Classificação e diagnóstico em psiquiatria

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Classificação e diagnóstico
em psiquiatria
I. Introdução
O Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, 4a edição, texto revisado
(DSM-IV-TR), publicado em 2000 pela American Psychiatric Association, é o sistema oficial de classificação utilizado por todos os profissionais da área da saúde mental para
o diagnóstico de transtornos psiquiátricos. O DSM-IV-TR contém critérios diagnósticos
para 17 categorias principais de transtornos mentais (Tab. 1.1) e compreende 375 doenças distintas. Todos esses transtornos são abordados neste livro em capítulos separados.
Um sistema semelhante é utilizado na Europa, chamado de Classificação internacional
de doenças e problemas relacionados à saúde (CID). Ambos, CID e DSM-IV-TR, utilizam os
mesmos códigos numéricos (os quais devem constar em relatórios médicos e formulários
de seguro) para cada transtorno. Toda a terminologia deste livro segue a nomenclatura
oficial e os seus critérios diagnósticos constam na abordagem de cada transtorno.
A classificação e os códigos numéricos do DSM-IV-TR estão listados na página 573
deste manual.
II. Características básicas do DSM‑IV‑TR
A. Critérios diagnósticos
1. O sistema diagnóstico do DSM-IV-TR lista critérios diagnósticos para cada transtorno.
2. Caso uma quantidade suficiente de sinais e sintomas seja obtida a partir da
história e do estado mental do paciente (Ver Cap. 2), é possível estabelecer o
diagnóstico.
3. Critérios diagnósticos específicos aumentam a confiabilidade (p. ex., observadores diferentes obtêm os mesmos resultados).
B. Abordagem descritiva
1. O DSM-IV-TR apenas descreve transtornos mentais e não oferece teorias quanto
a suas causas. Ele não abrange etiologia nem tratamento.
2. A abordagem descritiva aumenta a validade. Ela mede o que se propõe (p. ex.,
um paciente diagnosticado com esquizofrenia realmente é esquizofrênico).
III. Definição de transtorno mental
Um transtorno mental é uma doença com manifestações psicológicas e comportamentais associadas com sofrimento significativo e prejuízo no funcionamento causado por
perturbação biológica, social, psicológica, genética, física ou química. Ele é medido em
termos de desvio de algum conceito normativo. Cada doença possui sinais e sintomas
característicos.
Além das classificações do DSM-IV-TR, outros termos utilizados em psiquiatria para
descrever doenças mentais são os seguintes:
A. Psicótico. Perda do teste de realidade com delírios e alucinações (p. ex., esquizofrenia).
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B. Neurótico. Não há perda do teste de realidade; baseado em conflitos principalmente intrapsíquicos ou eventos de vida que causam ansiedade; entre os sintomas estão
obsessão, fobia e compulsão.
C. Funcional. Não há dano estrutural conhecido nem causa biológica bem definida
que explique o prejuízo.
D. Orgânico. Doença causada por um agente específico que produz alteração estrutural no cérebro; normalmente associada a prejuízo cognitivo, delirium ou demência
(p. ex., doença de Pick). A expressão orgânico não é usada no DSM-IV-TR, pois
infere que alguns transtornos mentais não apresentam um componente biológico
ou químico, no entanto, permanece em uso corrente.
E. Primário. Não há causa conhecida; também denominado idiopático (semelhante a
funcional).
F. Secundário. Identificado com manifestação sintomática de transtorno sistêmico, médico ou encefálico (p. ex., delirium resultante de uma doença encefálica infecciosa).
IV. Classificação de transtornos no DSM‑IV‑TR
A. Transtornos geralmente diagnosticados pela primeira vez na infância ou na ado‑
lescência
1. Retardo mental. Funcionamento intelectual abaixo da média; início anterior aos
10 anos de idade. Associado ao prejuízo do amadurecimento e da aprendizagem
e inadaptação social; classificado de acordo com o quociente de inteligência (QI)
como leve (50-55 a 70), moderado (35-40 a 50-55), grave (20-25 a 35-40), ou
profundo (inferior a 20-25).
2. Transtornos da aprendizagem. Déficit de amadurecimento no desenvolvimento
associado a dificuldade de aquisição de habilidades específicas em matemática,
expressão escrita e leitura.
3. Transtorno das habilidades motoras. Prejuízos no desenvolvimento de coordenação motora (transtorno do desenvolvimento da coordenação). Crianças com
esse transtorno geralmente são desajeitadas e descoordenadas.
