UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE AGRONOMIA DEPARTAMENTO DE GEOCIÊNCIAS Trabalho de Graduação Caracterização Microquímica das Turmalinas do Depósito Aurífero de Passagem, Mariana, MG Aluna Clarissa Oliveira da Luz 200604005-5 Orientador Prof. Dr. Rubem Porto Junior (DG/IA/UFRuralRJ) Dezembro de 2009 1 – LUZ, CLARISSA OLIVEIRA Caracterização Microquímica das Turmalinas do Depósito Aurífero de Passagem, Mariana, MG Curso de Geologia / Departamento de Geociências Instituto de Agronomia / Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ [Seropédica] Ano 2009 2 AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço a Deus, pela força, luz, e por sempre colocar no meu caminho pessoas especiais. A minha mãe pelo apoio, por escutar meus problemas, respeitar minhas escolhas, e me amar sempre e incondicionalmente. Ao meu pai, por sempre me apoiar financeiramente e estar sempre ao meio lado em todos os aspectos. Ao meu irmão, que sempre aturou o meu stress e a minha ansiedade, Amo muito os três. A todos os loucos que constituem a minha grande e confusa família, as minhas primasamigas, tias, tios e avós. Ao meu professor e orientador Rubem, por ajudar na produção deste trabalho e, principalmente, por falar sempre as palavras certas na hora certa, mesmo sem saber. A professora Beatriz P. Duarte, por disponibilizar seus dados para produção desta monografia. Agradeço a todos os amigos ruralinos, geólogos e não geólogos. Em especial, agradeço àquelas que estiveram ao meio lado durante estes quatro anos Carolina, Marcela e Pillar, por serem amigas nos melhores e piores momentos destes anos. 3 Resumo O Município de Passagem de Mariana está inserido no Anticlinal de Mariana, uma estrutura intensamente marcada pela mineralização de ouro. Neste município encontra-se a Mina da Passagem, nesta mina o minério pode ser encontrado de duas maneiras: no anfibólio xisto rico em pirrotita, encontrado na porção superior da mina, e nos veios de quartzo branco ricos em turmalina com sulfetos. Litologicamente esta região é constituída por metassedimentos metamorfisados sob condições de grau médio, que são em sua maioria cortados pelos veios de quartzo-carbonato-turmalina-sulfetos. A turmalina é um mineral comum nos litotipos presentes na mina, aparecendo com proporções distintas em cada um deles. Em geral os grãos de turmalina observados têm pleocroísmo de moderado a alto, de cor verde e tom amarelado e alta birrefringência. No presente trabalho são estudadas as rochas ricas em turmalina presentes nesta região, os turmalinitos. Os turmalinitos da Mina da Passagem são rochas extremamente ricas em turmalina, que geralmente compõem 70-80% da constituição da rocha. Estas são predominantemente de granulometria fina, e além da turmalina, este litotipo é constituído de quartzo, carbonato, muscovita, biotita, rutilo e minerais opacos (sulfetos). As turmalinas presentes no turmalinito são ricas em alumínio, por este motivo são chamadas de alcalinas. Quando classificadas segundo os diagramas de Henry e Guidotti (1985) observa-se que estas pertencem à série da schrol-dravita 4 ÍNDICE GERAL Agradecimentos 3 Resumo 4 Índice geral 5 Índice de Figuras 7 Índice de Tabelas 9 Capítulo 1 - Introdução 10 1.1 - Objetivos 10 1.2 - Metodologia 10 1.3 - Localização da Área de Estudo, Acessos e Aspectos Geomorfológicos 11 1.4 - Etapas de Desenvolvimento de Pesquisa 13 1.5 - Suporte à Pesquisa 13 1.6 - Nomenclatura e Classificações utilizadas 14 Capítulo 2 - Turmalinas e Turmalinitos 18 2.1 - Introdução 18 2.2 - Revisão dos trabalhos realizados sobre turmalinas e turmalinitos 18 2.3 - Revisão dos trabalhos sobre a Mina da Passagem (turmalinas) 23 Capítulo 3 - Geologia da área 31 3.1- Breve Introdução à Geologia do Quadrilátero Ferrífero 31 3.2 - A geologia do Depósito de Passagem 36 Capítulo 4 - O Turmalinito de Passagem 40 4.1 - Características gerais da turmalina 40 4.2 - Aspectos Petrográficos da turmalina presente nos metassedimentos e nos veios 43 4.3 - Aspectos Petrográficos do turmalinito 47 4.4 - Análise Geoquímica e Classificação 52 5 4.4.1 - Processo de classificação das turmalinas 56 Capítulo 5 - Conclusão 54 Capítulo 6 - Referências Bibliográficas 55 6 Índice de Figuras Figura Figura 1 Legenda Página JEOLJXA-8900 Electron Microprobe. Equipamento utilizado 12 para obtenção dos dados microgeoquímicos. Figura 2 Mapa de localização do Município de Passagem de Mariana 12 Figura 3 Diagrama Al-Fetot-Mg (proporções moleculares) de Henry e 15 Guidotti (1985). Figura 4 Diagrama Ca-Fetot-Mg (proporções moleculares) de Henry e 15 Guidotti (1985) Figura 5 Diagramas composicionais ternários desenvolvidos por 16 Coluna Estratigráfica do Quadrilátero Ferrífero proposta por 33 Hathorme e Henry Figura 6 Alkmim & Marshak Figura 7 Mapa Geológico simplificado da porção sul do Quadrilátero 36 Ferrífero Figura 8 Principais variedades de turmalina 40 Figura 9 Turmalina associada a muscovita presente no quartzito 43 Figura 10 Turmalina no mámore 43 Figura 11 Turmalinito em contato com veio 44 Figura 12 Xenólito fraturado de turmalinito no veio 44 Figura 13 Turmalinito maciço 47 Figura 14 Turmalinito 47 Figura 15 Grãos de turmalina associados a minerais opacos 48 Figura 16 Turmalinito com níveis de quartzo 48 Figura 17 Turmalinito com lentes milimétricas de mineral opaco fino e 49 níveis de quartzo 7 Figura 18 Grãos de turmalina zoneados Figura 19 Diagrama Al-Fetot-Mg com 49 as variações composicionais 53 composicionais 53 observadas na turmalina do turmalinito Figura 20 Diagrama Ca-Fetot-Mg com as variações observadas na turmalina do turmalinito 8 Índice de Tabelas Tabela Legenda Página Tabela 1 Espécies de turmalina aceitas pela International Mineralogical 17 Association (IMA) Tabela 2 Coluna estratigráfica do Pré-Cambriano no Quadrilátero 34 Ferrífero segundo Dorr II (1969), Modificada por Endo (1988). Tabela 3 Elementos químicos utilizados para classificação da turmalina 51 segundo o diagrama Al-Fetot-Mg de Henry e Guidotti (1985). Tabela 4 Elementos químicos utilizados para a classificação da turmalina 52 segundo o diagrama Ca-Fetot-Mg de Henry e Guidotti (1985). 9 CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO 1.1 Objetivos A presente pesquisa, cujo resultado está apresentado nesta monografia, envolveu a avaliação petrográfico-petrológica dos litotipos que compõe o depósito aurífero de Passagem de Mariana (Mina de Passagem), com o objetivo de caracterizar e classificar as turmalinas presentes nos principais litotipos, em especial aquelas que constituem os turmalinitos lá encontrados. 1.2 Metodologia A metodologia aplicada à pesquisa envolveu a re-análise petrográfica de lâminas préexistentes de turmalinitos e demais litologias do depósito que apresentam turmalinas e um estudo específico relativo à química mineral deste mineral visando sua classificação do ponto de vista composicional. A realização da pesquisa atendeu as seguintes etapas de trabalho: 1- Revisão Bibliográfica A revisão bibliográfica realizada pode ser dividida em duas partes. Uma delas concentrou-se na revisão dos trabalhos científicos publicados sobre turmalinas, de forma generalizada, entretanto buscando-se informações acerca dos processos de classificação química adotados, e outra que visou à revisão dos trabalhos realizados sobre a geologia da Mina da Passagem, com atenção especial àqueles que discutem as turmalinas desta mina. Com base nesta revisão, pode ser feito um breve relato sobre o estado da arte referente ao estudo das turmalinas e turmalinitos, bem como sobre a geologia do depósito aurífero de Passagem. 2- Análise petrográfico-petrológica Esta etapa pretendeu-se a realização da análise de lâminas (polidas ou não) com o intuito de se estabelecer as características dos litotipos envolvidas, mas, principalmente, das características das turmalinas encontradas em cada litotipo. Foram estudas 31 lâminas delgadas, sendo 17 de metapelitos, 6 de turmalinitos e 8 de veios carbonatados. Todas as lâminas utilizadas foram cedidas para este estudo pela Profa. Dra. Beatriz Paschoal Duarte e compõe parte do acervo de suas pesquisas no depósito aurífero de Passagem. 10 Este estudo foi integralmente realizado nas dependências do Departamento de Geociências da UFRuralRJ, no laboratório de Petrografia e foi utilizado microscópio petrográfico modelo BX-40 fabricado pela Olimpus. 3- Avaliação dos dados de Química Mineral A etapa referente a avaliação dos dados da química mineral dos materiais amostrados na Mina da Passagem, envolveu inicialmente a recuperação destes dados e sua organização. Estes dados já estavam disponíveis há algum tempo, entretanto, nunca haviam sido antes utilizados. Eles foram gerados a partir de um Programa de Pós Doutoramento realizado pelo Prof. Dr. Fernando Pires no “Materials Characterization Laboratory do Geology and Geophysics Department da University of Wyoming”. O equipamento utilizado para obtenção dos dados foi do tipo “JEOL JXA-8900 Electron Microprobe” (Figura 1). Organizado os dados foi realizado então a análise, o tratamento e a interpretação dos mesmos. Estes dados de química mineral foram também disponibilizados para nosso uso pela Profa. Dra. Beatriz Paschoal Duarte já que os mesmos também fazem parte de seu acervo sobre este depósito aurífero. 4- Classificação das Turmalinas Posteriormente a organização e análise dos dados da microgeoquímica, estes foram utilizados para que fossem obtidas a classificação das turmalinas. Para a classificação foram utilizados os diagramas Henry e Guidotti (1985), um diagrama de Ca-Fetot-Mg e outro de AlFetot-Mg. 1.3 Localização da Área de Estudo, Acessos e Aspectos Geomorfológicos A Mina da Passagem localiza-se no extremo sudeste do Quadrilátero Ferrífero, em um pequeno povoado pertencente ao município de Mariana em Minas Gerais, designado Passagem de Mariana (Figura 2). O acesso a esta Mina se faz por meio de estradas de rodagem. A partir do Rio de Janeiro, toma-se primeiro a BR-040 (Rio-Belo Horizonte) e, posteriormente, a BR-356 (Belo Horizonte-Ponte Nova) que cruza Ouro Preto e Mariana. Geomorlogicamente a região compõe o Sistema de Montanhas do Espinhaço, representadas aqui pelas Serras de Ouro Preto e Antônio Pereira, situadas a sul deste sistema de montanhas. Observa-se na região estruturas como “hogbags”, espigões e vales estreitos e profundos, nestes vales corre a principal drenagem da área, o Ribeirão do Carmo. 