hand, is represented by the two methods most performed in the world, Kata and Kumite. The Kata consists of predefined sequences of combinations involving both attacking and defensive movements against imaginary opponents; the Kumite is a training against an adversary or real fight. In recent years, this sport has grown significantly as well as the number of injuries in athletes. Although few studies have investigated this modality, there is an important incidence of injuries in karate. The objectives of this research were to investigate the more common injuries and diagnosis among athletes, to compare the period of time that athletes are more predisposed to injuries, as well as anatomical region more affected. This research was composed of 31 athletes, 16 male and 15 female, who participated in expressive competitions in national and international championships. The questionnaire contained open and closed questions with personal data, history of sports and injuries. 38 injuries were reported, with fracture prevalence of 34.21% followed by contusion and sprain, both with 15.79% and muscle injuries and tendonitis with 13.15% each. The areas most affected were the lower limbs with 44.71%, followed by the trunk region with 34.20% and finally, the region of the upper limbs with 21.04% of the injuries. The training period surpassed the competition in the number of injuries and the more experienced athletes were more susceptible to sports injuries. Key-words: athletic injuries, epidemiology, martial arts. Palavras-chave: lesões em atletas, epidemiologia, artes marciais. Recebido 14 de março de 2011; aceito em 3 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Angélica Castilho Alonso, Rua Aquiráz, 156, Vila Granada, 03654-040 São Paulo SP, Tel: (11) 9998-7682, E-mail: [email protected] Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução O Karatê, também conhecido como “caminho das mãos vazias”, teve sua origem na ilha de Okinawa onde conquistou todo o Japão e espalhou-se pelo mundo angariando adeptos, desportistas ou apenas amantes dessa arte. Sua filosofia encontra-se nas várias vertentes sendo as duas modalidades mais comuns: O Katá que é um conjunto de movimentos pré-definidos de ataque e defesa e o Kumitê sendo este o combate em si entre dois adversários [1]. A arte foi ganhando espaço no cenário mundial se tornando um dos esportes mais praticados, seja pela busca na qualidade de vida, conhecimento como defesa pessoal, filosófico e espiritual ou acima de tudo como atividade desportiva competitiva. O que faz cada vez mais atletas ultrapassarem seus limites físicos e mentais na busca pela melhora do desempenho atlético e técnico [2]. É um esporte que apresenta grandes desafios em sua execução, seja no combate real ou no momento da apresentação em sua luta imaginária, por meio de movimentos complexos pré-determinados. Alguns movimentos são básicos, coordenados, bruscos e multidirecionais, embora muitas vezes alternando-se com movimentos lentos, graciosos e dificultosos devido a saltos e apoios unipodais [1]. Como em qualquer esporte, os atletas do Karatê estão sujeitos a lesões associadas muitas vezes aos esforços repetitivos recorrentes ou ainda lesões por trauma devido ao contato físico existente, durante o treinamento, ou até mesmo quando estão em competição. As lesões desportivas acometem todos os segmentos corporais, sua gravidade é variável, mas, mesmo aquelas que não põem em risco a vida do indivíduo, com frequência o afastam da prática, ainda que temporariamente [2]. Apesar da alta taxa de lesões, muito do enfoque científico para as artes marciais, em geral, atem-se as áreas espirituais ou psicopedagógico [3-5]. Por este motivo os objetivos deste estudo foram: Identificar as lesões musculoesqueléticas mais frequentes no Karatê nas modalidades Kumitê e Katá, investigar a prevalência de lesões em atletas experientes e inexperientes; investigar as regiões anatômicas mais lesionadas e verificar o momento da lesão mais ocorrido. Material e métodos Trata-se de uma pesquisa epidemiológica observacional descritiva retrospectiva, realizada durante o Campeonato Brasileiro de Karatê na cidade de Caruaru em Pernambuco, em setembro 2010, onde foram entrevistados 31 atletas, com idade mínima 18 anos, sendo 16 (51,61%) do gênero masculino e 15 (48,39%) do gênero feminino da categoria adulta e participante da modalidade Katá ou Kumitê. Os critérios de inclusão foram os participantes de competições expressivas como campeonatos nacionais ou campeonatos internacionais com graduação mínima faixa marrom. 343 Foram exclusos atletas com idade inferior a 18 anos e aqueles que não participaram dos campeonatos em 2010. Procedimento Após concordarem em participar da pesquisa, os atletas assinaram o termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Para a aplicação do questionário, o responsável pelo local da competição foi devidamente informado sobre a coleta dos dados e autorizou a realização do mesmo, assinando o termo de autorização. Os instrumentos utilizados para a coleta de dados constituiu-se de uma entrevista estruturada, com perguntas aberto-fechadas e fechadas, relacionadas a dados pessoais (idade, gênero, profissão); atividades esportivas (tempo de prática, equipe, categoria, se havia preparador físico, fisioterapeuta); dados clínicos (doenças pessoais, doenças familiares, cirurgias anteriores e utilização de órteses); e histórico de lesões que requeriam procedimento médico e foram diagnosticadas pelo mesmo (diagnóstico médico, mecanismo de lesão, localização anatômica, exames subsidiários, tratamento fisioterapêutico). Para este estudo definimos como lesão o que diz o Sistema de Registro Nacional de Lesões Atléticas dos Estados Unidos (NAIRS): “um acontecimento que limita a participação do atleta por no mínimo um dia após sua ocorrência” [6]. Análise estatística Os dados obtidos por meio dos questionários aplicados com os atletas foram tratados e tabulados estatisticamente de maneira descritiva com tabelas de frequência e percentuais. Resultados Dos 31 atletas entrevistados 51,61% possuem idade entre 19 e 30 anos e 48,39% apresentam idades acima dos 30 anos. Todos os atletas afirmaram ter tido ao menos uma lesão durante a sua trajetória esportiva. Sobre o tempo de prática no esporte: 3 (9,69%) atletas praticam entre 01 e 10 anos, 13 (41,93%) atletas praticam entre 11 e 20 anos e 15 atletas (48,38%) praticam há mais de 20 anos. (Tabela I). Trinta e oito lesões foram relatadas, uma média de 1,23 lesões por atleta. 22 ocorrências (57,89%) correspondem a atletas com idades superiores a 30 anos e tempo de prática acima dos 20 anos. Com relação ao período em que mais ocorreram essas lesões, o treinamento prevaleceu com 18 atletas (58,06%) lesionados contra13 atletas (41,94%) com ocorrência de lesão em competição (Tabela II). Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 344 Tabela I - Distribuição dos atletas (frequência e porcentagem) pela idade/categoria e tempo de prática de Karatê. Masculino Feminino F(%) F(%) Atletas por idade 19 a 30 anos Acima de 30 anos Master Tempo de prática 01 a 10 anos 11 a 20 anos Acima de 20 anos Total F 09(56,3) 07(46,7) 16(51,6) 07(43,7) 08(53,3) 15(48,4) 03(18,7) - 03(9,7) 08(50) 05(31,3) 05(33,3) 10(66,7) 13(41,9) 15(48,4) F = Frequência Tabela II - Período de ocorrência das lesões. Período da lesão Treinamento Competição Masculino Feminino F(%) F(%) 10(62,5) 08(53,3) 06(37,5) 07(46,7) Total F(%) 18(58,0) 13(42,0) F= frequência. Masculino Feminino % % TRONCO Cabeça e pescoço Região lombar e cintura pélvica MMII Perna e coxa Joelho Tornozelo Pé MMSS Ombro Cotovelo Mãos e dedos Total Total % 7(31,8) 2(12,5) 9(23,9) 2(9,1) 2(12,5) 4(10,5) 5(22,7) 3(13,6) 1(6,3) 2(12,5) 1(6,3) 3(18,7) 6(15,8) 5(13,1) 1(02,6) 5(13,1) 2(12,5) (6,2) (12,5) 100 3(07,9) 1(02,6) 4(10,5) 100 2(9,1) 1(4,5) 2(9,1) 22(100) *Região dorsal e tórax, abdômen, braço e antebraço e punho não foram citados pelos participantes. Discussão O diagnóstico clínico mais frequente foi fratura/luxação13(34,21%), seguida das lesões musculares 11(28,9%), as entorses 6(15,8%), tendinite/fascite 5(13,1%) e por último as lombalgia/dorsalgia com 03(7,91%) (Tabela III). Tabela III - Incidência, número e frequência (%) das lesões. Diagnóstico Lesões musculares Fratura/Luxação Tendinite/Fascite Lombalgia/Dorsalgia Entorse Total Tabela IV - Incidência de lesões por região anatômica. Masculino Feminino F(%) F(%) 9(41,0) 2(12,6) 8(36,3) 5(31,2) 1(04,5) 4(25,0) 1(04,5) 2(12,5) 3(13,7) 3(18,7) 22(100) 16(100) Total F(%) 11(28,9) 13(34,3) 5(13,1) 3(7,9) 6(15,8) 38(100) F= frequência As regiões anatômicas foram subdivididas entre tronco, membros inferiores (MMII) e membros superiores (MMSS). A região dos MMII (composta por perna e coxa, joelho, tornozelo e pé) com 17 (44,71%) lesões foram as mais acometidas, ficando em segundo a região do tronco (composta por cabeça e pescoço, coluna lombar e cintura pélvica) com 13 lesões encontradas (34,20%) e por último, a região dos MMSS (composta por ombro, cotovelo, mãos e dedos) com 08 lesões encontradas (21,04%). Especificamente, a cabeça e pescoço com 09 (23,9%) lesões foram as localidades com maior incidência, ficando em segundo pernas e coxas com 06(15,78%) e em terceiro joelho e pé cada uma com 05 (13,15%) lesões encontradas (Tabela IV). As modalidades artísticas marciais em geral sofrem pela quantidade inexpressiva de pesquisas específicas na sua área, o que dificulta na comparação de dados e demais informações e obriga muitos autores a fazerem correlações com outros esportes quanto à prevalência de lesões [3-5]. Dos 31 atletas de karatê que participaram da pesquisa, todos relataram ter sofrido algum tipo de lesão. Esses dados corroboram com dados encontrados por Carazzato et al. [7] com atletas do judô, mas contraria os dados encontrados por Carpeggiani [3] em estudos com atletas do jiu jitsu, os quais apenas 64,4% apresentaram algum tipo de injuria. Houve uma prevalência de lesões em atletas mais experientes (57,89%) em relação aos menos experientes (42,11%). Este estudo corrobora com os resultados de outros autores [1] e até mesmo em outras modalidades de artes marciais [7-8]. O fator velocidade, força na técnica e todo o aumento da confiança pela experiência fazem com que potencialmente eleve a um estilo mais agressivo, colocando os experientes em maior risco de lesão. Embora este não tenha sido o foco de nosso estudo concordamos com Halabichet et al. [1] que afirmam que os fatores que podem determinar essa predisposição a lesões nos atletas com maior experiência são: frequência semanal de treino, intensidade excedida por longos períodos de tempo ou erros de treinamento por falta de periodização na tentativa de melhorar ou manter o seu desempenho mesmo com o passar dos anos. Quanto ao período de lesões, prevaleceram as lesões em treinamento (58,06%) sobre as lesões acometidas em campeonatos (41,94%). Esse resultado corrobora com os resultados encontrados por Carpeggiani [3] que analisou a prevalência de lesões em atletas do jiu-jitsu e verificou que 85,34% ocorreram em situações de treino; nas pesquisas com Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 atletas do taekwon-do, prevaleceram as lesões em treino com 59% [4]; e, em pesquisa com atletas do judô, observou-se que 71% dos processos lesivos ocorreram em treino [5]. Esse resultado possivelmente caracteriza a maneira como o atleta se expõe durante o treino, na tentativa de buscar a melhora do desempenho e consequentemente a meta esperada, ou ainda, a superioridade do volume de treino em relação ao volume de competição. Com relação ao diagnóstico clínico apresentado, os resultados obtidos foram a fratura/luxação predominando, seguido das lesões musculares, entorses, tendinites/fascite e por último lombalgia contrapondo a literatura [9], que afirma que as fratura apresentam baixa incidência, e na pesquisa de Arriaz et al. [10] prevaleceram como diagnostico clínico as contusões, epistaxe e as lacerações ficando por último as fraturas, as distensões e as entorses, assim como na pesquisa de Halabchi et al.[1], em seus estudos com karatecas, encontraram prevalência de lesão muscular, epistaxe, hematoma e contusão ficando a fratura como diagnóstico menos frequente, como também nos estudos de Zetaruk et al. [8], os quais relataram essas mesmas lesões como as mais frequentes. Acreditamos que as fraturas prevaleceram neste estudo por ser um tipo de lesão que não acontece com tanta frequência se comparado com outras mais simples que ocorrem diariamente e não sendo caracterizada pelo atleta, muitas vezes, como um tipo de lesão. Ao contrário do que ocorre com a fratura, pois existe a necessidade de maiores intervenções, tornando-se um registro na memória do esportista como uma lesão “de verdade”. Em relação à localização anatômica, houve uma prevalência dos membros inferiores seguidos pelo tronco e por último os membros superiores. Esses resultados podem provavelmente ser explicados porque o Karatê possui um repertório imenso de chutes e bases presentes tanto no Katá quanto no Kumitê, sendo estes, solicitados com grande frequência nos treinos e nas competições. Dados semelhantes foram encontrados por outros autores [8,10,11] e afirmam que existe um predomínio dos membros inferiores sobre as lesões devido ao número excessivo de chutes, pois muitos técnicos têm utilizado técnicas de pernas em seus atletas pela busca de maiores pontuações, outros fatores relacionados a lesões estão: no treinamento inadequado (excesso de volume de treino ou mesmo falta de aquecimento prévio). Porém resultados divergentes foram encontrados em estudo de Halabchi et al. [1], o qual apresentou a região do tronco sobrepondo os membros inferiores e superiores. Especificamente, as lesões de membros inferiores aconteceram em perna e coxa (15,78%), assemelhando-se as localidades apresentadas por diversos autores [1,8] e divergentes do resultado encontrado por Carpeggiani [3], em seu estudo com atletas do Judô, no qual predominaram as lesões em joelho com 27%. A região dos membros superiores, mãos e dedos (10,52%) prevaleceu como local com maior lesão, o que corresponde aos 345 dados encontrados por outros autores [12-14], que afirmam que a contusão digital provocada pelos golpes repetidos nas articulações metacarpofalângicas e/ou interfalângicas contra os obstáculos são lesões mais comuns de membros inferiores. Discordando de Silva [15], que afirma que a prevalência é de lesões de ombro, porém estes autores avaliaram esportes diferentes. A região da cabeça e pescoço (23,68%), além de ter sido destaque como local com maior incidência de lesão, em região de tronco, prevaleceu também como local com maior probabilidade, se comparada a todas as outras localidades mencionadas nesta pesquisa corroborando com outros estudos [1,10,15]. Fernandéz et al. [16] estudaram a prevalência de fraturas faciais vinculadas ao esporte, demonstraram que o Karatê ficou em 4ª lugar, apenas atrás do beisebol, boxe e basquetebol, deixando para trás diversos esportes. Essa prevalência explica-se devido a cabeça e pescoço, agora, serem os principais alvos dos lutadores por estas serem as regiões com maior pontuação dentro das competições. Apenas o estudo de Zetaruk et al.[8] foi contrário às conclusões, pois o resultado obtido determinou que lesões na cabeça e pescoço fossem os menos prováveis de ocorrer no esporte - karatê (10%) quanto à localização específica, porém trata-se de um estudo mais antigo e o nível de exigência tem aumentado muito com o passar dos anos. O trabalho retrospectivo é dificultado pelo fator memória dos atletas, pois lesões de menores proporções em geral não são lembradas pelos mesmos, porém têm um valor importante para se traçar um perfil das lesões nos atletas. Outros autores [17] também discorrem sobre este problema e relatam a dificuldade de gerar informações sobre as lesões desportivas e que a memória dos atletas pode ajudar, apesar da dúvida do tempo de recordação das lesões. Conclusão As lesões musculoesqueléticas mais frequentes no Karatê das modalidades Kumitê e Katá foram fratura/luxação, seguido das lesões musculares, entorses, tendinites/fascite e por último lombalgia. A prevalência de lesões em atletas experientes sobrepôs sobre os inexperientes, com um predomínio de injurias no momento do treino. Em relação à localização anatômica, houve uma prevalência dos membros inferiores (perna e coxa), seguidos pelo tronco (cabeça e pescoço) e por último os membros superiores (mãos e dedos). Referências 1. Halabchi F, Zianne V, Lotfian S. Injury profile in women Shotokan Karate Championships in Iran (2004-2005). J Sports Sci Med 2007;6(CSSI-2):52-7. 2. Hernandez AJ. Perspectivas da traumatologia esportiva no esporte de alto rendimento. 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Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 347 Artigo original Relação entre função cognitiva e capacidade funcional em idosos institucionalizados de Caxias do Sul/RS Relationship between cognitive function and functional capacity in institutionalized elderly of Caxias do Sul/RS Fernanda Cechetti*, Cristiane Reis**, Tiago Cabral**, Fernanda Bett**, Laís Rodrigues**, Renata Bortolini**, Fernanda Simioni**, Aline Zanonato**, Gislaine Schmitt**, Nathalia Guazzelli**, Gleice Vigolo**, Tiago Lopes**, Francine Finger**, Rosane Bolfe**, Franciele Roth**, Luciano Puhl*** *Docente pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), Doutorado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), **Alunos da Faculdade de Fisioterapia da UCS, ***Fisioterapeuta responsável, Caxias do Sul/RS Resumo Abstract O envelhecimento normal engloba um declínio gradual nas funções cognitivas, dependentes de processos neurológicos que se alteram com a idade. O declínio que acompanha o idoso tem início e progressão extremamente variáveis, e a perda de memória aparece como uma das funções mais acometidas. O objetivo deste estudo foi caracterizar uma população de idosos institucionalizados de Caxias do Sul/RS quanto ao seu estado cognitivo, às atividades comuns de vida diária, à mobilidade e à autonomia funcional a fim de identificar possível associação existente entre déficit cognitivo e prejuízo motor decorrentes da institucionalização destes sujeitos e vice-versa. Participaram deste estudo 67 sujeitos (77,59 ± 8 anos), os quais foram submetidos ao teste cognitivo Mini-Exame do Estado Mental (MEEM). Mobilidade para membros superiores e inferiores, e as atividades de vida diária foram avaliadas através do Índice de Katz. Não foi encontrada correlação estatisticamente significativa entre MEEM e idade, gênero, escolaridade e mobilidade de membros inferiores (r = 0,02, p > 0,05, Pearson). Uma associação foi detectada entre o desempenho dos idosos no teste para mobilidade dos membros superiores e o teste cognitivo MEEM (p = 0,01 e r = 0,251 Pearson). Os idosos demonstraram um déficit significativo na realização das tarefas banho, vestuário e transferência através do Índice de Katz. Portanto, podemos concluir através deste estudo que as alterações cognitivas detectadas através do MEEM não tiveram associação com o desempenho dos idosos nos testes de mobilidade para membros inferiores. Entretanto, verificou-se uma associação significativa entre o desempenho dos idosos no teste de capacidade funcional para membros superiores e o teste cognitivo avaliado através do MEEM. Normal aging involves a gradual decline in cognitive abilities which are dependent on neurological processes that change with age. The decline accompanying the elderly is extremely variable in relation to initiation and progression, and memory loss is one of the most affected functions. The aim of this study was to characterize a population of institutionalized elderly people of the city of Caxias do Sul/RS concerning their cognitive state, common activities of daily living, mobility and functional autonomy, in order to identify possible association between cognitive deficit and motor impairment as a result of institutionalization of these subjects and vice-versa. Sixty-seven subjects (77.59 ± 8 years old) participated on this study, and underwent cognitive testing using the Mini-Mental State Examination (MMSE). Mobility of upper and lower limbs and activities of daily life were evaluated using the Katz Index. No statistically significant correlation was found between MMSE with age, gender, education and mobility of lower limbs (r = 0.02, p > 0.05, Pearson). Association was detected between the performance of the elderly in the mobility test of the upper limbs and cognitive test MMSE (p = 0.01 e r = 0.251 Pearson). The Katz Index showed that the elderly had a significant deficit in performing the following tasks: bathing, clothing and transfer. Therefore, we conclude that the cognitive impairments of these elderly people, detected via the MMSE, did not have any association with their performance in the test of lower limbs mobility. However, it was found a significant association between the performance of the elderly in the upper limbs functional capacity test and the assessment of cognitive function using the MMSE. Key-words: elderly, cognition, mobility. Palavras-chave: idosos, cognição, mobilidade. Recebido em 21 de março de 2011; aceito em 10 de agosto de 2011. Endereço correspondente: Fernanda Cechetti, Rua Leopoldo Bier, 645/202, 90620-100, Porto Alegre RS, Tel: (51) 8425-4301, E-mail: [email protected] 348 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução A população brasileira vem envelhecendo de forma rápida desde o início da década de 60. Em 2000, segundo o Censo Brasileiro, a população de 60 anos de idade ou mais, era de 14.536.029 de pessoas, contra 10.722.705 em 1991. A população idosa no início da década representava 7,3%, enquanto, em 2000, essa proporção atingia 8,6% [1]. Entre as novas demandas impostas ao setor público, sobressaem-se os cuidados de longa duração dirigidos a idosos, com algum grau de dificuldade para a execução das atividades da vida diária e/ou aqueles cuja família não possui meios financeiros, físicos ou emocionais para a prestação dos cuidados necessários. Uma das modalidades de cuidados, definida pela Portaria SEAS nº 2874/2000 são as Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI), que consistem nas tradicionais instituições asilares. As ILPI são consideradas unidades de saúde de baixa complexidade que desempenham a função de atendimento do idoso desprovido de condições de autogestão de vida. A perda do funcionamento adaptativo em muitos destes idosos institucionalizados e um declínio ou de mudanças biológicas negativas podem ser consequência de um ambiente que estabelece e decide a ocasião para o comportamento deficitário e que reforça o comportamento ineficaz e de dependência [2]. O envelhecimento além de ocorrer fisiologicamente por fatores não modificáveis, também é mediado por fatores modificáveis como os fatores psicológicos e sociais. Este processo encerra inúmeras alterações na vida do idoso, afetando sua funcionalidade, mobilidade, saúde, privando-o de uma vida autônoma e saudável [3]. A capacidade funcional é um indicador de saúde para o idoso e passa a ser a resultante da interação entre saúde física e mental, independência na vida diária, integração social, suporte familiar e independência econômica. Qualquer uma dessas dimensões, se comprometida, pode afetar a autonomia funcional e a independência de um idoso [4]. Esta funcionalidade está dividida em duas categorias: atividades de vida diária (AVD’s) e as atividades instrumentais de vida diária (AIVD’s). As primeiras refletem apenas a capacidade ou não para o autocuidado básico, enquanto as AIVD’s o nível da capacidade de utilização dos recursos disponíveis no meio ambiental habitual para a execução de tarefas rotineiras do dia-a-dia [5]. Juntamente com a capacidade funcional, a mobilidade e a habilidade de deslocamento tornam-se menos eficazes no idoso, dificultando a realização de atividades essenciais como as AVD’s [6]. Em geral, o idoso perde a potencialidade para a realização das suas atividades, e isto pode ser ainda mais influenciável pelo declínio gradual nas funções cognitivas, dependentes de processos neurológicos que se alteram com a idade. As perdas de memória, principalmente as que se refletem em dificuldade para recordar nomes e objetos guardados são as mais frequentes [7]. Cuidados à saúde têm sido estudados enquanto política pública, portanto, este estudo teve o objetivo de caracterizar uma população de idosos institucionalizados da Cidade de Caxias do Sul quanto ao seu estado cognitivo, às atividades comuns de vida diária e à mobilidade, a fim de identificar possível associação existente entre déficit cognitivo e prejuízo motor decorrentes da institucionalização e vice-versa. Este estudo e posteriores trabalhos nessa área possuem uma grande relevância, devido ao número crescente de idosos institucionalizados, e também às estratégias terapêuticas futuras que possam não somente intervir, mas também contribuir de uma forma preventiva, melhorando a qualidade de vida desta população. Material e métodos Tratou-se de um estudo transversal do tipo exploratório descritivo caracterizando os idosos de uma instituição de Caxias do Sul (Lar São Francisco de Assis), com uma população estimada de 67 idosos, dentre eles 61% eram do sexo feminino. A amostra foi composta por todos os indivíduos institucionalizados, com idade a partir de 60 anos, ponto de corte para definir idoso preconizado pela Organização Mundial de Saúde [8]. As variáveis demográficas (idade, sexo, escolaridade e tempo de institucionalização) foram obtidas dos prontuários para descrever a amostra estudada. Neste estudo, optou-se por instrumentos que tendem a uma avaliação funcional geral e curta, procurando uma avaliação multidisciplinar de várias dimensões que afetam o indivíduo idoso institucionalizado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UCS, parecer nº 86/2010, e realizada no primeiro semestre de 2010. Mini-Exame do Estado Mental (MEEM) Esse teste é um dos mais empregados em todo o mundo, pois além da avaliação da função cognitiva, permite o rastreamento de quadros demenciais [9]. É composto por questões agrupadas em sete categorias, cada uma com a finalidade de avaliar funções cognitivas específicas como orientação, retenção ou registro de dados, atenção e cálculo, memória e linguagem [10]. A ausência de transtorno cognitivo é dada pelos seguintes valores de corte: 13 para analfabetos; 18 para indivíduos com 1 a 7 anos de escolaridade e 26 para 8 anos ou mais de escolaridade [11]. O MEEM avalia a presença ou não de alterações cognitivas e não fornece diagnósticos de quadros demenciais [12]. Fazem parte da amostra os idosos que estavam presentes na instituição durante os dias em que foi aplicado o teste, os que concordaram em participar da pesquisa, os que tinham capacidade suficiente para entender os comandos e aqueles que conseguiram terminar a avaliação, sendo assim, a popu- Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 lação do estudo para este teste, compreenderam somente 45 indivíduos (67,2%). Escala de Katz para Atividades de Vida Diária Essa Escala continua sendo um dos métodos mais empregados em estudos nacionais e internacionais [13], em que são delimitados seis critérios de avaliação que fornecem informações sobre a independência do indivíduo idoso: banho, vestir-se, higiene pessoal, transferência, continência e alimentação [14]. Todos os 67 sujeitos residentes na instituição foram avaliados neste teste e classificados conforme sua dependência ou independência na realização das tarefas. Teste de Autonomia Funcional – Vestir e Tirar a Camiseta (VTC) Tem o objetivo de avaliar a autonomia funcional dos membros superiores através da mensuração do tempo necessário pra executar essa tarefa. Foi utilizada uma camiseta sem mangas de tamanho G (Hering, Brasil) e um cronômetro. O teste consiste em cronometrar o tempo que um indivíduo idoso leva para vestir e retirar uma camiseta. Ao sinal de “já” é acionado o cronômetro e o indivíduo deve vestir a camiseta e retirá-la, ao término da tarefa o cronômetro é paralisado. Os voluntários receberam uma breve explicação e demonstração de como realizar o teste pelos avaliadores. Cada indivíduo realizou duas tentativas, sendo registrada a qual este executou a tarefa em menor tempo. A população do estudo para este teste compreendeu somente 28 (41,8%) indivíduos dos 66 moradores da instituição, devido à incapacidade de realizar o teste solicitado. Avaliação na mobilidade orientada para AVD – Versão Brasileira do Southampton Assessment of Mobility (SAM-BR) Esse teste tem como objetivo “detectar indivíduos da comunidade ou institucionalizados que tenham propensão a quedas e/ou que estejam em acompanhamento por tratamento de déficits da mobilidade”. Contém testes funcionais para o equilíbrio que reproduzem as alterações que as mudanças de posição do corpo produzem no sistema vestibular, durante a realização das atividades de vida diária, enquanto os testes da marcha refletem a segurança e a eficiência do deslocamento no ambiente [6]. São 18 itens distribuídos em quatro seções nas seguintes tarefas: transferência de sentado para o ortostatismo; equilíbrio em ortostatismo; marcha e transferência da posição ortostática para sentada. O paciente pode receber a pontuação 1 se ele “realiza” ou 0 se ele “não realiza” a tarefa solicitada. A pontuação final pode variar de 0 a 18. A população do estudo, para este teste, compreendeu 57 (85,1%) indivíduos. 