Monografia de Ortografia

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A IMPORTÂNCIA DO ERRO CONSTRUTIVO
1.1 Introdução
Jean Piaget, durante os testes de raciocínio, estudou o caminho do raciocínio das
crianças através do resgates das lógicas dos erros, resgatando o percurso da evolução do
pensamento. Através de alguns questionamentos ele descobriu o caminho de trabalhar a
partir do erro. “É errando que se aprende” (dito popular), vai ao encontro da noção de
Piaget quando afirma que o conhecimento é um processo de fazer e refazer. Não um fazer
e refazer de encher linhas com uma mesma palavra, repetindo corretamente num exercício
mecânico na qual a criança decora na hora, mas que com o passar do tempo volta a errar.
O fazer e refazer na perspectiva construtivista é um processo de compreensão e
construção de sistema da escrita, segundo Ferreiro (2001, p.15) “...se concebe a
aprendizagem da língua escrita como a compreensão do modo de construção de um
sistema de representação”. Nas tentativas dos erros e acertos, surgem hipóteses que vão
sendo reformuladas. Nesta perspectiva o erro é construtivo quando ele é trabalhado e não
evitado.
Entretanto os educadores alfabetizadores, ainda estão presos a visão de que sua
tarefa é de apenas transmitir, repetir o saber, ensinando o certo e punindo o errado,
desconsiderando, muitas vezes, que as crianças pensam, agem e respondem como crianças,
e essas ações, respostas e pensamentos são analisadas do ponto de vista dos adultos.
Hoffmann enfatiza (1997, p.79) “nem todos os erros cometidos podem ser
denominados “erros
construtivos” passíveis de descobertas por elas em termos de
melhores soluções. Os erros construtivos caracterizam-se por sua descoberta lógico matemática. O erro só é construtivo quando a criança tem que reestruturar seu
pensamento” .
A criança, quando entra na escola, já possui uma visão, várias hipóteses sobre a
escrita, a troca que acontece na escola entre a linguagem e a escrita vai reformulando as
suas hipóteses e caminhando rumo ao conhecimento. Este caminho que a ela percorre na
evolução da escrita passa por níveis o pré - silábico, o silábico e o alfabético.
É nessa troca, na reformulação das hipóteses, nas passagens dos níveis que a criança
comete erros. Neste período é preciso, trabalhar as dúvidas das crianças e, depois é que
devemos fazer as intervenções necessárias. As intervenções em sala de aula precisam ser
com atividades dinâmicas, lúdicas que incentivem os alunos a pensar. Propiciando
conflitos cognitivos com reflexão e confrontação, sempre tendo em mente que há
momentos adequados para todas as explicações.
Os erros são considerados como algo indesejável que é necessário eliminar, mas
aos quais não se presta muita atenção. No entanto, os mesmos têm uma grande importância
na aprendizagem e muitas vezes vemos que as crianças cometem erros sistemáticos ao
aprender e ao explicar determinados fatos. Estes que aparecem em muitas ou em todas as
crianças de uma idade determinada, rabiscos que as crianças fazem entre 3 a 4 anos, as
palavras espelhadas, esses exemplos estão ligados à estrutura do pensamento.
1.2 O PAPEL DO ERRO NA APRENDIZAGEM
O Professor precisa aprender a falar a linguagem dos alunos e a fazer leitura de
suas manifestações para poder acontecer uma reciprocidade onde o educador interage com
o educando. O aluno não chega a uma resposta à toa, ele têm um raciocínio, o que pode
acontecer é um desvio de pensamento, ou seja, ele não completa o pensamento. Nesse
sentido os erros são justificáveis.
Segundo Ferreiro (2001) não devemos nos limitar a explicar a solução correta,
nem tão pouco ignorar o erro, mas sim, conduzir o sujeito a buscar comparações que o faça
avançar.
Quando uma criança de um ano cai ao tentar aprender a andar, dizemos: “Muito
bem! Logo você vai conseguir!” Nunca dizemos: “ Uma criança de sua idade já deveria
estar andando. Vou lhe dar um prazo até Sexta-feira”. É assim ainda que alguns educadores
se comportam, dando prazos para as crianças aprenderem. Não podemos corrigir de forma
imediata os erros, pois fazendo isso, as crianças ficam inibidas e pode impedir a reflexão.