TABElA 1.1
Grupos de condições no DSM‑IV‑TR*
Transtornos diagnosticados com frequência pela primeira vez na infância ou adolescência
Delirium, demência, transtorno amnéstico e outros transtornos cognitivos
Transtornos mentais devido a uma condição médica geral
Transtornos relacionados a substâncias
Esquizofrenia e outros transtornos psicóticos
Transtornos do humor
Transtornos de ansiedade
Transtornos somatoformes
Transtornos factícios
Transtornos dissociativos
Transtornos sexuais e de identidade de gênero
Transtornos da alimentação
Transtornos do sono
Transtornos do controle dos impulsos não classificados em outro lugar
Transtornos da adaptação
Transtornos da personalidade
Outras condições que podem ser foco de atenção clínica
*Cada
transtorno é abordado em um capítulo separado neste livro.
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4. Transtornos da comunicação. Prejuízo desenvolvimental que resulta na dificuldade de produção de frases adequadas à idade (transtorno da linguagem ex‑
pressiva), dificuldade no uso e entendimento das palavras (transtorno misto da
linguagem receptivo‑expressiva), dificuldade na articulação (transtorno fono‑
lógico) e perturbações na fluência, cadência e ritmo da fala (tartamudez).
5. Transtornos globais do desenvolvimento. Caracterizados por comportamento
autista, atípico e retraído; imaturidade exacerbada; desenvolvimento inadequado, dividem-se em transtorno autista (comportamento estereotipado geralmente
sem fala), transtorno de Rett (perda da fala e das habilidades motoras com redução do crescimento da cabeça), transtorno desintegrativo da infância (perda da
fala e das habilidades motoras adquiridas antes dos 10 anos de idade), transtorno
de Asperger (comportamento estereotipado com alguma habilidade de comunicação) e do tipo sem outra especificação (SOE).
6. Transtornos de déficit de atenção e do comportamento disruptivo. Caracterizados por desatenção, agressividade excessiva, delinquência, destruição, hostilidade e sentimentos de rejeição, negatividade ou impulsividade. Dividem-se em
transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (dificuldade de manter a atenção, impulsividade), transtorno da conduta (delinquência) e transtorno desa‑
fiador de oposição (negatividade).
7. Transtornos da alimentação da primeira infância. Caracterizados por ingestão
de alimentação inadequada ou bizarra e hábitos de alimentação normalmente
iniciados na infância ou adolescência e que persistem na idade adulta. Dividem-se em pica (ingestão de substâncias não nutritivas) e transtorno de ruminação
(regurgitação ou remastigação).
8. Transtornos de tique. Caracterizam-se por vocalizações ou movimentos repentinos, involuntários, recorrentes, estereotipados. Dividem-se em transtorno de
Tourette (tique vocal e coprolalia), transtorno de tique motor ou vocal crônico
e transtorno de tique transitório.
9. Transtornos da excreção. Incapacidade de manter controle do intestino (en‑
coprese) ou da bexiga urinária (enurese) devido à imaturidade fisiológica ou
psicológica.
10. Outros transtornos da infância ou adolescência. Transtorno de ansiedade de
separação (não consegue desligar-se de casa, p. ex., recusa em ir à escola devido à
ansiedade), mutismo seletivo (recusa voluntária de falar), transtorno de apego
reativo na infância (prejuízo grave na capacidade de se relacionar, com início
antes dos 5 anos de idade), transtorno de movimento estereotipado (chupar o
polegar, bater a cabeça, roer as unhas, beliscar a pele).
B. Delirium, demência, transtorno amnéstico e outros transtornos cognitivos. Transtornos caracterizados por alteração na estrutura e função cerebrais que resultam em prejuízo de aprendizagem, orientação, discernimento, memória e funções intelectuais.
1. Delirium. Caracterizado pela confusão de curta duração e alterações na cognição causadas por uma condição médica geral (p. ex., infecção), substâncias
(p. ex., cocaína, opioides, fenciclidina), ou múltiplas etiologias (p. ex., traumatismo craniano e doença renal). Delirium SOE pode apresentar outras causas (p.
ex., privação de sono).
