SEPI - Sistema de Ensino Presencial Integrado

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PRESSUPOSTOS EPISTEMOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO
Toda teoria pedagógica pressupõe uma teoria epistemológica, da qual o professor
faz uso, mesmo que ele não tenha consciência disso. Ou seja, mesmo que o
professor ou a professora não saiba qual a teoria do conhecimento sustenta sua
práxis pedagógica ele faz uso de alguma, mesmo que isso não seja claro para ele
ou ela. Isso porque o ato de educar pressupõe quem educar e como educar. Quem
eu vou educar já sabe alguma coisa? Quem eu vou educar não sabe nada, é como
uma lousa em branco? Se concebo meu aluno como uma lousa em branco, eu,
professor, serei o transmissor exclusivo do conhecimento. Se não concebo meu
aluno como uma lousa em branco, meu procedimento deverá ser diferente.
Epistemologia: reflexão geral em torno da natureza, etapas e limites do
conhecimento humano, especialmente nas relações que se estabelecem entre
o sujeito indagativo e o objeto inerte, as duas polaridades tradicionais do
processo cognitivo; teoria do conhecimento. (Dicionário eletrônico HOUAISS
da língua portuguesa)
16.1 Empirismo e a pedagogia diretiva
Na pedagogia diretiva o professor é o centro do processo de conhecimento. Ele é o
portador do conhecimento que deve ser transmitido aos alunos. O aluno é concebido
como uma lousa em branco, como uma tabula rasa ou mesmo um balde vazio, que
deverá ser preenchido com os conhecimentos transmitidos pelo professor.
A epistemologia que sustenta essa prática é a do empirismo. Nessa concepção o
indivíduo nasce como uma folha em branco que será preenchida no seu contato com
o meio físico e social. Na escola, quem representa os conhecimentos, conteúdos e
valores a serem transmitidos são os professores. Assim, na relação sujeito-objeto, o
professor é o sujeito do processo de conhecimento, o detentor do conhecimento e o
aluno o não sujeito ou um sujeito ainda não dotado de conhecimento, Dessa forma,
tanto o conteúdo dos conhecimentos quanto a capacidade do aluno conhecer vêm
do meio físico ou social. O professor é o agente do conhecimento e considera seu
pupilo como uma folha em branco, não apenas quando nasceu ou quando chegou a
escola, mas sempre que inicia um novo conteúdo da matéria. (Cf. Becker, 2001,
p.17)1. Dessa forma, cabe ao professor transmitir os conhecimentos e depois avaliar,
medindo o “nível de conhecimento” que foi transferido aos alunos. (Cf. Machado,
2004, p.16)2
Essa relação epistemológica é caracterizada pela passividade dos alunos, já que
eles devem ficar sentados, enfileirados, em silêncio, prestando atenção, para assim
obterem o conhecimento transmitido pelo professor. Tal modelo epistemológico
favorece a reprodução da ideologia e a manutenção do status quo, ou seja, da
situação existente, uma vez que não há incentivo ao questionamento, à reflexão e à
criatividade. (Cf. Becker, 2001, p.18)
16.2 Apriorismo e a pedagogia não diretiva
1
BECKER, Fernando. Educação e construção do conhecimento. Porto Alegre: Artmed
Editora, 2001.
2
MACHADO, Nílson José. Conhecimento e Valor. São Paulo: Moderna, 2004.
A concepção pedagógica não diretiva ou apriorista, do ponto de vista
epistemológico, apóia-se na concepção idealista que admite a existência de idéias
inatas nos indivíduos.
Na pedagogia não diretiva o aluno é o centro do processo de conhecimento e o
professor é um mediador, um facilitador da aprendizagem. O aluno é concebido
como sendo dotado de potencialidades inatas, pela sua bagagem genética. Cabe ao
professor despertar o que cada um já tem em potência. O aluno aprende não porque
o professor ensina, mas porque ele já nasceu com o dom de aprender, ou seja, a
inteligência é algo dado a priori que nasce com o aluno e necessita desenvolver-se.