11 Figura 1 - JEOLJXA-8900 Electron Microprobe. Equipamento utilizado para obtenção dos dados microgeoquímicos. Figura 2 - Mapa de localização do Munícipio de Passagem de Mariana (A) 3 1.4 Etapas de Desenvolvimento de Pesquisa 1- Etapa Pré-campo Esta etapa envolveu o levantamento dos dados geológicos existentes. Realizou-se uma revisão bibliográfica detalhada dos trabalhos produzidos na área de estudo e dos trabalhos sobre turmalina e turmalinitos de maneira generalizada. 2- Etapa de Laboratório A etapa de laboratório abrangeu o levantamento e a organização dos dados microgeoquímicos e de lâminas. Como dito, este acervo de dados corresponde a parte do material da pesquisa realizada pela Prof. Dra. Beatriz Paschoal Duarte, durante a realização de sua Pós-Graduação a nível de Mestrado. O objetivo da recuperação deste material foi promover a caracterização e classificação química das turmalinas do turmalinito do depósito aurífero de Passagem, algo ainda não realizado até aqui revitalizando a discussão sobre tão importante depósito mineral, fruto de inúmeras discussões e controvérsias ao longo do tempo. Esta etapa compreendeu ainda a análise petrográfica ao microscópio com reconhecimento mineralógico, textural, estrutural e classificação modal das rochas do depósito que continham turmalinas. 3- Etapa de Gabinete Os dados obtidos nas etapas anteriores foram trabalhados nesta etapa. As análises petrográficas e geoquímicas receberam aqui o tratamento interpretativo para conclusão e fechamento do trabalho cujo resultado é esta monografia. 1.5 Suporte à Pesquisa A pesquisa foi suportada por um conjunto de dados provenientes da Dissertação de Mestrado da Profa. Dra. Beatriz Paschoal Duarte. Estes dados foram gerados durante o desenvolvimento da pesquisa, mas não foram utilizados para produção do trabalho final. Para a realização dos estudos, além dos dados analíticos e lâminas cedidas foram utilizados equipamentos de computação e softwares específicos. O Departamento de Geociências dispõe de estrutura mínima suficiente que permitiu o desenvolvimento da pesquisa sem sobressaltos. Além dos softwares comumente utilizados na edição de texto, desenhos, fotografias e produção de slides, foram utilizadas planilhas de cálculo executadas no Microsoft Excel, além do programa NEWPET e IGPET utilizado para a organização e análise dos dados de microgeoquímica e para a classificação das turmalinas. 13 1.6 Nomenclatura e Classificações utilizadas O esquema adotado para a classificação das turmalinas foi o proposto por Henry e Guidotti em 1985, este é representado por dois diagramas ternários que relacionam os principais elementos presentes na turmalina que possibilitam sua distinção (Figuras 3 e 4). Estes elementos com suas respectivas variações de turmalina são: Ferro – Schrol, Magnésio – Dravita, Cálcio – Lidicoatita e Alumínio – Elbaita. Através da utilização destes dois gráficos foi possível determinar a qual série composicional as turmalinas analisadas pertencem. O primeiro diagrama utilizado tem como extremos o ferro, magnésio e alumínio. Este é dividido em oito campos que correlacionam a composição da turmalina com sua proveniência. Os campos são os seguintes: granitóides, pegmatitos e aplitos ricos em lítio; granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados; granitos alterados hidrotermalmente; metapelitos e metapsamitos coexistentes com uma fase saturada em alumínio; metapelitos e metapsamitos não coexistentes com uma fase saturada em alumínio; rochas com quartzo-turmalina ricas em ferro 3+, rochas calcissilicáticas, e metapelito; metaultramáficas com baixo cálcio, e metassedimentos ricos em vanádio e cromo; e metacarbonatos e metapiroxenitos. O segundo utiliza o ferro, magnésio e o cálcio, assim como o anterior, correlaciona a composição da turmalina com sua proveniência, porém possui apenas seis campos. São eles: granitóides, pegmatitos e aplitos ricos em lítio; granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados; metapelitos ricos em cálcio, metapsamitos e rochas calcissilicáticas; metapelitos pobres em cálcio, metapsamitos e rochas com quartzo-turmalina; metacarbonatos; e metaultramáficas. Além do esquema de classificação adotado, vale citar o esquema desenvolvido em 1999 por Hawthorme e Henry, que baseia a classificação da turmalina de acordo com o íon que ocupa a posição do dominante X da estrutura do mineral. Desta maneira as turmalinas são classificadas como alcalinas, cálcicas, ou as “vacant-tourmaline”, quando não existe um íon ocupando a posição X. Este esquema também envolve a utilização de diagramas composicionais ternários para a classificação, e através desta os autores construíram tabelas que auxiliam a representação do grupo ao qual a turmalina pode participar (Figura 5 e Tabela 1). O esquema proposto por Hawthorme e Henry (1999) reconhece 14 grupos de turmalina aceitos pela International Mineralogical Association (IMA). 14 Figura 3 - Diagrama Al-Fetot-Mg (proporções moleculares) de Henry e Guidotti (1985). Granitóides, pegmatitos e aplitos ricos em lítio (1); granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados (2); granitos alterados hidrotermalmente (3); metapelitos e metapsamitos coexistentes com uma fase saturada em alumínio (4); metapelitos e metapsamitos não coexistentes com uma fase saturada em alumínio (5); rochas com quartzo-turmalina ricas em ferro 3+, rochas calcissilicáticas, e metapelito (6); metaultramáficas com baixo cálcio, e metassedimentos ricos em vanádio e cromo (7); e metacarbonatos e metapiroxenitos (8). Figura 4 - Diagrama Ca-Fetot-Mg (proporções moleculares) de Henry e Guidotti (1985). Granitóides, pegmatitos e aplitos ricos em lítio (1); granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados (2); metapelitos ricos em cálcio, metapsamitos e rochas calcissilicáticas (3); metapelitos pobres em cálcio, metapsamitos e rochas com quartzo-turmalina (4); metacarbonatos (5); e metaultramáficas (6). 6 Principais grupos classificatórios para Turmalina Grupo Cálcico Grupo Grupo “vacancy” Alcalino Subdivisão de acordo com o posicionamento do ânion W Subgrupo Fluor Subgrupo oxi Subgrupo hidroxi Figura 5 - Diagramas composicionais ternários desenvolvidos por Hawthorme e Henry (1999) 7 Tabela 1 – Espécies de turmalina aceitas pela International Mineralogical Association (IMA) Species (X) (Y3) (Z6) T6O18 (BO3)3 V3 W Alkali tourmaline Elbaite Na Li1.5 Al1.5 Al6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) Schorl Na Fe2+3 Al6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) Dravite Na Mg3 Al6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) Olenite* Na Al3 Al6 Si6O18 (BO3)3 (O)3 (OH) Chromdravite Na Mg3 Cr6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) Buergerite Na Fe3+3 Al6 Si6O18 (BO3)3 (O)3 F Povondraite* Na Fe3+3 Fe3+4Mg2 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 O Vanadiumdravite Na Mg3 V6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) Calcic tourmaline Liddicoatite* Ca Li2Al Al6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 F Uvite* Ca Mg3 MgAl5 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 F Hydroxy-feruvite* Ca Fe2+3 MgAl5 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) X-site vacant tourmaline Rossmanite LiAl2 Al6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) Foitite* Fe2+2Al Al6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) Magnesiofoitite Mg2Al Al6 Si6O18 (BO3)3 (OH)3 (OH) 17 CAPÍTULO 2 – TURMALINAS E TURMALINITOS 2.1 Introdução O presente capítulo pretende promover uma revisão sobre o assunto aqui tratado: turmalinas e turmalinitos. Esta revisão foi realizada visando a caracterização de vários aspectos referentes a turmalinas e turmalinitos. Foram selecionados artigos produzidos em diversas partes do mundo, referentes a trabalhos realizados sobre turmalinas e turmalinitos. Estes reportam estudos químicos e de classificação mineral das mais importantes ocorrências de turmalina do mundo. A pesquisa realizada nesta parte do trabalho teve por finalidade, rever os artigos científicos produzidos sobre turmalinas e eventualmente sua relação com mineralizações de ouro. Para tal, foi realizada uma ampla pesquisa sobre o assunto, a partir do Portal Capes. As principais revistas pesquisadas foram: Mineralium Deposita, Chemichal Geology e Contributions to Mineralogy and Petrology. O site Google Acadêmico também foi utilizado para na pesquisa de artigos sobre o tema. Para ambas as pesquisas foram utilizadas as palavras chaves a seguir: tourmaline, tourmalinegold-sulphides, tourmalinites, tourmalinites-gold, gold, turmalina, turmalinitos e turmalina-ouro. Além destas buscas também foram utilizados artigos cedidos pela Profa. Dra. Beatriz Paschoal Duarte que compõem parte do acervo de suas pesquisas no depósito aurífero de Passagem. 2.2. Revisão dos trabalhos realizados sobre turmalinas e turmalinitos Até a década de 90 vários trabalhos sobre turmalina foram realizados. Estes trabalhos traziam estudos químicos sobre este mineral, bem como processos de classificação da turmalina e estudos isotópicos, principalmente relacionados ao elemento Boro. A quantidade de estudos realizados sobre este tema diminui significativamente durante os anos que se seguiram. Neste capítulo pretendemos listar e avaliar alguns dos principais artigos escritos sobre ocorrências de turmalina em diversas partes do mundo. Dentre os trabalhos que devemos considerar de maior importância, Frondel e Collette (1957) relatam a síntese de turmalina pela reação de uma solução aquosa enriquecida em H2O e H3BO com fragmentos de minerais que fornecem sílica, alumínio, ferro dentre outros elementos. Esta síntese ocorre a determinadas condições de pressão e temperatura, e originam turmalinas de diferentes composições. 