2. Demência. Caracterizada pelo prejuízo grave na memória, no discernimento, na
orientação e na cognição; demência do tipo Alzheimer – normalmente ocorre
em pessoas com mais de 65 anos de idade e manifesta-se por desorientação intelectual e demência, delírios ou depressão progressivos; demência vascular – causada por trombose ou hemorragia; demência causada por uma condição médica
geral – relacionada ao HIV ou a traumatismo craniano; grupo misto – doença de
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Pick, doença de Creutzfeldt-Jacob (causada por uma proteína mutante denominada príon); também pode ser induzida por substância, causada por toxinas ou
medicamentos – vapores de gasolina, atropina ou múltiplas etiologias e SOE.
3. Transtornos amnésticos. Caracterizados por prejuízo da memória e esquecimento. Causados por uma condição médica geral (p. ex., hipoxia, toxina), ou
substância (p. ex., maconha, diazepam [Valium]).
C. Transtornos mentais causados por uma condição médica geral não classificados
em outro local. Sinais e sintomas de transtornos psiquiátricos que ocorrem como
resultado direto da doença. Entre eles estão transtornos associados a sífilis, encefalite, abscessos, doença ou trauma cardiovascular, epilepsia, neoplasia intracraniana, transtornos endócrinos, pelagra, avitaminose, infecção sistêmica (p. ex., febre
tifoide, malária) e doenças degenerativas do sistema nervoso central (SNC) (p. ex.,
esclerose múltipla). Podem produzir transtorno catatônico (p. ex., imobilidade
resultante de acidente vascular) ou alteração da personalidade (p. ex., resultante de tumor cerebral). Também podem produzir delirium, demência, transtorno
amnéstico, transtorno psicótico, transtorno do humor, transtorno de ansieda‑
de, disfunção sexual e transtorno do sono.
D. Transtornos relacionados a substâncias
1. Transtornos relacionados ao uso de substâncias. Dependência ou abuso de
drogas psicoativas (anteriormente sob a denominação de drogadição). Abrange
pacientes adictos ou dependentes de drogas como álcool, nicotina (tabaco) e
cafeína. Os pacientes podem ser dependentes de opioides (p. ex., ópio, alcaloides opiáceos e seus derivados, e analgésicos sintéticos com efeitos semelhantes
aos da morfina); alucinógenos (p. ex., dietilamida do ácido lisérgico [LSD]);
fenciclidina; hipnóticos, sedativos ou ansiolíticos; cocaína, cannabis (haxixe, maconha); anfetaminas; e inalantes.
2. Transtornos induzidos por substâncias. Fármacos psicoativos e outras substâncias podem causar síndromes de intoxicação e abstinência, além de delirium, demência persistente, transtorno amnéstico persistente, transtorno
psicótico, transtorno do humor, transtorno de ansiedade, disfunção sexual
e transtorno do sono.
3. Transtornos relacionados ao álcool. Subclasse de transtornos relacionados a
substâncias que inclui intoxicação com álcool (embriaguez simples); abstinência de álcool; delirium por intoxicação (devido a estado de embriaguez de vários dias); delirium por abstinência de álcool (também denominado delirium
tremens [DTs]); transtorno psicótico induzido pelo álcool (inclui alucinose
alcoólica – distinta de DTs por sensório claro); transtorno amnéstico persisten‑
te induzido pelo álcool ([síndrome de Korsakoff] – geralmente antecedida por
encefalopatia de Wernicke, uma condição neurológica de ataxia, oftalmoplegia
e confusão, ou as duas podem coexistir [síndrome de Wernicke-Korsakoff]); e
demência persistente induzida pelo álcool (distinta da síndrome de Korsakoff
por déficit cognitivo múltiplo). Também podem ocorrer transtorno do humor,
transtorno de ansiedade, disfunção sexual e transtorno do sono induzidos
pelo álcool.
E. Esquizofrenia e outros transtornos psicóticos. Abrange transtornos manifestados
por perturbações de pensamento e interpretação errônea da realidade, frequentemente acompanhada por delírios e alucinações.