As próprias crianças modificam sua perspectiva em relação ao erro e, também
seus conceitos. Muitas crianças escrevem e comparam, e ao fazer isso, sentem que as
palavras não estão iguais, elas dizem que não está completo que está faltando, que está
trocado, mas não que está errado. Elas já têm a noção construída de que erro não é “erro”,
pode ser falta de ... Sem constrangimento ou inibições e sem drama trocam ou
acrescentam, sempre tentando, comparando. Ferreiro nos diz que (2001,p.86) ” ...em
termos práticos, não se trata de continuamente introduzir o sujeito em situações conflitivas
dificilmente suportáveis, e sim de tratar de detectar quais são os momentos cruciais nos
quais o sujeito é sensível às perturbações e às próprias contradições, para ajudá-la a
avançar no sentido de uma nova reestruturação”.
Para Piaget,
a ortografia é concebida como um processo de compreensão e
construção de sistema de escrita, na visão construtivista e está ligada à possibilidade do
sujeito reconstruir o objeto de conhecimento por ter entendido quais são suas leis de
composição. Tal reconstrução permite ao aluno reformular hipóteses a partir de suas
descobertas; é um processo de tentativas, de erros e acertos.
Muitos professores, em sua prática tradicional, por desconhecerem a concepção de
erro, não o compreendem e nem a sua importância para a alfabetização, ficando presos à
idéia de que seu papel é simplesmente o de transmitir o saber, ensinando o certo e punindo
o errado. São muitos os que ainda fazem os alunos repetirem corretamente dez ou vinte
vezes uma palavra que escreveu errado. Esses educadores não percebem que isso é um
exercício mecânico, na qual a criança decora na hora, mas que, posteriormente, esquece e
volta a errar.
Foi a partir da década de 80, com o surgimento de novas abordagens sobre a
educação que passou a ser trabalhada a abordagem construtivista que, ao contrário da
tradicional, não teme o erro. Nessa abordagem, o erro deve ser trabalhado e não evitado.
Visa-se, então, a um processo de aprendizagem no qual “errando também se aprende”.
Um exemplo que se pode observar é o seguinte: a professora trabalha o exercício
“substitua com s ou ss”; a criança consegue realizar a atividade. Quando a professora
apresenta o exercício “substitua com s ou z”, a criança erra porque não consegue
identificar a diferença se ambos tem o mesmo som. O erro ocorre porque a estrutura de
assimilação não esta totalmente concluída e ela têm dificuldade para compreender a norma
ortográfica. Nesse caso, o erro é parte de uma construção, porque a criança precisa
reestruturar seu pensamento para escrever a palavra com a letra adequada.
No momento que a criança começa interagir com a língua escrita é que vai
reformulando suas hipóteses e percorrendo seu caminho até chegar ao conhecimento.
O que geralmente acontece é que as crianças escrevem conforme falam e como
cada região tem uma linguagem própria complica o processo de aquisição das normas
ortográficas. Muitas escolas ainda desconsideram o contexto cultural de seus alunos e com
isso a noção de erro ortográfico se acentua. Para Artur Gomes de Morais (2000, p.53) as
escolas continuam não tendo metas que definam que avanços esperam promover nos
conhecimentos ortográficos dos aprendizes. Nesta visão, a ortografia é tratada como objeto
de avaliação e de verificação e não de ensino. Um exemplo é o do ditado, uma das
atividades preferidas pelos professores para “ensinar” ortografia. Chamo a atenção, para o
processo de correção do ditado, quem acertou ganha parabéns; quem errou recebe críticas e
precisa copiar a mesma palavra várias vezes. O ditado, de forma alguma, é usado como
fonte de debate entre os alunos sobre por que você escreveu de tal maneira e ou de outra?
Como será que aparece escrita no dicionário a palavra “errada”?
Já, em outras escolas a ortografia tem um período especial reservado para os
“exercícios de treino ortográfico” e a “recitação/memorização de regras”, ocorrendo o que
Paulo Freire chama de transmissão de conhecimento, o aluno é submetido a recitar e
decorar regras para que consiga realizar os exercícios propostos. Equivocadamente o
professor trata a ortografia como uma questão “gráfica”, sem se preocupar em auxiliar as
crianças a refletir sobre os princípios geradores que permite usarmos esta ou aquela letra.