18 Augustithis (1967) desenvolveu um trabalho sobre a textura e paragênese de veios de turmalina-quartzo-ouro da Etiópia. O corpo apresenta várias influências tectônicas o que torna a interpretação da paragênese mais difícil com a presença de turmalina e ouro indicando diferentes condições de pressão e temperatura. Os estudos das texturas mostraram que os grãos de turmalina bem formados são oriundos de uma fase inicial de cristalização, posteriormente, em uma fase tardia de cristalização grãos de turmalina cristalizaram ao longo das interzonas do quartzo, substituindo-o, ou ainda precipitando em associação com os minerais de fases tardias. O ouro deste depósito ocorre principalmente com pirita de fase tardia e sua cristalização, e da turmalina, é vista como proveniente de uma série de fases de cristalização precoces e individualizadas e, depois, de uma cristalização simultânea. Na seqüência do estudo são interpretadas as características tectônicas deste complexo, mostrando a relação dos veios com as rochas em que eles estão encaixados. Posteriormente o autor propõe uma sequência de cristalização e por fim sugere possíveis gêneses para presença de turmalina nos veios de quartzo. Segundo o autor existem duas hipóteses contraditórias para a origem desta turmalina em corpos graníticos e pegmatíticos, uma é magmática ou pós-magmática e a outra é metassomática. Em 1968, Power desenvolveu um trabalho sobre a variação química das turmalinas no sul e oeste da Inglaterra. No caso estudado, a turmalina aparece como mineral acessório. As amostras de turmalina foram analisadas espectrograficamente e os resultados foram organizados em tabelas. Estas foram interpretadas, contudo, como um único grupo de onde pôde ser distinguido, através dos estudos químicos, que a origem da turmalina foi hidrotermal. As diferenças químicas encontradas eram muito sutis o que não possibilitou a distinção de nenhum outro grupo. Ethier e Campbell (1977) realizaram um trabalho sobre a presença da turmalina nos sedimentos proterozóicos na parte sul da cordilheira do Canadá. Os autores descrevem a turmalina com base na sua textura, composição e distribuição. Antes de concluir, dois tópicos importantes são propostos: um sobre outras concentrações de turmalina e outro sobre a estabilidade da mesma. No tópico sobre outras concentrações de turmalina, a mina da Passagem de Mariana é um dos exemplos citados e, segundo o artigo, devido as evidências texturais a turmalina presente nesta mina teria sido formada antes ou durante a primeira fase de deformação. Slack et al. (1984) escreveram um artigo sobre a importância geológica dos turmalinitos em terrenos metamórficos. Em artigos anteriores a este, os turmalinitos já haviam sido definidos como litologias “stratabound” geralmente concordantes com suas rochas hospedeiras e contendo 15% - 20% de turmalina ou mais. Segundo os autores os turmalinitos estratiformes datam principalmente do Proterozóico e Paleozóico tendo sua origem relacionada com bacias 19 dominadas por rochas metassedimentares clásticas. Os autores discorrem ainda sobre a ocorrência dos turmalinitos, citando as litologias que comumente aparecem associadas, a espessura média das camadas e até mesmo uma descrição sobre os grãos que os formam. A maior parte dos turmalinitos foi classificada como formados em ambiente deposicional marinho subaquoso, pois foram encontrados em sequências metassedimentares. Por fim, as aplicações econômicas e geológicas dos turmalinitos são discutidas e os turmalinitos são considerados importantes pela sua associação com minerais metálicos e pela presença de boro. Taylor e Slack (1984) desenvolveram um estudo sobre as turmalinas dos depósitos de sulfetos maciços dos Apalaches. Este trabalho possui um estudo químico das turmalinas com descrição dos elementos maiores e menores e de elementos traços e de zoneamento químico. Depois de realizada as análises, que foram feitas com microscópio eletrônico, as turmalinas da região foram classificadas e as séries de solução sólida presentes foram reconhecidas. Este trabalho ainda realiza um estudo isotópico e discute os ambientes de formação da turmalina discorrendo sobre os principais tipos de turmalina presentes em cada um. Em 1985, Davies escreveu um artigo debatendo sobre este trabalho realizado por Taylor e Slack em 1984. Este autor tratou da textura, zoneamento e química das turmalinas, apresentando pontos que segundo ele foram ignorados pelos autores e por este motivo os resultados apresentados poderiam estar ambíguos e potencialmente errados. Os autores escreveram posteriormente uma réplica que foi publicada em 1985 também. Appel (1985) descreve as turmalinas do oeste da Groenlândia, que aparecem de maneira disseminada, ocorrendo em uma grande variedade de rochas. Este artigo fala em especial das turmalinas ”stratabound” que estão associadas com os depósitos stratabound de scheelita. Neste trabalho, o autor discute ainda sobre as rochas parentais relacionadas com a turmalina, apresenta as análises químicas relacionando com as partes do depósito de scheelita e em sua conclusão relata os ambientes de ocorrência da turmalina. Henry e Guidotti (1985) realizaram um trabalho sobre a turmalina como um indicador mineral petrogenético utilizando como exemplo os metapelitos do noroeste de Maine. Este trabalho apresenta estudos petrológicos da turmalina que possibilitaram a descrição de aspectos cristalográficos e químicos deste mineral. Os estudos foram ilustrados para uma melhor visualização da utilidade destes, que foram fundamentais para determinar o zoneamento, equilíbrio químico e a relação da partição dos elementos com as fases coexistentes. Foram expostas neste trabalho as características mais gerais da turmalina e uma relação de sua composição com o tipo rocha em que está hospedada. Crown (1986) publicou um estudo simples sobre os turmalinitos do Grupo Aphebian Mistassini de Quebec, em que descreve sucintamente o grupo e as características 20 petrográficas da turmalina. A turmalina em questão está relacionada com um pacote sedimentar que sofreu metamorfismo de baixo grau, sua formação pode estar vinculada à diagênese ou ao metamorfismo burial. Contudo a formação da turmalina pode ainda estar relacionada com o ambiente evaporítico. Pilmer (1986) escreveu sobre os turmalinitos do Golden Dyke Dome, no norte da Austrália. Os turmalinitos desta região são considerados química e mineralogicamente como formações de ferro ricas em boro. Segundo o autor, a associação do turmalinito com os depósitos de ouro presente no Golden Dyke Dome é muito similar com o que ocorre na Mina da Passagem de Mariana. Em 1987, Pilmer ainda realizou outro trabalho sobre turmalinitos, mas desta vez fazendo uma associação entre estes e os depósitos estratiformes de scheelita. Estes turmalinitos foram estudados quimicamente e as turmalinas foram relacionadas com seus ambientes de formação e classificadas. No ano seguinte da publicação deste artigo, Smithies e Pirajno (1988) escreveram um artigo comentando o trabalho de Pilmer, que publicou no mesmo ano uma resposta a este comentário. Appleby e Williams (1988) divulgaram um artigo sobre os turmalinitos do sudeste da Irlanda. A mineralização das rochas desta área foi resultado da ação de fluidos magmáticos ou metamórficos em rochas metassedimentares aluminosas. O artigo apresenta um estudo do ambiente geológico em que as rochas se formaram e relacionou os veios de quartzo com a turmalina e mineralização de arsenopirita. Benvenuti et. al.(1989) publicaram um artigo sobre a mineralização de Bottino, esta consiste em corpos mineralizados hospedados por sequências sedimentares e vulcanosedimentares metamorfizadas na fácies xisto verde. Os turmalinitos aparecem associados com estes corpos e, segundo o autor, podem ter se desenvolvido durante a primeira deformação regional. Kretz et.al. (1989) desenvolveu um trabalho sobre a cristalização da muscovita nos granitos e da turmalina nos xistos, próximo a região de Yellowknife no Canadá. A cristalização destes minerais está relacionada com a presença dos diques de pegmatito que cortam os granitos e os xistos. As zonas de alteração geradas por esta intrusão foram estudadas neste trabalho, relatando as mudanças mineralógicas e sua relação com o pegmatito. Em 1989, McArdle et.at. produziram um trabalho sobre os turmalinitos como um potencial indicador de mineralizações de ouro no sudeste da Irlanda. O autor, entretanto, não reporta a ocorrência de ouro nesta região. Neste caso, os turmalinitos estão associados com pegmatitos ricos em lítio e estes são relacionados com depósitos de ouro em muitas partes do mundo. 21 No inicio da década de 90, Byerly et. al. (1991) trabalharam no sul da África em mineralizações de turmalina relacionadas com o metassomatismo de idade Arqueana. A turmalina desta região aparece comumente associada a estromatólitos o que, segundo os autores, indica que a formação da turmalina pode ter sido favorecida pelo mesmo ambiente onde se desenvolveram e preservaram estas primeiras formas de vida. Dommanget et. al. (1993) reportou a ocorrência de depósitos de ouro em Loulo, estes são depósitos polimorfos hospedados em arenitos “turmalinizados” sendo resultado de dois sucessivos eventos metalogénicos. Garba (1996) propôs uma relação entre a turmalinização associada ao Proterozóico com as mineralizações de ouro na Nigéria. Entretanto, a presença de ouro nesta região não está diretamente associada às turmalinas. Garba, assim como outros geólogos, procurou este tipo de relação, pois em várias partes do mundo a turmalina está relacionada com o ouro. A turmalina é considerada um mineral indicador importante na descrição das condições químicas e físico-químicas dos fluidos hidrotermais auríferos. Um exemplo brasileiro de turmalina associada a veios de quartzo e mineralização aurífera foi reportado por geólogos da USP e Unicamp na Formação Morro da Pedra Petra, Grupo Serra do Itaberaba em São Paulo. Através do estudo da turmalina presente nesta área, em 2003, Garda et. al. produziram um artigo que analisava a geoquímica destas turmalinas. Em geral a turmalina desta região aparece também associada a formações ferríferas, psamitos, rochas calcissilicaticas, metatufos básicos, rochas metavulcanoclásticas e anfibolitos. Uma das conclusões do trabalho foi a classificação das turmalinas. Também foram feitos neste estudo analises espetroscopicas e isotópicas que possibilitaram uma melhor interpretação da origem das turmalinas. Em 2004, Ribeiro-Kwitko & Oliveira desenvolveram uma pesquisa que tinha como objetivo a caracterização das condições de P-T e a natureza dos fluidos mineralizadores do depósito aurífero de Antônio Pereira, no Quadrilátero Ferrífero. Este depósito integra o contexto geológico do distrito aurífero de Mariana. Os depósitos integrantes deste distrito estão distribuídos ao longo do Anticlinal de Mariana, e estão preferencialmente encaixados na zona de cisalhamento Fundão-Cambotas. O trabalho segue fazendo um estudo detalhado dos veios quartzo-carbonáticos sulfetados mineralizados a ouro que encontram-se na Pedreira de Antônio Pereira. Os autores caracterizam dois tipos de veios de acordo com suas características estruturais e mineralógicas, e fazem uma análise geotermométrica para a caracterização da temperatura dos veios. Ainda é feita uma análise das inclusões fluidas distinguindo as fases aquosas e carbônicas. 