349 Análise estatística Para o tratamento estatístico dos dados utilizou-se o programa estatístico SPSS 15.0, utilizando-se um nível de significância de 5% (p < 0,05). Numa primeira etapa, os dados foram explorados através de estatística descritiva, realizando medidas de tendência central e de dispersão. Para análise do MEEM com escolaridade e gênero utilizou-se o ANOVA de uma via, seguida pelo teste de Duncan e o coeficiente de correlação linear de Pearson para verificar a existência de associação entre diferentes variáveis. Resultados A idade da amostra estudada (n = 67) variou entre um máximo de 90 e um mínimo de 60 anos de idade, em que a média ± desvio padrão foi de 77,59 ± 8,01 anos, com uma escolaridade média ± desvio padrão de 3 ± 2,1 anos, e 6,5 ± 5,5 anos de institucionalização. Os valores do MEEM foram de aproximadamente 16 ± 6,37. A pontuação média no teste de autonomia funcional - VTC foi de 35,78 ± 28,73 e apresentam no Teste da Mobilidade Orientada uma média de 15,23 ± 2,6. Na Tabela I, constam todos os idosos da instituição estudada, onde se observou um grau de dependência bastante importante destes indivíduos, principalmente para banho, vestimenta e higiene pessoal. Tabela I - Percentual de dependência e independência nas atividades de vida diária através da Escala de Katz, observado em todos os idosos da Instituição estudada. Atividade Banho Vestir-se Higiene Pessoal Transferência Continência Alimentação Dependente 78,78% 62,12% 48,48% 40,90% 51,51% 13,36% Independente 21,21% 37,87% 51,51% 59,09% 48,48% 86,36% Inicialmente, através da ANOVA, seguida pelo teste de Duncan analisou-se o Teste do MEEM com a escolaridade dos idosos, em que não foi encontrada nenhuma diferença significativa (F(2,44) = 0,49; p = 0,61). O mesmo ocorreu com o mesmo teste em relação ao gênero dos idosos (p = 0,77, em que a média dos participantes do sexo feminino foi de 14,28 e do sexo masculino 14,90. Conforme a Figura 1A, não foi observada correlação significativa entre idade e função cognitiva (Pearson r = 0,028, p = 0,273). O mesmo acontece quando correlacionamos os resultados do MEEM com tempo de institucionalização (Fig 1B) (Pearson r = 0,002, p = 0,78). Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 350 Figura 1 - Correlação entre MEEM e idade (A) e MEEM com tempo de institucionalização (B) dos idosos. B 30 A Pontos MEEM Pontos MEEM 30 25 20 15 50 60 70 80 Idade (anos) 90 100 B Pontos MEEM 30 25 20 15 10 5 50 5 10 15 Tempo de instituicionalização (anos) 20 Na amostra pesquisada em relação ao teste VTC, em que somente 28 dos 66 participantes conseguiram realizar o teste, se observou uma correlação positiva entre o MEEM e o desempenho dos idosos no VTC (p = 0,01 e r = 0,251 Pearson). Já no cruzamento do teste de cognição MEEM com a mobilidade orientada para membros inferiores não foram encontradas correlações (Pearson r = 0,02, p > 0,05) (Fig. 2). No cruzamento das variáveis VTC com mobilidade de membros inferiores também não se observou correlação (Pearson r = 0,015). Figura 2 - Correlação entre MEEM e VTC (A) e MEEM com mobilidade de membros inferiores (B) dos idosos. A Pontos MEEM 30 25 20 15 10 5 0 15 10 0 5 0 20 5 10 0 25 0 40 80 VTC 120 160 0 5 10 15 Mobilidade membros inferiores 20 Discussão Os resultados obtidos no presente estudo demonstraram que de uma maneira geral os idosos apresentam-se bastante dependentes nas atividades de vida diária, principalmente para vestimenta, higiene pessoal e banho (Tabela I). Estes dados podem ser justificados pela idade bastante alta da população em estudo, aproximadamente 78 anos. Estudos concordam com esses achados, nos quais são relatados uma correlação positiva entre idade e auxílio para realização de atividades básicas [15]. No Brasil, um inquérito domiciliar demonstrou que o aumento da expectativa de vida vem associado ao acréscimo da proporção de indivíduos que necessitam de auxílio para a realização AVD’s [16,17]. Em estudo realizado com idosos institucionalizados, os resultados encontrados referentes a maior grau de dependência foram para as atividades de banhar-se (78,78%) seguidos pelo vestir-se (62,12%). Autores afirmam que os idosos possuem grande dificuldade na realização das atividades de vida diária. E, este índice sofre considerável aumento quando se trata principalmente de indivíduos idosos institucionalizados [18]. Estes dados também podem ser justificados pelo principal achado neste estudo, onde existem alterações cognitivas nos idosos detectadas através do teste MEEM. Para este grupo a média deste teste foi de aproximadamente 16 pontos para uma média de 3 anos de escolaridade, sendo o ponto de corte para demência de 18 (para indivíduos com 1 a 7 anos de escolaridade) [11]. Somado a isso, essas alterações apresentam uma correlação positiva com a mobilidade destes indivíduos, principalmente de membros superiores, através do Teste de Autonomia Funcional (Figura 2A). É interessante identificar que as principais atividades prejudicadas nas AVD’s envolvem diretamente os membros superiores para uma perfeita realização. A escala de AVD’s de Western indica que idosos com baixo funcionamento cognitivo tendem a ter uma menor performance nas AVD’s [12]. Autores corroboram com nossos dados citando que evidências advertem que o comprometimento da atenção e da memória, em especial a memória recente, a desorientação Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 espacial e a deterioração das funções executivas podem estar relacionadas aos déficits na mobilidade [19]. Os idosos institucionalizados têm maior chance de terem déficits cognitivos associados às perdas motoras, pelo fato de terem que mudar seu estilo de vida, adaptar-se a uma rotina de horários, dividir o seu ambiente com estranhos e viver distante da família [20]. A maioria das instituições não realizam atividades ocupacionais durante o dia e os idosos, devido ao declínio do organismo, dão preferência às atividades menos exigentes e que requeiram menor esforço. Acontecendo, com isso, um fenômeno interessante que termina convertendo-se em um ciclo vicioso. O idoso tende a diminuir seu nível de atividade física, seja pela idade avançada ou pela incapacidade funcional, e todo este quadro (de influência físico/motora na cognição e vice-versa) pode levar às demências. Surpreendentemente não foi identificada correlação do estado cognitivo através do teste MEEM com a mobilidade de membros inferiores (Figura 2B). Isto pode ser justificado principalmente porque em alguns quadros demenciais os pacientes apresentam inquietação e deambulação incessante durante grande parte do dia e apenas na Demência de Alzheimer, ou seja, na ausência de sinais extrapiramidais, existe uma lentidão motora associada [22]. Pacientes com importantes alterações cognitivas e às vezes até portadores de demência, não necessariamente terão uma diminuição da mobilidade de membros inferiores [23]. O movimento é a base da aprendizagem, porque representa um importante aspecto da experiência em cada momento. Aprender uma competência motora requer o desenvolvimento e a modificação de programas motores cada vez mais exatos, os quais coordenam não apenas movimentos precisos, mas também o conhecimento necessário para executá-los. Assim, pode-se pensar o quanto o estado mental e funcional é dependente, podendo um interferir no outro, como ocorre com os idosos analisados nesta pesquisa [24]. Cabe às instituições que asilam estes idosos e aos profissionais responsáveis cuidarem para que essas capacidades restantes sejam preservadas ou melhoradas. E para que o processo de envelhecimento não seja só visto como o fim de uma vida [25]. Portanto, a implementação de um programa de atividades físicas adaptadas em instituições asilares pode amenizar a progressão do ciclo, já que promove aumento de força muscular, ganho de mobilidade e pode prevenir ou adiar a instalação do comprometimento cognitivo [26]. Conclusão Concluiu-se que as alterações cognitivas tiveram associação com a realização das atividades de vida diária relacionada ao desempenho dos idosos em atividades com os membros superiores. O mesmo não ocorreu na associação entre função cognitiva e mobilidade de membros inferiores. 351 Referências 1. Furtado C. Estatísticas do Século XX: Estatísticas populacionais, sociais, políticas e culturais. IBGE; 2003; [citado 2006 Mar 02]. Disponível em URL: http://www.ibge.gov.br. 2. 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Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 353 Artigo original Avaliação da resistência imposta pelos filtros trocadores de calor e umidade às vias aéreas de pacientes com suporte ventilatório mecânico Evaluation of resistance imposed by heat exchangers and moisture filters of airway in patients with mechanical ventilatory support Nayala Lirio Gomes Gazola, M.Sc.*, Fernando Osni Machado, D.Sc.**, Walter Celso de Lima, D.Sc.***, Humberto Pereira da Silva****, Juliana El Hage Meyer de Barros Gulini, M.Sc.***** *Doutoranda do PEN/UFSC, Fisioterapeuta HU-UFSC, Membro do GIATE, **Médico da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Universitário HU-UFSC e Professor do Curso de Medicina da UFSC, ***Professor da UDESC, ****Engenheiro da IEBUFSC, *****Fisioterapeuta HU/UFSC Resumo Abstract Introdução: Os FTCUs (filtros trocadores de calor e umidade) são dispositivos que combinam propriedades de umidificação e retenção bacteriana através de membranas que protegem pacientes mecanicamente ventilados. Objetivo: Analisar, em um modelo experimental, os efeitos de diferentes marcas de FTCU, em diferentes tempos de uso sobre resistência das vias aéreas de pacientes com suporte ventilatório artificial. Material e método: Trata-se de um ensaio clínico randomizado, a amostra constitui-se de 30 filtros de três diferentes marcas, utilizados por 48 horas em pacientes internados numa unidade de terapia intensiva. A variável estudada consistiu na resistência ao fluxo de ar, analisada em 0, 24 e 48 horas para cada marca de FTCU. Resultados: Não houve diferença estatisticamente significativa na resistência ao fluxo de ar entre as marcas no tempo de uso 24 horas (p = 0,489) e 48 horas (p = 0,374), apenas no momento 0 hora de utilização houve uma diferença estatisticamente significativa (p = 0,027) entre as marcas estudadas, e, além disso, dentro da mesma marca não houve diferença estatística na resistência ao fluxo de ar com o tempo de uso. Conclusão: A utilização por 48 horas dos FTCUs não interfere na resistência ao fluxo de ar de pacientes mecanicamente ventilados promovendo segurança no seu uso. Introduction: The FTCUs (heat and moisture exchange filters) are devices that combine wetting properties and retention through bacterial membranes that protect mechanically ventilated patients. Objective: To analyze, in an experimental model, the effects of different brands of FTCU at different times of use on the airways of patients with mechanical ventilation. Material and methods: Randomized clinical trial with a sample of 30 filters used three different brands for 48 hours in ICU patients. The variable studied was the resistance to airflow analyzed at 0, 24 and 48 hours for each brand of FTCU. Results: There were no statistically significant difference in resistance to air flow between the brands used 24 hours (p = 0.489) and 48 hours (p = 0.374). Just in time 0 hour of use there was a statistically significant difference (p = 0.027) among the brands studied. Within the same brand no statistical difference was observed in the resistance to air flow with time of use. Conclusion: The use of filters does not interfere with FTCUs resistance to airflow in mechanically ventilated patients promoting security in its use. Key-words: filter, airway resistance, artificial respiration, intensive care unit. Palavras-chave: filtros, resistência das vias respiratórias, respiração artificial, unidade de terapia intensiva. Recebido em 28 de março de 2011; aceito em 30 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Nayala Lirio Gomes Gazola, Rua Osni João Vieira, 620/1004, 88101-270 São José SC, Tel: (48) 9980-8818, E-mail: [email protected] 354 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução Na presença de intubação orotraqueal, nasotraqueal ou traqueostomia ocorre a perda das funções fisiológicas das vias aéreas como filtração, aquecimento e umidificação dos gases inalados [1]. Desta forma, com a utilização de uma via aérea artificial, a respiração prolongada de gases inadequadamente condicionados através de um tubo endotraqueal pode acarretar hipotermia, espessamento das secreções, destruição do epitélio das vias aéreas e atelectasias. Além disso, a parede e o muco dos brônquios e dos bronquíolos são quem sofrem maior influência da umidade e da temperatura do gás. Quando o paciente utiliza uma via aérea artificial, é necessário acrescentar-se ao circuito de ventilação mecânica (VM) um sistema para umidificar e aquecer o gás inalado [2-4]. Dois tipos de dispositivos têm sido comumente utilizados durante a VM visando a umidificação e o aquecimento do ar inspirado, sendo denominados umidificadores aquosos aque­cidos (UAA) e filtros trocadores de calor e umidade (FTCU) [3,5]. O princípio básico dos umidificadores aquecidos é transpor o gás seco e frio através de uma câmara preenchida parcialmente de água aquecida, onde por meio da evaporação, o vapor da água é misturado ao gás, elevando sua temperatura e umidade. Os umidificadores aquecidos apresentam algumas desvantagens, tais como: a condensação do vapor de água no circuito elevando a colonização de bactérias, o fornecimento de energia e o constante suprimento de água. Além disso, o uso incorreto pode causar aquecimento e umidificacão excessivos ou insuficientes, produzindo uma situação não fisiológica, podendo levar a repercussões clínicas indesejáveis, a quadros clínicos de hipotermia ou hipertermia, lesão térmica de via aérea, pouca fluidificação da secreção, degeneração e paralisia ciliar. Somado a isto, podem causar infecções pulmonares, aumentar a quantidade de secreções das vias aéreas aumentando consequentemente a resistência do sistema e ainda lesar o aparelho mucociliar e o surfactante devido ao condensado aquoso [4,6]. Os FTCUs são dispositivos colocados entre o tubo endotraqueal/traqueostomia e o conector em “Y” do circuito do ventilador. São umidificadores de ação passiva, cujo princípio de funcionamento é armazenar parte do calor e do vapor d’água proveniente do ar exalado, disponibi­lizando-os durante uma nova inspiração. Tem como vantagens, redução da perda e da condensação de água no circuito, baixo custo, facilidade de uso, papel filtro microbiológico e a não utilização de energia [5,6]. A filtração eficiente de bactérias pode ser especialmente importante em pacientes infectados ou imuno-comprometidos que estão na unidade de terapia intensiva (UTI), e os FTCUs podem ajudar a proteger tanto os pacientes quanto os ventiladores de contaminação microbiana [6]. Estes podem ser eficazes na preservação da temperatura corporal e umidade da via aérea enquanto diminui o acúmulo de líquido no circuito reduzindo a contaminação do sistema respiratório [7]. Além disso, são seguros, econômicos, oferecem baixa resistência ao fluxo de ar e pequeno espaço morto [8]. Porém o uso prolongado do FTCU (> 24h) pode promover o aumento do trabalho respi­ratório, devido à maior resistência oferecida à passagem do gás inspirado, além de alterações da ventilação alveolar [5]. Sendo assim, conhecer a resistência imposta por estes dispositivos ao paciente criticamente doente recebendo suporte ventilatório em unidades de terapia intensiva é de fundamental importância, pois o aumento na resistência ao fluxo de ar aumenta o trabalho respiratório podendo causar fadiga da musculatura respiratória e possivelmente interferir no processo de desmame da prótese ventilatória [9]. Além disto, saber com que frequência deve se trocar os filtros visando menor custo possível sem acarretar prejuízo ao doente, se faz necessária para a rotina da unidade de terapia intensiva dando maior segurança aos profissionais e a certeza que o melhor ao paciente está sendo realizado. Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi analisar, em um modelo experimental, a influência de três diferentes marcas de FTCU, em três diferentes tempos de utilização sobre a resistência das vias aéreas de pacientes com suporte ventilatório artificial. Material e métodos Trata-se de um ensaio clínico controlado e randomizado. Após aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade do Estado de Santa Catarina iniciou-se o estudo numa UTI geral. Para a coleta de dados utilizou-se o analisador de fluxo VT PLUS HF (gas flow analyzer) disponibilizado pelo laboratório do Instituto de Engenharia Biomédica da Universidade Federal de Santa Catarina – IEB/UFSC. Este equipamento foi previamente calibrado e manipulado por um engenheiro da IEB, presente no período de coleta dos dados. A leitura dos dados foi realizada dentro da UTI, desta forma existiu uma proximidade entre o paciente que estava utilizando o filtro e o local de coleta de dados, não exigindo cuidados especiais no transporte do filtro. O procedimento de coleta transcorreu da seguinte forma, seguindo um protocolo de coleta de dados: a) Foram registrados os dados dos pacientes em que foram colocados os filtros FTCU através da leitura dos prontuários, do ventilador mecânico e do monitor cardíaco; b) A sequência das 3 marcas de filtros (A, B e C) foi sorteada para então serem colocados nos pacientes internados na UTI a partir do leito 01; c) Desta forma, no momento 0 hora de utilização, ou seja, os filtros pré-uso analisou-se a resistência ao fluxo de ar destes através do VT PLUS HF antes de serem colocados no paciente; d) Em seguida, foram colocados no circuito ventilatório (entre a peça T e o tubo orotraqueal) do paciente e permaneceram por 24 horas. Após este período, os filtros Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 foram retirados e analisados o valor da resistência ao fluxo de ar; e) Posteriormente, os filtros foram recolocados no paciente por mais 24 horas, totalizando 48 horas de utilização. Em seguida, foram novamente retirados dos pacientes e verificados os valores de resistência ao fluxo de ar; f ) Para análise, toda vez que o filtro era retirado do paciente, estes foram conectados no ventilador mecânico com os seguintes parâmetros: VC = 500 mL, FR = 12 rpm, PEEP = 3 cmH2O, FiO2 = 21%, Tempo inspiratório = 1,0 s, Trigger = 1,5 L/ min. O ventilador mecânico foi conectados ao analisador VT PLUS HF e este ao um simulador de pulmão com complacência de 50 mL/cmH2O e resistência de 3 cmH2O/L/s (Figura 1) [10,11]. Os FTCUs foram então colocados entre o ventilador mecânico e o equipamento VT PLUS HF. Cabe ressaltar, que os parâmetros ventilatórios foram ajustados em valores mínimos, pois a eficácia dos FTCUs pode diminuir com o aumento do fluxo, da frequência e dos volumes respiratórios elevados, assim como em níveis elevados de fração inspirada de O2 [2]. Figura 1 - A) Sistema de análise montado; B) Posição do FTCU para coleta dos dados. 355 Os dados dos pacientes e dos filtros foram tabulados no programa Excel. O Teste de Shapiro Wilk foi usado para verificar a normalidade dos dados. Como os dados não apresentavam uma distribuição normal, a estatística descritiva dos dados foi apresentada com mediana e o intervalo entre o percentil de 25-75% dos dados mais típicos. Com o objetivo de verificar a diferença de resistência ao fluxo de ar entre as marcas utilizou-se o teste Kruskal – Wallis. Como apenas no tempo 0 hora de utilização dos FTCUs, houve diferença estatisticamente significativa entre as marcas, realizou-se o teste de Mann – Whitney para verificar a diferença entre as marcas neste momento. Finalmente, para verificar as diferenças entre os tempos de utilização dos filtros na mesma marca utilizouse o teste Anova Medidas Repetidas. Para todas as análises, considerou-se um nível de significância de 5%, ou p < 0,05. Resultados Os FTCUs da marca A apresentaram uma mediana da resistência ao fluxo de ar no tempo 0 hora de utilização de 1,915 ± 0,762 cmH2O/L/s, no tempo 24 horas de utilização de 2,102 ± 0,757 cmH2O/L/s e no tempo 48 horas de utilização a mediana da resistência ao fluxo de ar foi de 2,427 ± 0,728 cmH2O/L/s (Figura 2). Figura 2 - Mediana da resistência ao fluxo de ar dos filtros da marca A no tempo 0, 24 e 48 horas de utilização. cmH2O/L/s Marca do Filtro: Marca A 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 0 2,427 2,102 1,915 Tempo 0 h Tempo 24 h Tempo 48 h Os FTCUs da marca B apresentaram uma mediana da resistência ao fluxo de ar no tempo 0 hora de utilização de 2,180 ± 0,716 cmH2O/L/s, no tempo 24 horas de utilização de 2,036 ± 0,738 cmH2O/L/s e no tempo 48 horas de utilização a mediana da resistência ao fluxo de ar foi de 1,693 ± 0,772 cmH2O/L/s (Figura 3). Figura 3 - Mediana da resistência ao fluxo de ar dos filtros da marca B no tempo 0, 24 e 48 horas de utilização. Marca do Filtro: Marca B cmH2O/L/s Foram excluídos do estudo pacientes com temperatura corporal abaixo de 36º e acima de 40º graus centígrados, pois a hipertermia bem como a hipotermia podem afetar o desempenho do FTCU, além dos pacientes com expectativa de retirada da prótese ventilatória dentro das 48 horas do estudo. Foram excluídos os filtros que apresentaram secreção e excesso de umidificação para não danificar o analisador de fluxo. 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 0 2,18 2,036 1,693 Tempo 0 h Tempo 24 h Tempo 48 h Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 356 Os FTCUs da marca C apresentaram uma mediana resistência ao fluxo de ar no tempo 0 hora de utilização de 1,492 ± 0,679 cmH2O/L/s, no tempo 24 horas de utilização de 1,934 ± 0,775 cmH2O/L/s e no tempo 48 horas de utilização a mediana da resistência ao fluxo de ar foi de 1,889 ± 0,749 cmH2O/L/s (Figura 4). Figura 4 - Mediana da resistência ao fluxo de ar dos filtros da marca C no tempo 0, 24 e 48 horas de utilização. cmH2O/L/s Marca do Filtro: Marca C 3 2,5 2 1,5 1 0,5 0 Tabela III - Resultado do teste Anova Medidas Repetidas para a resistência ao fluxo de ar. Marcas 1,934 1,889 1,492 Marca A Marca B Marca C P 0,599 0,523 0,414 η2 0,009 0,11 0,15 p – Valor de significância; η2 – Eta parcial ao quadrado. Tempo 0 h Tempo 24 h Tempo 48 h O teste de Kruskal-Wallis demonstrou que não houve diferença estatisticamente significativa entre as marcas no tempo de uso 24 horas (p = 0,489) e 48 horas (p = 0,374), sendo que apenas no momento 0 hora de utilização houve uma diferença estatisticamente significativa (p = 0,027) entre as marcas estudadas (Tabela I). Tabela I - Resultado do teste de Kruskal-Wallis para a resistência ao fluxo de ar das 3 marcas de FTCU nos 3 tempos de utilização Chi-square P Por fim, para comparar a resistência entre os tempos, ou seja, a diferença entre o tempo 0, 24 e 48 horas de utilização dos filtros, dentro da mesma marca utilizou-se o teste Anova Medidas Repetidas. O resultando deste teste demonstrou que dentro da mesma marca não se observou diferença estatisticamente significativa na resistência ao fluxo de ar com o tempo de uso (Tabela III). Concluindo-se, desta forma, que ao longo de 48 horas de uso em nenhuma das marcas houve um aumento significativo da resistência ao fluxo de ar. Resistência tempo 0 horas 7,202 0,027* Resistência tempo 24 horas 1,430 0,489 Resistência tempo 48 horas 1,964 0,374 *Diferença estatisticamente significativa. Como apenas no tempo 0 hora, ou seja, no momento em que os filtros não haviam sido utilizados, houve diferença estatisticamente significativa foi utilizado o teste Mann-Whitney, para verificar quais as marcas eram diferentes entre si. O teste demonstrou que houve diferença estatisticamente significativa entre a marca B e C (Tabela II). Desta forma, pode-se inferir que a marca C foi a que impôs uma menor resistência ao fluxo de ar, quando ainda não tinham sido utilizadas, quando comparada com as demais. Entretanto, todas as marcas apresentavam resistência ao fluxo de ar abaixo de 4 cmH2O/L/s, ou seja, subnormal para valores em ventilação mecânica de seres humanos [2]. Tabela II - Resultado do teste U de Mann-Whitney para a resistência ao fluxo de ar no tempo 0 hora de utilização. Grupos de comparação Marca A B Marca A C Marca B C U 1586,500 1513,000 1287,000 p/2 0,131 0,066 0,0035* U – Teste de Mann-Whitney; p/2 – Valor de significância dividido por 2; *Diferença estatisticamente significativa. Discussão A resistência inspiratória é resultado da fricção de gases nas vias aéreas artificiais e do paciente durante todo o ciclo respiratório, seu valor normal está situado abaixo de 15 cmH2O/L/s. A resistência expiratória é o resultado da fricção do fluxo de gases nas vias aéreas artificiais, nas vias aéreas do paciente e no ramo expiratório dos circuitos do ventilador durante a expiração, seu valor normal é de 2-5 cmH2O/L/s [12]. Observando os dados deste estudo, todos os valores antes e após 24 e 48 horas de umidificação estavam dentro dos valores esperados, desta forma, quando colocados nos pacientes estes filtros não apresentariam um prejuízo adicional à resistência à passagem de ar e consequentemente aumento no trabalho respiratório. Os resultados encontrados em um estudo com diversas marcas de FTCU, dentro destas, as marcas A e C deste trabalho, com o objetivo de verificar a resistência dos filtros antes de ser umidificado e após 24 horas de umidificação, demonstraram que em ambas as marcas, antes e após 24 horas de umidificação, a resistência aumentou, porém estes valores foram maiores quando comparados com os achados do presente estudo [13]. Apesar da grande aceitação do uso de FTCU, algumas complicações podem ocorrer com a sua utilização como incremento da resistência imposta e do espaço morto, com consequente aumento do trabalho muscular respiratório, re­ dução do volume minuto e retenção de dióxido de carbono (CO2). Esses efeitos adversos, observados durante a utilização dos FTCUs, têm sido descritos na vigência de obstrução parcial do mesmo por secreções traqueobrônquicas e, após seu uso prolongado, estando associado ao aumento da sua higrosco­picidade e peso, não se esperando importantes alterações du­rante a utilização do filtro seco [5,14]. Estudos relatam que os FTCUs aumentam todas as variáveis de esforço inspiratório recorrente ao maior espaço morto Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 e a resistência gerada pelo componente, adicionando um aumento da resistência do circuito do trabalho respiratório. Na presença de secreções espessas, o uso desses filtros, devido à perda de água nas vias aéreas, pode aumentar os riscos de oclusão do tubo, aprisionamento aéreo e hipoventilação. O condensado de água que se forma pode eventualmente ficar acumulado no circuito do ventilador mecânico e não ser retirado, o que eleva a pressão das vias aéreas e aumenta a resistência ao fluxo aéreo, induz a falta de sincronismo entre o paciente e o ventilador, aumentando o trabalho respiratório [6]. Além disso, como os FTCUs aumentam a carga de trabalho respiratória, eles devem ser usados com precaução em pacientes com fraqueza ou pacientes cansados com insuficiência respiratória e durante a ventilação com pressão de suporte [4]. Estudos concluíram que não há modificações significativas no muco traqueal com o uso de FTCUs após 48 horas de VM e que os FTCUs não criam obstáculos ao fluxo aéreo, mas que devem ser utilizados com cautela em pacientes com muita secreção pulmonar. Esses resultados são confirmados pela literatura, afirmando que os FTCUs higroscópicos apresentam menor volume interno e menor resistência, quando comparado aos FTCUs que possuem componente hidrofóbico e misto, que, por sua vez, apresentam um maior volume interno e consequentemente uma maior resistência [6]. O filtro trocador de calor e umidade quando seco, a resistência através da maioria dos dispositivos é mínima. No entanto, em virtude da absorção da água, a resistência ao fluxo do trocador aumenta após algumas horas de uso. Em alguns pacientes a resistência aumentada pode não ser tolerada, especialmente naqueles com doença respiratória que já possuem trabalho respiratório aumentado [2]. Num estudo foi instilado 0,5 mL de água dentro do FTCU, observou-se que a absorção da água levou a um aumento na resistência ao fluxo de ar demonstrando que estes dispositivos quando em contato com água ou corpo estranho pode causar distúrbios ventilatórios [15]. Um estudo mensurou a resistência dos dispositivos de umidificação, de acordo com duas categorias: FTCU com filtro antibacteriano ou sem filtro antibacteriano. As medidas obtidas com o aparelho de teste de bancada foram comparadas aos dados do fabricante. Foram realizadas medições de resistência em apenas 34 dos 48 dispositivos testados para propriedades de umidificação. No entanto, esta avaliação foi grande o suficiente para demonstrar que não houve diferença significativa quando comparada com medições do fabricante [16]. Por fim, faz-se então necessária a troca constante dos filtros artificiais, já que o aumento do tempo de contato com agentes agressores e a facilitação de colonização predispõem o indivíduo a um risco maior de infecções respiratórias e a um aumento adicional da resistência respiratória. Cabe ressaltar que para o tempo analisado (até 48 horas) o presente estudo demonstrou que a resistência das vias aéreas não apresentou aumento significativo, o que contribui para a utilização segura dos filtros neste período [6]. 