Nenhuma criança conseguirá chegar ao nível ortográfico de escrita sem reflexão e
ajuda de professores, muitas vezes de seus colegas e familiares, onde a leitura é uma peça
fundamental neste processo de aquisição das normas ortográficas.
Artur Gomes de Morais (2000) propõe três princípios:

A criança necessita conviver com modelos nos quais apareça a norma ortográfica;
precisa ter um grande convívio com materiais impressos;

O professor precisa promover situações de ensino-aprendizagem que levem a
explicitação dos conhecimentos infantis sobre ortografia;

O professor precisa definir metas ou expectativas para o rendimento ortográfico de seus
alunos ao longo da escolaridade.
Não se pretende, aqui, dar receitas de como se faz, mas esses princípios podem
auxiliar o pensar atividades que ajudaram na difícil tarefa de “ensinar ortografia”.
1.3 CASTIGO OU FONTE DE APRENDIZAGEM?
Ferreiro e Teberoski nos dizem que a visão culposa do erro, na prática escolar,
tem conduzido ao uso permanente do castigo como forma de correção e direção da
aprendizagem, tomando a avaliação como suporte de decisão, mas uma concepção sadia do
erro possibilita sua utilização de forma construtiva.
Ainda hoje os erros dão margem as mais variadas formas de castigo, hoje o
castigo é raro nas escolas, mas não desapareceu completamente. Até por volta da década
de 60 o professor utilizava a régua escolar para bater nos alunos, e ainda grãos de milho
ou tampas de garrafas para pôr de joelhos seus alunos atrás de portas, além da palmatória.
Atualmente o castigo manifesta-se de outras maneiras, não atingindo diretamente o corpo
físico do aluno, mas sua personalidade, sendo retratada desta forma a “violência
simbólica”.
Esta tática é mais sutil, porque o educador ao invés de castigar cria um clima de
medo, tensão e ansiedade entre os alunos. O pior de tudo é que percebemos
que
normalmente o professor, na sua prática docente, não está interessado em descobrir quem
sabe o que já foi ensinado, mas sim quem não aprendeu, para poder expor publicamente
aos colegas a sua fragilidade.
Existiam e existem, ainda, castigos como: ficar retido na sala de aula durante o
recreio ou intervalo, entre uma aula e outra; suspender o lanche; realizar tarefas extras em
sala de aula ou em casa, a ainda a modalidade do castigo onde o aluno sofre por
antecipação, onde o professor utiliza expressões como:” vocês vão ver no dia da prova...
vou me comunicar com seus pais, pois não estão aprendendo nada... no dia da reunião
todos irão ficar sabendo o que vocês aprontam ... prestem atenção porque vale nota”.
A razão imediata e aparente do castigo decorre do fato de o aluno manifestar não
ter apreendido um conjunto determinado de conhecimento, uma seqüência metodológica
ou coisa semelhante. A idéia e a prática do castigo decorrem da concepção de que as
condutas de um sujeito que não correspondem a um determinado padrão preestabelecido,
merecem ser castigada, a fim de que ele “pague” por seu erro e “aprenda” a assumir a
conduta que seria correta.
Nesta perspectiva o erro é sempre fonte de condenação e castigo, porque decorre
de uma culpa e esta, segundo os padrões correntes de entendimento, deve ser castigada de
alguma forma de agir que configuram nosso cotidiano de ser.
Mas o erro também pode ser visto como fonte de aprendizagem, crescimento, ou
seja, estar aberto a observar o acontecimento como acontecimento, não como erro;
observar o fato sem preconceito, para dele tirar os benefícios possíveis. Uma conduta, em
princípio, é somente uma conduta, um fato; ela só pode ser qualificada como erro a partir
de determinados padrões de julgamento. Nunca podemos olhar um erro com preconceito,
pois neste tipo de atitude pode ocorrer a exclusão do aluno, é preciso antes de qualquer
coisa, observar para depois julgar, mas o que ocorre é o inverso, primeiro colocamos a
barreira do julgamento, e só depois tentamos observar os fatos.
É necessário aprender essa conduta se queremos usar o erro como fonte de
aprendizagem. Kamii, (1990,p.115) explica que,
“...quando uma criança diz que 4+2=5, a melhor forma de reagir,
ao invés de corrigi-la é perguntar-lhe:- Como foi que você
conseguiu 5? As crianças corrigem-se freqüentemente de modo
autônomo, á medida em que tentam explicar seu raciocínio a uma
outra pessoa. Pois a criança que tenta explicar seu raciocínio tem
de descentrar para apresentar a seu interlocutor um argumento
que tenha sentido. Assim, ao tentar coordenar seu ponto de vista
com o do outro, freqüentemente ela se dá conta de seu próprio
erro”.