1. Esquizofrenia. Caracterizada por alterações no afeto (ambivalente, constrito e
responsividade inadequada; perda de empatia em relação a terceiros), comportamento (retraído, agressivo, bizarro), pensamento (distorção da realidade, às
vezes com delírios e alucinações) e cognição. A esquizofrenia inclui cinco tipos:
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1. desorganizada (hebefrênica) pensamento desorganizado, riso nervoso, afeto superficial e inadequado, comportamento e maneirismos tolos e regressivos, queixas somáticas frequentes e delírios e alucinações eventuais transitórios e desorganizados;
2. catatônica – o subtipo de perturbação psicomotora é caracterizado por
atividade motora em excesso e às vezes violenta, e o subtipo de imobilidade
motora tem como característica a inibição generalizada, estupor, mutismo,
negativismo, flexibilidade cérea, e em alguns casos, estado vegetativo;
3. paranoide – esquizofrenia caracterizada por delírios de grandiosidade ou
de perseguição e, às vezes, por alucinações ou religiosidade excessiva, e o
paciente muitas vezes é hostil e agressivo;
4. indiferenciada – comportamento desorganizado com delírios e alucinações
proeminentes; e
5. residual – sinais de esquizofrenia após um episódio esquizofrênico psicótico,
em que os pacientes não estão mais psicóticos (o transtorno depressivo
pós‑psicótico da esquizofrenia pode ocorrer durante a fase residual).
2. Transtorno delirante (paranoide). Transtorno psicótico associado a delírios
persistentes (p. ex., erotomaníaco, grandioso, invejoso, persecutório, somático,
sem especificação). Paranoia é uma condição rara caracterizada pelo desenvolvimento gradual de um sistema delirante complexo com ideias de grandiosidade; apresenta curso crônico; o restante da personalidade se mantém intacto.
3. Transtorno psicótico breve. Transtorno psicótico com duração inferior a quatro
semanas causado por estressor externo.
4. Transtorno esquizofreniforme. Semelhante à esquizofrenia, com delírios, alucinações e incoerência, mas com duração inferior a seis meses.
5. Transtorno esquizoafetivo. Caracteriza-se por uma mecla de sintomas esquizofrênicos e elação acentuada (tipo bipolar) ou depressão (tipo depressivo).
6. Transtorno psicótico induzido. O mesmo delírio ocorre em duas pessoas, sendo que uma delas é menos inteligente que a outra ou mais dependente dela
(também denominado folie à deux).
7. Transtorno psicótico devido a uma condição médica geral. Alucinações ou
delírios que resultam de uma doença (p. ex., epilepsia do lobo temporal, avitaminose, meningite).
8. Transtorno psicótico induzido por substância. Sintomas de psicose causados
por substância psicoativa ou de outra natureza (p. ex., alucinógenos, cocaína).
9. Transtorno psicótico SOE (também denominado psicose atípica). Características psicóticas relacionadas a
1. cultura específica (koro – encontrado nas regiões sul e leste da Ásia, medo de
encolhimento do pênis);
2. um determinado período de tempo ou evento (psicose pós-parto – de 48 a 72
horas após o parto); ou
3. um conjunto singular de sintomas (síndrome de Capgras – pacientes acreditam possuir um clone).
F. Transtornos do humor (anteriormente denominados transtornos afetivos).
Caracterizam-se por alteração no humor (p. ex., depressão) que domina a vida
mental do paciente, sendo responsável pela redução do funcionamento. Os transtornos de humor podem ser causados por uma condição médica geral ou por
uma substância (p. ex., drogas [cocaína] ou fármacos [agentes antineoplásicos,
reserpina] psicoativos).
1. Transtornos bipolares. Caracterizam-se por alterações graves de humor entre
depressão e euforia e por remissão e recorrência. Bipolar I – episódio manía-
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co ou misto, geralmente com episódio depressivo maior; bipolar II – episódio
depressivo maior com episódio hipomaníaco (menos intenso do que mania);
transtorno ciclotímico – tipo menos grave do que transtorno bipolar.
2. Transtornos depressivos. Transtorno depressivo maior – humor gravemente
depressivo, retardo mental e motor, apreensão, inquietação, perplexidade, agitação, sentimentos de culpa, ideação suicida, em geral recorrente. Transtorno
distímico – forma menos grave de depressão, geralmente causada por evento
ou perda identificável (anteriormente denominado neurose depressiva). Depres‑
são pós‑parto ocorre dentro do período de 1 mês após o parto. Depressão de
padrão sazonal (também denominada transtorno afetivo sazonal [TAS]) ocorre
com maior frequência durante os meses de inverno.