357 O resultado deste estudo corrobora com os dados encontrados na literatura vigente que estudou a resistência imposta pelos FTCUs, onde ocorre aumento da resistência das vias aéreas, porém este está dentro do aceitável para o manejo seguro de pacientes mecanicamente ventilados. Neste trabalho, os valores da resistência não foram altos e isto se deve ao fato da metodologia empregada, pois os filtros foram umidificados pelo paciente reproduzindo as condições ambientais encontradas no uso clínico, visto que a maioria dos estudos umidificam os filtros de forma artificial. Por fim, o presente estudo apresentou como limitações a perda de alguns filtros ao longo do seu uso, o que restringiu o tempo da coleta dos dados em apenas 48 horas de utilização; a tentativa de reproduzir a umidificação em pacientes semelhantes para permitir a generalização dos resultados obtidos; a exclusão dos filtros com secreção e excesso de condensado de água que poderiam gerar maior resistência e a indisponibilidade de uma balança de alta precisão para pesagem dos filtros. Conclusão Conclui-se que os FTCUs podem ser usados com segurança ao longo de 48 horas em pacientes mecanicamente ventilados, pois não houve aumento significativo na resistência ao fluxo de ar e o pequeno aumento que pode ocorrer é facilmente absorvido pelo aumento dos parâmetros ventilatórios do ventilador mecânico, principalmente na pressão de suporte, como recomendado pela literatura. O aumento da pressão de suporte, desta forma, não refletira em prejuízos da função pulmonar e nem no aumento do trabalho respiratório destes pacientes que poderiam futuramente influenciar negativamente a retirada da prótese ventilatória. Estes resultados são de extrema importância para a rotina de uma unidade de terapia intensiva, pois a troca destes filtros com um tempo superior a 24 horas, diferente do recomendado pelos fabricantes, representa uma economia, isto, sem trazer prejuízos ou perda na qualidade ao serviço prestado aos pacientes. Referências 1. Campos AP, Nasrala MLS. Manutenção da via aérea artificial. In: Sarmento GJV, Veja JM, Lopes NS. Fisioterapia em UTI. Avaliação e procedimentos. São Paulo: Atheneu; 2006. 353p. 2. Galvão AM. Estudo comparativo entre os sistemas de umidificação aquoso aquecido e trocadores de calor e umidade na via aérea artificial de pacientes em ventilação mecânica invasiva. Rev Bras Fisioter 2006;10(3):303-8. 3. 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Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 359 Artigo original Correlação entre fleximetria e goniometria radiológica para avaliações da amplitude articular estática do cotovelo Correlation between fleximetry and radiological goniometry for assessment of static elbow range of motion Rodrigo Luis Ferreira da Silva, Ft., M.Sc.*, Renato Ramos Coelho, Ft., M.Sc.**, Rodrigo Gomes de Souza Vale, D.Sc.***, Estélio Dantas, D.Sc.**** *Professor efetivo da UEPA, **Professor da Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC/MG) Campus Bom Despacho e do Centro Universitário de Formiga (UNIFOR/MG), Pesquisador do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia (LAMCE-COPPE/RJ), ***Professor da Universidade Estácio de Sá, Coordenador do Laboratório de Fisiologia do Exercício da UNESA (LAFIEX), Coordenador do curso de Educação Física (UNESA Cabo Frio/RJ), ****Profissional de Educação Física (Escola de Educação Física do Exército), Bolsista de produção científica do CNPQ Resumo Abstract Este estudo objetivou determinar o grau de confiabilidade intra e interexaminador de avaliações realizadas por meio de fleximetria, e o seu grau de correlação com avaliações realizadas por goniometria radiológica. 10 indivíduos tiveram seu cotovelo direito estabilizado por chapas de ferro em ângulo fixo, que foi mensurado por 04 fisioterapeutas, com o uso de um flexímetro, em 3 dias diferentes com intervalo de uma semana entre os mesmos. Após estas avaliações, os cotovelos foram radiografados, com o mesmo ângulo estabilizado, para análise pela goniometria radiológica. Estas medidas apresentaram baixa confiabilidade intraexaminador (0,23; p = 0,00) e interexaminador (0,38; p = 0,04). As medidas obtidas pela fleximetria apresentaram melhores resultados na análise da confiabilidade interexaminador do que intraexaminador, fato este que possivelmente foi influenciado pelo longo intervalo de tempo entre as avaliações (7 dias). Observou-se também baixa correlação entre a fleximetria e a goniometria radiológica (r = 0,10) corroborando com inúmeros outros estudos. O teste t indicou ainda que houve uma diferença significante entre as médias obtidas pelas duas técnicas (p = 0,00). Estes resultados sugerem que o intervalo de 07 dias, pode ter dificultado a reprodutibilidade das medidas pelos examinadores e que a diferença processual entre as técnicas investigadas contribuiu para a ausência de correlação entre suas médias. This study aimed to determinate the intra and inter-reliability of assessments using the fleximetry, and to correlate with radiological goniometry assessment. 10 subjects had their right elbow stabilized by fixed iron angle plates, which was measured by 4 physical therapists, using a Fleximeter, on 3 different days with one week interval between them. After these evaluations, the elbows were radiographed with the same angle stabilized for radiological analysis by goniometry. These measures had low reliability intra examiner (0.23, p = 0.00) and inter (0.38, p = 0.04). The measurements obtained by fleximetry showed better results in the analysis of reliability than inter intra-examiner, a fact that was possibly influenced by the long interval between assessments (7 days). It was also observed low correlation between the radiological fleximetry and goniometry (r = 0.10), which corroborates numerous other studies. The t test also indicated that there was a significant difference between the means obtained by both techniques (p = 0.00). These results suggest that the interval of 7 days may have hampered the reproducibility of the examiners and that the procedural difference between the research techniques contributed to the lack of correlation between their averages. Key-words: arthrometry articular, radiography, elbow joint. Palavras-chave: goniometria articular, radiografia, articulação do cotovelo. Recebido em 18 de abril de 2011; aceito em 24 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Rodrigo Luis Ferreira da Silva, Rua Humaitá, 1528, 68010-010 Santarém PA, Tel: (93) 3523-5118, E-mail: [email protected] 360 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução Material e métodos Até os dias atuais o instrumento mais utilizado para medida de amplitude do movimento (ADM) ainda é o goniômetro universal [1-4], já existindo diversos estudos que comprovam sua validade quando comparada à goniometria radiológica [5-7] considerada referência de amplitude real [6,8]. No entanto, a relativa morosidade para a aplicação dos testes goniométricos, que exigem certo grau de rigor e de experiência profissional [9], acaba por estimular o desuso desta técnica pelos profissionais mais jovens, popularizando procedimentos menos confiáveis, como a estimativa visual [10]. Neste ínterim, o desenvolvimento de novos instrumentos surge como possibilidade de dinamizar a mensuração do movimento articular, desde que busquem sempre preservar a confiabilidade em suas medidas [11-13]. Embora não tão comuns como o goniômetro universal o flexímetro ou goniômetro pendular, que foi descrito pioneiramente por Fox e Van Breemen, em 1934, têm se tornado cada vez mais usuais na prática fisioterapêutica. Este instrumento consiste de um transferidor de 360º e de um ponteiro que se move pela ação da força gravitacional, registrando a medida angular de uma posição articular [4,14]. Para certas situações, o flexímetro parece ser de mais fácil utilização do que o goniômetro universal, já que não necessita ser alinhado a referências ósseas, facilitando, por exemplo, a avaliação dos movimentos rotacionais e do tronco. Além disso, alguns modelos apresentam ainda a vantagem de ser autofixáveis, deixando as mãos do avaliador completamente livres [14,15]. Contudo, apesar de apresentar algumas relativas vantagens, os flexímetros ainda são merecedores de críticas, pois são de difícil utilização em pequenas articulações e onde houver deformidade dos tecidos moles ou edema [4]. Algumas experimentações científicas já se preocuparam em demonstrar sua confiabilidade, reprodutibilidade e validade durante sua aplicação em protocolos de avaliação de ADM [12,16-18]. Ainda assim pouco se conhece em relação a sua validade [3,12], quase sempre ficando restritos às informações oferecidas pelos fabricantes acerca de seus produtos. Deste fato, surge a necessidade de comprovar a validade deste instrumento comparando-o com a goniometria radiológica, considerado como o método avaliativo mais fidedigno para a quantificação de ângulos formados entre as articulações [6,8], auxiliando, portanto no diagnóstico e acompanhamento de alterações esqueléticas [19-21]. Este estudo teve como objetivo determinar o grau de confiabilidade intra e interexaminador de avaliações realizadas por meio de fleximetria, e o seu grau de correlação em relação às avaliações realizadas por meio de goniometria radiológica, contribuindo assim para uma melhor opção dos profissionais fisioterapeutas, quanto aos instrumentos e técnicas a serem utilizados em suas avaliações, evitando que o tratamento do paciente seja prejudicado devido à mensuração equivocada do movimento articular. Esta pesquisa experimental foi desenvolvida no período de janeiro a fevereiro de 2009, com a coleta de dados realizada no laboratório de Recursos Terapêuticos Manuais da UEPA e na sala de radiologia do Hospital Sagrada Família, ambos em Santarém, e o posterior confrontamento dos valores de avaliações de ADM estática da articulação do cotovelo pelas técnicas de fleximetria e goniometria radiológica. A articulação do cotovelo foi escolhida para este estudo por ser uma articulação de grande interesse dentro da investigação clínica e radiológica [18,22-24]. Dois grupos foram selecionados para este estudo, sendo um composto por 10 indivíduos do sexo masculino, com idade entre 19-25 anos (22 anos; + 2,79) sem histórico de patologias ortopédicas e/ ou neurológicas que interferissem na mobilidade e anatomia normal dos ossos no membro superior direito (MSD) e que serviu de objeto de estudo (avaliados), e outro composto exclusivamente por fisioterapeutas, de ambos os sexos, com idade variando entre 22-25 anos (23,25 anos; ± 1,26), todos com 2 anos de experiência profissional (examinadores) e que teve como tarefa mensurar a ADM dos cotovelos direitos dos indivíduos que compunham o grupo de avaliados. Obedecendo as diretrizes básicas da norma CNENNN-3.01, do Conselho Nacional de Saúde [25], esta pesquisa obteve parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado do Pará/STM, sob o nº 048/08 e da Universidade Castelo Branco/RJ, sob o nº 148/08. Além disso, todos os seus participantes foram solicitados a assinar um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Antes de se realizarem as tomadas de medidas para esta pesquisa, os examinadores passaram por um período de treinamento em anatomia palpatória e na utilização do flexímetro, com intuito de homogeneizar o grau de conhecimento dos examinadores sobre as técnicas avaliativas pesquisadas. Para Batista et al. [2], o treinamento é um fator importante para diminuir possíveis diferenças nas avaliações. As tomadas de medidas com o uso do flexímetro foram executadas em 3 dias diferentes, com intervalos de uma semana entre estes e repetindo-se os mesmos avaliados, examinadores e ângulos, conforme o proposto por Beaton et al. [26] e já reproduzido em outros estudos [27,28]. Para a realização das avaliações da ADM, com o uso do flexímetro, foi estabelecida a seguinte padronização, em cada dia de avaliação: Os avaliados ficavam em uma sala separada dos examinadores, com o MSD estabilizado por meio de chapas de ferro retorcido, mantendo a articulação do cotovelo em ângulo fixo. Somente 5 indivíduos recebiam a fixação com as chapas de ferro, com o ângulo de interesse para o estudo (ângulo chave), enquanto os demais recebiam a estabilização com chapas de ferro fixadas em outros ângulos. Vale ressaltar que em nenhum momento os examinadores tiveram acesso ao valor do ângulo existente entre as chapas de Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 ferro retorcido e que a comunicação entre os examinadores foi evitada durante a realização das medidas. Cada examinador entrava individualmente nesta sala e realizava o adequado posicionamento de cada um dos avaliados, ajustando-o em perfil, à frente de uma parede de fundo claro, e com o lado direito de seu corpo voltado ao examinador. O úmero do membro avaliado foi sempre posicionado em alinhamento com a linha média lateral do tronco e o cotovelo foi estabilizado em máxima supinação para todas as avaliações de ADM, com o flexímetro. Neste momento o examinador dava então início a sua sequência de avaliações com o flexímetro, empregando os seguintes procedimentos específicos para esta técnica: Primeiramente ajustava-se o instrumento com a linha média do úmero do avaliado e posteriormente fixavam-no na porção distal do antebraço do indivíduo, mantendo o flexímetro perpendicular ao solo e voltado para a sua face, sendo que os valores de medida eram lidos pelo autor do estudo e não pelos examinadores. 361 meio de chapas de ferro retorcido, mantendo a articulação do cotovelo em ângulo fixo. Para esta técnica de avaliação todos os indivíduos receberam a fixação com as chapas de ferro, com o ângulo de interesse para o estudo. Cada examinador entrava individualmente nesta sala e realizava a palpação das estruturas ósseas de referência em cada avaliado, demarcando-as com uso de marcador metálico circular. Os pontos de referência foram: o epicôndilo lateral do úmero, a borda lateral do acrômio e o processo estiloide do rádio. Após a demarcação, o avaliado era posicionado em pé e em perfil, à frente do radiógrafo, e com o lado direito de seu corpo voltado ao foco radiográfico, de maneira que se realizassem incidências radiográficas em perfil da articulação do cotovelo direito dos avaliados. Figura 2 - Posicionamento para a tomada da imagem radiográfica. Figura 1 - Alinhamento do flexímetro a linha média do úmero (A) e posicionamento na porção distal do antebraço (B). À medida que cada examinador completava sua sequência de avaliações, ocorria a troca de examinador, sendo seguidos os mesmos passos para todos os demais examinadores, até que todos tivessem realizado este mesmo procedimento uma primeira vez. Após todos os examinadores terem mensurado todos os ângulos dos avaliados pela primeira vez, estes últimos realizavam então a troca das fixações de ferro, de maneira que outros 5 voluntários fossem estabilizados com as chapas de ferro correspondentes ao ângulo chave. Uma nova sequência de avaliação era cumprida até que todos os examinadores tivessem novamente mensurado todos os ângulos dos avaliados. Desta maneira, ao final destes três dias de avaliações obteve-se: três medidas de ADM com o flexímetro, de cada examinador em cada um dos avaliados. As tomadas de medidas com o uso da goniometria radiológica foram executadas em um único dia, ocorrido após a sequência de avaliações com o flexímetro, na sala de radiologia do Hospital Sagrada Família em Santarém e obedecendo a descrição empregada por Ferreira da Silva et al. [27], para o registro de imagem radiográfica. Para a realização destas avaliações da ADM, foi estabelecida a seguinte padronização. Os avaliados ficavam em uma sala separada dos examinadores, com o MSD estabilizado por Cada avaliado realizou uma incidência radiográfica em perfil, para o posicionamento de cada um dos examinadores. Após a obtenção das imagens radiográficas, seguia-se a mensuração do ângulo entre as bissecções ósseas do rádio e do úmero, segundo o descrito por Dantas et al. [29], através de um goniômetro metálico, tamanho grande, da marca Baseline Stainless. Figura 3 - Imagem radiográfica para goniometria radiológica. Os valores dos ângulos colhidos receberam tratamento estatístico através do software Statistical Package for Social Science 14.0 (SPSS Inc, USA), com o objetivo inicial de caracterizar o universo amostral pesquisado e o perfil do conjunto de dados, determinando a normalidade de sua distribuição e a Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 362 reprodutibilidade dos dados obtidos pelas avaliações realizadas com as duas diferentes técnicas. Após análise descritiva dos dados buscou-se determinar o grau de confiabilidade das medidas, assim como o grau de correlação entre as duas técnicas empregadas para avaliação de ADM. A confiabilidade intraexaminadores da ADM estática do cotovelo foi determinada através do cálculo do Coeficiente de Correlação Intraclasse (CCI) tipo 3,1 (CCI(3,1)). Para o cálculo da confiabilidade interexaminadores entre as avaliações dos diferentes avaliados, foi utilizado o cálculo do Coeficiente de Correlação Intraclasse tipo 2,3 (CCI(2,3)). Neste estudo, os valores de CCI foram considerados baixos quando menores que 0,50, moderado entre 0,50 a 0,75, alto acima de 0,75 e muito alto quando superiores a 0,90, segundo o descrito por Portney et al. [30]. Para determinar a correlação entre os valores obtidos pela fleximetria com os obtidos pela goniometria radiológica, adotou-se o teste de Pearson, considerando-se valores de r acima de 0,80 como alta correlação, de 0,60 a 0,79 como boa correlação, de 0,41 a 0,59 como moderada e abaixo de 0,40 como baixa correlação [1]. O teste t pareado foi empregado para avaliar a estabilidade dos valores obtidos pelas diferentes técnicas. Para todas as análises adotou-se uma significância de p < 0,05. Resultados Os resultados da confiabilidade intraexaminadores, demonstrada na Tabela I, evidenciam baixa confiabilidade para as medidas obtidas com a técnica de fleximetria de todos os avaliadores. Tabela I - Confiabilidade intraexaminador das medidas de quatro examinadores, para as medidas do ângulo chave, pela técnica da fleximetria. A B C D Todos examinadores Tabela II - Confiabilidade Interexaminador das medidas de quatro examinadores para as ADM de um ângulo fixo da articulação do cotovelo de 10 indivíduos, como o uso da fleximetria. Média 1ª rodada Média 2ª rodada Média 3ª rodada Todas rodadas CCI (2,3) 0,07 0,77 0,76 0,38 Limite Inferior -1,45 0,40 0,36 -0,05 Limite Superior 0,74 0,94 0,93 0,65 p 0,41 0,00 0,00 0,04 CCI: Coeficiente de Correlação Intraclasse; p: Nível descritivo do teste de significância estatística (Intervalo de confiança de 95%). Quanto à correlação entre estas duas técnicas, a Tabela III, apresenta um valor baixo (0,10) para esta correlação (Pearson), apontando um p valor de 0,56. Tabela III - Valor da correlação entre a média das medidas obtidas pela fleximetria e pela goniometria radiológica. Média DP Flex 95,91 9,57 Gonio Rad 105 4,30 N 120 40 Flex 1 0,10 Gonio Rad p 0,10 0,56 1 0,56 DP: Desvio Padrão; N: Tamanho da amostra; p: Nível descritivo do teste de significância estatística. Similarmente aos dados apresentados na tabela anterior, o teste t apresentado na Tabela IV, indica que houve uma diferença estatística significante entre as médias obtidas pela fleximetria e pela goniometria radiológica (p = 0,00). Tabela IV - Resultados da comparação entre os dados obtidos pela fleximetria e os obtidos pela goniometria radiológica pelo teste t. Média DP EP Menor Maior t p Flex Gonio -7,55 10,68 1,69 -10,96 -4,13 -4,47 0,00 Rad DP: Desvio Padrão; EP: Erro Padrão; t: Valor do teste; p: Nível descritivo do teste de significância estatística. CCI (3,1) 0,26 -0,08 0,22 0,00 Limite Inferior -0,02 -0,30 -0,14 -0,30 Limite Superior 0,65 0,36 0,66 0,49 p 0,01 0,65 0,13 1,01 0,23 0,07 0,44 0,00 CCI: Coeficiente de Correlação Intraclasse; p: Nível descritivo do teste de significância estatística (Intervalo de confiança de 95%). Quanto à confiabilidade interexaminadores, apresentada na Tabela II, as medidas obtidas pela técnica da fleximetria demonstraram um valor baixo para a primeira rodada de medidas e alto para a segunda e a terceira rodadas. Analisando o conjunto geral dos dados de todas as rodadas (confiabilidade interexaminador geral), observou-se também baixo índice de confiabilidade. Discussão Nitidamente as medidas angulares obtidas pela técnica de fleximetria apresentaram, neste estudo, melhores resultados na análise da confiabilidade interexaminadores do que na confiabilidade intraexaminadores, resultado equivalente ao de Chaves et al. [31], para análise de movimentos cervicais. Este comportamento, no entanto, é o oposto do que é observado na maioria dos estudos de confiabilidade para avaliação da ADM [3,6,32-34], assim como se opõem as afirmativas de Sacco et al. [1], Gadotti et al. [35] e Youdas et al. [36], ao defenderem que a confiabilidade intraexaminador tende a ser maior que a confiabilidade interexaminador, por ser mais fácil reproduzir os resultados quando um único examinador realiza as medidas. Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 O intervalo de tempo padronizado neste estudo, de 7 dias entre as avaliações, é tido como longo para estes modelos de experimentação e pode ter contribuído para os baixos valores de confiabilidade intraexaminador. Este longo intervalo pode ter influenciado, por exemplo, para que os examinadores mudassem a sua padronização quanto ao posicionamento e alinhamento do avaliado, procedimento este vital para a reprodutibilidade das medidas tomadas pela fleximetria, uma vez que o instrumento em questão tem sua funcionalidade baseada na força de atração gravitacional sobre o ponteiro do equipamento, não dependendo diretamente de uma variação angular, e sim de uma variação de sua posição espacial. Este fato também justificaria os melhores resultados obtidos para confiabilidade interexaminador, uma vez que esta é resultado da combinação dos dados de todos os examinadores em um mesmo dia de avaliação, o que facilitaria a reprodução dos alinhamentos dos avaliados. Percebe-se, portanto, que o intervalo de tempo entre as avaliações pode ser um importante fator de imprecisão de medidas angulares com o uso do flexímetro, mesmo quando tomadas pelo mesmo examinador. No entanto, neste estudo não foi possível estabelecer qual o intervalo de tempo ideal para que se mantenham bons índices de confiabilidade interexaminador, devido às limitações metodológicas do próprio estudo. Além disso, a carência de estudos de confiabilidade com o uso do flexímetro dificulta a comparação dos resultados desta pesquisa e uma análise mais profunda sobre os resultados obtidos na presente pesquisa. Vale mencionar, porém, que outros instrumentos baseados no princípio de atração gravitacional, como os inclinômetros pendulares e digitais, já demonstraram bons índices de confiabilidade intra e interexaminador [3,37], já sendo reportado inclusive melhores índices de confiabilidade em uma comparação com o goniômetro [3]. A considerável melhora dos níveis de confiabilidade interexaminador para a segunda e a terceira rodada de medidas, do presente estudo, com o uso do flexímetro, pode ser justificada pela evolução da habilidade dos examinadores para com o manuseio do aparelho durante a própria pesquisa, uma vez que todos relataram não utilizar esta técnica na sua rotina profissional. A ausência de correlação entre as medidas obtidas com a fleximetria e as obtidas com a goniometria radiológica, reforça o ponto de vista de Norkin et al. [4], que já foi também corroborado por Venturini et al. [3], Batista et al. [17], Ferreira da Silva et al. [27] e Chaves et al. [31], ao concordarem que os diversos instrumentos, já disponíveis para a medida do movimento articular, não devem ser utilizados de forma aleatória, e que qualquer comparação entre suas medidas deve ser cautelosa, uma vez que existem profundas diferenças entre seus princípios. Esta constatação pode ser confirmada pelo resultado de Simões et al. [16], que analisando a mobilidade angular dos movimentos do quadril de 20 indivíduos, observou excelentes níveis de correlação entre dois instrumentos 363 de avaliação de ADM, baseados no princípio de atração gravitacional. No caso específico da comparação pretendida neste estudo, é notória a diferença funcional entre as técnicas empregadas, uma vez que a fleximetria depende da força de atração gravitacional do ponteiro do equipamento e a goniometria radiológica baseia-se no alinhamento de referências ósseas observadas diretamente sobre uma imagem radiográfica. Polanowski et al. [12], em um ensaio científico no qual foram realizadas avaliações de ADM de posições de flexão e de extensão do joelho com o uso de um flexímetro, determinaram a reprodutibilidade e a validade deste equipamento, baseado na diferença insignificante entre suas medidas e as medidas tomadas com o uso de um goniômetro para as mesmas posições articulares. Em tempos mais recentes, porém, Batista et al. [17] observaram diferenças estatísticas significantes entre estes dois instrumentos, com o flexímetro apresentando valores médios maiores do que o goniômetro. Vale ressaltar que neste mesmo estudo foi observada uma forte correlação positiva entre estes instrumentos. Contudo, segundo Baraúna et al. [38], a validade de um instrumento indica o quanto as suas medidas representam o verdadeiro valor da variável de interesse, e que portanto deve ser comparada a um padrão-ouro bem estabelecido para essa medida, que no caso das avaliações de ADM trata-se da goniometria radiológica [4,6,8,32]. Conclusão As medidas da ADM do posicionamento articular estático do cotovelo, obtidas neste estudo com a técnica de fleximetria, apresentaram baixa confiabilidade intraexaminador para as medidas de todos os avaliadores, além de baixa e alta confiabilidade interexaminador, sugerindo que o longo intervalo de 7 dias pode ter dificultado a reprodutibilidade das medidas pelos examinadores. Não se observou uma boa correlação entre a fleximetria e a goniometria radiológica através das medidas obtidas por estas técnicas, nesta pesquisa, denotando que a diferença processual entre estes dois métodos de avaliação de ADM dificultou tal correlação, ou sugerindo, ainda, que esse fator possa dificultar qualquer outra correlação que venha a ser feita entre técnicas ou instrumentos avaliativos tão distintos. Referências 1. Sacco ICN, Alibert S, Queiroz BWC, Pripas D, Kieling I, Kimura AA, Sellmer AE, Malvestio RA, Sera MT. 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Rev Bras Fisioter 2006;10(1):83-90. Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 365 Artigo original Ginástica hipopressiva como recurso proprioceptivo para os músculos do assoalho pélvico de mulheres incontinentes Hypopressive gymnastics as resource for perineal proprioception in women with urinary incontinence Thaís F Costa, Ft.*, Ana Paula M Resende, Ft., D.Sc.**, Maura R Seleme, D.Sc.***, Liliana Stüpp, D.Sc.**, Rodrigo A. Castro, D.Sc.****, Bary Berghmans, D.Sc.*****, Marair GF Sartori, D.Sc.