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J Bras Nefrol 2003;25(2):86-94
86
Métodos molecular e imunológico no diagnóstico de hepatite C em
pacientes em hemodiálise
Molecular and serological assays in the diagnosis of hepatitis C in
hemodialysis patients
Maria Alice Dottaa, Hugo Chequera, João Pedro Marques Pereiraa, Virgínea Minghelli Schimittb,
Luciano Krugb e David Saitovitcha,b
a
Serviço de Nefrologia e PPrograma
rograma de PósGraduação em Nefrologia da Universidade FFederal
ederal do Rio Grande do Sul.
Pós-Graduação
Porto Alegre, RS, Brasil. bInstituto de Pesquisas Biomédicas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Porto Alegre, RS, Brasil
Hepatite C. Insuficiência
renal crônica. Hemodiálise.
Hepatitis C. Chronic renal failure. Hemodialysis.
Resumo
Introdução
Pacientes em diálise representam população de alto risco para o desenvolvimento da
hepatite C. O estudo teve como objetivo avaliar a prevalência de infecção pelo vírus da
hepatite C (HCV) em três unidades de Hemodiálise de Porto Alegre, por meio do teste
da reação em cadeia da polimerase (PCR), do ensaio imunoenzimático de terceira geração
(ELISA-3), e comparar as características demográficas e clínicas dos pacientes, positivos
e negativos, para o HCV em ambos os testes.
Métodos
Foram estudados 128 pacientes. No ensaio imunológico foi utilizado um Kit de fabricação
comercial de terceira geração – EMBRABIO/ Hemobio (ELISA-3). No ensaio molecular
foi utilizado o teste de PCR.
Resultados
Encontramos prevalência de 31,2% quando analisada pelo ELISA-3, 21% quando analisada
pelo RT-PCR e 18,7% com base nos dois métodos. Os pacientes foram divididos em
três grupos de acordo com a probabilidade de apresentarem a infecção pelo HCV:
grupo 1, concordantes positivos (18,7%); grupo 2, concordantes negativos (66,4%) e
grupo 3, discordantes (14,8%).
Conclusão
A prevalência do HCV em pacientes em diálise é elevada. Nos pacientes classificados
como discordantes, o ELISA-3 mostrou ser um bom teste de screening, visto que
12,5% destes foram reagentes neste teste e negativos no teste de PCR. O PCR deve
Trabalho baseado na tese de mestrado apresentado no Hospital de Clínicas de Porto Alegre em maio de 2002.
Métodos diagnósticos em hepatite C - Dotta MA et al
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ser realizado nos pacientes em diálise visto que 2,3% destes foram positivos por PCR
e negativos no teste de ELISA-3.
Abstract
Introduction
Patients submitted to hemodialysis are a high risk group for the development of hepatitis C
(HCV).This study focused on the evaluation of the prevalence of HCV infection in three
hemodialysis units in Porto Alegre using polymerase chain reaction (PCR) and immunological
methods (ELISA-3). The study has also compared the clinical and demographic characteristics
of HCV-positive and negative patients using both molecular and immunological methods.
Methods
One-hundred and twenty-eight patients were included in the study. Detection of HCV
antibodies was performed using a third-generation assay (EMBRABIO/ HEMOBIO ELISA-3).
Hepatitis C virus RNA was detected using PCR.
Results
HCV prevalence in the studied population was 31.2% when using the immunological method,
21% using the molecular one and 18.7% when both methods were used simultaneously.
Patients were divided into 3 groups, according to their probability of being infected with HCV:
group 1, 18.7% positive concordants; group 2, 66.4% negative concordants, and group 3,
14.8% discordants.
Conclusion
The prevalence of HCV infection in patients on hemodialysis is high and associated with
longer hemodialysis treatment. As serological and molecular tests are not always concordant,
ELISA-3 seems to be a better screening test for this population given that 12.5% of the
patients with a positive test were negative in RT-PCR testing. In contrast, the molecular
diagnosis cannot be overlooked in chronic renal patients on dialysis since 2.3% of the patients
with positive testing are ELISA-3 negative.