Transtornos de ansiedade. Caracterizados por ansiedade intensa e persistente (transtorno de ansiedade generalizada), com frequência beirando o pânico
(transtorno de pânico) e medo de sair de casa (agorafobia); medo de situações
ou objetos específicos (fobia específica) ou de desempenho e fala em público (fo‑
bia social); intrusão involuntária e persistente de pensamentos, desejos, compulsões ou ações (transtorno obsessivo‑compulsivo). Inclui o transtorno de estres‑
se pós‑traumático – segue-se a estresse extraordinário (guerra, catástrofe) e se
caracteriza por ansiedade, pesadelos, agitação e, às vezes, depressão; transtorno
de estresse agudo – semelhante ao transtorno de estresse pós-traumático, mas
dura quatro semanas ou menos. Também pode ser causado por (1) condição médi‑
ca geral (p. ex., hipertireoidismo) ou (2) substância (p. ex., cocaína).
Transtornos somatoformes. Caracterizados pela preocupação com o corpo e temor de doença. Classificam-se em transtorno de somatização – queixas somáticas
múltiplas sem patologia orgânica; transtorno conversivo (anteriormente denominado histeria, síndrome de Briquet) – são afetados os sentidos especiais ou o sistema
nervoso voluntário, resultando em cegueira, surdez, anosmia, anestesia, parestesia,
paralisia, ataxia, acinesia ou discinesia; os pacientes podem apresentar ausência de
preocupação inadequada (la belle indifference) e podem obter benefícios de suas
ações (ganho secundário); hipocondria (neurose hipocondríaca) – caracterizada pela preocupação com o corpo e temores persistentes de uma suposta doença;
transtorno doloroso – preocupação com dor para a qual contribuem fatores psicológicos; transtorno dismórfico corporal – preocupação infundada que uma parte
do corpo é deformada.
Transtornos factícios. Caracterizados pela produção intencional ou simulação de
sintomas psicológicos, físicos, ou ambos, para assumir o papel de enfermo (também denominado síndrome de Munchausen).
Transtornos dissociativos. Caracterizados por alteração repentina e temporária na
consciência ou identidade. Amnésia dissociativa (psicogênica) – perda de memória sem causa orgânica; fuga dissociativa (psicogênica) – afastamento físico
de casa sem explicação; transtorno dissociativo de identidade (transtorno de
personalidade múltipla) – a pessoa apresenta duas ou mais identidades distintas;
transtorno de despersonalização – sentimento de que as coisas são irreais.
Transtornos sexuais e da identidade de gênero. Dividem-se em parafilias, transtornos da identidade de gênero e disfunções sexuais. Nas parafilias, os interesses
sexuais da pessoa dirigem-se principalmente a objetos, em vez de outras pessoas, a
atos sexuais que não estão normalmente associados ao coito, ou ao coito praticado
sob circunstâncias bizarras. Entre as parafilias estão exibicionismo, fetichismo,
frotteurismo, pedofilia, masoquismo sexual, sadismo sexual, travestismo feti‑
chista (vestir-se com a roupa do sexo oposto), e voyeurismo. As disfunções sexuais
incluem transtornos do desejo sexual (transtorno de desejo sexual hipoati‑
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vo, transtorno de aversão sexual), transtorno da excitação sexual (transtorno
da excitação sexual feminina, transtorno erétil masculino [i. e., impotência]),
transtornos do orgasmo (transtorno do orgasmo feminino [i. e., anorgasmia]),
transtorno do orgasmo masculino (i. e., ejaculação retardada ou demorada, ejaculação precoce), e transtornos sexuais dolorosos (dispareunia, vaginismo). A
disfunção sexual pode ser causada por uma condição médica geral (p. ex., esclerose múltipla) ou induzida por substância (p. ex., anfetamina). Os transtornos
da identidade de gênero (incluindo o transexualismo) se caracterizam por incômodo com o próprio sexo biológico e o desejo de livrar-se das próprias características sexuais (p. ex., castração).
Transtornos da alimentação. Caracterizam-se pela perturbação acentuada do comportamento alimentar. Inclui anorexia nervosa (perda de peso corporal, recusa
para comer) e bulimia nervosa (ingestão compulsiva de alimentos com ou sem
vômito).
Transtornos do sono. Abrangem:
(1) dissonias, quando o indivíduo não consegue adormecer ou manter o sono
(insônia) ou dorme demais (hipersonia);
(2) parassonias, como transtorno de pesadelo, transtorno de sonambulismo
e transtorno de terror noturno (o indivíduo desperta imóvel em estado de
terror);
(3) narcolepsia (ataques de sono com perda do tônus muscular [cataplexia]);
(4) transtorno do sono relacionado à respiração (ronco, apneia); e
(5) transtorno do ritmo circadiano do sono (sonolência diurna, jet lag).