****** *Fisioterapeuta, Mestranda em Ciências pelo Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo/ Escola Paulista de Medicina, **Fisioterapeuta, Doutora em Ciências pelo Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo/ Escola Paulista de Medicina, ***Fisioterapeuta, Doutora em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, ****Professor Adjunto do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo/ Escola Paulista de Medicina, *****PhD em Epidemiologia Clínica, Maastricht, Holanda, ******Professora Associada Livre Docente do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo/ Escola Paulista de Medicina Resumo Abstract Introdução: Está amplamente descrito na literatura que as mulheres com e sem disfunção do assoalho pélvico apresentam grande dificuldade em realizar a contração adequada dos músculos perineais. A Ginástica Hipopressiva poderia facilitar o entendimento da correta contração uma vez que supostamente promove contração reflexa dos músculos do assoalho pélvico (MAP) durante sua realização. Objetivo: Avaliar a função dos MAP antes e após protocolo de exercícios hipopressivos para melhora da propriocepção perineal em mulheres com incontinência urinária de esforço (IUE). Métodos: Foram incluídas 14 mulheres com IUE que se submeteram a protocolo de três sessões individuais, com conteúdo padronizado, que incluiu o aprendizado dos exercícios hipopressivos em etapas. Após este período de aprendizado, as pacientes se submeteram a 12 semanas de exercícios domiciliares, com sessões mensais com o fisioterapeuta. A cada sessão, as pacientes apresentavam diário de exercícios preenchido para mensuração da aderência ao tratamento. A função dos MAP foi mensurada antes e após o tratamento por meio de palpação bidigital, utilizando-se a escada de Oxford, o endurance muscular e o número de contrações rápidas. Resultados: Houve melhora em todos os parâmetros de função muscular avaliados: Oxford (p = 0,0005); endurance (p = 0,0001) e número de contrações rápidas (p < 0,0001). Conclusão: Houve aumento da função muscular do assoalho pélvico após prática de exercícios hipopressivos para melhora da propriocepção perineal. Introduction: It is widely reported in the literature that women with and without pelvic floor dysfunction have great difficulty in performing adequate contraction of the perineal muscles. Hypopressive Gymnastics could facilitate the correct understanding of contraction since that supposedly promotes reflex contraction of the pelvic floor muscles (PFM) during its implementation. Objective: To evaluate the function of PFM before and after hypopressive exercise protocol to improve perineal proprioception in women with stress urinary incontinence (SUI). Methods: Were included 14 women with SUI who underwent a protocol of 3 individual sessions with standardized content, which included learning of the hypopressive exercises in stages. After this learning period, patients underwent 12 weeks of home exercise, with monthly sessions with the physiotherapist. At each session, the patients presented daily exercises journal to measure adherence. The role of PFM was measured before and after treatment by bidigital palpation, using the Oxford scale, muscular endurance and the number of rapid contractions. Results: Was observed improvement in all evaluated parameters of muscle function: Oxford (p = 0.0005), endurance (p = 0.0001) and number of rapid contractions (p < 0.0001). Conclusion: Was observed increased pelvic floor muscle function after hypopressive exercise for improving perineal proprioception. Palavras-chave: incontinência urinária de esforço, propriocepção perineal. Recebido 15 de julho de 2011; aceito 15 de setembro de 2011. Endereço para correspondência: Maura R. Seleme, [email protected] Key-words: perineal proprioception, stress urinary incontinence. 366 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução De acordo com a International Continence Society (ICS), a função adequada dos músculos do assoalho pélvico (MAP) é definida como habilidade em realizar contração voluntária forte e presença de contração involuntária, que resultam em fechamento circular da vagina, uretra e ânus em movimento cranioventral do períneo e elevação dos órgãos pélvicos [1]. Essa contração é importante para prevenir perda involuntária de urina ou fezes [1]. Diversos autores evidenciam a dificuldade que as mulheres apresentam em contrair adequadamente os MAP [2-4]. Em mulheres sem disfunção do assoalho pélvico, foi descrito que 37,2% não possuem habilidade em contrair corretamente mesmo após uma sessão com orientações, e ainda que 25% dessas mulheres realizam o movimento oposto à contração correta, a manobra de Valsalva [2]. Em estudo mais recente foi relatado 44,9% de inabilidade de contração dos MAP em mulheres sem disfunções [3]. Já em mulheres incontinentes, a dificuldade é ainda maior, e abrange 65,5% dessas [4]. A Ginástica Hipopressiva foi proposta como alternativa para o tratamento das disfunções do assoalho pélvico e, dentre suas indicações, encontra-se a melhora da propriocepção dos MAP [5,6]. Esses exercícios são praticados em três fases: 1) inspiração diafragmática lenta e profunda, 2) expiração completa e, 3) aspiração diafragmática, em que ocorre progressiva contração dos músculos abdominais profundos, intercostais e elevação das cúpulas diafragmáticas [5,7]. A aspiração diafragmática supostamente promove pressão negativa na cavidade abdominal e, reflexamente, ativa os MAP por meio de tração da fáscia abdominal, que é conectada à fáscia endopélvica [5,7]. Assim, essa ativação reflexa dos MAP facilitaria o aprendizado da correta contração [5]. Entanto, apesar dessas indicações existem poucas evidências de que a prática dos exercícios hipopressivos possa efetivamente auxiliar o aprendizado da correta contração dos MAP. O objetivo do presente estudo foi avaliar os efeitos de um protocolo de ginástica hipopressiva no aprendizado da contração dos MAP em mulheres com incontinência urinária de esforço (IUE). Material e métodos No período de fevereiro a dezembro de 2009, foram selecionadas 14 pacientes do Ambulatório de Uroginecologia e Cirurgia Vaginal da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, Brasil. As participantes desse estudo piloto foram recrutadas por contato pessoal. Os critérios de inclusão adotados foram a presença de IUE, sem defeito esfincteriano, confirmada por estudo urodinâmico. Como critérios de exclusão, adotaram-se a presença de doenças degenerativas, diabetes e hipertensão descompensados e realização prévia de tratamento fisioterapêutico para IUE. As pacientes que concordaram em participar do estudo, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNIFESP por meio do protocolo n° 1978/07. Para o diagnóstico da IUE, as mulheres passaram pelos procedimentos médicos de rotina (anamnese, exame físico geral e exame ginecológico). Uma vez incluída no estudo, a paciente foi avaliada por fisioterapeuta especializado em uroginecologia, que mensurou a função muscular por meio de palpação bidigital, utilizando-se a escala de Oxford, o teste do tempo de manutenção da contração em segundos, também chamado de endurance muscular e o número de contrações rápidas, também chamado de fast. Referida avaliação foi adaptada do método Perfect, descrito por Laycock et al. [8], amplamente utilizado na literatura. Antes da avaliação, a paciente recebeu orientações sobre a localização e função dos MAP e os procedimentos de avaliação foram explicados em detalhes. Para a avaliação fisioterapêutica, as pacientes foram orientadas a esvaziar a bexiga e em seguida foram colocadas em posição de litotomia. Foi respeitado um tempo de repouso três vezes maior que o tempo de contração e em seguida foi solicitada a contração mantida pelo máximo de tempo que a paciente conseguisse. O protocolo de propriocepção com ginástica hipopressiva foi constituído de 3 sessões individuais para consciência e aprendizado dos exercícios, uma vez por semana. Essas sessões foram conduzidas por um segundo fisioterapeuta. A primeira sessão consistiu de esclarecimentos sobre a localização e função dos MAP e dos músculos abdominais. A seguir, as pacientes observaram e localizaram o próprio assoalho pélvico com o auxílio de espelho. Em seguida, foram instruídas a realizar a contração isolada desses músculos e, para a facilitação do aprendizado. A Ginástica Hipopressiva foi ensinada em etapas. Inicialmente, as pacientes foram instruídas quanto à respiração diafragmática. Foram incentivadas a inspirar lenta e profundamente pelo nariz e expirar pela boca o máximo de ar que conseguissem. Ao perfazer esse movimento de expiração, os músculos transversos abdominais eram ativados. Em seguida, foram usados comandos verbais como “abaixe as costelas” e “aproxime o abdômen das costas” para intensificar a contração dessa musculatura. Por fim, foram instruídas com relação à terceira fase dos exercícios hipopressivos, compreendida por aspiração diafragmática. Nessa manobra ocorre associação entre o fechamento da glote e o movimento de sucção abdominal, em sentido posterior e superior, que resulta em pressão negativa dentro da cavidade abdominal e ativação reflexa dos músculos transversos abdominais e músculos do assoalho pélvico, segundo Seleme et al. [5]. Acredita-se que essa manobra poderia facilitar o aprendizado da contração correta dos MAP. Na ultima sessão, as pacientes foram ensinadas a contrair voluntariamente os MAP durante a fase de aspiração diafragmática. Embora houvesse ativação reflexa desses músculos, a Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 contração voluntária foi incentivada. Os exercícios foram treinados nas posições deitada e em pé. O tempo de manutenção da aspiração diafragmática associada a contração perineal foi preconizado de acordo com a avaliação inicial dos músculos do assoalho pélvico, individual para cada paciente. Após o término do período de aprendizado, as mulheres foram encaminhadas para a realização de exercícios domiciliares. Foram preconizadas de 4 a 6 repetições do exercício na posição deitada e de 4 a 6 repetições na posição de pé 2 vezes ao dia, perfazendo, no total, 16 a 24 repetições diárias. Durante este período de realização de exercícios domiciliares, as pacientes preencheram diário de exercícios e receberam contato telefônico quinzenal pelo fisioterapeuta, para esclarecimento de possíveis dúvidas e manutenção do incentivo. Além disso, as pacientes receberam uma cartilha de exercícios, detalhando cada etapa, para facilitar o aprendizado. Ao final de um mês as pacientes retornaram para consulta com o fisioterapeuta. O protocolo de Ginástica Hipopressiva era refeito e o período de manutenção da contração era intensificado, seguindo ritmo natural de progressão do treinamento, com o objetivo de maior recrutamento dos músculos envolvidos no fortalecimento e de não permitir a adaptação do músculo [8]. Esse protocolo foi seguido por três meses (12 semanas). Ao final desse período, as pacientes foram reavaliadas. No que se refere à análise estatística, os dados foram analisados por meio do software especializado SPSS 13.0. Inicialmente realizou-se estatística descritiva (frequência, média e desvio padrão), posteriormente, analítica, utilizando-se os testes t de Student, para avaliar as diferenças entre as variáveis quantitativas paramétricas, e Qui-quadrado, para as variáveis ordinais. O intervalo de confiança utilizado foi de 95%, e os valores de p < 0,05 foram considerados significativos, assinalando-se com asterisco. Resultados Das 14 mulheres selecionadas para o estudo, 12 concluíram o tratamento. A média de idade das pacientes foi de 57,6 (± 8) anos. O índice de massa corpórea (IMC) médio foi de 27,7 (± 6,5) kg/m². O número de gestações foi de 3,5 (± 1,6) e o de partos vaginais foi 2,5 (± 1,8). No que se refere à avaliação dos MAP, os resultados encontrados estão demonstrados na Tabela I. Tabela I - Avaliação dos músculos do assoalho pélvico, mensurada por meio de ultrassonografia bidimensional e palpação bidigital, no início e ao final do tratamento. Variável Oxford Endurance (seg) N° de contrações rápidas (fast) Inicial Final p valor 1,6 (± 0,6) 2,8(± 0,5) P = 0,0005* 2,7 (± 1,8) 5,3 (± 2,1) P = 0,0001* 3,4 (± 1,3) 7,3 (± 1,9) P < 0,0001* Valores obtidos por meio do Teste t de Student. * 367 No que diz respeito às variáveis mensuradas pelo diário de exercícios, no primeiro mês de tratamento, as pacientes relataram que praticaram os exercícios em média 27,5 dias. No segundo mês a média foi de 27 dias e no terceiro mês de tratamento, as pacientes realizaram os exercícios em média 29 dias. No que se refere à perda urinária, observou-se que no início do tratamento, todas as pacientes (n = 12) perdiam urina. Ao final do tratamento, quatro pacientes relatavam não perder mais urina e 7 pacientes relataram melhora significativa. Seis pacientes no início do tratamento perdiam urina em jato que molhava a roupa e causava constrangimento, e, ao final, somente uma. Discussão Está amplamente descrito na literatura que o treinamento específico para os MAP representam o padrão ouro para o tratamento da incontinência urinária de esforço [10] e, recentemente, seu valor foi reconhecido também no tratamento da bexiga hiperativa e do prolapso genital [11]. Entretanto, para que o treinamento específico seja praticado, é necessário garantir a correta contração dos MAP, pois, não surtiria efeito realizar inúmeras séries de exercícios, incluindo contrações rápidas e lentas se o movimento realizado no treinamento não estivesse correto. Em 1952, Arnold Kegel descreveu a correta contração dos MAP, que envolve dois componentes: fechamento ao redor dos orifícios pélvicos e movimento de elevação cranial dos órgãos. Recentemente, inúmeros autores descreveram pesquisas avaliando a capacidade de contração correta dos MAP de mulheres com e sem disfunção do assoalho pélvico [2-4,13]. Outros autores afirmam que pesquisas na área de consciência perineal e aprendizado da correta contração deveriam ser prioridade dos pesquisadores na área do assoalho pélvico [14]. Este estudo piloto objetivou avaliar o efeito de um programa de Ginástica Hipopressiva no aprendizado da correta contração dos MAP. A função dos MAP no presente estudo foi avaliada por meio de palpação bidigital, utilizando-se a escala de Oxford, bem como o endurance muscular e o número de contrações rápidas derivados da escala Perfect [8]. Segundo Bo e Morkved [14], a palpação bidigital é um dos principais métodos de avaliação utilizados pelos fisioterapeutas e, observa-se que mesmo nos dias de hoje, em que há tantos outros métodos tecnológicos de avaliação (ultrassom, ressonância magnética), a palpação ainda é um dos métodos de avaliação mais utilizados. Pacientes que possuem adequada contração dos MAP, devem apresentar valores acima de 3 na escala Oxford, sem recrutar outros grupos musculares como adutores, abdominais e glúteos [15]. Em nosso estudo, a função muscular do assoalho pélvico antes do tratamento, mensurada pela escala de Oxford, foi de 1,6 (± 0,6), considerada função muscular débil. Entretanto, após período de treinamento envolvendo 368 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 ginástica hipopressiva para o aprendizado da correta contração, observou-se melhora da função muscular, cujo valor foi de 2,8(± 0,5), aproximando-se da função considerada ideal. O endurance muscular aumentou de 2,7 (± 1,8) segundos para 5,3 (± 2,1) segundos (p = 0,0001), e o número de contrações rápidas aumentou de 3,4 (± 1,3) para 7,3 (± 1,9) (p < 0,0001). As pacientes foram orientadas a ficar em aspiração diafragmática, ou seja, manter a contração, por maior tempo possível, e tal fato pode ter resultado na melhora significativa do tempo de manutenção da contração. No que diz respeito à técnica hipopressiva, há carência de estudos que realmente evidenciem o que ocorre com o músculo diafragma e os MAP. Os autores que preconizam a utilização dessa técnica, afirmam que há elevação das cúpulas diafragmáticas e dos MAP ocasionados pela diminuição da pressão dentro da cavidade abdominal durante a manobra de aspiração diafragmática. Recentemente, Talasz et al. [16] evidenciaram íntima correlação entre os movimentos das cúpulas diafragmáticas e do assoalho pélvico por meio de ressonância magnética. Seus resultados demonstraram que quando o diafragma se desloca para baixo, durante a inspiração, o assoalho pélvico igualmente se desloca para baixo e que na expiração ocorre o contrário, as cúpulas diafragmáticas se elevam porque os pulmões se esvaziam e o assoalho pélvico se eleva na mesma proporção. Estes resultados estão em acordo com as afirmações dos autores que preconizam os exercícios hipopressivos, no que se refere ao movimento sincrônico do diafragma respiratório e do assoalho pélvico. No presente estudo a aderência foi mensurada por meio de diários de exercícios. No primeiro mês as pacientes praticaram os exercícios em média 27,5 dias, no segundo mês, 27 dias e no ultimo mês as pacientes relaram praticar os exercícios em média 29 dias. Esses dados demonstram elevada aderência ao tratamento. Embora os exercícios para o assoalho pélvico não sejam invasivos, não apresentem efeitos colaterais e sejam de baixo custo, fatores como baixa aderência da paciente ao tratamento, baixa motivação da paciente e falta de compreensão da terapia podem interferir nos resultados dessa abordagem terapêutica sendo fatores limitantes para esse tipo de abordagem [17]. Este fato não ocorreu no presente estudo, onde a aderência ao tratamento foi elevada. A literatura aponta como fatores determinantes para o sucesso da terapia a compreensão dos exercícios e o conhecimento do próprio corpo. Por outro lado os fatores negativos seriam a não assimilação da orientação que está sendo oferecida e a não incorporação dos exercícios no dia a dia. Quando inadequado, o treinamento pode gerar resultados insatisfatórios e frustração [17]. No presente estudo as pacientes foram instruídas acerca da localização e função da pelve e dos MAP, fato que as incentivou ao conhecimento do próprio corpo. Além disso, a Ginástica Hipopressiva pode ter sido bem aceita pelas pacientes deste estudo porque trabalha o individuo de forma global e em diversas posturas além de incorporar a respiração e a postura em sua prática. Todavia, faltou-nos comparar os exercícios hipopressivos com outras técnicas de consciência perineal descritas na literatura. Portanto, sugestões para novos estudos incluindo outras técnicas de consciência e outras técnicas de avaliação do assoalho pélvico tais como atividade elétrica e volume muscular devem ser consideradas para os pesquisadores dessa área. Conclusão A Ginástica Hipopressiva apresentou resultados positivos na melhora da propriocepção perineal, observados pela melhora da função muscular. Houve elevada aderência das pacientes ao tratamento. Referências 1. Messelink B, Benson T, Berghmans B et al. Standardisation of terminology of pelvic floor muscle function and dysfunction: report from the pelvic floor clinical assessment group of the international continence society. Neurourol Urodyn 2005;24:374-80. 2. Bo K, Larsen S, Oseid S et al. Knowledge about and ability to correct pelvic floor muscle exercises in women with urinary stress incontinence. Neurourol Urodyn 1998;7:261-2. 3. Talasz H, Himmer-Perschak G, Marth E et al. Evaluation of pelvic floor muscle function in a random group of adult women in Austria. Int Urogynecol J 2008;19:131-5. 4. Talasz H, Gosch M, Enzelsberger H, Rhomberg HP. Geriatrische Patientinner mit harninkontinenz-symptomen und ihre kontrolle über den beckenboden. Z Gerontol Geriatr 2005;38:424-30. 5. Seleme M R, Bertotto A, Ribeiro VW. Exercícios hipopressivos. In: Palma P. 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A respiração tornou-se apical, os valores da espirometria e das pressões respiratórias máximas apresentaram-se abaixo dos valores previstos, a postura ficou mais posteriorizada com aumento da lordose lombar, o centro de gravidade deslocou-se para cima e houve maior oscilação postural. Conclusão: A função respiratória, postura e equilíbrio sofreram modificações no decorrer da gestação. Objective: To evaluate the respiratory function, posture and balance during pregnancy. Method: Were performed spirometry, manometry, and were assessed posture and balance at 16th to 28th week of pregnancy. Results: This case study is about a 33 years old woman. The breathing became apical, values of spirometry and maximal respiratory pressures were lower than predicted, the posture was more posterior with increased lumbar lordosis, the gravity center moves upwards and there was a greater postural oscillation. Conclusion: Respiratory function, posture and balance have been altered during gestation. Palavras-chave: testes de função respiratória, postura, equilíbrio postural, gravidez. Key-words: respiratory function tests, posture, postural balance, pregnancy. Recebido em 11 de fevereiro de 2011; aceito em 29 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Maria Elaine Trevisan, Rua Benjamin Constant, 670/301, 97050-022 Santa Maria RS, E-mail: elaine.trevisan@ yahoo.com.br Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução A gravidez é um processo fisiológico natural compreendido pela sequência de adaptações corporais a fim de se adequar às necessidades orgânicas do complexo materno-fetal e parto [1,2]. As modificações respiratórias são evidenciadas pelo aumento da circunferência torácica e alterações nos volumes e capacidades pulmonares [1,3,4]. A respiração que é predominantemente diafragmática nos primeiros meses torna-se costal ao final da gestação [4]. Ajustes no sistema postural são advindos do crescimento do útero, aumento da massa corporal e tamanho das mamas. Esses são fatores que contribuem para o deslocamento do centro de gravidade (CG) para cima e para frente, podendo acentuar a lordose lombar e promover uma anteversão pélvica e modificação na base de apoio [5]. Provavelmente a adaptação postural frente às modificações ocorridas é individual e de acordo com características posturais prévias [6]. Essas adaptações podem gerar mecanismos compensatórios, levando a distúrbios musculoesqueléticos, dor e desconforto nas atividades de vida diária [7-9]. O aumento da altura do CG e a frouxidão ligamentar, principalmente na região do quadril, provocam alterações no equilíbrio durante a gestação. O aumento da oscilação corporal pode estar relacionado a uma adaptação neuromuscular ou a uma estratégia compensatória para manter a postura ereta em uma situação onde a projeção vertical do CG se encontra próximo aos limites da base de apoio, como ocorre na gestação [9]. A partir do exposto, o presente estudo teve como objetivo avaliar a função respiratória, a postura e o equilíbrio da gestante, podendo assim acompanhar a evolução das alterações que ocorrem no organismo materno. Material e métodos Apresentação do caso Mulher de 33 anos de idade, gestação de 16 semanas, não tabagista, sem história de doença pulmonar e/ou cirurgia no tórax e abdome. O protocolo de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE 0314.0.243.000-09) e aceite confirmado pela assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As variáveis estudadas foram mensuradas da 16ª a 28ª semana gestacional. A espirometria foi realizada na posição sentada seguindo os critérios da American Thoracic Society e referência de Knudson et al. [10] para o cálculo dos valores previstos. A pressão inspiratória e expiratória máxima (PImáx e PEmáx) foi medida pelo manovacuômetro Microhard MVD500, na posição sentada, de acordo com Black e Hyatt [11]. Foi 371 registrada a maior de três manobras aceitáveis e reprodutíveis e comparada aos valores previstos [12]. Na avaliação postural foram verificados os segmentos corporais da cabeça, tronco e membros inferiores na vista lateral direita através da demarcação de pontos anatômicos, gestante em trajes de banho, descalça e cabelos presos. As imagens foram captadas por uma máquina fotográfica digital a uma distância de 3 metros e analisadas pelo protocolo de Avaliação Postural – SAPO. Para verificar o equilíbrio corporal foi utilizada a plataforma de força AMTI modelo OR6-5 (Advanced Mechanical Technologies, Inc), taxa de amostragem de 100 Hz. A gestante posicionou-se sobre a plataforma em apoio bipodal, pés descalços desenhados em papel milimetrado para manter a base nas coletas subsequentes e olhar fixo à frente. Foram realizadas três tentativas de 30 segundos com os olhos abertos (OA) e três com os olhos fechados (OF). Foi analisada a amplitude de deslocamento ântero-posterior (COPap) e médio-lateral (COPml) do centro de pressão. O Centro de Gravidade (CG) do corpo, em relação ao eixo longitudinal no plano transverso, foi determinado pelo método da Prancha de Reação. A gestante posicionou-se sobre a prancha em decúbito dorsal e permaneceu imóvel, membros superiores ao longo do corpo e respiração tranquila durante as medidas. Resultados e discussão As variáveis de equilíbrio corporal, força muscular respiratória e centro de gravidade são apresentadas na tabela I. Tabela I - Valores das pressões respiratórias, IMC, altura do centro de gravidade (CG) e variáveis de equilíbrio postural com os olhos abertos (OA) e olhos fechados (OF) nas diferentes idades gestacionais. IG PImáx cm/H2O PImáx% PEmáx cm/H2O PEmáx % IMC (kg/m²) CG COPap OA (cm) COPap OF (cm) COPml OA (cm) COPml OF (cm) 16 20 24 28 semanas semanas semanas semanas -55 -49 -53 -62 63 62 61 71 82 80 71 71 54 52 47 47 24,2 24,96 25,72 26,25 0,93 0,94 0,94 0,95 1,73 1,57 1,52 1,57 1,49 1,19 1,32 1,93 0,92 0,81 0,78 1,06 0,81 0,75 0,79 0,97 IG: Idade gestacional; PImáx: Pressão inspiratória máxima; PEmáx: Pressão expiratória máxima; IMC: Índice de massa corpórea; %: percentual do previsto; COPap: amplitude de deslocamento ântero-posterior e COPml:­amplitude de deslocamento médio-lateral do centro de pressão. O valor de PImáx previsto para este caso é -87,17 cm/ H2O e de PEmáx 152,51 cm H2O [12]. Esses valores apresentaram-se abaixo do previsto para mulheres não-grávidas 372 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 de mesma idade. Valores inferiores a 60% do previsto estão relacionados com fraqueza muscular respiratória [13], assim, pode-se verificar que a PImáx esteve dentro da normalidade e PEmáx relacionada à fraqueza muscular expiratória. Estudos [1,3,14] observaram que os valores de PImáx e PEmáx em gestantes ficaram abaixo da normalidade sendo explicado pela restrição mecânica que dificulta a incursão diafragmática e pela diminuição da força muscular respiratória. Entre a 20ª e 24ª semana gestacional ocorreu a maior redução da PEmáx concordando com Almeida et al. [2]. A redução da PEmáx, principalmente em períodos gestacionais mais avançados, mostra que o volume abdominal interfere na biomecânica do tronco, afetando principalmente a força muscular expiratória, especialmente transverso e reto abdominal [1]. Observou-se alteração na posição do CG que aumentou sua altura no decorrer da gestação. Houve aumento do COPap na condição OF e COPml nas condições OA e OF, sugerindo uma maior oscilação postural. A maior oscilação postural no deslocamento médio-lateral pode ser explicada pela forma de aplicação do teste, onde mantivemos a mesma base de apoio em todas as coletas. Estudos [15,16] relatam que o principal fator biomecânico a ser considerado na gestante advém do crescimento do útero, anteriorização dentro da cavidade abdominal, aumento da massa corporal e tamanho das mamas, que contribuem para o deslocamento do CG para cima e para frente, podendo acentuar a lordose lombar e promover a anteversão pélvica. Butler et al. [16] afirmam que o ganho de peso, aumento da altura do CG e frouxidão ligamentar combinados provocam alterações no equilíbrio, principalmente no segundo e terceiro trimestres por ocorrer maior ganho de peso. Oliveira et al. [17] observaram um significante aumento de oscilações do COPap quando as gestantes estavam com OF e pés juntos, acreditando que haja uma tendência de compensar a falta de visão (OF) com o aumento da oscilação do COPap e COPml ao longo da gestação. Butler et al. [16] reportaram aumento da oscilação postural tanto com os OA quanto OF. Nagai et al. [18] e Mann et al. [9] demonstraram diferença significativa na área e no comprimento da trajetória do COPap­ e COPml quando compararam gestantes e não-gestantes com os OF, denotando uma dependência das informações vindas dos sistemas somatossensorial e visual na manutenção do equilíbrio em gestantes. Esses resultados estão de acordo com nossos achados. Os volumes e capacidades pulmonares estão apresentados nas Figuras 1 e 2. Os valores de CVF, VEF1 e PFE apresentaram-se abaixo do previsto, mas nos padrões de normalidade, nos períodos gestacionais avaliados. Concordam com esses achados Chicayban e Dias [1] que encontraram menor expansibilidade e força muscular em gestantes, sem alteração no volume corrente. Silva [14] observou que o VEF1 foi menor em gestantes em comparação ao grupo controle não se diferenciando do grupo obesidade sugerindo que a gravidez e a obesidade podem alterar a mecânica pulmonar reduzindo os volumes pulmonares. Os dados da avaliação postural comparativa entre 16ª e 28ª semana se encontram na Tabela II. Figura 1 - Valores da Capacidade Vital Forçada (CVF) e Volume Expiratório Forçado no primeiro segundo (VEF1) nas diferentes idades gestacionais. 