I n t r o d u ç ã o
Antes de 1989, todos os casos de hepatite pós-transfusional que resultavam em doença hepática crônica,
após serem descartadas as hepatites pelo vírus A (HAV)
e B (HBV), eram classificados como hepatite Não-A,
Não-B (HNANB).1 Em 1989, pesquisadores da Chiron
Corporation (Emeryville, CA, EUA) e do Center for Disease Control (Atlanta, GA, EUA) descobriram o agente etiológico responsável por cerca de 90% dos casos
de HNANB de transmissão pós-transfusional, denominando-o HCV.2
Estima-se que 80% dos indivíduos infectados pelo
HCV desenvolvam doença crônica com progressão para
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cirrose em 20% dos casos e carcinoma hepatocelular
em 4% dos casos.3 A doença hepática crônica associada ao HCV contribui com 8 a 10 mil mortes por ano
nos EUA e é a principal indicação para transplante
hepático naquele país.4
Pacientes com insuficiência renal crônica (IRC) submetidos à hemodiálise, representam população de alto
risco para o desenvolvimento da hepatite C.5,6 Vários
estudos têm demonstrado alta prevalência do HCV entre
pacientes de unidades de hemodiálise, constituindo
um sério problema nas mesmas.7-9 Em Porto Alegre,
Karohl et al10 realizaram estudo em cinco unidades de
hemodiálise e observaram uma prevalência de 29,8%
de infecção pelo HCV utilizando o teste de ELISA-2.
Conforme mencionado anteriormente, pacientes
com IRC submetidos à hemodiálise representam população de alto risco para adquirir a infecção pelo
HCV.5,6 Vários estudos relatam a alta freqüência de
transfusões sangüíneas como fator associado à transmissão do HCV.11,12 O tempo de tratamento dialítico
também parece ser fator associado à infecção pelo
HCV.11,12 Nesse sentido, já foi observado que o tempo
em diálise é significativamente mais longo em pacientes anti-HCV positivos, do que nos anti-HCV negativos.11 Além disso, Medici et al13 demonstraram que o
risco de contrair a infecção aumenta consideravelmente após dez anos de tratamento.
A modalidade de diálise tem diferença significativa em relação à transmissão do HCV. Pacientes em
diálise peritoneal parecem ter menor risco de adquirir
a infecção do que pacientes em hemodiálise.11
Alguns estudos têm demonstrado a existência da
transmissão ambiental do HCV em unidades de diálise.
Nesses, foi observada a soroconversão de pacientes para
o HCV sem que os mesmos tivessem sido transfundidos, e sem o recebimento de transplantes de órgãos no
período estudado. Esses dados sugerem a existência de
outras formas de transmissão dentro da unidade de diálise.14,15 Várias evidências reforçam a teoria da transmissão ambiental do vírus: a baixa prevalência do HCV
entre os pacientes em diálise peritoneal em relação à
hemodiálise; a existência de correlação entre o tempo
em diálise; e a presença do HCV, bem como a relativa
homogeneidade dos genótipos do HCV em pacientes
que fazem diálise na mesma sala.16-18
Pacientes renais crônicos em diálise são diagnosticados para o HCV, na maioria dos centros, através
de testes de ELISA de segunda ou de terceira geração.18,20 No entanto, Bukh e colaboradores observa-
Métodos diagnósticos em hepatite C - Dotta MA et al
ram que testes de ELISA não refletiam corretamente o
índice de infecção pelo HCV em hemodialisados quando comparados com o teste de RT-PCR, havendo casos de pacientes não-reagentes para o anti-HCV, porém HCV-RNA positivos por PCR. 21 Gretch et al 22
demonstraram que o período entre a infecção pelo
HCV e a formação de anticorpos detectados no teste
de ELISA-3 é de aproximadamente 2 meses. Nesse período o paciente é anti-HCV negativo e potencial transmissor do vírus, evidenciando assim outro fator negativo na detecção direta de anticorpos. Estudos
também têm demonstrado que pacientes com IRC que
fazem diálise apresentam alterações imunológicas
importantes, como deficiência na produção de anticorpos detectáveis contra o HCV, prejudicando assim
ensaios sorológicos baseados na detecção direta desses anticorpos.23,24 Esses dados sugerem que o uso
exclusivo de testes imunológicos seja inadequado
para detectar casos de HCV em hemodialisados.19
Pacientes
e
métodos
Trata-se de estudo transversal e multicêntrico, sendo o mesmo centralizado no Hospital de Clínicas de
Porto Alegre (HCPA).