22 Os trabalhos mais recentes sobre turmalinas envolvem estudos istópicos, um exemplo é o trabalho de Krienitz et. al. (2008). Os autores estudaram a evolução dos fluidos hidrotermais, que possibilitaram a formação do depósito de ouro, através da determinação química e isotópica das turmalinas dos greenstone belts do sul da Índia. Através da análise dos artigos verifica-se que estudos químicos envolvendo turmalina são feitos há décadas, mas apesar disso, muitas lacunas são deixadas. Muitos geólogos apoiaramse na química deste mineral para defender suas interpretações, o que iniciou uma série de debates, muitos deles até hoje, sem uma aceitação incontestável, se é que esta seja possível de ser obtido em algum momento. 2.3 Revisão dos trabalhos sobre a Mina da Passagem (turmalinas) Os registros iniciais sobre a Mina da Passagem datam do início do século XIX. Um dos pioneiros nos estudos da região foi o Barão Von Eschwege, este cientista tem sua história ligada à história desta mina. Eschwege implementou melhorias nas ferramentas utilizadas nas lavras e criou a primeira companhia mineradora do país, a Sociedade Mineralógica da Passagem. Por motivos políticos, Eschwege teve que sair do país, suas idéias foram passadas a sucessores que adotaram procedimentos contrários aos seus conceitos. Muitos outros cientistas escreveram sobre esta mina, nomes como Derby, Legraye, Barbosa, Maia, Fleischer, Routhier, Vial, dentre outros. Esta parte do trabalho propõe um resumo de alguns trabalhos realizados sobre a Mina da Passagem que serão relevantes ao estudo microgeoquímico das turmalinas de Passagem. Em 1917, o Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio publicou em seu Boletim um relatório com as informações geológicas e econômicas conhecidas sobre a Mina da Passagem. O relatório reporta que o minério consiste em “...quartzo maciço, com a presença de outros minerais em menor quantidade. Um depósito de itabirito e xistos quartzosos com magnetita encontra-se acima do corpo de minério, formando a capa. Já a lapa é constituída por xistos micáceos”. Outra característica citada é “... a presença de turmalina com piritas arsênicas e ferríferas muitas vezes ligadas ao quartzo maciço ou separadas por corpos laminados de quartizitos”. Os veios de quartzo são acompanhados por uma série de minerais, mas os principais são a turmalina e a arsenopirita. São também expostos neste trabalho as particularidades dos trabalhos subterrâneos e processos de mineração. Segundo o documento o minério era erguido à superfície por três diferentes poços, cada um com uma inclinação própria. Os poços eram cavados na lapa e as galerias acompanham as sinuosidades da capa. O minério era lavrado ao lado superior da galeria, porém com a continuidade do processo era necessária a construção de suportes para o teto. Em geral todas as escavações eram suportadas por alvenaria seca, sendo a rocha encaixante um material muito comum nestes suportes. A extração do minério durante algum tempo foi feita por firmas européias. Este 23 sistema foi extinto, pois a fiscalização era cara e para evitar que a firma contratada explorasse uma área maior que a aproveitável. A dinamite-gelatina era o explosivo utilizado, a escavação da mina era feita durante o dia e a noite o trabalho se limitava a tirar o choco dos tiros dados de dia e transportar os vagonetes de minério. Os vagonetes eram descarregados, e o minério separado. Cada parte do minério era tratada de acordo com sua granulação. A parte mais grossa era transportada até britadores do engenho inferior, enquanto a parte fina era levada para o engenho superior. Do ouro extraído, 5% era retirado dos cochos dos pilões nas operações mensais e 50% recuperada como ouro livre nas baetas. Na etapa seguinte o minério enriquecido era levado a um edifício para ser re-concentrado. Ainda são relatados os processos de cianuteração das areias e dos resíduos lodosos, a disposição sanitária, iluminação, ventilação e abastecimento de água da Mina da Passagem durante este período. Barbosa et. al. escreveram, em 1948, “Notas sobre o Minério da Mina da Passagem”. Este trabalho foi resultado de uma visita técnica dos alunos da Escola Politécnica de São Paulo a Mina da Passagem. Durante esta excursão observou-se uma variedade mineralógica maior que as previamente relatadas, por este motivo os autores focaram o estudo nos minerais opacos existentes no minério da mina. Segundo o artigo, a jazida da passagem encontra-se entre rochas metamórficas do andar médio da Série Minas. A direção das camadas varia devido às ondulações nos flancos de anticlinais, a mina possui esta característica por estar posicionada numa inflexão do eixo do anticlinal de São Bartolomeu. O acesso a mina acompanhava o mergulho dos veios, eram planos inclinados que convergiam para um mesmo ponto e eram ligados por galerias de nível. A mina de Passagem possui dois veios principais, um veio inferior e um superior. O inferior encontra-se subjacente aos itabiritos e encaixado em dolomitos, em sua parte superior. O superior é conhecido como “Jopling”, e sua encaixante é um quartzo dolomito. A caracterização mineralógica dos dois veios foi feita da seguinte maneira: minerais opacos, minerais transparentes da ganga e encaixantes. Em ambos os tipos de veios foram identificados os seguintes minerais opacos (sulfetos, elementos nativos e sulfossais): arsenopirita, pirita, loelingita, bertierita, pirrotita, tungstenita, calcopirita, benjaminita e ouro. Já os minerais da ganga são a turmalina, quartzo, granada, carbonatos, muscovita, clorita e sericita, cumingtonita, zirconita e horneblenda. No veio inferior a arsenopirita é o mineral mais abundante do minério. Os cristais deste mineral apresentam-se, quase sempre, fraturados, algumas destas são preenchidas por carbonatos e sulfetos. A arsenopirita pode ainda substituir diferencialmente a ganga, mantendo inclusões desta. As inclusões da ganga são substituídas parcial ou completamente por tungstenita, que mantém contatos ondulados com a arsenopirita, e frequentemente estas 24 inclusões da ganga também são substituídas pela loelingita que fica inclusa em contatos retos na arsenopirita. A arsenopirita pode aparecer envolta por cristais de pirrotita. Este mineral pode substituir às inclusões da ganga na arsenopirita, e frequentemente a calcopirita substitui a pirrotita nos contatos desta com a arsenopirita. A bertierita e a calcopirita são outros minerais que podem substituir as inclusões da ganga mantendo contatos regulares com a arsenopirita. O ouro aparece incluso na arsenopirita, penetrando as fraturas ou ao longo do contato com a ganga. A pirita também aparece fraturada, algumas de suas fraturas preenchidas por carbonatos e calcopirita. O mineral denominado bertierita não obteve identificação completa neste estudo, podendo ser um mineral pertencente ao grupo de minerais raros. Este mineral substitui qualquer mineral de ganga, ele aparece penetrando agregados de turmalina e carbonatos adjacentes. A pirrotita preenche as fraturas e as clivagens presentes nas turmalinas, já suas fraturas são preenchidas por carbonatos. Minerais como a granada, clorita e micas reagem com a pirrotita ou sobre ela. A pirrotita ainda envolve e corroe a loelingita, substitui o quartzo e preenche fraturas da pirita. O ouro ocorre quase sempre substituindo a benjaminita, que é um mineral raro no minério e aparece associado à ganga compactada de turmalina. Raramente o ouro preenche fraturas de turmalina ou aparece incluso na arsenopirita. O ouro metálico incide de maneira disseminada em certos pontos da ganga. Certamente este mineral foi o último a se depositar. A turmalina é um mineral muito abundante, ela é substituída ou corroída com pouca intensidade pelos sulfetos. É atravessada e envolvida por carbonatos, ou substitui envolvendo e penetrando os carbonatos pré existentes. Através de observações mineralógicas concluiu-se que a turmalina se formou depois de forte movimentação que afetou o quartzo. A turmalina ainda atravessa feldspato, sericita e quartzo, e apresenta inclusões de biotita. No veio superior, diferente do inferior, a arsenopirita é um mineral raro e a pirrotita é abundante. Não foi observada a presença de ouro, dentre outros minerais opacos. Entre os minerais transparentes a turmalina não ocorre, sendo abundantes a granada, cumingtonita, micas e carbonatos. Ainda são descritos neste artigo as encaixantes de ambos os veios e o pegmatito. E por fim os autores apresentam um diagrama paragenético da jazida de Passagem. Nas considerações finais, conclui-se que a mineralização ocorreu depois do último período orogenético que afetou a série Minas, e seguindo o ponto de vista genético a mineralização dos 25 sulfetos ocorreu logo após a fase pegmatítica. Segundo os autores, a turmalina teria se formado em fase hidrotermal, e após sua cristalização formaram-se os sulfetos. As análises mineralógicas feitas no pegmatito possibilitaram a conclusão de que jazida era de origem profunda e alta temperatura. Já na década de 1970 do século XX, R. Fleischer e P. Routhier (1973) apresentaram um artigo referente a estratigrafia, estrutura e geologia econômica do Quadrilátero Ferrífero, com um foco especial para a gênese do depósito de ouro de Passagem. Tal artigo foi discutido por Barbosa et. al. no ano seguinte. O tema central do artigo de Fleischer e Routhier (1973) é a discussão da genética da mineralização do ouro. Segundo estes autores a mineralização foi originalmente depositada durante a sedimentação, hipótese esta contrária a de origem epigenética para mineralização, defendida por outros autores. Barbosa et al. (1974) contestam a veracidade da hipótese singenética de Fleischer & Routhier (1973), alegando que estes não explicam a natureza geoquímica do processo de sedimentação ou a concentração subseqüente. No artigo são apontadas ainda as características que foram interpretadas por Fleischer e Routhier (1973) de maneira a defenderem sua hipótese genética, contudo citando outros cientistas que estudaram a região e que chegaram a conclusões distintas, Lacourt (1937 in Barbosa, 1974) foi um destes. Segundo Lacourt (1937 in Barbosa, 1974) a intensidade da mineralização não varia muito, mineralizações de ouro podem ser evidenciadas em diferentes tipos de rochas na região de Ouro Preto e a