Cabe ao professor auxiliar, ajudando a despertar o conhecimento já existente no
aluno. Se na concepção anterior o professor era o centro do processo e seu poder e
autoridade era legitimado pelo modelo epistemológico, aqui isso já não poderia
ocorrer. Por outro lado, já que o modelo epistemológico não legitima o poder do
professor, esse poder acaba, em geral, assumindo uma forma mais dissimulada e
perversa que no modelo tradicional (Cf. Becker, 2001, p.21). Segundo Becker:
Essa mesma epistemologia, que concebe o ser humano como dotado de um saber
“de nascença”, conceberá, também, dependendo das conveniências, um ser
humano desprovido da mesma capacidade, “deficitário”. Esse “déficit”, porém, não
tem causa externa; sua origem é hereditária. – Onde se detecta maior incidência de
dificuldades ou retardos de aprendizagem? – Entre os miseráveis, os malnutridos, os
pobres, os marginalizados... (...) A criança marginalizada, entregue a si mesma, em
uma sala de aula não-diretiva, produzirá, com alta probabilidade, menos, em termos
de conhecimento, que uma criança de classe média ou alta. Trata-se, aqui, de
acordo com o apriorismo, de déficit herdado; epistemologicamente legitimado,
portanto (2001, p.22).
16.3 Construtivismo e a pedagogia relacional
Na pedagogia relacional ou construtivista, os pólos sujeito-objeto, aluno-professor,
não estão dicotomizados, conforme exposto nas teorias anteriores. Nesta
concepção, o conhecimento não é visto como algo que vem do exterior para o
interior, como na tendência com base no empirismo, ou como algo dado de forma
inata, como na tendência com base no apriorismo3.
Na pedagogia construtivista, o conhecimento é algo concebido como uma
construção contínua, realizada na interação entre sujeito e objeto. Tanto a bagagem
hereditária quanto o meio social são importantes para o processo de conhecimento,
mas nenhum desses fatores pode assumir uma independência em relação ao outro.
Desde que nasce a criança irá, na sua relação com o meio, construir conhecimento
por meio de um processo que altera mobilidade e estabilidade, avançando sempre a
novos equilíbrios mais consistentes que os anteriores. Segundo Becker, o professor
construtivista:
3
1O termo inato indica uma ordem psicológica, significa o que já nasce com o indivíduo. Já
o termo a priori, indica uma ordem lógica do conhecimento, significa o que é anterior à
experiência.
Não acredita na tese de que a mente do aluno é tabula rasa, isto é, que o aluno,
frente a um conhecimento novo, seja totalmente ignorante e tenha de aprender tudo
da estaca zero, não importando o estágio do desenvolvimento em que se encontre.
Ele acredita que tudo o que o aluno construiu até hoje em sua vida serve de patamar
para continuar a construir e que alguma porta se abrirá para o novo conhecimento –
é só questão de descobri-la; ele descobre isso por construção (2001, p.24).
16.4 EDUCAÇÃO, POLÍTICA E SOCIEDADE: AS TEORIAS DA EDUCAÇÃO
Assim como a prática pedagógica pressupõe um modelo epistemológico ela também
pressupõe uma finalidade em relação à organização social. Ou seja, diante da
questão: qual o objetivo da educação em relação à sociedade, podemos ter
diferentes respostas. 1) Ela visa salvar a sociedade de suas mazelas? 2) Ela visa
conservar a sociedade tal qual essa se encontra? 3) Ela visa transformar a
sociedade e suas estruturas?
16.4.1 As teorias não-críticas da educação ou tendência redentora
Dermeval Saviani, no seu livro Escola e democracia, discute as questões
assinaladas acima. Segundo ele, diante do problema da marginalidade escolar e
social é possível identificar três grandes grupos, em relação ao posicionamento que
adotam. Em um primeiro grupo ele denomina que estão as “teorias não-críticas da
educação” e identifica alguns aspectos gerais comuns a elas. Para essa tendência a
sociedade é concebida como um conjunto orgânico, harmonioso, e a marginalidade
é entendida como um desvio. Assim, já que a marginalidade é um desvio, cabe à
escola corrigir essa distorção. Ela deve ser corretora dos desvios sociais e
promotora da coesão social. Dessa forma, a escola é concebida com uma certa
autonomia em relação à sociedade. Ela atua modelando a sociedade sem ser
influenciada pela mesma. Saviani denomina como teorias não-críticas: a pedagogia
tradicional, a pedagogia nova e a pedagogia tecnicista. São denominadas de nãocríticas devido à forma ingênua como concebem sua relação com a sociedade. Essa
teoria é também chamada de tendência redentora, no sentido de ser a salvadora da
sociedade. Sobre as concepções dessa tendência Luckesi, no seu livro Filosofia da
educação, explica:
A tendência redentora – concebe a sociedade como um conjunto de seres humanos
que vivem e sobrevivem num todo orgânico e harmonioso, com desvios de grupos e
indivíduos que ficam à margem desse todo. Ou seja, a sociedade está ‘naturalmente’
composta com todos os seus elementos; o que importa e integrar em sua estrutura
tanto os novos elementos (novas gerações), quanto os que, por qualquer motivo, se
encontram à sua margem. Importa, pois, manter e conservar a sociedade,
integrando os indivíduos no todo social (LUCKESI, 1994, p.38).