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética do
Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, projeto
número 00.183, em agosto de 2000. Todos os pacientes incluídos no estudo foram informados sobre os
objetivos do mesmo e assinaram termo de consentimento.
Foram incluídos 128 pacientes que fazem hemodiálise regularmente nos Serviços de Nefrologias dos
seguintes hospitais: Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Hospital Ernesto Dorneles e Hospital Divina Providência.
Os dados clínicos (história de transfusões sangüíneas e duração do tempo de diálise) e os laboratoriais
(determinação dos níveis séricos de ALT) foram obtidos através da consulta aos prontuários dos pacientes. Na determinação dos níveis séricos de ALT, foram
adotados como valores de referências normais, 9-36
U/L, para o sexo feminino, e 9-43U/L, para o sexo masculino, conforme determinado pelo Laboratório de
Análises Clínicas do HCPA.
A coleta do material e o preparo das amostras
foram realizados durante a sessão habitual de he-
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modiálise, onde foi coletada uma amostra de 5 ml
de sangue sem anticoagulante. O material foi centrifugado a 5000 rpm por dez minutos e o soro armazenado em alíquotas de 200 µl a -80ºC até o momento
da extração de RNA. Alíquotas de 200µl de soro também foram armazenadas a -20ºC até a realização do
teste de ELISA. Para a realização do teste, foi utilizado kit de fabricação comercial (EMBRABIO/ Hemobio anti-HCV de terceira geração) sendo o ensaio
realizado conforme determinação do fabricante. O
objetivo do teste é detectar a presença de anticorpos anti-HCV nas amostras de soro analisadas. O
teste de RT-PCR foi realizado no Laboratório de Pesquisa do Serviço de Nefrologia do HCPA e do Programa de Pós-Graduação em Nefrologia da UFRGS.
A primeira fase desta técnica baseia-se na síntese de
um DNA complementar (cDNA) ao RNA mensageiro
(mRNA) cujos fragmentos específicos homólogos à
seqüência do mRNA podem ser amplificados pela
técnica da reação em cadeia da polimerase (PCR).
Dessa reação é gerado um fragmento de 288 pares
de bases pb.25 Após a primeira amplificação é realizada uma segunda amplificação (NESTED-PCR) utilizando-se o material gerado na primeira amplificação, sendo o fragmento formado de 187pb.25
Para a análise estatística, as variáveis quantitativas foram descritas por meio da média e do desvio
padrão. As médias foram comparadas por meio do
teste t de Student para amostras independentes e da
análise de variância seguido do teste de Tukey para
comparações múltiplas. As variáveis qualitativas foram analisadas pelo teste do Qui-quadrado de Pearson com correção de Bonferroni quando necessário.
O nível de significância adotado foi de 5% (P<0,05).
Os dados foram processados pelos programas EpiInfo, versão 6.04B, e Statistical Package for the Social
Sciences (SPSS), versão.
R e s u l t a d o s
Dos 128 pacientes estudados, 40 (31,2%) apresentaram-se anti-HCV reagentes pelo teste ELISA-3, e 88
(68,7%) foram não-reagentes. Não houve diferença
estatisticamente significante em relação à idade, ao
sexo e à história de transfusão sangüínea entre os pacientes reagentes e não-reagentes para o teste ELISA3. O tempo em diálise foi maior nos pacientes reagentes, em relação aos não-reagentes, e essa diferença
atingiu significância estatística. Entre os pacientes reagentes 30 (81,1%) apresentaram ALT normal e em sete
(18,9%) este estava alterado. Entre os pacientes nãoreagentes, 85 (97,7%) apresentaram a ALT dentro dos
limites da normalidade e em dois (2,3%) pacientes a
ALT estava alterada, havendo diferença estatisticamente
significante entre os pacientes reagentes e não-reagentes. Esses dados são apresentados na Tabela 1.