O erro deve ser visto como suporte para o crescimento, uma busca participativa
em que o educador discute com o aluno, apontando-lhes os desvios cometidos. Assim visto
e compreendido de forma dinâmica o erro é um caminho para o avanço.
Pode-se dizer que na sucessão de erros e acertos é que aprimoramos nossa
aprendizagem com a reestruturação do pensamento. O pai da eletricidade disse para seu
ajudante, que não podia desistir de seu invento, pois já sabia várias maneiras de como não
se fazer uma lâmpada. Percebemos, com isso, que não devemos temer o erro, pois este
norteia a prática em sala de aula, devemos é aprender a retirar deles os melhores e os mais
significativos benefícios.
O educador percebe que continuar do jeito que está não é mais possível, pois
nossos alunos estão concluindo o ensino fundamental e médio de tal forma que fica longe
daquilo que nos parece ideal. Não é necessário que só aconteça insucesso e erro para
ocorrer o crescimento, mas uma vez que ocorra não devemos fazer deles trampolins de
culpa e de castigo, mas trampolins em direção a uma conscientização
O erro sempre foi um assunto muito discutido e pouco resolvido pois cada um
julga de um modo diferente, cada pessoa pensa de uma maneira diferente. Cada criança
tem um processo de aprendizagem e um entendimento diferente, por isso o que é erro para
alguns é criatividade para outros.
Em sala de aula, não é de erros e acertos, mas o de dar à criança o tempo
necessário para que possa entender, amadurecer até alcançar seus objetivos.
1.4 O CONVÍVIO COM MATERIAIS IMPRESSOS
Baseando-se nas inúmeras leituras, tais como Paulo Freire (1987), Rubem Alves
(1992), Ana Teberosky (1989), Vera Teixeira de Aguiar (2001), Emília Ferreiro (2001),
pode-se afirmar que quando o aluno convive com diferentes textos automaticamente se
apropria da “língua escrita”, isto é, a leitura fornece um emaranhado de informações que
além de auxiliar o aluno na construção de seus próprios textos o ajuda a refletir sobre a
norma ortográfica.
A leitura é uma das mais ricas experiências engendradas pelo ser humano e como
afirma Jean Piaget quanto mais a criança viu e ouviu, tanto mais deseja ver e ouvir. Quanto
maior for o enriquecimento perceptivo, afetivo, social e comunicativo, tanto maior será o
desenvolvimento da sua inteligência.
Para que esse enriquecimento ocorra é preciso romper com algumas concepções
sobre o aprendizado da leitura. Um deles é que ler é simplesmente decodificar, converter
letras em sons, sendo a compreensão conseqüência natural dessa ação. Precisa-se romper
com esse pensamento equivocado e refletir sobre a importância de verificar as suposições tanto em relação à escrita, propriamente, quanto ao significado.
Paulo Freire afirma que “não basta apenas ler”. É necessário “mastigar” o texto,
absorver dele o máximo de informações possíveis, fazer referência e de certo modo colocar
em prática, de forma crítica, o que foi lido. Com o ato de ler enriquecemos nosso “eu”,
nosso pensar e nosso falar.” (Raquiela Brehm Mauer,2000)
XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX
E AÍ, COMO SE ESCREVE?
Raquiela Brehm Mauer*
Ao longo da caminhada em busca de uma formação pessoal e profissional, pude observar nos
contatos com as crianças, durante os inúmeros estágios realizados no curso de Pedagogia, as dificuldades
enfrentadas a respeito da construção ortográfica das palavras.
Isso não foi diferente com a 3ª série da escola P.V. onde realizei o último estágio do curso. Nessa
turma foram inúmeras dúvidas, erros, construções e desconstruções a respeito da ortografia. Foram as
perguntas como: Como se escreve... ? Com que letra se escreve... ? É com s ou ç ? É com d ou t ?, Que me
levaram as indagações: Quando começar a trabalhar a ortografia? Como reagir ao ver que a criança está
“errando” ? Como posso inovar, para ajudar meus alunos a escrever melhor? O que há de específico em
aprender ortografia? O que as crianças precisam saber para seguir a norma ortográfica? O que é que eles não
sabem quando cometem um erro de ortografia? Por que numa mesma série escolar, ou numa mesma turma
encontramos uma grande heterogeneidade na evolução ortográfica dos alunos?