turmalinização ocorreu apenas em partes da mina da Passagem e não é contemporânea a deposição do ouro. Entretanto para Fleischer e Routhier (1973) a intensidade da mineralização é controlada estratigraficamente. Estes autores não consideram a presença de ouro nos diferentes tipos de rocha além de não considerarem a turmalina um mineral muito comum nas rochas da região. Os Barbosa et. al. (1974) afirmam ainda que Fleischer e Routhier confundem o Grupo Nova Lima com a Formação Batatal. Fleischer e Routhier publicaram, em 1974, uma réplica ao texto de Barbosa et. al. Neste trabalho os autores lembram que Lacourt, ao contrário do que Barbosa diz ser importante, não faz referência a trabalhos anteriores em seu artigo. Ainda contestam que a hipótese de turmalinização pré ouro e pré sulfetos não é suportada por nenhum argumento convincente. Os autores da réplica rebatem a acusação de 26 desconhecimento da estratigrafia do Quadrilátero Ferrífero, expondo características do Grupo Nova Lima, da Formação Batatal e também do Moeda. Segundo Fleischer e Routhier até a publicação de seu artigo em 1973, nenhum outro autor havia escrito sobre a relação da turmalina com o ouro. Logo, as afirmações de Barbosa et. al. (1973) sobre o artigo de Lacourt estariam equivocadas. Fleischer e Routhier asseguram que Lacourt não propôs conclusões sobre a variação sistemática da espessura do horizonte mineralizado e também não reportou a intensidade da turmalinização. Em Vial et. al. (1988) apresentam um artigo onde são descritos os veios de sulfetoturmalina-quartzo presentes no depósito de ouro da Mina da Passagem. Os autores realizam um estudo da geologia da mina, e através do estudo petrológico, geoquímico e de inclusões fluidas dos veios, concluem a favor da hipótese de gênese epigenética para mineralização. Em 2006, Cavalcanti e Xavier escreveram um artigo sobre a origem dos turmalinitos auríferos da região sudeste do Quadrilátero Ferrífero. No artigo relatam a ocorrência de turmalina de três maneiras distintas nesta região do Quadrilátero, turmalina em corpos de turmalinitos estratiformes, turmalina em halos de alteração hidrotermal das encaixantes da mineralização, e a turmalina presente nos veios mineralizados. As três ocorrências apresentam, segundo os autores, variações composicionais, mas nada significativo, logo são todas classificadas como dravita. Foram estudados para o trabalho os turmalinitos estratiformes presentes nas minas de Passagem, Mata Cavalo e Scliar. Estes foram descritos como corpos foliados e concordantes com as rochas encaixantes, sendo muitas vezes interrompidos por veios discordantes. Exibem a foliação principal, assim com dobras assimétricas, crenulação e boudinage. Os turmalinitos são extremamente ricos em turmalina, com aproximadamente 80-90%, apresentando também carbonatos, quartzo, sulfetos, apatita, titanita, zircão e rutilo. Quando mineralizados, os turmalinitos podem conter até 25% arsenopirita, a quantidade de carbonatos diminui e o quartzo aparece como produto das reações hidrotermais. A maior ocorrência de turmalinito mineralizado nesta parte de Minas está localizada na Mina da Passagem, trata-se de camada estratiforme com 3 metros de espessura interrompida por veios. Em seguida os autores relatam a presença de halos de turmalinização e veios ricos em turmalina. Os halos estão presentes em todas as minas estudadas ocorrendo ao longo de toda a sequência litológica envolvida coma mineralização. Os veios ricos em turmalina são do tipo quartzo-turmalina-sulfeto e quartzo-carbonato-turmalina-sulfeto, sendo os veios de quartzoturmalina-sulfeto anteriores aos de quartzo-carbonato-turmalina-sulfeto. Os veios são subverticais, discordantes, mas possuem apófises concordantes com a foliação principal das encaixantes. 27 Turmalinas das três ocorrências foram analisadas quimicamente, e foram classificadas segundo Hawthorne e Henry (1999) como alcalinas. Seguida desta classificação as turmalinas foram analisadas nos diagramas de Henry e Guidotti (1985). No diagrama Al-Fetot-Mg as turmalinas do turmalinito plotam no campo dos metapelitos e metapsamitos que não coexistem em fases saturadas em Al, o que segundo os autores pode estar relacionado às alterações hidrotermais que ocorrem no turmalinito devido ao metamorfismo e ao processo mineralizante que atuou na região. Já as turmalinas presentes no halos e veios estão no campo de metapelitos e metapsamitos com fases saturadas em Al, correspondendo a turmalinas que se formaram tardiamente devido ao metamorfismo e ao processo mineralizante. No diagrama Ca-Fetot-Mg todas as turmalinas plotam no campo dosmetapelitos, metapsamitos e rochas de quartzo-turmalina pobres em Ca. Depois desta análise, segue-se o estudo geoquímico do Nd. Na discussão do trabalho a composição química das turmalinas corrobora a hipótese de que os turmalinitos são de origem exalativo-sedimentar, pois além de localizados na base de formações ferríferas bandadas, a turmalina pertence ao grupo alcalino, tendo sido classificada como dravita rica em Mg., ou seja com baixa razão FeO/(FeO+MgO). Através da correlação dos dados obtidos no trabalho pode-se indicar que: a circulação profunda de fluidos gerou focos exalativos ricos em boro, que resultaram na precipitação do turmalinito estratiforme; e a formação da turmalina dos halos de turmalinização e dos veios mineralizados está relacionada com a mistura de fluidos mobilizados das rochas encaixantes e daqueles provenientes do sistema mineralizante. Em 2007 Vial et al. escreveram o artigo de nome “An epigenetic origin for the Passagem de Mariana gold deposit, Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais, Brazil”, com base no mestrado de uma das autoras do artigo, Duarte. O trabalho divide a geologia da mina em três tópicos, estratigrafia, geologia estrutural e metamorfismo. Os autores reconheceram dez unidades litológicas, itabirito anfibolítico ou dolomítico, pirrotita-anfibólio-xisto, anfibólio, rocha rica em pirrotita e quartzo, quartzo com turmalina e sulfetos, rochas carbonáticas-quartzo bandado com sulfetos, filito sericitico, rocha calcária bandada, quartzito, e xisto com quartzo, carbonato, biotita e sericita. Cada unidade foi inserida no grupo litológico que melhor representava o seu litotipo. As rochas da área sofreram três fases de deformação, a primeira originou a foliação, subparalela a camada composicional primária. D2 foi um evento mais forte, formando dobras recumbentes e uma nova foliação. A última fase de deformação é caracterizada pela superimposição de fraturas sobre as outras estruturas. 28 As falhas de empurrão são comuns e afetam todas as unidades mapeadas. As evidências microestruturais indicam um evento caracterizado por uma intensa deformação dúctil em um regime de cisalhamento simples. O pico do metamorfismo é marcado pela formação de estaurolita-cianita-almandina que se formam no período tardi a pós D2/ pré D3. Pode-se verificar metamorfismo retrógrado localmente, este é caracterizado pela cloritização da biotita, e cloritização e biotização da granada em fraturas relacionadas a D3. Esta associação sugere que o metamorfismo retrógrado é contemporâneo a D3. A turmalinização é o tópico seguinte, relatando sobre a os três tipos de turmalinas descritas por Duarte (1991), a turmalina disseminada em horizontes pelíticos, turmalina nos turmalinitos e as turmalinas nos veios de quartzo. A composição química da rocha encaixante controla o nível de turmalinização. O artigo ainda relata a natureza da mineralização do corpo e veios mineralizados, apresentando seções geológicas do depósito de Passagem, um estudo de inclusões fluidas. O último registro de estudos sobre a Mina da Passagem data de junho de 2009, o artigo de Garda et al. analisa a composição química da turmalina presente nos turmalinitos estratiformes da Mina da Passagem. O artigo promoveu um estudo químico das turmalinas por meio de microssonda eletrônica (elementos maiores e F) e de ICP-MS (elementos-traço e elementos terras raras). Foram distinguidas três turmalinas no turmalinito: turmalina fina, em que não é possível observar zoneamento de cor ao microscópio óptico, que compõe turmalinito maciço (tipo 1); turmalina zonada, um pouco mais grossa que a primeira, que compõe turmalinito maciço ou bandado (tipo 2); turmalina grossa que cresce perpendicularmente às bordas dos fragmentos de turmalinito (tipo 3). Os três tipos de turmalina foram analisados, para o diagrama Al-FetotMg (Henry e Guidotti, 1985) a maior parte dos dados para os três tipos de turmalina agruparam-se no campo 4, dos metapelitos e metapsamitos saturados em Al. Todas as turmalinas são membros da série schorlita-dravita, com o componente dravita variando ao redor de 70% e razoes Ca/(Ca+Na) (proporções atômicas) de até 40%. Os autores desenvolveram diagramas TiO2xCaO, para os tipos 1 e 2 estes caracterizaram campos distintos para teores de TiO2 < 0,5% e TiO2 > 0,5%. Para TiO2 < 0,5%, a turmalina do tipo 1 mostra teores médios mais baixos de FeO, MgO, CaO, Na2O e F e mais altos de Al2O3 e SiO2, em relação à turmalina do mesmo tipo com TiO2 > 0,5%. Na turmalina do tipo 2 as variações composicionais são observadas com mais clareza. As variações nos teores de Ca e Ti, promovem distinção da cor do núcleo e a cor da borda, núcleos verdes e bordas marrons, o aumento de CaO e TiO2 corresponde ao aumento da MgO, Na2O e F e decréscimos em SiO2, Al2O3 e FeO. Na turmalina do tipo 3 observa-se decréscimos em SiO2 e 29 Al2O3 e aumentos em TiO2, FeO, MgO, CaO, Na2O e F. Os três tipos de turmalina apresentam aumento nos teores de MgO, Na2O e F e decréscimo nos de SiO2 e Al2O3 com o aumento dos teores de TiO2 e CaO. Essas variações podem ser evidenciadas através da análise das variações de cor e pleocroísmo nos tipos 2 e 3. O artigo ainda apresenta uma análise de elementos terras raras (ETR) e traço por ICPMS. As turmalinas do tipo 1 caracterizam-se pelo padrão menos enriquecido em ETR leves e anomalia positiva muito fraca de Eu. Comparando a concentração dos ETR nos diferentes tipos de turmalina, pode-se observar um enriquecimento dos ETR leves do tipo 3 para o tipo1. Também pode-se observar um enriquecimento em Rb, Sr, Y, Cs, Th e U, a partir do tipo 1 para os tipos 2 e 3. Analisando os diagramas plotados Al-Fetot-Mg,os autores concluíram que os metapelitos e metapsamitos saturados em Al são indicadores do ambiente de formação dos turmalinitos da Mina de Passagem de Mariana, confirmando que os metapelitos carbonáceos da Formação Batatal sejam potenciais precursores ou fontes de boro dos turmalinitos. 