Em relação ao teste de RT-PCR, dos 128 pacientes
estudados, 27 (21%), foram positivos e 101 (79%) foram negativos. Não houve diferença estatisticamente
significante em relação ao sexo, à idade e à história
de transfusão sangüínea entre os pacientes positivos
e negativos no teste. O tempo em diálise foi maior
nos pacientes positivos, em relação aos negativos e
essa diferença foi estatisticamente significante. Entre
os pacientes positivos, 18 (75%) apresentaram ALT
normal e seis (25%) apresentaram ALT alterada. Entre os pacientes negativos, 97 (97%) apresentaram
níveis de ALT normal e 3 (3%) apresentaram ALT alterada, resultado estatisticamente significante entre
os pacientes positivos e negativos. Dados apresentados na Tabela 2.
Como não houve 100% de concordância entre
os dois testes, os pacientes foram divididos em três
grupos.
Grupo 1, concordantes positivos, pacientes ELI-
Tabela 1
Número de pacientes
Sexo (M/F)
Idade (anos)
Tempo de diálise (meses)
Transfusão sangüínea(S/N)
ALT Normal / Alterada
*Média ± desvio padrão.
P1= teste do Qui-quadrado.
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Dados demográficos e clínicos em relação ao teste de ELISA-3
ELISA+
ELISA 40
88
24 / 16
48 / 40
56,0±13,4*
56,8±14,3*
76,7±56,7*
35,8±30,5*
22 / 18
45 / 43
30 / 7**
85 / 2**
**Total de pacientes 124.
P2= teste t de Student.
P1=0,9
P2=0,9
P 2 <0,001
P1=0,8
1
P =0,003
90
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SA-3 reagentes e RT-PCR positivos (n=24); Grupo 2,
concordantes negativos, pacientes ELISA-3 não-reagentes e RT-PCR negativos (n=85); e Grupo 3, discordantes, pacientes ELISA-3 reagentes e RT-PCR negativos ou pacientes ELISA-3 não-reagentes e RT-PCR
positivos (n=19)
Grupo 1 (concordantes positivos)
Dos 128 pacientes estudados, 24 (18,7%) foram
positivos em ambos os testes. Destes, 14 (58,3%) eram
do sexo masculino e dez (41,6%) do sexo feminino; 14
(58,3%) receberam transfusão sangüínea e dez(41,6%)
não foram transfundidos. A idade média desses pacientes foi de 58,3±12,5 anos e o tempo médio em diálise foi de 79,1±60,3 meses. Para a avaliação da ALT
foram considerados 21 pacientes (exclusão dos etilistas). Entre estes, 15 apresentaram ALT normal (71,4%)
e seis apresentaram a ALT alterada (28,6%). Dados
apresentados na Tabela 3.
Grupo 2 (concordantes negativos)
Dos 128 pacientes estudados, 85 (66,4%) foram
negativos em ambos os testes. Destes, 45 (52,9%) eram
do sexo masculino e 40 (47%) do sexo feminino. Qua-
renta e quatro (51,7%) receberam pelo menos uma
transfusão sangüínea e 41 (48,2%) não foram transfundidos. A idade média dos pacientes foi de 56,4±14,0
anos e o tempo médio em diálise foi de 36,7±30,6 meses. Para a avaliação da ALT foram considerados 84
pacientes (exclusão dos etilístas). Destes, 82 (97,6%)
apresentaram ALT normal e dois (2,4%) evidenciaram
ALT alterada. Dados apresentados na Tabela 3.
Grupo 3 (discordantes)
Dos 128 pacientes estudados, 19 (14,8%) apresentaram resultados discordantes entre os dois métodos
diagnósticos. Estes foram subdivididos em 2 grupos
para melhor caracterização.
• Grupo 3A: 16 (12,5%) pacientes reagentes no teste
de ELISA-3 e negativos no teste de RT-PCR.