3,7 3,5 3,5 3,43 3,43 3,38 3,38 2,97 2,97 2,89 2,92 2,92 16 semanas 20 semanas 24 semanas 3,3 3,42 3,1 3,04 2,9 2,7 CVF previsto CVF obtido 3,43 3,43 2,97 2,87 28 semanas VEF1 previsto VEF1 obtido Tabela II - Valores dos ângulos pelo Protocolo SAPO. Segmento corporal analiPontos anatômicos sado Cabeça Tragus /C7/linha horizontal Tragus/acrômio/linha vertical Tronco Acrômio/trocanter maior do fêmur/linha horizontal Acrômio/trocanter maior do fêmur/maléolo Acrômio/maléolo/linha vertical EIAS/espinha ilíaca postero-superior/linha horizontal Membros Infe- Trocanter maior do fêmur/ linha articular do joelho/ riores maléolo Maléolo/linha articular do joelho/linha horizontal Ângulo medido 16 semanas 28 semanas Alinhamento horizontal Alinhamento vertical Alinhamento vertical do tronco Ângulo do quadril Alinhamento vertical do corpo Alinhamento horizontal da pelve Ângulo do joelho 47,7 15,3 -2 -4,4 1,9 -12,2 46,1 12,6 -4,3 -8,6 1,4 -19,3 3,6 0,9 84 84,8 Ângulo do tornozelo Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Figura 2 - Valores do Pico de Fluxo Expiratório (PFE) nas diferentes idades gestacionais. 7,2 6,99 7 6,8 6,89 6,81 6,81 6,81 6,6 6,4 6,5 6,2 6 5,8 16 semanas 6,21 6,21 20 semanas 24 semanas 28 semanas Valor previsto Valor obtido Evidencia-se que ocorreu flexão cervical, extensão da cabeça, inclinação posterior do tronco, aumento do ângulo do quadril, aproximação do corpo a linha vertical, anteversão pélvica, diminuição do ângulo do joelho e aumento do ângulo do tornozelo. Semelhante aos achados deste estudo, Benetti et al. [19] observaram que as alterações mais importantes ocorrem no plano sagital e as principais adaptações na região lombar, destacando o aumento da lordose lombar e inclinação posterior do tronco. Conclusão Evidenciou-se que os volumes, capacidades pulmonares e a PImáx apresentaram-se abaixo do previsto, porém dentro da normalidade. A PEmáx apresentou-se abaixo da normalidade e relacionada à fraqueza muscular expiratória. Houve adaptações posturais e maior oscilação postural com deslocamento do CG para cima. Esses resultados contribuem para entender as adaptações corporais que ocorrem na gestação chamando a atenção para as questões musculares, ventilatórias e de controle postural, fundamentais na manutenção da funcionalidade, neste importante período da vida da mulher. Referências 1. Chicayban LM, Dias SAAN. Análise da função pulmonar em gestantes e não-gestantes. Perspect Online 2010;4(15):144-50. 373 2. 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Rev Ciênc Méd 2005;14(3):259-65. 374 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Revisão Intervenção precoce em lactentes prematuros Early intervention in premature infants Regiane Briques Alves, Ft.*, Denise Campos, Ft., D.Sc.** *Fisioterapeuta pós-graduanda do Curso de Especialização em Intervenção em Neuropediatria da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), **Docente do Curso de Fisioterapia da Faculdade Anhanguera de Campinas (FAC), Membro do Grupo Interdisciplinar de Avaliação do Desenvolvimento Infantil (GIADI) Resumo Abstract Os recentes avanços da neonatologia têm reduzido significativamente as taxas de mortalidade de recém-nascidos prematuros. Entretanto, eles estão sob maior risco para apresentar déficits de desenvolvimento, em relação aos nascidos a termo. Este estudo teve por objetivo verificar, a partir de revisão de literatura, os efeitos da intervenção precoce em lactentes nascidos pré-termo. Foram incluídos artigos publicados nas bases de dados Medline, Lilacs, Scielo e Pubmed, na língua portuguesa e inglesa, no período de 1988 a 2011. Foram excluídos artigos baseados em experimentos com modelos animais, bem como artigos que não apresentaram clareza quanto aos métodos utilizados e resultados obtidos. Concluiu-se que a intervenção precoce diminui os atrasos do desenvolvimento motor de lactentes e, quando associada à orientação e colaboração dos pais, os resultados são ainda mais benéficos. Recent advances in neonatology have significantly reduced the mortality rates in preterm infants. However, they are at highest risk of having developmental deficits, when compared to those born at term. This study aimed to ascertain from the literature review the effects of early intervention in infants born preterm. Articles in Portuguese and English published in Medline, Lilacs, Scielo, Pubmed from 1988 to 2011 were included. We have excluded articles based on experiments with animal models as well as articles that were not clear enough about the used methods and results. It was concluded that early intervention reduces the motor development delays in infants and if associated to the parents guidance and collaboration the results are even more beneficial. Key-words: infant, premature, infant development, early intervention. Palavras-chave: lactente, prematuro, desenvolvimento infantil, intervenção precoce. Introdução Existem duas classificações, de grande importância, que devem ser empregadas para identificar a maturidade e condição física dos recém-nascidos (RN). A primeira está relacionada à idade gestacional (IG). Define-se como pré-termo, o RN com menos de 37 semanas completas de gestação; a termo, aqueles nascidos com IG entre as 37 e 41 semanas e seis dias; e, pós-termo, aqueles com 42 semanas ou mais de gestação. A outra classificação refere-se ao peso de nascimento (PN). Considera-se macrossomia, quando o RN apresenta peso acima de 4 kg; peso normal, quando o peso varia entre 2,5 kg e abaixo de 4 kg; baixo peso, quando o peso do RN é inferior a 2,5 kg; muito baixo peso, quando o RN pesa menos de 1,5 kg; e extremo baixo peso, quando o peso do RN é abaixo de 1,0 kg [1]. Estima-se que no mundo nascem anualmente 20 milhões de bebês prematuros e com baixo peso [2]. A evolução tecnológica e científica, agregada à capacitação dos profissionais envolvidos em gestações de risco, tem permitido maior sobrevivência de RN pré-termo [3,4]. À medida que sobrevivem RN com IG e peso progressivamente menores, cresce a preocupação dos profissionais com a qualidade de vida dessa população, pois a imaturidade anátomo-fisiológica predispõe Recebido em 31 de maio de 2011; aceito em 1 de setembro de 2011. Endereço para correspondência: Denise Campos, Av. Dr. Nelson Noronha Gustavo Filho, 150/83D, Tel: (19) 3294-0750, E-mail: denise.campos@ gmail.com Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 o lactente a uma série de dificuldades para adaptação e evolução na vida pós-natal [5]. Com o avanço tecnológico e farmacológico na perinatologia, riscos como: mortalidade perinatal, sequelas neurológicas e do sistema cardiorrespiratório estão diminuindo a cada ano, beneficiando o desenvolvimento motor do bebê [6]. Esses avanços tecnológicos contribuíram também para a melhoria da qualidade de vida dessas crianças, e aumentou o acesso aos serviços assistenciais do parto ao primeiro ano de vida, tornando mais promissor o prognóstico do desenvolvimento neuropsicomotor [7]. Cabe destacar, no entanto, que embora o aprimoramento dos cuidados intensivos permita maior sobrevivência de RN com risco biológico, a incidência de doenças neurológicas, que inviabilizam a sobrevivência dessas crianças em condições adequadas, não tem se modificado significativamente [8]. O lactente nascido pré-termo pode apresentar dificuldade para adquirir habilidades motoras axiais e apendiculares, atraso na aquisição da linguagem, problemas de visão e alteração cognitiva [9]. O atraso no desenvolvimento motor comumente ocorre devido à presença de hipotonia ao nascer, a qual determina posturas em extensão, quando em supino, diferentemente dos lactentes nascidos a termo, que apresentam flexão nessa posição [10]. O período compreendido entre o nascimento e o final do primeiro ano de vida é considerado um dos mais críticos para o desenvolvimento infantil. Neste período, o desenvolvimento motor apresenta um ritmo acelerado de mudanças, as quais resultam na aquisição de mobilidade. Até pouco tempo atrás, acreditava-se que o desenvolvimento motor sofria interferência apenas do sistema nervoso central (SNC). Entretanto, com o surgimento da Teoria de Sistemas Dinâmicos, verificou-se que o desenvolvimento motor normal resulta da interação entre sistema nervoso, musculoesquelético e ambiente [11]. O desenvolvimento motor é dependente da biologia, do comportamento e do ambiente; não apenas da maturação do sistema nervoso. Quando a criança nasce, o SNC ainda não está completamente desenvolvido. Ela percebe o mundo pelos sentidos e age sobre ele, criando uma interação que se modifica no decorrer do desenvolvimento. Deste modo, por meio da relação com o meio, o SNC se mantém em constante evolução, em um processo de aprendizagem, que permite melhor adaptação ao meio em que vive [12,13]. Pesquisas recentes vêm sugerindo a importância da atuação da fisioterapia na prevenção, detecção e atendimento precoce de neonatos. As crianças atendidas em programas de intervenção precoce necessitam de menos assistência no futuro, já que nenhuma fase do desenvolvimento motor será tão rápida como a de zero a um ano e oito meses de vida [14]. Acreditase que a intervenção precoce possa oferecer ao prematuro a experiência de atividades, que talvez ele levasse mais tempo para fazê-las. Essa experiência, o mais cedo possível, possibilita aquisições motoras [15]. Atualmente, os profissionais que trabalham com desenvolvimento infantil estão reconhecendo cada vez mais a 375 importância de considerar, durante o tratamento, a interação entre aspectos biológicos (organismo), fatores de aprendizado ou experiência (ambiente) e exigência específica da tarefa [16]. Para melhor abordagem ao intervir na criança, é necessária uma análise coletiva das variações do desenvolvimento dentro de uma perspectiva “sócio-ecológica”. Assim o atendimento individualizado da criança possibilita a identificação de risco em particular, e a avaliação da família possibilita a contextualização e a definição de estratégias de intervenção, que podem contribuir para o êxito do programa [17]. Inicialmente, acreditava-se que as mudanças no comportamento motor refletiam diretamente as alterações maturacionais do sistema nervoso central. Hoje, porém, sabe-se que o processo de desenvolvimento ocorre de maneira dinâmica e é suscetível a ser moldado a partir de inúmeros estímulos externos. A interação entre aspectos relativos ao indivíduo, como suas características físicas e estruturais, ao ambiente em que está inserido e à tarefa a ser aprendida são determinantes na aquisição e refinamento das diferentes habilidades motoras [18]. De modo geral, a estimulação sensório-motora visa suprir déficits do RN pela imaturidade e privação social e sensorial. Sabe-se que o sistema nervoso do RN pré-termo é imaturo. A partir dessa ideia, existem algumas razões para a intervenção precoce: a plasticidade do cérebro infantil; a importância do aprendizado sensório-motor; o desenvolvimento mental da criança; o desenvolvimento da atividade reflexa normal; os cuidados na prevenção de contraturas e deformidades; e a preocupação em relação à diminuição da defasagem com a idade cronológica [12]. O principal objetivo da intervenção precoce é permitir que a criança experimente movimentos e posturas normais desde seu nascimento, favorecendo sua habilitação. Caso contrário, se a criança começar a realizar movimentos e posturas anormais, durante seu desenvolvimento, estará aprendendo a interagir com o mundo em padrões anormais, reforçando circuitos neuronais de comportamentos anormais, dificultando e limitando sua qualidade de vida [19]. Nos últimos anos, existe uma ênfase cada vez maior em relação à importância do envolvimento da família no processo de intervenção. Por isso, a área de intervenção precoce vem definindo o papel da família em relação ao desenvolvimento de seus filhos com algum tipo de atraso, tornando-a mais competente e independente para solucionar os problemas diários, que surgem durante as várias etapas do desenvolvimento [20]. A participação dos pais no tratamento e na educação dos filhos proporciona maior evolução no desenvolvimento global da criança, pois os pais passam a maior parte do tempo com seus filhos, em relação ao tempo com o terapeuta. Assim, a família é o sistema mais efetivo e econômico em promover e manter o desenvolvimento da criança [21]. Tendo em vista o exposto acima em relação ao aumento na taxa de sobrevivência de RN pré-termo e, consequentemente, o aumento de lactentes com maior risco para apresentar Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 376 alterações no desenvolvimento, faz-se necessário o aperfeiçoamento de profissionais que possam proporcionar avaliação e intervenção precoce de modo eficiente, a fim de prevenir ou minimizar alterações no desenvolvimento, numa fase de intensa plasticidade cerebral. Justifica-se assim, a importância deste estudo em aprofundar os conhecimentos sobre a intervenção precoce. Material e métodos Tratou-se de um estudo de revisão de literatura, utilizandose de estratégias de busca primária e secundária em base de dados computadorizadas (Medline, Lilacs, Scielo e Pubmed), além de livros e teses de mestrado na área de saúde infantil. Para busca primária foram utilizados os seguintes descritores combinados: lactente, prematuro, desenvolvimento infantil, intervenção precoce. Para busca secundária foram utilizadas listas de referências dos artigos encontrados após a busca primária. Foram considerados critérios de inclusão, artigos publicados nos idiomas português e inglês, que abordavam sobre intervenção precoce em lactentes prematuros. Foram excluídos artigos baseados em experimentos com modelos animais, bem como artigos que não apresentavam clareza quanto aos métodos utilizados e resultados obtidos. Não foi limitada a data de publicação, sendo que o ano de publicação dos estudos variou entre 1988 e 2011. Os textos foram analisados e sintetizados de forma crítica, a fim de discutir as informações obtidas que correspondiam especificamente ao tema pretendido para compor esta revisão. Resultados Ao todo foram selecionados 33 trabalhos, sendo 22 no idioma português e 11 no idioma inglês. Foram selecionados 27 artigos científicos publicados em periódicos nacionais e internacionais relacionados com saúde, 02 dissertações, e 04 livros. Dentre estes, 7 artigos de pesquisa de campo, conforme descritos na Tabela I. Discussão A prematuridade é considerada como fator de risco notável no desenvolvimento das crianças, sugerindo que estas sejam acompanhadas mais de perto em ambientes clínicos. Acreditase que a prematuridade tenha grande impacto no desenvolvimento motor grosso e fino no primeiro ano de vida. No entanto, existem muitas controvérsias sobre em que extensão os fatores médicos e ambientais podem trazer consequências negativas, além do próprio grau de prematuridade [22]. Alguns autores apontam que as crianças nascidas pré-termo não só apresentam atraso no desenvolvimento de habilidades motoras grossas, mas apresentam também trajetórias específicas de desenvolvimento nos primeiros 18 meses de vida, quando comparadas com as crianças nascidas a termo. Nesse sentido, Haastert et al. [23], realizaram um estudo com 800 crianças (IG ≤ 32 semanas), utilizando a Alberta Infant Motor Scale (AIMS) para determinar se a criança pré-termo apresenta padrão de desenvolvimento motor diferente das crianças a termo da amostra normativa do teste. Os autores identificaram diferenças significativas no desenvolvimento motor grosso de crianças pré-termo, mesmo com correção da IG, quando comparadas às crianças nascidas a termo. Esse estudo sugere que o perfil do desenvolvimento motor grosso de crianças pré-termo, até os 18 meses, mostra uma variação típica, que parece ser específica para essa população. Ou seja, esse estudo sugere uma trajetória de desenvolvimento motor específica para o lactente pré-termo. Por isso faz-se necessário um olhar diferenciado no acompanhamento desses bebês, utilizando-se de intervenções clínicas precoces e efetivas, realizadas por uma equipe multiprofissional, associadas ao treinamento e colaboração dos pais, para um bom prognóstico do desenvolvimento neuropsicomotor. Semelhante a esses achados, Palmer et al. [24] verificaram que a fisioterapia aplicada isoladamente demonstrou ser menos efetiva na melhora do desenvolvimento motor, em relação a fisioterapia associada a colaboração dos pais, após um ano de terapia, incluindo brincadeiras apropriadas para aumento das habilidades, em crianças com dificuldades motoras antes Tabela I - Programas de intervenção no desenvolvimento motor. Autores Palmer 1988 Idades 12 – 19 meses Número de casos 48 Lima et al. 2007 0 a 18 meses 13 Formiga 2004 Média 3 m e 6 dias 08 Rothberg 1991 IG* < 34 semanas 80 Almeida 2004 6 a 8 meses 40 Braz 1999 Até 6 meses 05 Lekskuschai 2001 *IG. Idade Gestacional IG* < 37 semanas 84 Resultados Fisioterapia isolada menos efetiva. 4 semanas de intervenção associada a orientação dos pais. Êxito no desenvolvimento. Lactentes estimulados adquiriram maior número de comportamentos. Nenhum efeito benéfico da fisioterapia. Mudanças positivas no comportamento e na aprendizagem dos bebês após dez sessões. Programa de intervenção potencializou a evolução do desenvolvimento. Resultados positivos no desenvolvimento, comparados com um grupo controle. Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 dos três anos de vida. Em concordância com estes autores, outros estudos confirmaram que a intervenção fisioterapêutica, associada ao treinamento dos pais, gera resultados mais favoráveis no desenvolvimento motor, do que a intervenção fisioterapêutica sem orientação dos pais [25]. Lima, Severiano e Marques [26] acompanharam durante quatro semanas consecutivas o desenvolvimento motor de crianças submetidas à estimulação. Todas apresentaram resultado favorável, pois obtiveram 100% na escala AIMS, ou seja, realizaram as posturas máximas esperadas para a idade, indicando assim que o programa de estimulação, realizado pelos pais e cuidadores, mostrou-se eficaz em seu caráter preventivo e educativo, ao gerar experiências e atividades em seu meio ambiente que desafiassem, exigissem e estimulassem o processo de desenvolvimento, de acordo com a etapa de maturação que cada criança se encontrava. Concluiu-se que as crianças submetidas ao programa de estimulação precoce, durante quatro semanas consecutivas, obtiveram êxito no desenvolvimento. Em outro estudo realizado em 2004 por Formiga, Pedrazzani e Tudella [27], foram comparados dois grupos, o grupo controle (GC) e grupo estudo (GE), o qual recebia estimulação precoce. Como resultado ambos os grupos apresentaram evolução, especialmente nas subescalas prona e supina. Entretanto os lactentes do GE adquiriram maior número de comportamentos, e maior evolução na subescala sentada e em pé. É importante destacar que, embora os bebês tivessem nascidos prematuros, esses eram considerados normais e, portanto, atingiram os ganhos esperados para suas respectivas idades, especialmente o GE. Um programa de intervenção fisioterapêutica precoce foi elaborado para crianças com muito baixo peso ao nascer, onde houve 80 crianças divididas em um grupo neurologicamente normal e outro grupo de alto-risco, de acordo com a pontuação de uma escala de neurodesenvolvimento. Foram divididas também em dois grupos, o controle, sem fisioterapia, e com acompanhamento da fisioterapia durante um ano. Crianças do grupo de alto-risco tinham um quociente de desenvolvimento significativamente mais baixo do que o grupo normal. Dentre as 80 crianças, 49 foram reavaliadas com uma idade média de 74,7 meses. Observou-se que a fisioterapia até 1 ano não influenciou o desfecho posterior em ambos os grupos, normais ou em situação de risco. As crianças de risco e normais tiveram média semelhante nos quocientes de desenvolvimento aos 6 anos, mas a pontuação locomotora de crianças em risco foi significativamente inferior ao das crianças normais. Portanto, neste estudo, nenhum efeito benéfico da fisioterapia foi comprovado nem em curto e nem a longo prazo [28]. Esse resultado pode ter ocorrido devido à divisão dos grupos controle e de intervenção, pois embora as crianças tenham sido separadas em dois grupos, com atraso no desenvolvimento, e crianças consideradas normais, os autores não mencionaram se essas crianças eram prematuras, e se suas idades gestacionais foram corrigidas pra tal comparação. Almeida [29] aplicou um programa de intervenção em bebês de creches, no qual os cuidados básicos com a criança 377 envolviam higiene e alimentação e, em geral, não existia a preocupação com o desenvolvimento. Esse programa incluía exercícios de acompanhamento visual, manipulação e atividades para ganho de postura, realizados por 15 minutos. Foi possível observar mudanças positivas no comportamento e na aprendizagem dos bebês após dez sessões realizadas por uma fisioterapeuta. Por outro lado, em um programa de intervenção domiciliar administrado pelos pais, o qual incluía uma variedade de técnicas de estimulação tátil e vestíbulo-cinestésica, como massagem, movimentos de balançar e abraçar, os efeitos em curto prazo se relacionaram ao maior ganho de peso, maturação neurológica e na melhora do desempenho no teste mental de Bayley (Bayley Mental Test). Porém, os programas de intervenção motora executados pelos pais demonstram resultados questionáveis quanto à capacidade de alterar, a longo prazo, o desenvolvimento da criança [30]. Braz [31] analisou o desenvolvimento de bebês de risco, com quadro clínico de anoxia perinatal, que participaram de um programa de estimulação domiciliar até seis meses de idade, divididos em grupo controle e experimental. O grupo experimental era composto por cinco bebês que receberam estimulação domiciliar duas vezes por semana, durante quatro meses, com a mãe recebendo orientações. Foi verificado que o programa de intervenção potencializou a evolução do desenvolvimento dos bebês. Um ensaio clínico randomizado desenvolvido para crianças prematuras demonstrou melhora significativa do desempenho motor após um programa de intervenção fisioterapêutica, realizado durante a estadia no hospital, além da intervenção dos pais, os quais foram orientados e treinados para continuar a intervenção após a alta hospitalar do bebê. Esses resultados positivos no desenvolvimento motor foram observados e comparados com um grupo controle, aos quatro meses de idade corrigida [32]. Frente a esses achados, é importante que o terapeuta envolva ao máximo a família no programa de intervenção, dividindo a responsabilidade e ambos trabalhando de forma cooperativa. Além disso, o ambiente também deve ser reconhecido como fator determinante para o desenvolvimento motor, ou seja, um ambiente rico em estímulos visuais, motores, auditivos favorece o ganho de mobilidade, percepção corporal e consequentemente posturas. Sendo assim, além dos estímulos promovidos pelo terapeuta e pais, é necessário um ambiente propício para a progressão do desenvolvimento [33]. Conclusão Este estudo descreveu a importância do acompanhamento e intervenção precoce de lactentes nascidos prematuros. A maioria dos estudos consultados demonstrou benefícios relativos à intervenção precoce, tais como o ganho de movimento e postura, minimizando o atraso dos lactentes prematuros em relação aos nascidos a termo, reafirmando assim, a necessidade da atenção dirigida ao recém-nascido pré-termo. 378 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Foi observado também que há muitos estudos da década passada, o que pode nos sugerir que há tempos já se falava muito a respeito dos benefícios da fisioterapia para esses bebês, porém, apesar de vários estudos mostrarem a importância da intervenção precoce, ainda há pouca vivência e divulgação desse serviço prestado pelo fisioterapeuta especialista na área. Concluiu-se, portanto, que a intervenção precoce pode diminuir os atrasos do desenvolvimento motor do lactente e, quando associada à orientação e colaboração dos pais, o ganho é ainda maior. Cabe salientar ainda, que o ambiente também deve ser reconhecido como fator determinante para o desenvolvimento motor. Sendo assim, além dos estímulos promovidos pelo terapeuta e pais, é necessário um ambiente propício, rico em estímulos visuais, motores e auditivos. Referências 1. Beck S, Wojdyla D, Say L, Betran AP, Merialdi M, Requejo JH, et al. The worldwide incidence of preterm birth: a systematic review of maternal mortality and morbidity. Bull World Health Organ 2010;88:31-8. 2. Luz TP, Neves LAT, Reis AFF, Silva GR, Silva L GP. Magnitude do baixo peso ao nascer. J Bras Ginecol 2002;108(5):133-44. 3. Mancini M.C Mancini MC, Carvalho DJ, Gontijo DT. Comparação das habilidades motoras de crianças prematuras e crianças nascidas a termo. Rev Fisioter Univ São Paulo 2000;7(1):25-31. 4. 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Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 379 Revisão Particularidades clínicas e fisioterapêuticas de crianças submetidas à cirurgia de cardiopatias congênitas Clinical and physical therapy particularities of children after congenital heart disease surgeries Angela Sachiko Inoue, Ft*, Filomena Regina Barbosa Gomes Galas, D.Sc.**, Emilia Nozawa, Ft., D.Sc.