Os transtornos do sono também podem ser causados por uma condição médica
geral (p. ex., doença de Parkinson) e abuso de substância (p. ex., alcoolismo).
Transtornos do controle dos impulsos não classificados em outro local. Abrangem transtornos nos quais os indivíduos não conseguem controlar impulsos e os
executam. Incluem transtorno explosivo intermitente (agressão), cleptomania
(furto), piromania (provocar incêndios), tricotilomania (arrancar cabelos) e jogo
patológico.
Transtornos da adaptação. Reação mal-adaptativa a um estresse de vida bem definido. Divide-se em seis subtipos, conforme os sintomas – com ansiedade, humor
depressivo, misto de ansiedade e depressão, com perturbação da conduta e
com perturbação mista das emoções e da conduta.
Transtornos da personalidade. Transtornos caracterizados por padrões mal-adaptativos de comportamento profundamente arraigados, geralmente de uma vida
inteira, que costumam ser reconhecidos durante a adolescência ou antes dela.
1. Transtorno da personalidade paranoide. Caracterizado por suspeita sem fundamento, hipersensibilidade, ciúme, inveja, rigidez, autoimportância excessiva
e tendência a culpar e atribuir motivação maldosa a terceiros.
2. Transtorno da personalidade esquizoide. Caracteriza-se por timidez, sensibilidade excessiva, preferência por solidão, esquiva de relacionamentos íntimos ou
competitivos, excentricidade, fantasia e habilidade para expressar hostilidade e
agressividade; não há perda de capacidade de reconhecer a realidade.
3. Transtorno da personalidade esquizotípica. Semelhante à personalidade esquizoide, mas o indivíduo exibe leve perda do teste de realidade, possui crenças
estranhas, é retraído e distante.
4. Transtorno da personalidade obsessivo‑compulsiva. Caracteriza-se por preocupação excessiva com conformidade e padrões de consciência; o paciente pode
ser rígido, extremamente minucioso, dedicado, inibido e incapaz de relaxar (três
Ps – pontual, poupador e preciso).
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5. Transtorno da personalidade histriônica. Caracteriza-se por instabilidade
emocional, excitabilidade, reação excessiva, vaidade, imaturidade, dependência
e autodramatização para atrair a atenção e seduzir.
6. Transtorno da personalidade esquiva. Caracteriza-se por baixos níveis de
energia, tendência a cansar-se facilmente, ausência de entusiasmo, incapacidade
de aproveitar a vida e sensibilidade extrema ao estresse.
7. Transtorno da personalidade antissocial. Abrange indivíduos em conflito com
a sociedade. Incapazes de lealdade, são egoístas, insensíveis, irresponsáveis, impulsivos e incapazes de sentir culpa ou aprender por experiência; apresentam
baixo nível de tolerância à frustração e tendência a culpar aos outros.
8. Transtorno da personalidade narcisista. Caracteriza-se por sentimentos de
grandiosidade, merecimento, inveja, manipulação, ausência de empatia e carência de atenção e admiração.
9. Transtorno da personalidade borderline. Caracteriza-se por instabilidade, impulsividade, sexualidade caótica, atos suicidas, comportamento automutilador,
problemas de identidade, ambivalência e sentimento de vazio e tédio.
10. Transtorno da personalidade dependente. Caracteriza-se por comportamento passivo e submisso; o indivíduo não se sente seguro de si e torna-se totalmente dependente de terceiros.
Q. Outras condições que podem ser foco de atenção clínica. Inclui condições nas
quais não há transtorno mental, mas o problema é o foco do diagnóstico ou tratamento.
1. Fatores psicológicos que afetam a condição clínica. Transtornos caracterizados por sintomas físicos causados ou afetados por fatores emocionais; costumam
envolver um único sistema de órgãos com controle ou estímulo do sistema nervoso autônomo. Exemplos: dermatite atópica, dor nas costas, asma brônquica,
hipertensão, enxaqueca, úlcera, colo irritável e colite (também denominados
transtornos psicossomáticos).
2. Transtornos dos movimentos induzidos por medicamentos. Transtornos
causados por medicamentos, especialmente antagonistas dos receptores dopaminérgicos (p. ex., clorpromazina [Thorazine]). Inclui parkinsonismo, sín‑
drome maligna induzida por neuroléptico (rigidez muscular, hipotermia),
distonia aguda (espasmo muscular), acatisia aguda (inquietação), discinesia
tardia (movimentos coreiformes) e tremor postural.