• Grupo 3B: 3 (2,3%) pacientes não-reagentes no teste de ELISA-3 e positivos no teste de RT-PCR.
Dos 16 pacientes do grupo 3A, dez (62,5%) eram
do sexo masculino e seis (37,5%) do sexo feminino,
destes oito (50%) foram transfundidos e oito (50%) não
tinham história de transfusão sangüínea, a idade média dos pacientes foi de 52,6±14,4 anos e tempo médio em diálise foi de 73,1±52,5 meses. Entre esses pa-
Tabela 2
Número de pacientes
Sexo (M/F)
Idade (anos)
Tempo de diálise (meses)
Transfusão sangüínea(S/N)
ALT Normal/ Alterada
Dados demográficos e clínicos em relação ao teste de RT-PCR
RT-PCRRT-PCR+
27
101
17 / 10
55 / 46
56,6±14,7*
55,8±14,1*
71,5±61,7*
42,5±37,3*
15 / 12
52 / 49
18 / 6**
97 / 3**
*Média ± desvio padrão.
P1= teste do Qui-quadrado.
P1=0,8
P2=0,7
P 2=0,01
P1=0,9
1
P <0,001
**Total de pacientes 124.
P2= teste t de Student.
Tabela 3
Número de pacientes
Sexo (M/F)
Idade
Tempo de diálise
Transfusão sangüínea S/N
ALT Normal/ Alterada
Dados demográficos e clínicos dos pacientes discordantes
Grupo 1
Grupo 2
Grupo 3A
24
85
16
14/10
45/40
10/6
58±12,5
56,4±14,0
52,6±14,4
79,1±60,3
36,7±30,6*
73,1±52,5
14/10
44/41
8/8
15/6***
82/2
15/1
Grupo 3B
3
3/0
43,3±21,1
10,6±2,3**
½
3/0
*Estatisticamente significante a diferença em relação ao grupo 1 e grupo 3A pelo teste de Tukey.
**Estatisticamente significante a diferença em relação ao grupo 1 pelo teste de Tukey.
***Estatisticamente significante a diferença em relação ao grupo 2 pelo teste do Qui-quadrado com correção de bonferroni.
P1=0,4
P2=0,2
2
P <0,001
P1=0,8
P 1 <0,001
Métodos diagnósticos em hepatite C - Dotta MA et al
cientes 15 (93,8%) apresentaram ALT normal e um
(6,3%) evidenciou ALT alterada.
Dos três pacientes do grupo 3B, todos eram do sexo
masculino, um recebeu pelo menos uma transfusão
sangüínea (33,3%) e dois pacientes não foram transfundidos (66,7%). A idade média dos pacientes foi de
43,3±21,1 anos e o tempo médio em diálise foi de
10,6±2,3 meses. Todos eles apresentaram ALT dentro
dos limites da normalidade.
Com base nos testes empregados, as seguintes prevalências de infecção pelo HCV foram encontradas: em
relação ao método imunológico 31,2%, em relação ao
método molecular 21% e com base nos métodos imunológico e molecular 18,7%.
D i s c u s s ã o
No presente estudo demonstrou-se prevalência de
31,2% do vírus da hepatite C quando analisado pelo
teste de ELISA-3 e de 21% quando analisado pelo teste
de RT-PCR. Ainda, quando analisados os dois testes simultaneamente, a prevalência encontrada foi de 18,7%.
O estudo confirma a alta prevalência de infecção
em pacientes em hemodiálise em nosso meio, independente do teste diagnóstico empregado. Esses índices se aproximam dos resultados encontrados por outros investigadores, em que a presença do vírus da
hepatite C em renais crônicos em hemodiálise foi superior à encontrada na população em geral ou em doadores de sangue.26,27 Como já citado anteriormente, a
prevalência da infecção pelo HCV varia muito entre os
diversos continentes do mundo. As razões para essas
variações encontradas nos diferentes estudos não são
bem estabelecidas. A variabilidade observada parece
ser dependente da adoção de estratégias e precauções
para prevenir a transmissão do vírus nas distintas unidades de diálise,28 ou depender do teste diagnóstico
utilizado e da geração do ensaio imunológico para
detecção do HCV.