30 CAPÍTULO 3 – A GEOLOGIA DA ÁREA 3.1. Breve Introdução à Geologia do Quadrilátero Ferrífero O Quadrilátero Ferrífero encontra-se na porção central do estado de Minas Gerais e no extremo sul do Cráton São Francisco. Trata-se de uma área de grande importância econômica para todo país devido suas inúmeras riquezas minerais. Do ponto de vista geotectônico o Quadrilátero está inserido na Província São Francisco, que engloba os Estados da Bahia e de Minas Gerais. Litoestratigraficamente é constituído pelo embasamento cristalino, o Supergrupo Rio das Velhas, o Supergrupo Minas e o Grupo Itacolomi. O embasamento cristalino do Quadrilátero Ferrífero é formado por remanescentes mesoarqueanos, em geral complexos granito-gnáissicos e “greenstone belts”. A evolução tectônica do Quadrilátero é marcada pelos eventos tectôno-metamórficos Transamazônico e Brasiliano. Sendo o evento Transamazônico marcado, principalmente, por uma fase de natureza compressiva, que gerou o cinturão de empurrão e dobramento; e outra de natureza extensional, que originou “domos e quilhas” e que teve como conseqüência o colapso orogênico (Alkmim e Marshak, 1998) O Neoarqueano da região foi marcado por importantes mudanças relacionadas com o ciclo de Wilson. Neste Período desenvolveram-se margens passivas ou áreas de plataforma estável. Arcos magmáticos marcaram o fechamento de amplos oceanos e bacias extensionais de retroarco desenvolveram-se sobre o substrato siálico onde se formou a maioria dos greenstone neo-arqueanos. Durante este período, ocorreu a orogênese Jequié (2.7 Ga), denominada em Minas Gerais por orogênese Rio das Velhas. Nesta orogênese o Supergrupo Rio das Velhas foi formado. Esta unidade é formada pelos Grupos Nova Lima e Maquiné. O primeiro é composto por três unidades: a basal, composta de rochas metamáficas e metaultramáficas intercaladas com metassedimentos químicos, representando um ambiente extensional de fundo oceânico. A unidade intermediária é formada por rochas piroclásticas félsicas metamorfisadas, associadas a um ambiente compressivo. Por fim, a unidade de topo é formada de rochas metassedimentares vulcanoclásticas e epiclásticas turbiditicas ainda associadas a um ambiente compressivo. O Grupo Maquiné é formado por rochas da fase final de colmatação da bacia. É composto de metaconglomerados, metarenitos e metapelitos. A sequência de rochas que formam o Supergrupo Rio das Velhas é caracterizada como um Greenstone Belt segundo 31 Almeida e Schorscher (1976 in Almeida, 2002), sendo produto de três estágios: um estágio extensional, um compressivo e outro colisional, que representariam um ciclo de Wilson completo. Logo após a orogênese Jequié seguiu-se um período de tafrogênese, entendido como um evento tectônico de afundamento crustal que conduz a formação e desenvolvimento de bacias geológicas onde se acumulam sedimentos e rochas vulcânicas correspondente às fases de desenvolvimento de rift. Durante este evento foi depositado o Supergrupo Minas. Este é subdividido em quatro grupos, são eles: Caraça, Itabira, Piracicaba e Sabará, segundo a coluna estratigráfica de Alkmim e Marshak (1998 in Reis, 2002) (Figura 6). O Grupo Caraça é formado por metaconglomerados, metapelitos e quartzitos, rochas estas associadas a um ambiente continental com predomínio de estruturas associadas a leques aluviais, fluviais a fluvio-deltáico. Já no Grupo Itabira predominam itabiritos e dolomitos, portanto, sedimentação tipicamente química, associados a ambientes marinhos. As rochas do Grupo Piracicaba constituem uma pacote sedimentar representante de um ambiente marinho mais profundo. Do ponto de vista litológico, predominam quartzitos grossos e filitos. O Grupo Sabará é constituído por xistos e grauvacas máficas, interpretados como resultado de uma sedimentação ainda mais profunda associada a vulcanismo. Este Grupo é o único que não é uma sequência de margem passiva, entende-se que ele foi depositado após uma mudança na estabilidade tectônica nos estágios mais tardios da evolução da Bacia Minas. O Grupo Itacolomi é representado por uma sequência metassedimentar que repousa discordantemente sobre os metassedimentos do Supergrupo Minas. Esta sequência é caracterizada por quartzitos, quartzitos conglomeráticos e lentes de conglomerado com seixos de itabirito, filito, quartzito e quartzo de veio, depositados em ambiente litorâneo ou deltáico (Dorr II, 1969 in livro do Almeida). Para Glockner (1981 in Almeida, 2002), este Grupo representa um bloco tectonicamente alóctone de posição estratigráfica incerta que teria sido empurrado sobre as unidades litológicas do Quadrilátero Ferrífero. O Quadrilátero Ferrífero ainda é inserido por alguns geólogos no chamado Cinturão Mineiro. Segundo Alkmim (1989 in Almeida, 2002), a denominação Cinturão Mineiro estendese para toda a porção do embasamento exposto no sul do Cráton que experimentou deformação e ação termal no decorrer do Evento Transamazônico. Desta forma, o Cinturão Mineiro engloba o Quadrilátero e os terrenos adjacentes a sudoeste. Durante muitos anos a coluna estratigráfica produzida por Dorr II (1969 in Duarte, 1991) (Tabela 2) foi a mais aceita para a região do Quadrilátero Ferrífero. Esta coluna ainda identifica 32 Figura 6 - Coluna Estratigráfica do Quadrilátero Ferrífero proposta por Alkmim & Marshak (1998) 24 Tabela 2 - Coluna estratigráfica do Pré-Cambriano no Quadrilátero Ferrífero segundo Dorr II (1969), Modificada por Endo (1988). 34 o grupo Tamanduá no Supergrupo Minas. As rochas deste grupo ainda geram discussões, pois alguns acreditam que este grupo pertence, não ao Supergrupo Minas, e sim ao Supergrupo Rio das Velhas, outros que ele pertence ao Minas e ainda existem alguns geólogos que não consideram que este grupo exista. Assim como esta discussão outras foram feitas durante a evolução do estudo no Quadrilátero Ferrífero. Cada pesquisador interpretou seus dados de uma determinada maneira, podendo ou não concordar com observações prévias. Como o Quadrilátero representa uma região de grande importância geológica, os estudos nesta região sempre foram muito intensos, renovando sempre os conhecimentos e trazendo novidades a todo o momento. 3.2. A geologia do Depósito de Passagem A Mina da Passagem localiza-se no extremo sudeste do Quadrilátero Ferrífero, entre as Cidades de Ouro Preto e Mariana. Esta região de Minas Gerais é marcada estruturalmente pela presença do Anticlinal de Mariana (Figura 7) e a Mina da Passagem localiza-se na charneira dessa estrutura. Mina possui 409 metros de profundidade e é dividida em níveis espaçados na vertical de cerca de 20 metros. Atualmente a mina encontra-se alagada à um nível de cerca de 80 metros abaixo da superfície. Segundo Duarte (1990) o corpo de minério Fundão, situado na Mina da Passagem, é constituído de rochas metassedimentares metamorfisadas cortadas por veios de quartzo ou quartzo sulfetados e turmalinitos. De acordo com os dados coletados no trabalho de Duarte (1990) a base do pacote de itabiritos corresponde a um plano de falhamentos de empurrão. A tectônica presente neste local possibilitou uma repetição de camadas e colocou rochas pertencentes ao Grupo Nova Lima entre rochas dos Grupos Caraça e Itabira. Foram identificadas três fases de deformação na área. A primeira, D1, formou a foliação S1, subparalela ao acamamento composicional S0, e que foi parcial ou totalmente transporta durante D2. D2 foi um evento de grande intensidade caracterizado por tectônica horizontal, com desenvolvimento de dobras fechadas, quase recumbentes, de transposições e de deslocamentos ao longo dos planos S2. D3 promoveu um fraturamento subvertical, superimposto em todas as estruturas desenvolvidas na área. O metamorfismo desta área teve seu auge no período tardi a pós D2, porém pré D3. 35 Figura 7 - Mapa Geológico simplificado da porção sul do Quadriláterro Ferrífero com localização da Mina da Passagem 27 A mineralização da área se desenvolveu em seis estágios. Os três primeiros formaram os minerais da ganga (quartzo, carbonato e turmalina) e os turmalinitos, estes têm sua formação contemporânea ao metamorfismo regional progressivo que atuou na área. Já os três últimos estágios são caracterizados pelo grande desenvolvimento de sulfetos e ouro, que foram depositados por substituição, nas bordas ou em fraturas dos minerais da ganga. O ouro aparece associado à arsenopirita, bismutinita, bismuto nativo e menos frequentemente à calcopirita. A formação do ouro ocorreu após o auge do metamorfismo e foi contemporânea ao fraturamento promovido por D3. A Mina da Passagem situa-se na zona de contato entre rochas do Grupo Nova Lima e os Itabiritos do Supergrupo Minas. Segundo Vial (1988 in Duarte, 1991) as rochas encaixantes dos corpos mineralizados são xistos do Grupo Nova Lima, quartzitos da Formação Moeda, filitos e rochas carbonáticas da Formação Batatal e itabiritos dolomiticos Formação Cauê. Estas unidades litológicas encontram-se imbricadas devido à tectônica de falhas de empurrão que regem o local. Nesta Mina o minério pode ser encontrado de duas maneiras: no anfibólio xisto rico em pirrotita, encontrado na porção superior da mina, e nos veios de quartzo branco ricos em turmalina com sulfetos. O principal sulfeto é a arsenopirita associada com pirrotita, pirita, calcopirita, galena, bertierita e loelingita. O ouro ocorre associado com a arsenopirita nas fraturas deste mineral, podendo aparecer em menores proporções na pirita, pirrotita, calcopirita e na ganga quartzosa. O corpo mineralizado ocorre comumente encaixado em formações ferríferas bandadas, da fácies carbonato, e em menor proporção no carbonato-sulfeto e em xistos-grafitosos. Isto sugere que estas rochas podem ter sido fonte do ouro no depósito, origem singenética. Existe uma grande discussão quanto a gênese da mineralização do ouro nesta mina. Fortes evidências fortalecem a hipótese singenética desta mineralização, entretanto, leva-se em consideração que não ocorre ouro associado a carbonato e/ou sulfeto das formações ferríferas e xistos grafitosos, e que o corpo de minério Fundão, por exemplo, corresponde a veios de quartzo e/ou carbonato e a turmalinitos formados durante o metamorfismo regional das rochas encaixantes. Os epigeneticistas relacionaram a mineralização a uma intrusão granítica, contudo como esta ainda não foi encontrada os cientistas sugeriram uma possível fonte metamórfica para a mineralização. Os singeneticistas defendem que a mineralização é “strata-bound” e está encaixada em rochas do Grupo Caraça. Já os epigeneticistas acreditam que em vários pontos do Anticlinal de Mariana as rochas do Grupo Caraça estão ausentes, devido ao falhamento de empurrão, que não foi observado pelos singeneticistas. A maior parte dos geólogos que estuda a região opta pela hipótese epigenética. Não existem evidências conclusivas a favor de nenhuma das hipóteses, o que gera grandes discussões sobre o assunto. 