*** *Fisioterapeuta do Serviço de Fisioterapia do Instituto do Coração (InCor) HCFMUSP, Doutoranda pela Faculdade de Medicina da USP, **Médica, Diretora do Serviço de Anestesiologia e UTI cirúrgica do Instituto do Coração (InCor) HCFMUSP, ***Fisioterapeuta Chefe do Serviço de Fisioterapia do Instituto do Coração (InCor) HCFMUSP Resumo Abstract Os avanços importantes nas últimas décadas que ocorreram no campo das cardiopatias congênitas, sobretudo na melhoria implantada nas unidades de cuidados intensivos pediátricos, a melhor compreensão e o diagnóstico preciso das alterações hemodinâmicas associados aos avanços nos procedimentos cirúrgicos têm apresentado repercussões importantes na melhora da expectativa de vida destes pacientes. O atendimento cardiológico pediátrico torna-se desafio para toda equipe multiprofissional, uma vez que o impacto das cardiopatias tem repercussões significativas na qualidade de vida destes. A fisioterapia, como membro desta equipe, deve buscar o aperfeiçoamento constante de suas técnicas para contribuir com a otimização com cuidados destes pacientes. Foi realizada uma revisão com diferentes elementos abordando aspectos clínicos e cirúrgicos, bem como a atuação da fisioterapia diante de pacientes com cardiopatias congênitas. The important advances in recent decades that occurred in the field of congenital heart disease, especially in improving in pediatric intensive care units, better understanding and accurate assessment of hemodynamic changes associated with advances in surgical procedures have shown significant impact in increasing survival of these patients. The pediatric cardiac care becomes an important issue to multidisciplinary team, since the impact of heart disease has a significant impact on quality of life. Physical therapy, as a member of this team, should search and propose the constant improvement of its techniques to contribute to optimizing care of these patients. A review was made with different elements addressing clinical and surgical aspects and the role of physical therapy on patients with congenital heart disease. Key-words: heart defects, congenital, surgery, physical therapy, postoperative care. Palavras-chave: cardiopatias congênitas, cirurgia, fisioterapia, cuidados pós-operatórios. Recebido em 17 de junho de 2011; aceito 4 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Angela Sachiko Inoue, Av. Enéas de Carvalho Aguiar 44, 05403-000 São Paulo SP, E-mail: [email protected] 380 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução Os avanços importantes nas últimas décadas que ocorreram no campo das cardiopatias congênitas, sobretudo na melhoria implantada nas unidades de cuidados intensivos pediátricos, a melhor compreensão e o diagnóstico preciso das alterações hemodinâmicas associados aos avanços nos procedimentos cirúrgicos têm apresentado repercussões importantes na melhora da expectativa de vida destes pacientes [1-3]. Embora haja maior sobrevida, a maioria dos pacientes submetida a mais de um procedimento cirúrgico, com procedimentos mais complexos, está exposta a diversas complicações e ainda permanece sob grande risco de mortalidade [4]. O reconhecimento e a valorização das manifestações clínicas iniciais da cardiopatia, tais como a cianose, infecções pulmonares de repetição, endocardite infecciosa, hipodesenvolvimento pondero-estatural, tornam-se fundamentais para evitar o impacto morfológico e funcional sobre o sistema cardiovascular [2]. O atendimento cardiológico pediátrico torna-se desafio para toda equipe multiprofissional, uma vez que o impacto das cardiopatias tem repercussões significativas na qualidade de vida e na sobrevida destes [1]. Experiências dos programas de elevado desempenho mostram que os cuidados intensivos em crianças com cardiopatias congênitas são mais bem realizados por uma equipe bem estruturada, comprometida com medicina especializada e treinada em cuidados com estes pacientes [5]. A fisioterapia como membro desta equipe, tem, portanto, como objetivo, prestar assistência para estes, tanto no período pré-operatório quanto no pós-operatório, buscando o aperfeiçoamento de suas manobras, técnicas e intervenções para contribuir com a melhora da qualidade de vida destes indivíduos. Considerações anatômicas e fisiopatológicas As cardiopatias congênitas podem ser classificadas quanto ao fluxo sanguíneo pulmonar em hipofluxo, hiperfluxo ou normofluxo pulmonar e/ou quanto a fisiopatologia ou ao tipo da comunicação das circulações sistêmico pulmonar, shunt, entre esquerda-direita, denominada cardiopatia acianogênica ou direita-esquerda, cardiopatia cianogênica [6,7]. • Hipofluxo pulmonar: está relacionado à hipovolemia pulmonar e presente em cardiopatias obstrutivas do ventrículo direito e da artéria pulmonar, tais como atresia tricúspide, tetralogia de Fallot e atresia pulmonar. Estes indivíduos podem apresentar cianose, dispneia aos grandes esforços com comprometimento do débito sanguíneo pulmonar [6,7]. • Hiperfluxo pulmonar: ocorre nos estados de hipervolemia pulmonar, em patologias que acarretam shunt esquerdadireita como na comunicação interatrial e interventricular, persistência do canal arterial, dupla via de saída do ventrículo direito. Esta alteração exterioriza-se por dispneia, principalmente pela diminuição da complacência pulmonar • • • • resultante do extravasamento do líquido para o interstício pulmonar pela membrana alvéolo-capilar. Esta condição também predispõe a criança a infecções pulmonares de repetição [6,7]. Normofluxo pulmonar: não há alterações de volemia pulmonar como na transposição de grandes artérias. Cardiopatias acianogênicas: caracterizadas pela ausência de cianose; normalmente estes pacientes apresentam dispneia associada a sintomas congestivos (tosse, expectoração com ou sem infecção brônquica) e podem apresentar hipertensão venocapilar pulmonar. As cardiopatias mais comuns são a comunicação interatrial, comunicação interventricular e persistência do canal arterial. As cardiopatias como a estenose aórtica, coarctação da aorta, apesar de serem acianogênicas, não apresentam alterações de fluxo sanguíneo pulmonar [6,7]. Cardiopatias cianogênicas: caracterizadas pela presença de shunt direita-esquerda e cianose. Apresentam dispneias não associadas aos fenômenos congestivos e podem estar acompanhados de sinais de hipóxia cerebral (irritabilidade, torpor, sonolência, crises convulsivas) normalmente resultantes de hipofluxo pulmonar, determinando, ainda, retardo do desenvolvimento proporcional à gravidade da situação. As cardiopatias cianogênicas mais frequentes são a tetralogia de Fallot, transposição das grandes artérias, atresia tricúspide, síndrome do coração esquerdo hipoplásico, entre outras [6,7]. Hipertensão pulmonar: situação frequente que acompanha as cardiopatias congênitas. Define-se hemodinamicamente por pressão média da artéria pulmonar acima de 25 mmHg em repouso com pressão de oclusão da artéria pulmonar menor de 15 mmHg. Do ponto de vista anatomopatológico existem duas formas de desenvolver a hipertensão pulmonar. A primeira está associada à presença de comunicação sistêmico pulmonar com shunt esquerda-direita levando ao aumento do fluxo sanguíneo pulmonar (hiperfluxo pulmonar), cuja incidência está diretamente relacionada com o tipo e o tamanho do defeito. A resistência vascular pulmonar pode exceder a resistência vascular sistêmica revertendo o shunt para direita-esquerda, podendo levar a criança a apresentar cianose. A segunda forma está associada ao aumento da espessura da parede das arteríolas bem como hipertrofia dos vasos periféricos, resultando em vasoconstrição, provavelmente causada por hipóxia pela cardiopatia. A redução do fluxo pulmonar acentua ainda mais o grau desta hipóxia. Esta condição está presente em cardiopatias cianogênicas como a transposição de grandes artérias e síndrome da hipoplasia do coração esquerdo [8,9]. Apesar dos avanços obtidos nos últimos anos em relação ao tratamento da hipertensão pulmonar, principalmente com a utilização do Óxido Nítrico inalatório (NO), que é vasodilatador pulmonar seletivo, observa-se mortalidade elevada nestes pacientes principalmente em recém-nascidos, por isso Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 se deve instituir tratamento clínico precoce para estabilizar o quadro e deixá-los em condições de serem submetidos ao tratamento cirúrgico [8,9]. Considerações cirúrgicas A abordagem cirúrgica deve ser planejada baseando-se no diagnóstico pré-operatório, tanto do ponto de vista funcional quanto anatômico para fornecer dados suficientes com o objetivo de minimizar os riscos intraoperatórios e buscar melhores resultados no pós-operatório. Os resultados cirúrgicos têm sido cada vez melhor graças à melhora das técnicas diagnósticas, anestésicas, perfusionais, dos cuidados pós-operatórios alterando a história natural destas cardiopatias, principalmente quando tratado no primeiro ano de vida da criança [3]. São raras as contraindicações cirúrgicas, em que se opta por conduta conservadora; neste caso a longevidade natural deve ser maior a apresentada pela evolução pós-operatória, ou ainda nas situações nas quais os defeitos são discretos, a ponto de não interferirem na evolução natural [10]. A escolha para a conduta conservadora ou cirúrgica, tanto paliativa quanto corretiva, portanto, define-se a partir da análise da história natural dos defeitos cardíacos conjuntamente com a presença ou não de síndromes genéticas como a síndrome de Down [10]. Atualmente, com a evolução supracitada, possibilitou a reparação total de diversos defeitos cardíacos congênitos em pacientes de baixa faixa etária, incluindo neonatos, contrastando com períodos anteriores quando se preferia correções paliativas pela gravidade das cardiopatias [3]. • Cirurgias paliativas: Quando o defeito anatômico apresentar impossibilidade de correção cirúrgica que restabeleça a anatomia cardíaca normal, ou pela gravidade anatômica da malformação ou pelo risco cirúrgico elevado, são indicados os procedimentos paliativos até que a criança tenha condições ideais de idade e peso para realizar a cirurgia corretiva [10,11]. Em alguns casos a anatomia do coração é tão alterada que a correção total torna-se impraticável, e nestas condições, as cirurgias paliativas acabam tornando-se definitivas [10]. As cirurgias paliativas visam atingir os seguintes objetivos [11,12]: a)Aumentar o fluxo arterial pulmonar através de anastomoses sistêmico-pulmonares: tem como objetivo aumentar o fluxo pulmonar e a saturação de oxigênio sistêmico em doentes com cardiopatias congênitas cianogênicas. Possibilita a melhora da capacidade funcional do paciente e o desenvolvimento da árvore arterial pulmonar e como complicação pode ser citada o aumento excessivo de fluxo sanguíneo pulmonar e consequente congestão pulmonar. As cirurgias mais frequentemente utilizadas são a de Blalock-Taussig (shunt da artéria subclávia para a artéria pulmonar) e o shunt central (shunt da aorta para a artéria pulmonar) 381 utilizadas em cardiopatias como a tetralogia de Fallot, atresia pulmonar, atresia tricúspide com estenose pulmonar e ventrículo único com estenose pulmonar, transposição de grandes artérias com comunicação interventricular e estenose pulmonar. b)Reduzir o fluxo arterial pulmonar através da bandagem do tronco ou artéria pulmonar: utilizada em cardiopatias com hiperfluxo pulmonar para se prevenir a doença vascular pulmonar que resulta em hipertensão pulmonar. Está indicado no defeito septal átrio-ventricular completo, isomerismo atrial, ventrículo único com hiperfluxo pulmonar, transposição de grandes artérias com comunicação interventricular entre outros. c) Aumentar a mistura sanguínea arteriovenosa através de atriosseptectomia ou septostomia atrial: indicada em alguns casos de transposição de grandes artérias em pacientes com idade superior a três meses e em algumas lesões complexas não susceptíveis de imediato a correção total como a dupla via de ventrículo direito ou esquerdo com estenose pulmonar e hipoplasia de um dos ventrículos. A septostomia atrial por balão introduzido por Rashkind e Miller praticamente suplantou a septectomia cirúrgica nos recém-nascidos. d)Redução do trabalho ventricular através da anastomose cavopulmonar (cirurgia de Glenn): tem como objetivo divergir o sangue da veia cava superior para as artérias pulmonares com preservação da continuidade entre as artérias pulmonares direita e esquerda. Desta forma, aproximadamente um terço do retorno venoso sistêmico é drenado diretamente para o pulmão, sem passar pelo coração, minimizando o trabalho ventricular. Este procedimento tem sido realizado em pacientes com atresia tricúspide e hipoplasia de ventrículo direito. Este procedimento precede a cirurgia de Fontan reduzindo a sua mortalidade. e) Cirurgia de conexão cavopulmonar total (cirurgia de Fontan): esta cirurgia tem como objetivo conectar a veia cava inferior na artéria pulmonar, separando-se a circulação sistêmica e pulmonar e colocada em série sem a interposição de um ventrículo normal. Nesta cirurgia a circulação é caracterizada por apresentar fluxo pulmonar passivo. f) Cirurgia de Norwood: a reconstrução paliativa estagiada descrita por Norwood et al., em 1983, vem sendo utilizada crescentemente como alternativa cirúrgica em crianças com síndrome da hipoplasia do ventrículo esquerdo. O procedimento envolve a criação de uma ampla comunicação entre o ventrículo direito sistêmico através do tronco da artéria pulmonar e a aorta descendente e arco aórtico reconstruídos e o estabelecimento de fonte controlada de fluxo pulmonar por meio de uma anastomose sistêmico-pulmonar. Esta cirurgia permite com que a criança tenha condições hemodinâmicas para ser submetida aos próximos estágios que é a cirurgia de Glenn e em seguida a cirurgia de Fontan. • Cirurgias corretivas ou definitivas: Com a intervenção cirúrgica corretiva precoce se obteve a cura de anomalias 382 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 congênitas anteriormente citadas como graves como a transposição de grandes artérias e a tetralogia de Fallot, já no período neonatal [10]. Acompanhado a este fato, observou-se redução progressiva de mortalidade pós-operatória e, como consequência, há um número maior de adolescentes e adultos com anomalias congênitas [3]. Desta forma, a prevenção, o diagnóstico, a monitorização e o tratamento destas cardiopatias devem ser realizados independentemente da idade do paciente, envolvendo equipes de médicos clínicos e cirurgiões, tanto pediátricos quanto adultos. Podemos dividir a cirurgia cardíaca corretiva em cirurgias extracardíacas e intracardíacas, sendo citadas as principais cardiopatias e respectivas correções cirúrgicas. A maioria das cirurgias intracardíacas é realizada com a utilização de CEC, hipotermia e proteção miocárdica [13,14]. Cirurgias extracardíacas • Persistência do canal arterial (PCA): A PCA é uma das formas mais comuns de cardiopatia congênita. De modo geral é assintomática. Somente pacientes com PCA de grande calibre podem evoluir com insuficiência cardíaca, hipodesenvolvimento e infecção pulmonar de repetição. Pode estar associada às cardiopatias congênitas cianóticas (nesses casos a PCA é benéfica, pois a diminuição do fluxo na artéria pulmonar é compensada pelo shunt esquerda-direita do canal) e às cardiopatias congênitas acianóticas (nesses casos a PCA aumenta a sobrecarga cardíaca dos pacientes). O tratamento da PCA é cirúrgico no qual se realiza a ligadura e secção do canal arterial, salvo algumas situações especiais. A idade ideal para correção cirúrgica é entre os 6 e 24 meses. • Coarctação de aorta: É caracterizada pelo estreitamento da artéria entre o arco aórtico e a aorta descendente, causando diminuição do fluxo sanguíneo sistêmico a partir da estenose do vaso. Seu diagnóstico é, geralmente, feito na infância e os principais achados clínicos no paciente adulto são a hipertensão arterial sistêmica, diferença entre a amplitude dos pulsos e da pressão arterial entre os membros superiores e inferiores. O objetivo do tratamento cirúrgico é corrigir a obstrução no nível da região estenosada com o mínimo risco de reestenose com anastomose término-terminal, ou a interposição de um enxerto tubular ou ainda com angioplastia percutânea por balão. • Interrupção de arco aórtico: Cardiopatia complexa, com alto índice de mortalidade e frequentemente acompanhada de outras anomalias. A cirurgia se baseia na anastomose da região de interrupção do arco aórtico e envolve durante o seu procedimento a circulação extracorpórea (CEC) com hipotermia profunda e parada circulatória ou baixo fluxo de perfusão. Cirurgias intracardíacas • Defeitos do septo interatrial (CIA): é causado habitualmente por fechamento incompleto da parede entre os átrios direito e esquerdo durante o desenvolvimento embrionário. Podem ser classificados em vários tipos: forame oval patente, ostium secundum (tipo fossa oval), seio venoso (tipo veia cava superior) e seio coronário. Na infância os sintomas podem passar despercebidos, mas com o decorrer dos anos complicações como disritmias ou hipertensão pulmonar podem surgir. No exame físico, a pessoa com CIA pode apresentar sopro cardíaco claramente audível. A correção cirúrgica da CIA (atriosseptoplastia) pode ser necessária, especialmente se o paciente tem sintomas secundários ao desvio de sangue entre as câmaras cardíacas. • Defeitos do septo ventricular (CIV): É a presença de comunicação entre os ventrículos. Morfologicamente são classificados em vários tipos: perimembranoso (80% dos casos), via de saída (5-7%), via de entrada (5-8%) e muscular (5-20%). Como na CIA, a repercussão clínica da CIV depende do tamanho dessa abertura, o tempo de evolução da patologia e a presença ou não de outras anormalidades cardíacas e pulmonares concomitantes. A presença de hipertensão pulmonar agrava o quadro e pode inclusive limitar a eficácia do tratamento cirúrgico (ventriculosseptoplastia). • Defeito do septo atrioventricular: defeito cardíaco que se caracteriza por grande comunicação entre átrios e ventrículos e valva átrio-ventricular única. Pode ser na forma total, valva atrioventricular comum e grandes comunicações intercavitárias, muitas vezes associada à Síndrome de Down ou na forma parcial, com conexão incompleta entre as cúspides superior e inferior esquerdas, com CIA presente e CIV ausente. A indicação cirúrgica na forma total é precoce, nos primeiros seis meses de vida e consiste na identificação e fechamento da CIV e CIA e na definição e separação da valva atrioventricular única em duas valvas direita e esquerda. Na forma parcial, a hipertensão pulmonar encontra-se geralmente ausente e a intervenção pode ser realizada eletivamente após o primeiro ano de vida. A bandagem do tronco pulmonar, como cirurgia paliativa, somente é realizada na presença de importante repercussão ventricular. • Atresia tricúspide: malformação complexa, caracterizada pela ausência de comunicação atrioventricular direita (ausência da válvula tricúspide), associada a CIA, graus variáveis de hipodesenvolvimento do ventrículo direito e comunicação entre as circulações sistêmica e pulmonar, por meio de uma CIV. A indicação cirúrgica encontra-se relacionada à magnitude do fluxo sanguíneo pulmonar, variando a técnica de acordo com a idade do paciente. Geralmente os pacientes evoluem com hipertensão pulmonar. Pacientes com fluxo pulmonar reduzido que necessitem de cirurgia antes dos seis meses de idade são submetidos à Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 • • • • • anastomose sistêmico-pulmonar. Em idades mais avançadas realiza-se a cirurgia cavopulmonar bidirecional ou total. Drenagem anômala de veias pulmonares: é uma malformação do retorno venoso pulmonar em que as veias pulmonares estão direta ou indiretamente ligadas ao átrio direito, associada a um desvio esquerda-direita para permitir que o retorno venoso pulmonar atinja a circulação sistêmica. A sua mortalidade é elevada quando não corrigida precocemente e aqueles que sobrevivem podem evoluir com quadro de hiperfluxopulmonar e hipertensão pulmonar importante contraindicando o procedimento cirúrgi Anomalia de Ebstein: caracterizada por malformação da valva tricúspide e tem consequências funcionais variáveis, de acordo com a gravidade da malformação. A indicação cirúrgica está relacionada ao grau de insuficiência, à presença de cianose, à presença de arritmias paroxísticas e à insuficiência cardíaca. O defeito valvar é corrigido através de plastias e ou substituição valvar. Tetralogia de Fallot: caracteriza-se pelo hipodesenvolvimento do infundíbulo do ventrículo direito com deslocamento do septo infundibular, produzindo estenose ou atresia da via de saída do ventrículo direito e comunicação interventricular. Em sua descrição original, são descritos como elementos básicos, a estenose pulmonar, a dextroposição da aorta, a comunicação interventricular e a hipertrofia do ventrículo direito. A indicação cirúrgica e a técnica de abordagem dependem das inúmeras variáveis anatômicas e clínicas. Os procedimentos definitivos mais realizados são a ventriculosseptoplastia e a ampliação de via de saída de ventrículo direito. Dupla via de saída do ventrículo direito: na sua definição clássica, caracteriza-se como malformação cardíaca na qual ambos os vasos da base se originam totalmente do ventrículo direito, ou em sua maior parte (50%). Geralmente associa-se à CIV. A indicação cirúrgica varia de acordo com o espectro da malformação, sendo optado por cirurgias paliativas como Blalock-Tausig e Bandagem do tronco pulmonar e cirurgias corretivas como a o fechamento da CIV com retalho em forma de túnel intraventricular conectando o ventrículo esquerdo à aorta e a Cirurgia de Rastelli que é a interposição de tubo extraventricular entre o ventrículo direito e a artéria pulmonar. Transposição das Grandes Artérias (TGA): má-formação, que representa 8-10% do total das cardiopatias congênitas, caracterizada pela presença de conexão atrioventricular concordante e conexão ventrículo-arterial discordante: a aorta se origina do ventrículo direito e o tronco pulmonar do ventrículo esquerdo. O tratamento de emergência consiste em estabelecer mistura adequada, obtida pela atriosseptostomia por cateter-balão (Técnica de Rashkind). No período neonatal até aproximadamente um mês, a correção anatômica pela Operação de Jatene, que é a operação no plano arterial, com redirecionamento sanguíneo no nível dos grandes vasos, é a técnica de escolha. A correção no • • • • 383 plano atrial, também conhecida como operação de redirecionamento, pelas técnicas de Senning e Mustard, criandose túneis intracardíacos, redirecionando, respectivamente, o retorno venoso sistêmico para VE (AP), e o retorno venoso pulmonar para o VD (Aorta) passou a ser empregada em crianças maiores. Em pacientes com TGA associada a CIV e obstrução da via de saída do VE é utilizada a cirurgia de Rastelli. A técnica consiste no fechamento da CIV, de forma que o sangue é direcionado para Aorta e na conexão do VD com a AP, pelo tubo valvulado externo. Ventrículo único: refere-se às anomalias cardíacas nas quais há uma única câmara ventricular funcional de onde se originam os vasos de base. Pode decorrer devido à falha da septação ventricular ou hipoplasia de um dos ventrículos. A indicação cirúrgica é precoce nos pacientes sem estenose pulmonar associada, e nos pacientes com estenose pulmonar associada. O tratamento cirúrgico consiste de procedimentos paliativos como a bandagem do tronco pulmonar com objetivo posterior de realizar a cirurgia cavopulmonar total. Hipoplasia do coração esquerdo: é uma doença na qual o ventrículo esquerdo e a aorta apresentam graus variados de hipoplasia. Vem sempre acompanhada de estenose ou atresia da valva mitral e/ou aórtica. Atualmente, existem duas formas de tratamento que são o transplante cardíaco neonatal e a reconstrução paliativa estagiada descrita por Norwood et al. em 1983. O transplante cardíaco tem importantes limitações, que são a pequena disponibilidade de doadores compatíveis e os efeitos colaterais adversos da imunossupressão a longo prazo. Assim sendo, a operação de Norwood vem sendo utilizada crescentemente. O primeiro estágio corresponde à cirurgia de Norwood. Em seguida, é realizada a cirurgia de Glenn. O terceiro estágio é completado com a operação de Fontan com derivação cavopulmonar total, com direcionamento do fluxo da veia cava inferior para o pulmão, concluindo o tratamento cirúrgico. Tronco arterial comum: caracteriza-se por uma grande artéria única que deixa a base do coração e de onde se origina as circulações coronariana, sistêmica e pulmonar e normalmente associada a uma CIV. O tratamento cirúrgico deve ser o mais precoce possível devido a alta mortalidade e consiste no fechamento da CIV, divisão das artérias pulmonares do tronco comum e restabelecimento da conexão entre o ventrículo direito e as artérias pulmonares. Origem anômala de artéria coronária: Representa uma das causas mais comuns de isquemia e infarto do miocárdio em crianças, uma vez que a artéria coronária esquerda originase da artéria pulmonar. A criança pode desenvolver áreas de múltiplos infartos, fibroses e evoluir com insuficiência cardíaca nos primeiros meses de vida. O tratamento cirúrgico consiste na reconstituição das coronárias originando da aorta. 384 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Pós-operatório imediato em cirurgia cardíaca Para acompanhar todo o resultado até aqui estabelecido, é de fundamental importância a continuidade de informações entre toda a equipe para evitar as possíveis complicações decorrentes da cirurgia permitindo adequar à melhor conduta pós-operatória. Na experiência da unidade de terapia intensiva cirúrgica do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InCor - HCFMUSP) estes pacientes são admitidos, logo após a cirurgia, e, neste momento, é de fundamental importância receber as informações do momento intraoperatório, tais como: • diagnóstico da cardiopatia encontrada: em algumas situações o diagnóstico no pré-operatório pode não coincidir com a cardiopatia no intraoperatório, embora venha sendo minimizado cada vez mais pela evolução das técnicas diagnósticas [2]; • procedimento cirúrgico realizado: paliativa ou corretiva [2]; • tipo de anestésicos [2], dificuldades de intubação orotraqueal, dificuldades ventilatórias; • tempo de cirurgia: quanto maior o tempo maiores riscos de apresentar alterações metabólicas e hormonais [2]; • tempo em circulação extracorpórea (CEC): embora sua aplicabilidade seja fundamental, ela não está livre de riscos e complicações como uso da hemodiluição, a ocorrência de coagulopatias, retenção hídrica, a hipotermia podendo levar a hipóxia tecidual e acidose lática, e o risco da síndrome da resposta inflamatória sistêmica que ocorre com o aumento da permeabilidade vascular devido a lesão endotelial por exposição sanguínea a componente não-endotelial [2]; • uso de hemoderivados e drogas vasoativas [1]; • intercorrências intraoperatórias como parada cardiorrespiratória, lesões do miocárdio e das grandes artérias [1]; • impossibilidade de fechar o esterno: em algumas situações, devido a instabilidade hemodinâmica, muitas vezes, devido a tempo de CEC prolongado, é necessário a manutenção do esterno aberto até a estabilidade do quadro, e nestas situações deve se ter atenção especial devido a instabilidade torácica [1]. Uma vez admitido realiza-se a monitorização da criança, tanto parâmetros hemodinâmicos quanto respiratório, urinário, gástrico e de temperatura; o controle dos exames laboratoriais e de adequação das drogas [1]. Em relação ao sistema respiratório, a maioria das crianças que são encaminhadas à unidade de terapia intensiva chega com intubação orotraqueal. Em algumas cirurgias como a correção de PCA e CIA e com estabilização hemodinâmica a extubação pode ser realizada ainda em sala operatória. Uma vez intubada a criança é conectada a ventilador mecânico e os parâmetros ventilatórios ajustados de acordo com a idade e a gasometria arterial [1]. Deve ser levado em conta o tipo de cirurgia, sendo a definitiva com saturação de oxigênio acima de 90% e cirurgia paliativa com a mesma saturação acima de 70%. Em relação à capnografia espera-se pressão de dióxido de carbono em torno de 35 a 45 mmHg. A microatelectasia pode ser evitada com instituição de pressão expiratória final em vias aéreas (PEEP) em torno de 4 ~ 5cmH2O. O uso de óxido nítrico (NO) acoplado ao ventilador mecânico pode ser uma alternativa para as crianças com sinais de hipertensão pulmonar [2]. O NO inalatório promove vasodilatação seletiva apenas das regiões ventiladas, melhorando a relação ventilação-perfusão, e consequentemente a oxigenação, reduzindo a pressão arterial pulmonar [16]. A expansibilidade torácica, bem como a ausculta e o volume exalado devem ser avaliados para instituir a melhor pressão aplicada ao sistema respiratório da criança. Em algumas cirurgias como a de Glenn e de Fontan, onde é realizada a anastomose direta das veias cavas na artéria pulmonar, o fluxo sanguíneo pulmonar ocorre em função da diferença de pressão entre a circulação sistêmica e pulmonar, e, portanto, deve ser utilizada pressão intratorácica de forma criteriosa e menor possível para evitar repercussões hemodinâmicas [17]. Outra particularidade é a cirurgia de Norwood, que, para a adaptação hemodinâmica, são utilizadas baixas concentrações de oxigênio para provocar vasoconstrição pulmonar e, assim, aumentar a resistência vascular pulmonar permitindo a melhor distribuição do fluxo sanguíneo sistêmico e pulmonar [18]. O comprometimento da função renal é outro ponto a ser considerado no período pós-operatório. A sua incidência varia de 2 a 10% e tem maior prevalência nas cardiopatias cianogênicas. O tempo de CEC, bem como o tempo de cirurgia prolongado, além de uso de drogas nefrotóxicas, são alguns dos fatores de risco associados à disfunção renal. A medida terapêutica diante de insuficiência renal aguda baseia-se na manutenção do débito cardíaco, instituição de drogas que estimulem a diurese, bem como outros procedimentos como a diálise peritoneal e a hemodiálise por ultrafiltração [1,19]. Assim como em cirurgia cardíaca em adulto, as crianças não estão livres de apresentarem complicações neurológicas. Os eventos estão diretamente relacionados ao tempo de cirurgia, intercorrências operatórias e alterações hidroeletrolíticas e metabólicas. Dentre as manifestações mais comuns podem ser citadas as agitações psicomotoras e as crises convulsivas em diferentes graus. A conduta frente às manifestações neurológicas baseia-se em manobras que visam reduzir o risco de edema cerebral, associada à manutenção de boa oxigenação cerebral e investigação e correção dos fatores causadores deste distúrbio [1]. Fisioterapia respiratória A atuação fisioterapêutica hospitalar em pediatria se faz necessária nos cuidados pré e pós-operatória das crianças com cardiopatias congênitas. Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Pacientes com cardiopatias complexas podem apresentar comprometimento da função pulmonar relacionado à hipoplasia pulmonar, doença pulmonar restritiva, alterações posturais, como a escoliose, ou ainda paralisia diafragmática secundária a lesão do nervo frênico [17]. O objetivo principal é otimizar a função respiratória e, desta forma, facilitar as trocas gasosas, adequar a relação ventilação-perfusão, mantendo as vias aéreas pérvias, prevenindo as complicações respiratórias além de eleger o suporte ventilatório mais adequado para determinada situação. Fisioterapia no pré-operatório No período pré-operatório, é de fundamental importância o conhecimento e a avaliação das repercussões respiratórias das cardiopatias. Algumas cardiopatias com hiperfluxo pulmonar, frequentemente, cursam com sinais de hipersecreção pulmonar, desconforto respiratório e quadro de congestão pulmonar. Em outras situações as crianças podem apresentar baixa imunidade pelo seu hipodesenvolvimento e apresentar infecções pulmonares ou de vias aéreas superiores, contraindicando o procedimento cirúrgico [7]. A atuação fisioterapêutica inicia-se por avaliação completa da criança, desde o conhecimento do seu histórico por meio do levantamento dos registros em seu prontuário, bem como uma entrevista dos pais/cuidadores e, principalmente, pela aplicação de propedêutica adequada, por meio de inspeção, palpação, ausculta pulmonar, além da correta interpretação dos exames complementares para identificar e traçar as condutas apropriadas. Mais recentemente, para a população pediátrica, com a finalidade de avaliar a função cardiovascular global, incluindo a capacidade física, estão sendo propostos testes de exercícios, como, por exemplo, o Teste de Caminhada de 6-minutos, mostrando-se importante marcador de estratificação prognóstica para a mortalidade dos pacientes [20,21]. Deve se evitar as descompensações hemodinâmicas e diminuir o gasto metabólico e, desta forma, a fisioterapia ser aplicada somente em casos claramente indicados. Existem relatos de que a aplicação inadvertida da fisioterapia pode induzir ao broncoespasmo, aumentar a hipertensão pulmonar e piorar os parâmetros fisiológicos como a frequência cardíaca, respiratória e a oxigenação [22]. Uma vez realizada a avaliação é traçada a conduta fisioterapêutica objetivando a promoção da higiene brônquica, a melhora do trabalho respiratório e a otimização da oxigenação propiciando a criança apta para o procedimento cirúrgico. Fisioterapia no pós-operatório As crianças no pós-operatório estão mais predispostas a desenvolverem insuficiência respiratória por causa do baixo desenvolvimento muscular da caixa torácica, das alterações 385 da complacência torácica e, principalmente, pulmonar e da deficiente estabilização da ventilação colateral. A fisioterapia deve ser iniciada logo após o término da cirurgia, com especial atenção a instabilidade hemodinâmica e sangramentos significativos [1]. É de fundamental importância o conhecimento do procedimento cirúrgico, das intercorrências no intraoperatório e a evolução natural do pós-operatório para que o fisioterapeuta possa tomar a sua decisão desde a escolha da forma de ventilação da criança e toda a sua conduta no pós-operatório. Na admissão da criança na unidade pós-operatória deve se ajustar inicialmente os seguintes parâmetros ventilatórios [23]: Pico de pressão inspiratória (PPI): Tempo inspiratório (Ti): Frequência respiratória (f): Pressão expiratória positiva final (PEEP): Volume corrente exalado (VCex): Fração inspirada de oxigênio (FiO2): 20 cm H2O De acordo com a idade (Tabela 1) De acordo com a idade (Tabela 1) 5 cm H2O 8 a 10 ml/kg 0,6 Tabela I - Parâmetros da ventilação mecânica de acordo com a idade. Idade RN – 3 m 3m–1a 1–4a 5 – 7 a (40 kg) 7 – 10 a 10 – 15 a 15a Tempo inspiratório (s) 0,5 - 0,7 0,8 - 0,9 0,9 - 1,0 1,1 1,2 1,4 1,5 Frequência respiratória (rpm) 22 - 25 20 20 20 18 15 12 - 14 Fonte: Manual de Rotinas do Serviço de Fisioterapia do Instituto do Coração [23]. Em seguida, realiza-se a avaliação fisioterapêutica à beira do leito por meio da ausculta pulmonar, para avaliação da ventilação pulmonar bilateral; avaliar a expansão pulmonar e readequar os parâmetros ventilatórios e monitorizar a oxigenação periférica com oxímetro de pulso. Lembrar que as pressões utilizadas devem sempre considerar a hemodinâmica da criança, evitando repercussões negativas sobre a mesma. Em seguida procede-se a avaliação radiológica para observar a integridade do parênquima pulmonar e do espaço pleural, bem como o posicionamento adequado da cânula orotraqueal. A avaliação gasométrica permite a adequação dos parâmetros ventilatórios até o desmame completo e a extubação. Deve ser lembrado que os vasos pulmonares são sensíveis às alterações hipercápnicas e hipóxica podendo causar ou aumen- 386 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 tar a hipertensão pulmonar levando a redução da oxigenação e a descompensação hemodinâmica. Algumas particularidades, no que diz respeito a cuidados que devemos ter em relação à ventilação mecânica, são importantes e devem ser lembradas [23]: 1)É de fundamental importância a umidificação dos gases para prevenção da formação de tampões mucosos, uma vez que, além da existência da via aérea artificial, aumenta significativamente a resistência da via aérea da criança; 2)Após procedimentos paliativos e persistindo shunt direitaesquerda, espera-se saturação de oxigênio entre 75 a 80%, o que corresponde PaO2 de aproximadamente 40 ~ 50mmHg; 3)Nos pacientes submetidos a cirurgia de Fontan e Glenn, o fluxo pulmonar depende da Pressão Venosa Central (PVC), que deve ser sempre mantida em valores supranormais (15 ~ 18mmHg). Para isso devem ser ventilados objetivando menor pressão intratorácica por meio de menor pressão de pico inspiratória, menor tempo inspiratório, maior frequência respiratória e menor PEEP e a extubação precoce; 4)Crianças submetidas às correções mais complexas se beneficiam permanecendo sedados e intubados por 24 horas ou mais; 5)Crianças submetidas à cirurgia de Norwood devem ser ventilados com FiO2 reduzida e permitir PaCO2 discretamente aumentada a fim de se evitar a vasodilatação pulmonar importante e consequente desequilíbrio de fluxo sanguíneo sistêmico. O desmame deverá ser lento, principalmente pela instabilidade hemodinâmica; 6)Crianças com hipertensão pulmonar ou que se beneficiam com baixa resistência vascular pulmonar devem ser mantidas sedadas, hiperventiladas evitando-se a hipoxemia, a hipercapnia e a acidose respiratória e, se necessário, administrar óxido nítrico. Técnicas fisioterapêuticas na criança sob ventilação mecânica Durante a ventilação mecânica os procedimentos fisioterapêuticos objetivam a manutenção e a promoção da higiene brônquica, a reversão de possíveis atelectasias, além do desmame protocolado para uma extubação segura às crianças. Em casos de ventilação mecânica prolongada, inicia-se também a estimulação motora, desde que este procedimento não interfira na hemodinâmica das mesmas. As manobras mais frequentemente utilizadas são: 1)Vibrocompressão torácica: por meio da compressão e movimentos oscilatório das mãos sobre o tórax, provocam aumento do fluxo expiratório e tixotropismo favorecendo a remoção de secreção (vibração de 13 Hz e compressão de 1 a 3 Hz) [24]; 2)Insuflação pulmonar manual com vibrocompressão torácica (Bag squeezing): consiste na hiperinsuflação pulmonar por meio de bolsa de distensão manual (AMBU e/ou baraca), conectado a fonte de oxigênio, fornecendo fluxo de ar turbulento, realizando a hiperventilação manual associado ao movimento de vibrocompressão torácica na fase expiratória; 3)Aspiração endotraqueal: remoção de secreção por meio da aplicação de pressão negativa. Deve ser realizada a hiperventilação ou a hiperoxigenação prévia. O procedimento deve ser asséptico e se necessário instilar soro fisiológico para facilitar a fluidificação e a remoção da secreção. Após a estabilização do quadro hemodinâmico inicia-se o processo de desmame e associado ainda ao adequado nível de consciência e bom padrão ventilatório procede-se a extubação. Após a extubação, deve-se fornecer oxigênio umidificado por cateter de oxigênio e titular e monitorizar a oxigenação com oxímetro de pulso e gasometria. Uma das complicações frequentes logo após a extubação é a obstrução das vias aéreas por edema subglótico. Uma vez identificada, pode ser administrada inalação com adrenalina (discutida com a equipe médica), e em caso de edema subglótico por intubação prolongada, pode ser instituído tratamento com corticóide. Os procedimentos fisioterapêuticos mais frequentes após a extubação baseiam-se nas técnicas de remoção de secreção brônquica e técnicas de reexpansão pulmonar: 1)Inaloterapia ou aerossolterapia: terapia que se utiliza a via inalatória para o tratamento e prevenção de doenças de vias aéreas superiores. Tem como objetivo facilitar a fluidificação de secreções com administração de solução fisiológica, além de ser uma via de administração de medicamentos [24]; 2)Vibrocompressão torácica: como descrito acima; 3)Expiração lenta prolongada (ELPr): técnica passiva de auxílio à expiração obtida por meio de pressão manual torácica externa, lenta, iniciada no final de uma expiração espontânea e realizada até o volume residual. Tem como objetivo obter volume expiratório maior que de uma expiração normal, melhorando a desinsuflação pulmonar, evitando o estreitamento brônquico observados nas técnicas de expiração forçada [24]; 4)Desobstrução rinofaríngea retrógrada: tem como objetivo promover a limpeza das secreções localizadas na região rinofaríngea utilizando-se o reflexo inspiratório de Hering-Brauer após expiração lenta e prolongada. A técnica consiste em fechar a boca do bebê ao final da expiração prolongada, realizada com apoio manual torácico, forçando uma inspiração pelo nariz [25]; 5)Aumento do fluxo expiratório (AFE): técnica de esvaziamento passivo das secreções por aumento do fluxo expiratório e apoio abdominal. Tem como objetivo trazer as secreções da periferia pulmonar para coletá-las nos brônquios ou na traqueia pelo movimento toracoabdo- Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 minal sincronizado, na fase expiratória, criado pelas mãos do fisioterapeuta modulando o volume corrente que se pretende mobilizar [24]; 6)Aspiração nasotraqueal: Tem como objetivo estimular a tosse e retirar secreções brônquicas, realizadas após as manobras de higiene brônquica em crianças que não apresentam tosse eficaz e consequentemente não conseguem eliminar as secreções pulmonares; deve se administrar oxigênio durante todo o procedimento [26]; 7)Insuflação pulmonar manual com máscara facial: consiste na hiperinsuflação pulmonar por meio de uma bolsa de distensão manual (AMBU), conectado a rede de oxigênio, a qual é acoplada máscara facial, na face da criança. Tem como objetivo manter volumes e capacidades pulmonares, pela hiperinsuflação, e favorecer a eliminação de secreções brônquicas, pelo aumento do fluxo expiratório quando associado à vibrocompressão torácica. A técnica deve ser realizada com dois fisioterapeutas e não deve ser realizada em casos de fístulas ou pneumotórax [27]; 8)CPAP nasal: proporciona a manutenção de pressão positiva durante todo o ciclo respiratório. Seu principal objetivo é a melhora da hipoxemia pelo aumento da capacidade residual funcional e da capacidade vital. Está indicado em crianças com desconforto respiratório de várias origens: hipoxemia, quadro congestivo, atelectasia e disfunção do nervo frênico. O sistema é aplicado por meio de ventilador mecânico na modalidade CPAP ou espontânea, acoplado a criança por meio de pronga nasal e deve ser iniciado com CPAP de 5 a 6 cmH2O, com fluxo suficiente para manter a pressão adequada e FiO2 necessária para manter PaO2 desejada. Deve se dar especial atenção e cuidados quanto à agitação e não adaptação da criança, hipersecreção pulmonar, necrose nasal, obstrução nasal, distensão gástrica, hipercapnia e hipoventilação e alterações hemodinâmicas [27]. Em crianças maiores utiliza-se outras técnicas classicamente conhecidas por seu uso em pacientes adultos como a técnica de expiração forçada (TEF), expiração lenta total com a glote aberta em decúbito lateral (ELTGOL), exercícios respiratórios, ciclo ativo da respiração, drenagem autógena, Flutter®, inspirômetro de incentivo, respiração por pressão positiva intermitente (RPPI) e ventilação não invasiva por meio de BIPAP® (ventilação com pressão positiva com dois níveis pressóricos). Uma vez a criança estabilizada e sem uso de drogas vasoativas, é encaminhada para a enfermaria onde se dá a continuidade dos cuidados no pós-operatório até a sua alta hospitalar. Fisioterapia e estimulação motora Além da atuação no sistema respiratório, a fisioterapia também tem a sua atuação reconhecida no campo do desenvolvimento motor e lesões neurológicas, objetivando 387 identificar o atraso no desenvolvimento das capacidades neuropsicomotora, muito comum em crianças com cardiopatias, e diminuir o seu impacto por meio de estimulações do seu desenvolvimento. A lesão cerebral é uma das complicações mais significantes em cirurgias de cardiopatias congênitas. Quanto menor a criança, maiores são os riscos de lesão cerebral por causa da vulnerabilidade de seus órgãos frente às mudanças agudas de alterações de perfusão e oxigenação. Snookes et al. [28] identificaram que crianças menores de seis meses de idade apresentam prejuízos no desenvolvimento cognitivo e motor, já em crianças acima de um ano, o risco de retardo no desenvolvimento motor foi maior que o cognitivo. Frente à lesão neurológica, a fisioterapia objetiva tratamento mais precoce possível, a fim de contar-se com a maior plasticidade cerebral, evitar-se a fixação de padrões anormais, prevenir contraturas e deformidades e fornecer às crianças a maior quantidade de experiências sensoriais, que constituem estímulo ao desenvolvimento cerebral. O conhecimento do desenvolvimento motor normal, com suas reações e reflexos, é de fundamental importância para que o melhor procedimento seja adotado. A estimulação cognitiva e sensorial deve ser iniciada desde a internação da criança, independente do setor que ela esteja, e do uso de artefatos como o ventilador mecânico, cateteres e monitorização. Conclusão O aumento de sobrevida das crianças, com o avanço tecnológico e de novos recursos, também trouxe, como consequência, o aumento do número de crianças criticamente crônicas sujeitas ao aumento da morbidade das mesmas, uma vez que os efeitos do imobilismo são proporcionais ao tempo. Além disso, a desnutrição é condição frequente em cardiopatias congênitas e deve ser respeitada limitando o gasto energético e prevenindo fadiga. Desta forma, a fisioterapia motora lança mão de recursos como exercícios passivos, alongamentos para a manutenção de amplitude articular e prevenção de contraturas, posicionamento, quebra de padrões neurológicos, exercícios de controle cefálico e tronco, exercícios proprioceptivos, estimulação vestibular (postura e equilíbrio) além da estimulação de todos os outros campos como visual, tátil, auditiva e oral, como principais técnicas para buscar o desenvolvimento neuropsicomotor adequado das crianças. Referências 1. Abellan DA, Gimenez SC. Peculiaridades no pós-operatório em cirurgia cárdio-infantil. In: Auler Junior JOC, Almeida S et al. Pós-operatório de cirurgia torácica e cardiovascular. Porto Alegre: Artmed; 2004. p.266-79. 2. João PRD, Faria Junior F. Immediate post-operative care following cardiac surgery. 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Cardiopatia congênita cianótica com hiperfluxo pulmonar: quando indicar tratamento cirúrgico e quais as técnicas? In: Timerman A, César LAM. Manual de Cardiologia da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo. São Paulo: Atheneu; 2000. p.517-20. 15.Croti UA, Mattos SS, Pinto Jr VC, Aiello VD. Cardiologia e cirurgia cardiovascular pediátrica. São Paulo: Roca; 2008. 16.Ryan A, Tobias JD. A 5-year survey of nitric oxide use in a pediatric intensive care unit. Am J Ther 2007;14:253-8. 17.Allan CK. Intensive care of the adult patient with congenital heart disease. Prog Cardiovasc Dis 2011;53:274-80. 18.Maher KO, Pizarro C, Gidding SS, Januszewska K, Malec C, Norwood WI, Murphy JD. Hemodynamic profile after the Norwood procedure with right ventricle to pulmonary artery conduit. Circulation 2003;108(7):782-4. 19.Romão JR, Fuzissima MG, Vidonho Junior AF, Noronha IL, Quintaes PSL, Abensur H, et al. Acute renal failure associated with cardiac surgery in infants. 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Objetivo: Conhecer a história da profissionalização da fisioterapia no mundo ocidental, bem como as novas perspectivas para a profissão no que se refere a sua estruturação, formação e organização (18942010). Metodologia: Trata-se de uma revisão de literatura, realizada a partir da análise aprofundada da leitura do material bibliográfico. Resultados: Apresentamos três categorias oriundas das análises documentais: Massagem: a busca do conhecimento; Reabilitação: o reconhecimento profissional; A fisioterapia na atualidade e perspectivas futuras. Conclusão: A fisioterapia surgiu como profissão utilizando-se da massagem e, posteriormente, desenvolveu sua prática aliada à reabilitação física. Atualmente, a reabilitação permanece como grande área de abrangência do fisioterapeuta, porém ampliou-se para novas perspectivas, como a prevenção de doenças, promoção de saúde e melhoria da qualidade de vida. Introduction: The knowledge of historical aspects related to professionalization of physical therapy, worldwide, is crucial to its understanding, as a new health profession. Objective: To know the history of the professionalization of physical therapy in the Western World, as well as new perspectives on the profession, as regards to its structure, formation and organization (1894-2010). Methods: This was a literature review, carried out after detailed analysis of literature material. Results: We present three categories derived from analysis of documents: Massage: the pursuit of knowledge; Rehabilitation: the professional recognition; Physiotherapy today and perspectives for the future. Conclusion: The physical therapy as a profession emerged using massage and later developed its practice in association with physical rehabilitation. Currently, rehabilitation remains as a large area covered by the physical therapist, but has broadened new perspectives such as disease prevention, health promotion and improved quality of life. Key-words: physical therapy, profession, massage. Palavras-chave: fisioterapia, enfermagem, medicina, história, massagem. Recebido em 27 de junho de 2011; aceito em 5 de agosto de 2011. Endereço para correspondência: Daniela Simoni Espíndola, Rua Nossa Senhora Aparecida, 1205/308 Bl: B, 88117-420 São José SC, Tel: (48) 99583058, E-mail: [email protected] 390 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Introdução A fisioterapia vem se constituindo como profissão na área da saúde, a partir do final do século XIX, integrando os saberes teóricos e práticos basicamente de três profissões anteriormente estabelecidas: a enfermagem, a medicina e a educação física. A primeira contribuiu para o surgimento da profissão por meio da utilização da massagem como ferramenta terapêutica para alívio, principalmente de desconfortos ortopédicos e reumatológicos. A segunda, por sua vez, introduziu os conhecimentos relativos às bases fisiológicas e biomecânicas da saúde e da doença, possibilitando o desenvolvimento de um novo campo de conhecimento científico, fortemente ligado à reabilitação de indivíduos com sequelas de lesões ortopédicas, neurológicas e medulares nos períodos da Primeira e Segunda Guerras Mundiais. O conhecimento estabelecido a partir do escopo técnicocientífico da enfermagem, da medicina e da educação física permitiu, ao fisioterapeuta, durante todo o século XX, desenvolver e implementar técnicas de avaliação e tratamento oriundos da terapia manual, da hidroterapia e eletroterapia para a recuperação das atividades funcionais dos indivíduos. A evolução da própria profissão em si acarretou mudanças expressivas no perfil do fisioterapeuta, que, atualmente, também atua nas questões relacionadas à saúde pública por meio da promoção de saúde, prevenção de doenças e melhoria da qualidade de vida da população. Para discutir sobre a profissionalização da fisioterapia, é necessário compreender os aspectos fundamentais da história da fisioterapia em âmbito mundial e, ainda, apresentar como ocorreu sua inserção na área da saúde, desde o surgimento dos primeiros profissionais até o presente momento, século XXI. Neste contexto, traçamos como objetivos deste estudo descrever o desenvolvimento da fisioterapia como profissão no que se refere a sua estruturação, formação e organização no período compreendido entre 1894 e 2010. O recorte temporal inicial corresponde ao ano de 1894, devido à criação da Sociedade de Massagistas Formadas. Esta sociedade foi fundamental para o surgimento, posteriormente, da profissão reconhecida como fisioterapia. O critério temporal final corresponde ao ano de 2010, devido à inserção do profissional fisioterapeuta nas políticas públicas de saúde. Material e métodos Trata-se de uma revisão de literatura, que aborda o período correspondente à profissionalização da fisioterapia, contextualizando-a do final do século XIX até os dias atuais. Para o levantamento bibliográfico, foi feita uma busca ativa nas bases de dados Ebsco, Scielo e Portal Capes, entre novembro de 2009 e junho de 2010, utilizando-se os descritores: massagem, história, fisioterapia, reabilitação, poliomielite e guerras. Foram utilizadas, ainda, outras fontes, como dissertações e livros relacionados ao tema proposto. Para análise dos dados, utilizou-se a análise de conteúdo de Bardin [1], que consiste em um conjunto de instrumentos metodológicos cujo objeto de estudo é o conteúdo das mensagens contidas nas palavras, trazendo à tona novas realidades. A partir da análise dos artigos e demais textos pesquisados, buscamos discutir e refletir sobre os principais fatos que têm marcado a história da fisioterapia, possibilitando a construção das seguintes categorias temáticas: 1) Massagem: a busca do conhecimento 2) Reabilitação: o reconhecimento profissional e 3) A fisioterapia na atualidade e perspectivas futuras. Resultados e discussão Massagem: a busca do conhecimento Historicamente, o princípio das técnicas utilizadas na profissão de fisioterapia tem origem na terapia manual. As mãos tornaram-se um instrumento de conhecimento e ferramenta terapêutica, desempenhando um papel fundamental nas três fases do processo terapêutico: avaliação, diagnóstico e tratamento [2]. A massagem destaca-se por ser a primeira e a mais conhecida entre as várias técnicas de terapias manuais existentes. A primeira referência escrita sobre massagem foi apresentada no manuscrito Nei Ching em 2598 a. C. Este material é considerado o escrito médico mais antigo, também conhecido como O Livro de Medicina do Imperador Amarelo. No Oriente, a massagem era valorizada por sua aplicação terapêutica e foi aperfeiçoada durante séculos, através de técnicas elaboradas com base na teoria médica oriental, originando a Massagem Tradicional Chinesa e o Shiatsu no Japão [3-4]. A trajetória histórica da terapia manual e da massagem tem sido marcada por períodos de declínio e ascensão. Durante a Idade Média, a prática da massagem caiu no esquecimento, devido à estagnação em todas as áreas do conhecimento, incluindo a área da saúde. Contudo, no período do Renascimento, ocorreu o desenvolvimento do humanismo e das artes e, paralelamente, a retomada dos cuidados relativos ao corpo e a revitalização do culto ao físico [5]. Após a Revolução Industrial, no século XIX, a prática da massagem foi regulamentada na Europa por meio da fundação da Society of Trained Masseuses (STM), por três enfermeiras e uma parteira [6]. No período compreendido entre 1850 e 1900, as mulheres conquistaram o direito de exercer uma profissão por meio da prática da massagem. O crescimento e o reconhecimento da massagem como uma prática moralmente aceitável, desenvolvida por mulheres, foi uma das várias atribuições da enfermagem para a fisioterapia [6]. A era da massagem moderna iniciou em 1863, com a publicação do Estradere’s Du Massage, um tratado sobre a massagem escrito pelo médico francês Estradere. Neste manuscrito, o médico classificou sistematicamente cada técnica de acordo com o local do corpo lesionado. Este tratado estimulou a pesquisa científica, contribuindo para o rápido Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 desenvolvimento de modernas técnicas de massagem [4]. Atualmente, o valor terapêutico da massagem é amplamente reconhecido, e continua prosperando e se desenvolvendo por todo mundo ocidental, entre profissionais e leigos [3]. A Enfermagem Moderna teve início com Florence Nightingale, a primeira mulher que fundou uma escola para formação de enfermeiros. Na época, o aprendizado da massagem com finalidade terapêutica era uma das exigências para a qualificação das enfermeiras. Desde 1860, os escritos de Florence relatavam a importância da massagem no tratamento dos doentes, com a finalidade de promover o relaxamento muscular, auxiliar na redução da ansiedade e da dor, além de contribuir para a diminuição de edema crônico [7]. A fisioterapia iniciou como profissão em 1894, na Inglaterra, como resposta aos escândalos relacionados às práticas imorais de casas de massagem divulgados pelo British Medical Journal (BMJ). A massagem, na visão do público, apresentava uma forte relação com a busca do prazer sexual e com a prostituição. Para que a massagem deixasse de ter uma conotação sexual e se tornasse reconhecida publicamente como uma ferramenta terapêutica, o BMJ recomendou, em seus escritos, a instituição de uma associação que subsidiasse a formação de massagistas. Para receber a certificação do curso, eram avaliadas as competências das profissionais na área. Esta recomendação serviu como incentivo para que três enfermeiras, Rosalind Paget, Lucy Robinson e Margaret Palmer, e a parteira Elisabeth Anne Manley fundassem, em dezembro de 1894, em Londres, a Society of Trained Masseuses (STM) [6]. A STM se desenvolveu e, no decorrer de quatro décadas, incorporou os conhecimentos técnicos e científicos da medicina e da enfermagem, tornando-se, em 1943, a Sociedade de Fisioterapeutas Formados. Os profissionais que integravam esta sociedade aprenderam a correlacionar os estudos de anatomia e fisiologia aos princípios teóricos e práticos, não somente da massagem, mas também dos efeitos fisiológicos dos movimentos terapêuticos e das correntes elétricas para a recuperação de incapacidades físicas, o que é amplamente denominado de reabilitação [8]. As fundadoras da STM regulamentaram a educação, o treinamento, o registro e a prática da massagem, tornando-a uma profissão segura e honrável, na qual as mulheres britânicas passaram a atuar, conquistando sucesso e reconhecimento por parte da sociedade inglesa. Esse sucesso foi alcançado a partir de algumas parcerias previamente estabelecidas, com o cumprimento de compromissos políticos e sociais, que serviram de reforço ao modelo androcêntrico (perspectiva hegemônica masculina), no qual as mulheres deveriam ser submissas e deferentes aos médicos. Este modelo se fez presente nas regras para o funcionamento da STM, as quais estabeleciam que a massagem somente poderia ser realizada mediante encaminhamento médico, criando uma forte dependência da STM em relação à classe médica [6]. Em 1896, a STM convidou um seleto grupo de médicos para tornarem-se patronos da sociedade. Este fato fez com 391 que os médicos introduzissem oficialmente o conhecimento da medicina nos conhecimentos relacionados à massagem que as enfermeiras detinham. Isso permitiu que os médicos, assim como as enfermeiras, também pudessem se tornar membros dessa sociedade e, principalmente, fizessem com que este grupo profissional se subordinasse a eles. Em 1905, o Comando de Guerra Britânico incentivou a STM para a realização de provas para enfermeiros aprenderem as técnicas de massagem [9]. Em 1912, as fundadoras da STM fizeram uma nova parceria com 79 médicos, aprovando-os como membros, criando a Incorporated Society of Trained Masseuses (SITM) [10]. Em março de 1917, o Jornal da SITM publicou um anúncio informando que a Marinha Real Britânica estava selecionando massagistas formados para servirem durante a Primeira Guerra Mundial. Como consequência, houve, neste ano, a criação da Escola de Massagem da Marinha Real, no Hospital Chatcham, em Londres, com a finalidade de formar equipes para tratamento de pessoas doentes. Esta equipe tinha como coordenadora a irmã Curphey Kingdon e suas assistentes. Nesta escola, os estudantes tinham aulas sobre massagem, ginástica médica e eletricidade médica [9]. Em 1920, já com a incorporação de 5.000 membros, a sociedade recebeu uma nova designação e passou a ser conhecida como Chartered Society of Massage and Medical Gymnastics (CSMMG) e, pela primeira vez, os homens puderam fazer parte da sociedade como membros [7,9]. A Escola de Massagem da Marinha Real funcionou durante 13 anos no Hospital Chatcham e posteriormente, em 1930, foi desativada. Neste período, formaram-se 60 homens, entre os quais, Charles Strong, em 1930, reconhecido como o primeiro fisioterapeuta no mundo, sendo homenageado, em 1974, devido ao brilhante serviço prestado à Família Real Britânica [9]. Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o aprendizado das técnicas relativas à massagem na profissão de enfermagem foi praticamente extinto na Inglaterra. Esta situação ocorreu, provavelmente, porque em 1943 a CSMMG começou a assumir a massagem como base instrumental de trabalho, passando a chamar-se Sociedade de Fisioterapeutas Formados. Nesta época, as escolas de fisioterapia começaram a usufruir das escolas de massagem dos hospitais, previamente organizadas por enfermeiras e massagistas [7]. De todas as partes do mundo, os estudantes seguiam para Londres para aprender esta nova profissão e, posteriormente, retornavam aos seus países de origem, para iniciar o trabalho como fisioterapeutas [10]. Pode-se deduzir que a união entre massagem e o conhecimento prévio desenvolvido pela enfermagem e medicina significou muito mais do que um simples convívio, possibilitou o desenvolvimento desta nova sociedade e profissão. Os fisioterapeutas tornaram-se fortemente aliados à comunidade médica, resultando na inclusão de novos conhecimentos e tecnologias, subsídios estes que passaram a sustentar de for- 392 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 ma consistente a nova profissão, através do estudo das bases biomecânicas da saúde e da doença [10]. Reabilitação: o reconhecimento profissional A reabilitação física é considerada uma das áreas da medicina desenvolvida, principalmente, durante a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, devido às sequelas físicas e neurológicas ocasionadas pelos conflitos [11]. É importante destacar que, no Brasil, o princípio deste campo de atuação ocorreu devido aos inúmeros casos de crianças com sequelas físicas de poliomielite [12]. Na Europa, no período correspondente à Primeira Guerra Mundial (1914-1918), foram recrutados profissionais da Sociedade Incorporada de Massagistas Formados para prestarem serviços à Marinha Real Britânica [9]. Estes profissionais detinham conhecimentos relativos aos exercícios terapêuticos direcionados à reabilitação física, ou seja, à recuperação de incapacidades físicas [8]. Contudo, a consolidação da reabilitação física como base fundamental da fisioterapia ocorreu na América, principalmente nos Estados Unidos da América (EUA), em decorrência da Primeira Guerra Mundial, por meio da criação da entidade denominada Mulheres Auxiliares dos Cuidados Médicos. Posteriormente, esta foi designada somente como Auxiliares em Reabilitação. Esta categoria fez parte da subdivisão do Departamento Médico do Exército, inserida no Serviço de Cirurgia Geral. Nesta época, já existiam Cursos de Fisioterapia na Inglaterra e França, porém, foi nos EUA que a profissão alcançou maior visibilidade, devido à necessidade de profissionais para auxílio na recuperação dos combatentes de guerra com déficits físicos. As Auxiliares em Reabilitação foram comandadas por Marguerite Sanderson, fisioterapeuta supervisora que desenvolveu a estrutura administrativa do programa [12]. Em 1915, Mary MCMillan, considerada a primeira fisioterapeuta americana que trabalhou na Primeira Guerra Mundial, contribuiu para a implementação inédita dos Programas de Formação em Emergências. Este curso foi realizado em diversas localidades dos EUA. Em 1918, Mary foi nomeada chefe do Serviço de Assistência em Reabilitação do maior hospital militar da época, o Walter Reed General Hospital [12]. Neste mesmo período, o Exército dos EUA fez uma campanha no Reed College, Escola de Formação Superior em Educação Física, para estimular a formação de profissionais. Foram recrutadas mulheres para trabalhar na Primeira Guerra Mundial com o intuito de formá-las para reabilitação dos combatentes de guerra, fomentando o surgimento de uma nova profissão: a fisioterapia. A partir desta campanha no Reed College, sob o comando do general William Gorgas, cirurgião chefe do Departamento Médico do Exército dos EUA, foram instituídos cursos nos programas de educação física em todo o país. Estes foram denominados Fisioterapia nas Emergências da Guerra, com objetivo de formar mulheres com habilidades em reabilitação física de soldados mutilados, possibilitando o retorno deles aos campos de batalha [13]. A base científica do curso teórico-prático de Fisioterapia nas Emergências de Guerra foi planejada a partir dos conhecimentos oriundos da medicina. Os militares ortopedistas organizaram os conteúdos do curso, ensinando as alunas de fisioterapia a pensarem nos pacientes em termos de diagnóstico e categorizações médicas. As atividades teórico-práticas do curso de fisioterapia não eram realizadas à beira do leito do paciente, havia a realização de dissecção de cadáveres, além do aprendizado das teorias de fisiologia humana e das bases científicas sobre as cirurgias ortopédicas [13]. As Escolas de Educação Física dos EUA proporcionaram uma ótima estrutura física e docente para a formação dos fisioterapeutas, com amplos ginásios para realização de exercícios físicos e instrutores que ensinavam sobre as técnicas de massagem e ginástica corretiva [13]. O recrutamento de militares mulheres para atuar como fisioterapeutas foi um desafio à Tradição Vitoriana acerca da feminilidade, culminando em uma ruptura do papel tradicional exercido por mulheres cuidadoras. Ao contrário da educação recebida pelas mulheres do século XIX, impregnadas de doçura e fragilidade feminina, as fisioterapeutas vislumbravam-se como mulheres fortes, que detinham um conhecimento especializado no âmbito de sua atuação profissional. A ênfase na dupla virtude da mulher, união entre simpatia e ciência para o avanço profissional, foi substituída, na fisioterapia, pela utilização dos recursos rígidos da medicina de reabilitação: força e ciência [13]. Ao recrutar educadoras físicas para tratar e exercitar os soldados, o Exército reconheceu que as mulheres poderiam tornar-se especialistas em saúde e em condicionamento físico, tanto do homem saudável, quanto daquele com deficiência. A sólida união entre medicina ortopédica e educação física tornou-se o foco de trabalho da fisioterapia, pois, ao invés de trabalhar com indivíduos sadios, os fisioterapeutas realizavam seu trabalho com pessoas doentes, no tratamento de homens feridos, considerando-os como pacientes [13]. No período correspondente à Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os serviços de reabilitação continuaram tendo seu desenvolvimento associado às guerras, devido ao grande número de vítimas que necessitavam de reabilitação. Assim, os princípios e práticas da reabilitação fortaleceram-se ainda mais, devido à complexidade das incapacidades funcionais, como a amputação de membros, lesões medulares e cerebrais [Entre 1914 e 1916, no estado americano de Vermount, ocorreram as primeiras epidemias de paralisia infantil, denominada também como poliomielite, sendo que seu tratamento necessitava das competências e habilidades do fisioterapeuta. O programa de tratamento foi chamado de Plano Vermount, coordenado pelo Dr. Robert Lovett, um médico que associava o trabalho dos fisioterapeutas às orientações aos familiares no tratamento das crianças com poliomielite. Nesta época, muitas Auxiliares em Reabilitação trabalharam em sua equipe, utilizando os princípios da reabilitação, como os exercícios Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 corretivos, a massagem e o fortalecimento muscular para o tratamento destas crianças [12]. O surgimento de uma epidemia mundial de poliomielite suscitou avanços científicos no campo da reabilitação. Esta doença potencializou o desenvolvimento de métodos de avaliação muscular, imprescindíveis para a execução e manutenção do tratamento funcional de músculos lesionados. A avaliação da função muscular e a prescrição do tratamento adequado aos portadores de poliomielite impulsionaram o desenvolvimento científico sobre a anatomia funcional e a retração muscular, considerados como base para os estudos relativos à reabilitação. As severas incapacidades advindas da poliomielite tiveram grande influência no desenvolvimento de metas terapêuticas funcionais aos pacientes. O objetivo não era a cura da doença, mas a conquista da máxima capacidade funcional, para realização de atividades cotidianas com maior nível de independência possível [14]. No Brasil, as epidemias de poliomielite tiveram um papel central na criação da primeira instituição formadora de fisioterapeutas no país, a Escola de Reabilitação do Rio de Janeiro (ERRJ). E ainda, influenciaram o perfil dos primeiros fisioterapeutas como profissionais voltados para a atuação na reabilitação, formados para atender principalmente ao deficiente físico e outros lesionados [15]. A fisioterapia na atualidade e perspectivas futuras A fisioterapia enfrentou muitos desafios para estabelecer sua identidade profissional e consequente campo de atuação na saúde tanto no Brasil quanto nos países da América e Europa. Inicialmente, a massagem foi utilizada como principal recurso terapêutico da fisioterapia, porém foi com o trabalho desenvolvido por meio da reabilitação física das pessoas que a profissão passou a ser reconhecida. Atualmente, a profissão vislumbra uma atuação além da perspectiva reabilitadora, passando a atuar também nas questões relacionadas à promoção de saúde e prevenção dos agravos de saúde. As políticas de saúde estão baseadas em práticas preventivas, e levam em consideração a realidade e o cotidiano de cada comunidade para efetivar seus programas. Neste contexto, a sociedade está cada vez mais preocupada com as necessidades de saúde e o desenvolvimento pessoal, profissional e social das pessoas em situação de dependência funcional [16]. Atualmente, há plena necessidade de investimentos na formação e atuação dos profissionais de saúde, no sentido de estudar e trabalhar a saúde em sua totalidade social. A integralidade e a humanização na assistência à saúde requerem, dos acadêmicos e dos profissionais da área, o reconhecimento do indivíduo/cliente como um todo físico-psíquico-biológico e social [17]. A fisioterapia tem a possibilidade de atuar na melhoria da saúde, com o desenvolvimento de estratégias de promoção de saúde, prevenção de doenças e tratamento dos agravos/ 393 problemas de saúde. Esses três pilares podem ser abordados por meio de condutas terapêuticas, como orientação quanto à realização de exercícios físicos, a fim de que se tornem hábitos de vida da comunidade. Ainda podem ser trabalhados os aspectos que envolvem os cuidados posturais e adaptação ergonômica no cotidiano do indivíduo, além da identificação de fatores de risco para desvios posturais, prevenção da hipomobilidade (principalmente em pessoas idosas), entre outros aspectos abordados pela profissão [18]. Na perspectiva de atuação da fisioterapia na atenção básica, torna-se importante destacar que a profissão teve que agregar novos valores que não replicassem o mesmo formato e ações que tradicionalmente permearam a sua trajetória consolidada nos níveis secundário e terciário de atenção à saúde. Entre as principais diferenças, destacam-se: a mudança do cenário do atendimento, no qual, ao invés de um ginásio terapêutico, um consultório ou um leito hospitalar, as intervenções passam a ser nas próprias unidades básicas de saúde, em domicílios, em escolas, praças, igrejas, locais estes desprovidos de recursos físicos (ondas curtas, fornos, ultrassons, entre outros) [18]. Neste contexto, o atendimento deixa de ser exclusivamente individualizado, incorporando-se a este o atendimento em grupo. As ações fisioterapêuticas se diluem e dividem espaço com as ações voltadas para a prevenção e promoção da saúde. Ocorre a transformação de uma prática profissional baseada na decisão individual, arbitrada pelo fisioterapeuta, sobre os métodos e procedimentos a serem aplicados, para a busca de uma prática em que as decisões coletivas, numa perspectiva interdisciplinar com a participação dos usuários, são prioritárias para definir as ações que possam trazer impactos favoráveis para a saúde da comunidade [18]. Dentro de suas possibilidades de atuação no tratamento de agravos de saúde, no atendimento domiciliar, o fisioterapeuta proporciona condições para que pessoas com dificuldades físicas diversas e dependência funcional possam ter uma vida com o maior grau de autonomia possível. Além disso, ele orienta familiares e cuidadores acerca de como podem contribuir para otimização das capacidades físicas, cognitivas e sociais do indivíduo com dependência funcional. Neste sentido, os saberes e práticas utilizados na fisioterapia têm a finalidade de recuperar as pessoas em situação de dependência, valorizando suas necessidades e intervindo na rede de apoio às pessoas inseridas nesse cenário [15]. O fisioterapeuta, juntamente com a equipe de saúde da comunidade, deve empenhar-se para implementar estratégias que visam minimizar as situações que geram essa dependência e incentivar essas pessoas a exercerem sua cidadania por meio do conhecimento de seus direitos como indivíduos participantes da sociedade [15]. A inserção da fisioterapia na atenção básica se constitui em um fato histórico recente e, por consequência, incipiente. Contudo, a participação da profissão nesse campo de trabalho tem favorecido diversas reflexões sobre a ampliação e reconfiguração de suas práticas para a apropriação de novos 394 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 saberes necessários a uma melhor intervenção nesse nível de atenção à saúde [19]. O trabalho do profissional fisioterapeuta deve voltar-se, portanto, para a promoção da saúde, de forma global, especialmente se ele pretende trabalhar numa equipe transdisciplinar [20]. Conclusão A fisioterapia é uma profissão que emergiu a partir de vários conhecimentos e práticas, basicamente das profissões de enfermagem, medicina e educação física. Cada uma dessas profissões agregou saberes que permanecem no cotidiano do fisioterapeuta na atualidade. Com a enfermagem, iniciou-se a prática da massagem como terapêutica para tratamento de distúrbios físicos, sendo a precursora das terapias manuais. A medicina, por sua vez, contribuiu na solidificação do respaldo teórico, necessário para a compreensão dos mecanismos anátomo-fisiológicos dos distúrbios físicos e funcionais relativos ao corpo humano. E, finalmente, a educação física forneceu a base teórico-prática, que possibilitou o desenvolvimento, tanto dos movimentos terapêuticos quanto dos equipamentos necessários para a recuperação das incapacidades físicas e funcionais do indivíduo. A fisioterapia construiu sua identidade profissional permeada pelo objetivo de promover a reabilitação física, sendo ainda marcante este campo de atuação da profissão. Contudo, atualmente é importante destacar o papel do fisioterapeuta na saúde pública, juntamente com a atuação interdisciplinar, na elaboração de estratégias para atender às necessidades da comunidade em termos de prevenção de doenças e promoção de saúde, melhorando, assim, a qualidade de vida das pessoas envolvidas nesse contexto social. Referências 1. Bardin L. 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Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 395 Normas de Publicação - Fisioterapia Brasil Revista Indexada na LILACS - Literatura Latinoamericana e do Caribe em Ciências da Saúde, CINAHL, LATINDEX Abreviação para citação: Fisioter Bras A revista Fisioterapia Brasil é uma publicação com periodicidade bimestral e está aberta para a publicação e divulgação de artigos científicos das várias áreas relacionadas à Fisioterapia. Os artigos publicados em Fisioterapia Brasil poderão também ser publicados na versão eletrônica da revista (Internet) assim como em outros meios eletrônicos (CD-ROM) ou outros que surjam no futuro. Ao autorizar a publicação de seus artigos na revista, os autores concordam com estas condições. A revista Fisioterapia Brasil assume o “estilo Vancouver” (Uniform requirements for manuscripts submitted to biomedical journals) preconizado pelo Comitê Internacional de Diretores de Revistas Médicas, com as especificações que são detalhadas a seguir. Ver o texto completo em inglês desses Requisitos Uniformes no site do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), www.icmje.org, na versão atualizada de outubro de 2007 (o texto completo dos requisitos está disponível, em inglês, no site de Atlântica Editora em pdf ). Submissões devem ser enviadas por e-mail para o editor executivo ([email protected]). A publicação dos artigos é uma decisão dos editores. Todas as contribuições que suscitarem interesse editorial serão submetidas à revisão por pares anônimos. Segundo o Conselho Nacional de Saúde, resolução 196/96, para estudos em seres humanos, é obrigatório o envio da carta de aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa, independente do desenho de estudo adotado (observacionais, experimentais ou relatos de caso). Deve-se incluir o número do Parecer da aprovação da mesma pela Comissão de Ética em Pesquisa do Hospital ou Universidade, a qual seja devidamente registrada no Conselho Nacional de Saúde. 1. Editorial O Editorial que abre cada número da Fisioterapia Brasil comenta acontecimentos recentes, inovações tecnológicas, ou destaca artigos importantes publicados na própria revista. É realizada a pedido dos Editores, que podem publicar uma ou várias Opiniões de especialistas sobre temas de atualidade. 2. Artigos originais São trabalhos resultantes de pesquisa científica apresentando dados originais com relação a aspectos experimentais ou observacionais, em estudos com animais ou humanos. Formato: O texto dos Artigos originais é dividido em Resumo (inglês e português), Introdução, Material e métodos, Resultados, Discussão, Conclusão, Agradecimentos (optativo) e Referências. Texto: A totalidade do texto, incluindo as referências e as legendas das figuras, não deve ultrapassar 30.000 caracteres (espaços incluídos), e não deve ser superior a 12 páginas A4, em espaço simples, fonte Times New Roman tamanho 12, com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico, sobre-escrito, etc. Tabelas: Recomenda-se usar no máximo seis tabelas, no formato Excel ou Word. Figuras: Máximo de 8 figuras, em formato .tif ou .gif, com resolução de 300 dpi. Literatura citada: Máximo de 50 referências. 3. Revisão São trabalhos que expõem criticamente o estado atual do conhecimento em alguma das áreas relacionadas à Fisioterapia. Revisões consistem necessariamente em análise, síntese, e avaliação de artigos originais já publicados em revistas científicas. Será dada preferência a revisões sistemáticas e, quando não realizadas, deve-se justificar o motivo pela escolha da metodologia empregada. Formato: Embora tenham cunho histórico, Revisões não expõem necessariamente toda a história do seu tema, exceto quando a própria história da área for o objeto do artigo. O artigo deve conter resumo, introdução, metodologia, resultados (que podem ser subdivididos em tópicos), discussão, conclusão e referências. Texto: A totalidade do texto, incluindo a literatura citada e as legendas das figuras, não deve ultrapassar 30.000 caracteres, incluindo espaços. Figuras e Tabelas: mesmas limitações dos Artigos originais. Literatura citada: Máximo de 50 referências. 4. Relato de caso São artigos que apresentam dados descritivos de um ou mais casos clínicos ou terapêuticos com características semelhantes. Só serão aceitos relatos de casos não usuais, ou seja, doenças raras ou evoluções não esperadas. Formato: O texto deve ser subdividido em Introdução, Apresentação do caso, Discussão, Conclusões e Referências. Texto: A totalidade do texto, incluindo a literatura citada e as legendas das figuras, não deve ultrapassar 10.000 caracteres, incluindo espaços. Figuras e Tabelas: máximo de duas tabelas e duas figuras. Literatura citada: Máximo de 20 referências. 5. Opinião Esta seção publica artigos curtos, que expressam a opinião pessoal dos autores: avanços recentes, política de saúde, novas idéias científicas e hipóteses, críticas à interpretação de estudos originais e propostas de interpretações alternativas, por exemplo. A publicação está condicionada a avaliação dos editores quanto à pertinência do tema abordado. Formato: O texto de artigos de Opinião tem formato livre, e não traz um resumo destacado. Texto: Não deve ultrapassar 5.000 caracteres, incluindo espaços. Figuras e Tabelas: Máximo de uma tabela ou figura. Literatura citada: Máximo de 20 referências. 6. Cartas Esta seção publica correspondência recebida, necessariamente relacionada aos artigos publicados na Fisioterapia Brasil ou à linha editorial da revista. Demais contribuições devem ser endereçadas à seção Opinião. Os autores de artigos eventualmente citados em Cartas serão informados e terão direito de resposta, que será publicada simultaneamente. Cartas devem ser breves e, se forem publicadas, poderão ser editadas para atender a limites de espaço. A publicação está condicionada a avaliação dos editores quanto à pertinência do tema abordado. Preparação do original • Os artigos enviados deverão estar digitados em processador de texto (Word), em página A4, formatados da seguinte maneira: fonte Times New Roman tamanho 12, com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico, sobrescrito, etc. • Tabelas devem ser numeradas com algarismos romanos, e Figuras com algarismos arábicos. • Legendas para Tabelas e Figuras devem constar à parte, isoladas das ilustrações e do corpo do texto. • As imagens devem estar em preto e branco ou tons de cinza, e com resolução de qualidade gráfica (300 dpi). Fotos e desenhos devem estar digitalizados e nos formatos .tif ou .gif. Imagens coloridas serão aceitas excepcionalmente, quando forem indispensáveis à compreensão dos resultados (histologia, neuroimagem, etc). Página de apresentação A primeira página do artigo traz as seguintes informações: • Título do trabalho em português e inglês; • Nome completo dos autores e titulação principal; • Local de trabalho dos autores; • Autor correspondente, com o respectivo endereço, telefone e E-mail; Resumo e palavras-chave A segunda página de todas as contribuições, exceto Opiniões, deverá conter resumos do trabalho em português e em inglês e cada versão não pode ultrapassar 200 palavras. Deve conter introdução, objetivo, metodologia, resultados e conclusão. 396 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Abaixo do resumo, os autores deverão indicar 3 a 5 palavras-chave em português e em inglês para indexação do artigo. Recomenda-se empregar termos utilizados na lista dos DeCS (Descritores em Ciências da Saúde) da Biblioteca Virtual da Saúde, que se encontra em http://decs.bvs.br. Agradecimentos Agradecimentos a colaboradores, agências de fomento e técnicos devem ser inseridos no final do artigo, antes das Referências, em uma seção à parte. Referências As referências bibliográficas devem seguir o estilo Vancouver. As referências bibliográficas devem ser numeradas com algarismos arábicos, mencionadas no texto pelo número entre colchetes [ ], e relacionadas nas Referências na ordem em que aparecem no texto, seguindo as normas do ICMJE. Os títulos das revistas são abreviados de acordo com a List of Journals Indexed in Index Medicus ou com a lista das revistas nacionais e latinoamericanas, disponível no site da Biblioteca Virtual de Saúde (www.bireme.br). Devem ser citados todos os autores até 6 autores. Quando mais de 6, colocar a abreviação latina et al. Exemplos: 1. Phillips SJ, Hypertension and Stroke. In: Laragh JH, editor. Hypertension: pathophysiology, diagnosis and management. 2nd ed. New-York: Raven Press; 1995.p.465-78. Yamamoto M, Sawaya R, Mohanam S. Expression and localization of urokinase-type plasminogen activator receptor in human gliomas. Cancer Res 1994;54:5016-20. Envio dos trabalhos A avaliação dos trabalhos, incluindo o envio de cartas de aceite, de listas de correções, de exemplares justificativos aos autores e de uma versão pdf do artigo publicado, exige o pagamento de uma taxa de R$ 150,00 a ser depositada na conta da editora: Banco Itaú, agência 0733, conta 45625-5, titular: Atlântica Multimídia e Comunicações Ltda (ATMC). Os assinantes da revista são dispensados do pagamento dessa taxa (Informar por e-mail com o envio do artigo). Todas as contribuições devem ser enviadas por e-mail para o editor executivo, Jean-Louis Peytavin, através do e-mail artigos@atlanticaeditora. com.br. O corpo do e-mail deve ser uma carta do autor correspondente à Editora, e deve conter: • Resumo de não mais que duas frases do conteúdo da contribuição; • Uma frase garantindo que o conteúdo é original e não foi publicado em outros meios além de anais de congresso; • Uma frase em que o autor correspondente assume a responsabilidade pelo conteúdo do artigo e garante que todos os outros autores estão cientes e de acordo com o envio do trabalho; • Uma frase garantindo, quando aplicável, que todos os procedimentos e experimentos com humanos ou outros animais estão de acordo com as normas vigentes na Instituição e/ou Comitê de Ética responsável; • Telefones de contato do autor correspondente. • A área de conhecimento: ( ) Cardiovascular / pulmonar ( ) Saúde funcional do idoso ( ) Diagnóstico cinético-funcional ( ) Terapia manual ( ) Eletrotermofototerapia ( ) Orteses, próteses e equipamento ( ) Músculo-esquelético ( ) Neuromuscular ( ) Saúde funcional do trabalhador ( ) Controle da dor ( ) Pesquisa experimental /básica ( ) Saúde funcional da criança ( ) Metodologia da pesquisa ( ) Saúde funcional do homem ( ) Prática política, legislativa e educacional ( ) Saúde funcional da mulher ( ) Saúde pública ( ) Outros Observação: o artigo que não estiver de acordo com as normas de publicação da Revista Fisioterapia Brasil será devolvido ao autor correspondente para sua adequada formatação. Atlantica Editora - [email protected] Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 397 Agenda Novembro 3 a 5 de novembro I Congresso Internacional de Fisioterapia, Ética e Bioética Vitória, ES Informações: www.confibe.com.br 11 a 14 de novembro V Congresso Brasileiro e III Congresso Internacional da Sociedade Nacional de Fisioterapia Esportiva V Jornada Brasil-Argentina de Fisioterapia Esportiva Maceió, AL Informações: www.sonafe2011.com 18 a 19 de novembro III Congresso Mineiro de Fisioterapia Cardiorrespiratória e Fisioterapia em Terapia Intensiva Belo Horizonte, MG Informações: www.assobrafir.com.br 2012 Fevereiro 12 a 16 de fevereiro 18° Congresso Mundial de Ergonomia, Congresso da União Latino-Americana de Ergonomia 16° Congresso Brasileiro de Ergonomia Centro de Convenções de Pernambuco, Recife, PE Informações: www.iea2012.org Março 30 de março a 1 de abril IV Congresso Brasileiro de Acupuntura – SOBRAFISA Ribeirão Preto, SP Informações: www.sobrafisa.org.br Abril 12 a 15 de Abril XI Reatech – Feira Internacional de tecnologias em reabilitação, inclusão e acessibilidade IV Fisiotech – FEIRA Internacional de Tecnologias em Fisioterapia Centro de exposições Imigrantes, São Paulo, SP Informações: www.reatechvirtual.com.br Maio 16 a 19 de maio XVI Simpósio Internacional de Fisioterapia Respiratória e Fisioterapia em Terapia Intensiva VIII Congresso Brasileiro de Fisioterapia Respiratória VII Congresso Brasileiro de Fisioterapia em Terapia Intensiva I Encontro Luso – Brasileiro de Fisioterapia Cardiorrespiratória e Fisioterapia em Terapia Intensiva Centro de Convenções SulAmerica, Rio de Janeiro, RJ Informações: www.assobrafir.com.br Setembro 13 a 16 de setembro VIo Congresso Internacional de Fisioterapia Natal, RN Informações: www.sbf.org.br 30 de setembro a 5 de outubro IFOMPT 2012 – World Congress of Manual/ Musculoskeletal Physiotherapy Montreal, Canadá Informações: www.ifomptconference.org Cursos de Neurociências Aplicadas à Reabilitação Prof. Dr. Nelson Annunciato e Prof. Dr. Carlos Monteiro Vocês estão convidados a conhecer um modo diferente de aprender neurociências e aplicá-las às terapias. 18/06 27/08 17/09 15/10 19/11 10/12 -Ampliando os conhecimentos teóricos-práticos sobre a Motricidade: do reflexo ao movimento voluntário. -A porta de entrada para a Neuro-Universo terapêutico: Órgãos dos Sentidos. Sensação, Consciência, Percepção e seus distúrbios. -Quesitos básicos para a Atenção e Controle Postural: compreendendo melhor a Formação Reticular. -Reações posturais normais e alteradas na Paralisia Cerebral: como analisá-las e tratá-las. -Sistema crânio-oro-cervical: relação postural entre a cabeça, tronco e membros. -Funções Nervosas Superiores e seus Distúrbios. Investimento por módulo: R$ 190,00 profissionais R$ 160,00 graduandos (com comprovante) Mais informações e inscrições: www.neda-brain.com [email protected] Tel.: (22) 2376-2071 Local dos cursos: Av. Paulista, 1776, 2º andar - São Paulo - SP - das 8hs às 18 hs. 398 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011 399 400 Fisioterapia Brasil - Volume 12 - Número 5 - setembro/outubro de 2011