Não foi encontrada diferença estatisticamente significante entre idade e sexo dos pacientes positivos
ou negativos para o HCV, seja pelo método imunológico, seja pelo molecular.
Como já relatado em alguns trabalhos, também foi
observado no presente estudo que a presença da infecção pelo HCV está correlacionada com o tempo de
tratamento dialítico.11,29 Boero et al30 observaram que
os pacientes ELISA reagentes tinham em média 109
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91
meses em diálise em relação aos pacientes não-reagentes que tinham em média 33 meses em diálise com
resultado estatisticamente significante. Neste estudo
encontramos resultados semelhantes, os pacientes
ELISA reagentes tinham em média 76,7 meses em diálise em relação aos não-reagentes que tinham em média
35,8 meses, os pacientes RT-PCR positivos tinham em
média 71,5 meses em relação ao negativos que apresentaram 42,5 meses, e os pacientes concordantes positivos tinham em média 79,1 meses em relação aos
pacientes concordantes negativos que tinham em média 36,7 meses.
Neste trabalho encontramos pacientes que não receberam transfusão sangüínea e apresentaram teste
imunológico e molecular positivo. No grupo de pacientes concordantes positivos, 41,6% não foram transfundidos. Percentual semelhante também foi observado nos pacientes ELISA reagentes dos quais 45% não
foram transfundidos e nos pacientes RT-PCR positivos
dos quais 44,4% não foram transfundidos. O fato de
pacientes que não receberam transfusão sangüínea
apresentarem HCV, bem como o achado de associação positiva entre tempo de diálise e presença do vírus, suportam a possibilidade da transmissão ambiental do vírus entre esses pacientes, conforme
demonstrado em outros estudos.30,31
Apesar do pequeno número de indivíduos com ALT
elevada, no estudo, foi encontrada uma diferença estatisticamente significante entre o grupo de pacientes
positivos e negativos em ambos os métodos diagnósticos e também no grupo de concordantes positivos e
negativos. Contudo, observamos que 81% dos pacientes ELISA-3 reagentes, 75% dos RT-PCR positivos e
71,4% dos concordantes positivos apresentaram nível
normal de ALT. Isso pode ser explicado pelo fato de
que a ALT pode flutuar entre nível normal e alterado
durante a evolução da doença, e que pacientes com
hepatite crônica podem apresentar níveis de ALT persistentemente normais.4 Esse fato demonstra que uma
determinação normal da ALT não deve ser considerada teste diagnóstico confiável para afastar a infecção
pelo HCV, sendo necessário um teste imunológico e
ou molecular para a detecção da infecção. Esses resultados sugerem que o nível da ALT não deve ser utilizado como marcador dessa infecção nessa população,
pela sua baixa sensibilidade, embora sua elevação
possa estar associada com a infecção pelo HCV.
Devido à discordância de resultados encontrados
nos dois testes diagnósticos, decidimos pela divisão
92
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dos pacientes em três grupos, com isso objetivamos à
melhor caracterização dos pacientes em cada grupo.
Os pacientes ELISA+ e RT-PCR+ foram considerados
como concordantes positivos, os pacientes ELISA- e RTPCR- concordantes negativos e os pacientes ELISA- e
RT-PCR+ ou ELISA+ e RT-PCR- como discordantes.