3. Problemas de relacionamento. Prejuízo na interação social de uma unidade de
relacionamento. Inclui problemas de relacionamento entre pai/mãe‑criança,
problemas de relacionamento com parceiro e problemas de relacionamento
com irmãos. Também pode ocorrer quando um membro é doente mental ou
físico, o que acarreta estresse para o outro.
4. Problemas relacionados a abuso ou negligência. Inclui abuso físico e abuso
sexual de crianças e adultos.
R. Outras condições que podem ser foco de atenção clínica. Condições nas quais os
indivíduos apresentam problemas que não são graves o suficiente para estabelecer
diagnóstico psiquiátrico, mas que interferem no funcionamento. Classificam-se em
comportamento antissocial em criança ou adolescente e em adulto (reincidência de atos criminosos), funcionamento intelectual borderline (QI 71-84),
simulação (produção voluntária de sintomas), falta de aderência ao tratamento,
problema ocupacional ou acadêmico, problema de fase da vida (paternidade/
maternidade, desemprego), luto, declínio cognitivo relacionado à idade (esquecimento normal decorrente de idade avançada), problema de identidade (escolha
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profissional), problema religioso ou espiritual e problema de aculturação (imigração).
S. Outras categorias. Além das categorias diagnósticas enumeradas acima, outras categorias de doenças são listadas no DSM-IV-TR que necessitam de mais estudos antes
de integrarem oficialmente o DSM-IV-TR ou que são controversas. Entre elas estão:
1. Transtorno pós‑concussão. Prejuízo cognitivo, cefaleia, problemas de sono,
irritabilidade, tontura, alteração na personalidade após lesão na cabeça.
2. Transtorno neurocognitivo leve. Perturbações na memória, compreensão e
atenção resultantes de uma doença (p. ex., desequilíbrio de eletrólitos, hipotireoidismo, estágios iniciais de esclerose múltipla).
3. Abstinência de cafeína. Fadiga, depressão, cefaleias e ansiedade após a interrupção do consumo de café.
4. Transtorno depressivo pós‑psicótico da esquizofrenia. Um episódio depressivo, que pode ser prolongado, que surge após uma doença esquizofrênica.
5. Transtorno deteriorante simples (esquizofrenia simples). Caracteriza-se
por excentricidades de conduta, inabilidade em corresponder às exigências da
sociedade, embotamento do afeto, perda de volição e empobrecimento social.
Delírios e alucinações são evidentes.
6. Transtorno depressivo menor, transtorno depressivo breve recorrente, e
transtorno disfórico pré‑menstrual. O transtorno depressivo menor está
associado a sintomas leves, como angústia e preocupação excessiva com sintomas autônomos menores (tremor e palpitações). O transtorno depressivo
breve recorrente é caracterizado por episódios recorrentes de depressão, sendo que cada um dura menos de duas semanas (geralmente de 2 a 3 dias) e
cada um termina com recuperação total. Transtorno disfórico pré‑menstrual
ocorre uma semana antes da menstruação (fase lútea) e se caracteriza por
humor deprimido, ansiedade, irritabilidade, letargia e perturbações do sono.
7. Transtorno misto de ansiedade‑depressão. Caracteriza-se por sintomas tanto de ansiedade quanto de depressão, sendo que nenhum é predominante (denominado neurastenia na CID).
8. Transtorno factício por procuração. Também conhecido como síndrome de
Munchausen por procuração; os pais simulam doença nos filhos.
9. Transtorno de transe dissociativo. Caracterizado por perda temporária do
senso de identidade pessoal e consciência do ambiente; o paciente age como
se fosse possuído por outra personalidade, espírito ou força.
10. Transtorno de compulsão periódica. Variante da bulimia nervosa, caracterizada por episódios recorrentes de ingestão compulsiva de alimentos sem vômito autoinduzido nem abuso de laxantes.
11. Transtorno da personalidade depressiva. Caracteriza-se por pessimismo,
anedonia, tristeza crônica e solidão.
12. Transtorno da personalidade passivo‑agressiva. Caracteriza-se por teimosia,
procrastinação e ineficiência intencional multiplicada por agressão subjacente
(também denominado transtorno da personalidade negativista).
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