37 CAPÍTULO 4 - O TURMALINITO DE PASSAGEM 4.1. Características Gerais da Turmalina A palavra turmalina tem duas etimologias, uma que significa “pedra que atrai poeira” outra que expressa “gema misturada”. É um silicato de química complexa, e durante muito tempo sua fórmula básica era desconhecida. Entretanto, através de determinações estruturais, chegou-se a fórmula NaR3Al6B3Si6O27(OH)24. Nesta fórmula o Na pode ser parcialmente substituído por K ou por Ca, se as condições de valência forem satisfatórias. Em sua fórmula química também estão presentes elementos como ferro, lítio, magnésio e potássio. A turmalina pertence ao grupo trigonal na cristalografia, ocorrendo com habito prismático ou colunar, e é comumente triangular na seção basal. É o único mineral comum com prismas de três lados, estes geralmente possuem estrias que produzem um efeito triangular. Este mineral possui uma unidade de célula romboédrica, e através da variação dos parâmetros da célula duas séries podem ser distinguidas, uma entre dravita e schorl e outra entre elbaita e schorl. O elemento R da fórmula básica da turmalina pode ser Fe2+ na variedade schorl, Mg na dravita, ou (Al + Li) nas séries de elbaita, outros íons que podem entrar neta posição são Mn, na variedade tsilaisita, e Fe3+ ou Cr. As turmalinas ricas em Mg são as dravitas, de cor tipicamente marrom. As ricas em Fe são chamadas de schorl e são pretas, é a variedade mais comum da turmalina. Na série da elbaita existe uma grande variação de cor, desde uma rubelita, que contem Mg e pouco Fe, ate uma variação verde, verdelita, e uma azul, indicolita. Schorl e turmalinas ricas em Li são usualmente encontradas em granitos e pegmatitos graníticos. Já as dravitas estão geralmente restritas aos xistos e mármore (Figura 8). Existe uma grande variedade de composições entre os membros finais ricos em Mg e Fe, e entre os ricos em Fe e Li, contudo membros intermediários são menos comuns. Os elementos químicos influenciam nas características do mineral, como por exemplo, a presença de Fe e Mn controla os índices de refração, a birrefringência aumenta com o aumento do teor de Fe. O pleocroísmo tem intensidades variadas, mas nas turmalinas ferríferas é normalmente bem forte. Estas costumam apresentar pleocroísmo do amarelo, marrom ou azul até amarelo fraco e verde amarelado. As turmalinas magnesianas comumente apresentam pleocroísmo do amarelo ao amarelo fraco, já as turmalinas ricas em lítio ou elbaitas são geralmente incolores. 38 Dravita Schorl Elbaíta Figura 8 - Principais variedades de turmalina 31 A turmalina pode ser distinguida com o uso do microscópio pelo seu pleocroísmo marcado, extinção reta, caráter uniaxial, relevo relativamente moderado e birrefringência moderada. As distinções entre as turmalinas podem ser observadas através dos índices de refração ou birrefringência em conjunto com características como cor ou pleocroísmo. Este mineral pode ser encontrado principalmente em dois tipos de rochas: rochas ígneas, principalmente o granito, e metamórficas, como xistos e mármore. Por ser um mineral resistente, a turmalina também pode ser encontrada em arenitos e conglomerados. A turmalina é um mineral típico de pegmatitos, veios pneumatolíticos, e de alguns granitos, sendo também comumente encontrada em rochas metamórficas como produto do metassomatismo do boro ou como resultado da recristalização dos grãos de sedimentos. Em rochas graníticas as turmalinas pertencem à série schorl-elbaita e são genericamente ricas em Fe. Em alguns pegmatitos e em veios graníticos de estágios tardios as turmalinas ricas em lítio são desenvolvidas, mostrando com freqüência uma variação na cor e composição correspondente a sua posição no pegmatito. No estagio pneumatolítico da alteração, a turmalinização pode ocorre através da introdução de boro que ataca os minerais normais do granito. Os principais minerais que aparecem como produtos de alteração da turmalina incluem muscovita, biotita ou lepidolita, micas, e também clorita e cookeita. A turmalina é um mineral acessório muito comum em diferentes tipos de rocha, ocorrendo em muitas rochas sedimentares clásticas, assim como produto de ações químicas, como mineral resistente a ações mecânicas, e também se desenvolve como mineral autigênico durante os estágios finais da diagênese em rochas carbonáticas e como mineral secundário em arenitos. No Brasil podemos encontrar quase todas as variedades de turmalina, principalmente em Minas Gerais e na Bahia. No estado da Paraíba, em 1989, um tipo único de turmalina, de cor azul e verde foi encontrado. 4.2. Aspectos Petrográficos da turmalina presente nos metassedimentos e nos veios As rochas presentes na Mina da Passagem constituem pacotes metassedimentares, que foram metamorfisadas sob condições de grau médio (Winkler, 1977 - Bia) (???). Segundo Pascoal (1990), encontram-se nesta região os seguintes litotipos: mica quartzitos, quartzitos, mármore, mármore escuro, carbonato quartizito bandado, rocha quartzo carbonática, itabirito, filitos, micaxistos, ,quartzo-muscovita-biotita xisto, biotita-quartzo xisto, quartzo-biotitahornblenda xisto e muscovita-quartzo-biotita xisto. 40 A turmalina pode ser encontrada com freqüência na maioria dos litotipos citados acima, sendo que em maior ou menor proporção em cada um deles. Através da análise microscópica da turmalina nos diferentes litotipos, pode-se verificar semelhança nas propriedades ópticas. Assim sendo, provavelmente possuem composição química semelhante. Os grãos de turmalina observados possuem pleocroísmo de moderado a alto, de cor verde e tom amarelado e alta birrefringência. Estas características representam turmalinas ricas em ferro. As turmalinas enriquecidas em Lítio ou Magnésio possuem birrefringência baixa, o pleocroísmo das enriquecidas em Magnésio varia de amarelo a amarelo fraco, e as ricas em Lítio são incolores variando a tons levemente escuros (Howie e Zussman, 1966) Os quartzitos e mica quartzitos são rochas formadas por 80-90 % de grãos de quartzo, em geral muito finos e recristalizados. Os grãos de turmalina são muito finos, e não representam 5% da totalidade da rocha, em geral ocorrem próximo da muscovita ou biotita, e comumente formando lentes milimétricas de pequenos grãos arredondados (Figura 9). Os mármores são constituídos de aproximadamente 80% de carbonatos, mais quartzo, biotita, muscovita, turmalina e opacos. O quartzo aparece recristalizado com granulometria fina e formando lentes na matriz carbonática, ou com granulometria média associado a grãos de carbonato de mesma granulometria. A turmalina nesta rocha forma pequenos níveis entre os grãos de carbonato. Entre os grãos de turmalina e de carbonato pode-se verificar a ocorrência de rutilo e de um mineral opaco bem fino, arredondado, que possivelmente é grafita (Figura 10). Seguindo a estratigrafia da Mina da Passagem, os grãos de turmalina ficam mais expressivos quando próximos dos veios mineralizados, que geralmente estão em contato com os turmalinitos (Figura 11). Os veios e os turmalinitos ocorrem encaixados em todas as litologias da área, com exceção dos itabiritos (Duarte, 1990). Os veios de quartzo são sulfetados, chegando a ter 15% de sulfetos, e o carbonato pode estar presente em sua constituição com porcentagens elevadas, até 65%. A turmalina é um mineral comum nos veios geralmente aparecendo bem formada, com hábito triangular ou tabular e com granulometria superior a observada nos outros litotipos descritos. A borda dos veios normalmente fica enriquecida em turmalina, e por vezes verifica-se concentrações significativas de turmalina no veio que foram descritos por Duarte (1990) como xenólitos do turmalinito no veio (Figura 12). Assim como possui xenólitos do turmalinito, os veios podem obter xenólitos de outras rochas encaixantes. As turmalinas presentes neste litotipo por serem maiores e estarem relacionadas com percolação de fluidos hidrotermais, apresentam um nítido zoneamento químico. Em algumas lâminas pode-se observar níveis dobrados, boudinagens e grãos fraturados. Acredita-se que estas estruturas são resposta das forças cisalhantes que atuaram na região. 41 0,5 mm Figura 9 - Turmalina associada a muscovita presente no quartzito 0,5 mm Figura 10 - Turmalina (setas em preto) e grafita (setas em branco) no mámore 34 1 mm Figura 11 - Turmalinito em contato com veio 1 mm Figura 12 - Xenólito fraturado de Turmalinito no veio quartzoso 35 A turmalina, por não ser tão maleável, muitas vezes se rompe, formando fraturas que comumente são preenchidas por carbonatos. Segundo Duarte (1990) a cristalização das turmalinas presentes nos metassedimentos ocorreu depois da primeira fase de deformação e antes da segunda fase de deformação e o Boro teria sido proveniente dos filossilicatos precursores das micas. Já a turmalina presente nos veios teve sua cristalização sin- a tardi D2. 