No estudo observamos que 19 (14,8%) pacientes
foram classificados como discordantes. Destes, 16 foram anti-HCV reagentes e HCV-RNA negativos. A positividade do ELISA associada à negatividade do RTPCR pode ser explicada pelas seguintes observações:
o vírus da hepatite C pode estar localizado em locais
do organismo diferentes da corrente sangüínea, como
no fígado e células mononucleares periféricas.33,34
Além disso, os níveis de viremia podem oscilar nos
pacientes com hepatite C, o HCV pode transitoriamente desaparecer da corrente sangüínea e não estar presente no soro no momento da coleta.35,36 O número
de cópias de RNA pode se encontrar abaixo do limite
de detecção do teste.30,35 Finalmente, a presença do
anticorpo pode persistir mesmo após o desaparecimento do HCV-RNA, representando nessa situação
uma infecção passada.35
Os três pacientes restantes, também classificados
como discordantes, foram anti-HCV não-reagentes e
HCV-RNA positivos. Algumas explicações para tais
achados residem no fato de o paciente poder se encontrar no período da janela imunológica, período
no qual já adquiriu a infecção, mas ainda não desenvolveu anticorpos contra a doença.36,37 Várias doenças ou imunossupressão farmacológica podem suprimir ou modificar a resposta imunológica do paciente.38
O fato de hemodialisados serem imunodeprimidos
pode ocasionar resposta imunológica inadequada
nesses indivíduos, prejudicando a formação de anticorpos.37,38 Nesse caso, o tempo para a soroconversão pode ser bem maior do que o esperado para pacientes não-imunossuprimidos.
É importante ressaltar que este estudo é transversal e que este tipo de delineamento apresenta algumas limitações, principalmente pelo fato de os pacientes serem avaliados em uma única ocasião. É provável
que os casos discordantes quanto ao diagnóstico da
hepatite C fossem esclarecidos com o seguimento dos
pacientes, tendo em vista todas as observações citadas anteriormente. De fato, mesmo que não tenha sido
este o objetivo do estudo e embora o delineamento do
Métodos diagnósticos em hepatite C - Dotta MA et al
mesmo seja transversal, observamos que dos três pacientes classificados como discordantes, os quais são
ELISA não-reagentes e RT-PCR positivos dois se soroconverteram até o momento da redação deste trabalho, sugerindo que os mesmos estavam no período da
janela imunológica no momento da coleta de sangue
para a realização deste estudo.
C o n c l u s õ e s
Com base nos dados obtidos na amostra estudada, concluímos que, a prevalência da infecção pelo
HCV em pacientes em hemodiálise é elevada, sendo
de 31,2% quando analisada pelo método imunológico, de 21% quando analisada pelo método molecular
e de 18,7% com base nos dois métodos. Os pacientes
ELISA-3 reagentes e não reagentes diferem entre si
em relação ao tempo de tratamento dialítico, que foi
maior nos pacientes reagentes, e quanto ao nível de
ALT, alterada em uma maior proporção de pacientes
positivos em relação aos negativos. As demais características demográficas e clínicas analisadas, sexo,
idade e transfusão sangüínea, não diferiram nesse
grupo. Os pacientes RT-PCR positivos e negativos
diferem entre si em relação ao tempo de tratamento
dialítico, que foi maior nos pacientes positivos, e
quanto ao nível de ALT, alterada em uma maior proporção de pacientes positivos em relação aos negativos. As demais características demográficas e clínicas
analisadas, sexo, idade e transfusão sangüínea, não
diferiram nesse grupo. A ALT apresentou baixa sensibilidade como marcador da infecção pelo HCV, visto que alta percentagem de indivíduos ELISA+ (81%),
RT-PCR+ (75%) e pacientes concordantes positivos
(71,4%) apresentaram nível normal de ALT.
Através da análise dos resultados dos pacientes
classificados como discordantes, podemos concluir que
o teste ELISA-3 mostrou ser um bom teste de screening
nessa população, visto que foi encontrado maior percentual de pacientes reagentes nesse teste e negativos
no teste RT-PCR, embora fosse necessário um acompanhamento dos pacientes para o esclarecimento do resultado. O diagnóstico molecular se torna importante
em pacientes renais crônicos em diálise, já que foram
identificados indivíduos HCV-RNA positivos com teste
imunológico negativo para o HCV.
Métodos diagnósticos em hepatite C - Dotta MA et al
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Aceito em 15/1/2003. Aprovado em 20/5/2003.
Financiado pela CAPES (Processo n. 42001013019P1) e pelo
FIPE (Processo n. 00183).
Endereço para correspondência:
David Saitovitch
Serviço de Nefrologia do Hospital São Lucas da PUCRS
Av
Av.. Ipiranga, 6690 3º andar Jardim Botânico
90610-000 Porto Alegre, RS, Brasil
E-mail: [email protected]
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