16.4.2 As teorias crítico-reprodutivistas da educação ou a tendência
reprodutivista
Em um segundo grupo Saviani coloca as “teorias críticoreprodutivistas” da educação
e identifica alguns aspectos comuns no seu posicionamento geral em relação à
questão colocada acima sobre a marginalidade. Para essa tendência a sociedade é
concebida com divisões de classes e estas possuem interesses divergentes. A
marginalidade é concebida como algo inerente e produzido pela própria estrutura
social. Já a educação está condicionada pela estrutura social e é também
reprodutora da marginalidade social, uma vez que reproduz a marginalidade cultural.
Dessa forma, a estrutura socioeconômica determina a forma de manifestação da
educação e esta, por sua vez, é colocada a serviço dos interesses da classe
dominante. Um exemplo dessa tendência encontra-se na obra Ideologia e aparelhos
ideológicos de Estado de Louis Althusser. Esse pensador defende que a escola é
um dos aparelhos ideológicos do Estado e serve para reproduzir a ideologia da
classe dominante e, dessa forma, manter o status quo.
Althusser,
Louis
(1918
1990)
http://www.consciencia.org/ imagens/banco/
Fonte:
Essas teorias são críticas devido à forma como concebem a relação da educação
com a sociedade. Ou seja, analisam a educação a partir dos seus condicionamentos
socioeconômicos. São também “reprodutivistas”, pois entendem que a educação é
reprodutora da sociedade. Daí serem denominadas por Luckesi como tendências
reprodutivistas. Segundo ele:
Diversa da tendência anterior aborda a educação como uma instância dentro da
sociedade e exclusivamente a seu serviço. Não a redime de suas mazelas, mas a
reproduz no seu modelo vigente, perpetuando-a, se for possível.
(...)
A escola, segundo a análise de Althusser, é o instrumento criado para otimizar o
sistema produtivo e a sociedade a que ele serve, pois ela não só qualifica para o
trabalho, socialmente definido, mas também introjeta valores, que garantem a
reprodução comportamental compatível com a ideologia dominante (LUCKESI, 1990,
p.41 e 45).
16.4.3 A teoria crítica ou a tendência transformadora
A partir da análise dos dois grupos anteriores, Saviani propõe uma via alternativa a
estes. Trata-se da teoria crítica. Há alguns pontos comuns entre a “teoria crítica” em
relação às “teorias crítico-reprodutivistas”. Em relação à concepção de sociedade,
pode-se afirmar que há consenso entre as duas: a sociedade é concebida com
divisões de classes e estas possuem interesses divergentes. Daí que a
marginalidade é algo inerente e produzido pela estrutura social. Em relação à
concepção de educação, a teoria crítica também concebe que a educação está
condicionada pela estrutura social e é também reprodutora da marginalidade social,
uma vez que reproduz a marginalidade cultural. Mas não entende que essa é sua
única possibilidade. Uma vez que a educação, ao se fazer consciente dos
mecanismos sociais, das influências que recebe do sistema no qual está inserida,
pode atuar no sentido contrário. Ou seja, a escola com base em um projeto social
pode atuar no sentido de promover a conservação ou a transformação da sociedade.
Essa tendência é denominada por Luckesi como transformadora. Em resumo temos:
A tendência redentora propõe uma ação pedagógica otimista, do ponto de vista
político, acreditando que a educação tem poderes quase que absolutos sobre a
sociedade. A tendência reprodutivista é crítica em relação à compreensão da
educação na sociedade, porém pessimista, não vendo qualquer saída para ela, a
não ser submeterse aos seus condicionantes. Por último, a tendência
transformadora, que é crítica, recusa-se tanto ao otimismo ilusório, quanto ao
pessimismo imobilizador. Por isso, propõese compreender a educação dentro de
seus condicionantes e agir estrategicamente para a sua transformação. Propõese
desvendar e utilizar-se das próprias contradições da sociedade, para trabalhar
realisticamente (criticamente) pela sua transformação (LUCKESI, 1990, p. 51).
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