4.3. Aspectos Petrográficos do turmalinito Diferente da maioria dos litotipos da região, o turmalinito é uma rocha maciça, raramente apresentando foliação (Figura 13). As turmalinas constituintes do turmalinito são predominantemente de granulometria fina, sua presença nesta rocha varia em porcentagens de 15-90% (Figura 14). Mineralogicamente, além da turmalina, este litotipo é constituído de quartzo, carbonato, muscovita, biotita, rutilo e minerais opacos (sulfetos). Os grãos de quartzo e carbonato são os mais abundantes depois da turmalina. O quartzo apresenta grãos de granulometria fina a média, recristalizados, geralmente formando níveis quartzosos. Assim como os grãos de quartzo, os grãos de carbonato de granulometria fina estão recristalizados, os grãos médios são subédricos e podem ser vistos junto com os grãos médios de quartzo. A biotita e a muscovita aparecem com menos frequência no turmalinito, e quando presente são finas. O rutilo torna-se comum nesta litologia da mina, aparecendo próximo a turmalina e a grafita. Distintas gerações de minerais opacos podem ser observadas, em algumas lâminas evidencia-se a presença de opacos finos e arredondados que estão associados a turmalina fina e assim como ela acompanham a foliação. Opacos maiores equidimensionais, com grãos subédricos a euédricos, destacam-se em algumas lâminas e em geral não são afetados pela foliação, o que indica que são anteriores a ela. Nota-se ainda a presença de opacos de granulometria grossa, anédricos e com inclusão de grãos de diversos minerais, inclusive a turmalina (Figura 15). Dentre os opacos pode se destacar, principalmente, a presença de arsenopirita, grafita, pirita e pirrotita. Como para este estudo foi utilizado um microscópio de luz refletida a distinção destes minerais torna-se complicada. Com o auxílio de professores pôdese identificar alguns grãos grafita e a arsenopirita, através da observação de seu hábito, forma e granulometria. É comum observar nesta rocha a presença de alternância de níveis de turmalinito com níveis de quartzo (Figura 16), e algumas vezes com lentes milimétricas do mineral opaco fino e de hábito granular, possivelmente grafita (Figura 17). A alternância pode até mesmo ser 44 evidenciada apenas pela variação da granulometria da turmalina, níveis de granulometria fina e níveis de granulometria grossa. A turmalina mais fina, comumente, encontra-se em estruturas dobradas. Os grãos de turmalina de granulometria média a grossa estão visivelmente zoneados, o centro é mais azulado e as bordas mais esverdeadas, da cor dos grãos mais finos (Figura 18). Estes se encontram subédricos a euédricos, com hábito triangular e outros com hábito prismático, caracterizando a rocha com porções granoblásticas e nematoblásticas. Os turmalinitos estão extremamente associados aos veios, como já foi mencionado, e às rochas quartzo carbonáticas da região. No contato do turmalinito com estas os grãos de turmalina têm granulometria média a grossa e são subédricos a euédricos (Figura 11). Os turmalinitos da mina da passagem possuem altos teores de turmalina, quase sempre superiores a 50% do volume total da rocha. Devido a esta característica, o boro não poderia ser proveniente da estrutura dos filossilicatos, como adotado para a presença de turmalina nos metassedimentos. Por este motivo a origem do turmalinito é muito controversa. Apesar da presença de xenólitos de turmalinito no veio levar a crer que a formação do turmalinito foi anterior a do veio, Duarte (1990) levanta alguns pontos que indicam que o turmalinito foi formado durante o hidrotermalismo da região, defendendo assim a ocorrência de um processo de turmalinização, que teria um controle estrutural e composicional. Entre os pontos levantados estão: o processo de turmalinização que ocorre nas proximidades dos veios; os xenólitos das encaixantes parcialmente turmalinizados; xenólitos que gradam de turmalinito maciço para uma rocha textura, estrutura e mineralogia reliquiares das rochas encaixantes; presença lado a lado de xenólitos de turmalinito e xenólitos de outro tipo litológico; e os turmalinitos só ocorrem onde há a presença de veios de quartzo ou de quartzo e carbonato. As turmalinas deste litotipo se formaram após a primeira fase de deformação até após a segunda fase de deformação. 4.4. Análise Geoquímica e Classificação Os dados geoquímicos, como já citado no Capítulo 1, foram obtidos através do programa de Pós Doutoramento realizado pelo Prof. Dr. Fernando Pires, através da utilização do “JEOL JXA-8900 Electron Microprobe” da Universidade de Wyoming. Estes dados foram obtidos em 1990 e desde então não são utilizados, por este motivo houve certa dificuldade na recuperação destes. Além da dificuldade em recuperar os dados, houve uma seleção dentre eles, para que somente fossem utilizados os dados mais verossímeis. 45 1 mm Figura 13 - Turmalinito maciço. Aspecto ao microscópio 1 mm Figura 14 - Turmalinito padrão. Aspecto ao microscópio 37 0,5 mm Figura 15 - Grãos de turmalina associados a minerais opacos 0,5 mm Figura 16 - Turmalinito com níveis de quartzo 38 0,5 mm Figura 17 - Turmalinito com lentes milimétricas de mineral opaco fino e níveis de quartzo 0,5 mm Figura 18 - Grãos de turmalina apresentando zonamento de cor 39 Vale ressaltar que atualmente existem métodos mais eficazes de se analisar quimicamente um mineral, contudo para o presente trabalho foram utilizados os dados previamente obtidos creditando a eles confiabilidade. Para a análise foram selecionados 19 pontos de cinco amostras, todas representativas da turmalina presente no turmalinito. Estes pontos possuem uma relação de todos os elementos químicos constituintes do mineral, como para o estudo apenas quatro elementos são necessários, Cálcio, Ferro, Alumínio e Magnésio, somente estes foram abordados. Os recálculos foram feitos com o auxilio do Excel e para melhor visualização os dados foram dispostos em tabelas (Tabela 3 e 4). Para a organização e análise da microgeoquímica foram utilizados o NEWPET e o IGPET, que organizaram os pontos nos diagramas desenvolvidos por Henry e Guidotti (1985), utilizados para a classificação das turmalinas dos turmalinitos ( Figuras 19 e 20). 4.4.1. Processo de classificação das turmalinas Como pode ser observado no diagrama Al-Fetot-Mg (Figura 19), a turmalina analisada possui química próxima da série de schorl-dravita, logo são turmalinas com significativas quantidades de Mg e Fe. Os pontos encontram-se no campo dois do gráfico que representa granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados. Contudo tendem levemente para o campo quatro, que representa metapelitos e metapsamitos não coexistentes com uma fase saturada de alumínio. No diagrama Ca-Fetot-Mg (Figura 20) os pontos estão mais evidentes na série da schorldravita, mostrando o real enriquecimento deste mineral em ferro. Assim como no diagrama anterior, os pontos estão concentrados no campo dois que também representa granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados. Entretanto, como ocorreu no diagrama anterior, alguns pontos tendem ao campo quatro que caracterizam os metapelitos pobres em cálcio, metapsamitos e rochas com quartzo e turmalina. 49 Tabela 3 – Elementos químicos utilizados para classificação da turmalina segundo o diagrama Al-Fetot-Mg de Henry e Guidotti (1985). Al (%) Fe (%) Mg (%) Total (%) mpnb-2a Pt38 Pt43 56,83101 56,70058 31,43364 31,11024 11,73536 12,18918 100 100 OS-20 Pt35 Pt36 Pt42 59,84057 58,57325 53,70783 33,93296 35,31759 42,32152 6,226479 6,109151 3,970649 100 100 100 XXX Pt35 Pt36 Pt37 Pt38 57,95869 59,30269 58,57777 58,47068 37,71692 35,75742 36,29518 36,31014 4,324392 4,939883 5,127045 5,219184 100 100 100 100 Mp12a Pt24 Pt25 Pt26 Pt28 Pt30 59,9897 59,46623 59,79143 58,89691 59,8952 25,57319 24,36874 26,3475 26,8112 24,43725 14,43712 16,16503 13,86107 14,29189 15,66755 100 100 100 100 100 mpb21 Pt07 Pt08 Pt09 Pt11 Pt12 60,02651 59,538 59,8057 59,31005 60,06295 22,2023 21,10493 20,83311 21,90259 20,59064 17,77119 19,35707 19,36119 18,78737 19,34642 100 100 100 100 100 50 Tabela 4 – Elementos químicos utilizados para a classificação da turmalina segundo o diagrama Ca-Fetot-Mg de Henry e Guidotti (1985). Ca (%) Fe (%) Mg (%) Total (%) mpnb-2a Pt38 Pt43 4,072 3,650 69,850 69,227 26,078 27,123 100 100 OS-20 Pt35 Pt36 Pt42 0,625 0,871 0,927 83,968 84,510 90,575 15,408 14,618 8,498 100 100 100 pt35 pt36 pt37 pt38 0,571 0,898 0,701 0,176 89,201 87,073 87,008 87,279 10,227 12,029 12,291 12,545 100 100 100 100 mp12a pt24 pt25 pt26 pt28 pt30 3,123 5,759 3,151 6,208 5,865 61,920 56,657 63,462 61,180 57,359 34,957 37,584 33,387 32,612 36,775 100 100 100 100 100 mpb21 pt07 pt08 pt09 pt11 pt12 5,507 5,151 5,180 5,672 5,163 52,484 49,473 49,146 50,775 48,896 42,009 45,376 45,674 43,553 45,941 100 100 100 100 100 51 Figura 19 - Diagrama Al-Fetot-Mg com as variações composicionais observadas na turmalina do turmalinito de Passagem Figura 20 - Diagrama Ca-Fetot-Mg com as variações composicionais observadas na turmalina do turmalinito de Passagem 44 CAPÍTULO 5 - CONCLUSÃO A ocorrência de turmalina em veios mineralizados pode ser evidenciada em varias partes do mundo, como pode ser visto na revisão bibliográfica. Nos locais já estudados estes veios encontram-se encaixados em pacotes metassedimentares, e sempre surge a discussão quanto à origem tanto da turmalina quanto da mineralização. Na Mina da Passagem, como em outras regiões, os corpos mineralizados correspondem, principalmente, a veios que se encontram hospedados em sequências metassedimentares e a presença de turmalina pode ser evidenciada com freqüência na maior parte dos litotipos. Através da análise das características microscópicas das turmalinas presentes nos metassedimentos e nos veios, o pleocroísmo de moderado a alto, cor verde e tom amarelado e alta birrefringência, concluiu-se que, possivelmente estas sejam alcalinas enriquecidas em ferro. Os turmalinitos encontram-se associados a estas litologias, os grãos de turmalina presentes nele são, em geral, bem finos e suas características ópticas são semelhantes as observadas nas turmalinas presentes nos metassedimentos e veios. Além de grãos bem finos pode-se registrar grãos maiores com zoneamento químico e grãos médios no contato do turmalinito com o veio, que também apresentam zoneamento. Utilizando os diagramas de Henry e Guidotti (1985) as turmalinas presentes no turmalinito foram classificadas como pertencentes a série schorl-dravita. Os dados, no diagrama Al-Fetot-Mg, ficaram concentrados no campo dois do gráfico que representa granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados, tendendo para o campo quatro, que representa metapelitos e metapsamitos coexistentes com uma fase saturada em alumínio. Já no diagrama Ca-Fetot-Mg os dados também ficaram concentrados no campo dois, que mais uma vez representa granitóides pobres em lítio e pegmatitos e aplitos associados, tendendo ao campo quatro que caracteriza os metapelitos pobres em cálcio, metapsamitos e rochas com quartzo e turmalina. Correlacionando estes dados com os obtidos por Garda et. al. (2009), considerando que os seus dados são mais atuais e para sua análise foi abordado uma densidade superior de dados, observou-se moderada semelhança entre os resultados. Em ambos estudos a turmalina foi classificada na série da schorl-dravita. Entretanto no diagrama Al-Fetot-Mg apresentado no trabalho de Garda et. al. as turmalinas estão nitidamente no campo quatro, e no presente trabalho elas apresentam uma tendência a se posicionar nesta região do diagrama, mas estão no campo dois.