Neste artigo não tenho a pretensão de responder todas estas questões, porém, restringir-me a
descrever como o erro ortográfico era e é trabalhado dentro da escola, as razões de sua existência e como se
dá sua organização no pensamento dos lunos. Acredito que refletindo sobre o tema poderemos nos preparar
melhor para desenvolver um dos nossos papéis como educadoras, o de ajudar o aluno à “escrever certo”.
O artigo está baseado em experiências pedagógicas, leituras e entrevistas realizadas ao longo do curso.
Por isso, na primeira parte cito um emaranhado de informações sobre o erro ortográfico em diferentes épocas. Já,
na segunda parte trabalhei com as atividades propostas para que o aluno perceba a importância da norma
ortográfica na sociedade. E para finalizar tratei do processo que envolve o professor como mediador desta
construção.
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De nada nos adianta estar revendo o erro ortográfico como erros construtivos (parte de
um processo) se enfatizam interpretações padronizadas em livros didáticos que de nada
influenciam na construção do conhecimento do aluno, porém, padronizam respostas e
pensamentos. Como menciona Iara Conceição B. Neves (1999,153)
“Ensinar a escrever é uma tarefa de uma escola disposta a olhar para
frente e não para a repetição do passado que nos trouxe à escola que
temos hoje: Trabalhar com a incerteza e com o erro e não com a
resposta certa, porque escrever é produzir velhas certezas, pois
certezas nos deixam no mesmo lugar é o erro que nos leva na direção
do novo”.
É errando que se aprende. Sabe-se, hoje, que o aluno aborda o mundo na tentativa de
compreendê-lo, de forma curiosa e ativa, acionando esquemas de ação e elaborando hipóteses
que busquem responder suas indagações. Percebe-se, ainda, que os objetos, dos quais os
alunos tentam se apropriar estão histórica e culturalmente dados e que, portanto, as condições
sócio-históricas e a linguagem, especificamente, funcionam como elementos mediadores entre
o aluno e o objeto de conhecimento.
Pensemos então, em um texto com interpretação “única” onde o aluno deverá
responder: Qual é o título do texto?, Quem é o autor?. Essas perguntas não o fazem pensar e
refletir, apenas reafirmam que o conhecimento é estático. Evitando trabalhar com a
interpretação única e com conhecimentos estáticos, proporcionei aos alunos um ambiente de
investigação a respeito da língua, seus elementos e as relações que a constituem e
caracterizam; e priorizei neste processo a expressão de pensamento, dúvidas e descobertas;
além de construir vínculos afetivos entre eles, através das produções textuais no grande grupo,
em duplas ou individualmente. A hora da leitura foi um desses momentos. Ela ocorria sempre
que produções textuais eram construídas, os alunos ouviam com atenção a leitura do colega e
logo após, faziam seus comentários sobre a produção, como: “Você poderia ter finalizado seu
texto desta forma...” . “Poderias clarear suas idéias sobre o porque não gostou, não ficou
claro”. “Esta palavra...ficaria melhor”. Neste processo de construção e interpretação os alunos
interagem, constroem juntos, trocam informações além de construírem um vínculo afetivo.
SITUAÇÕES DE ENSINO E APRENDIZAGEM QUE PROMOVEM A
ORTOGRAFIA
Procurando mudança no ensino percebe-se que questionar e estimular a curiosidade
sem “medo do erro” são fontes de reflexão e assim de construção de conhecimento.
Sendo assim, uma das situações que se pode procurar estimular dentro da sala de aula
seria a curiosidade, que auxilia o aluno a buscar informações em todos os momentos do dia a
dia escolar. A construção de texto tanto individual quanto coletivo também se torna um outro
importante aliado.
De acordo com Maria Izabel H. Dalla Zen (1998, p. 8), ensinar a língua “é promover
situações que permitam a reflexão sobre a linguagem nos seus diferentes contextos de uso.
Isto é, ler e discutir, produzir textos e analisar a trama discursiva dos materiais lidos e
elaborados”.
Contudo, o dicionário neste processo seria como um amigo “salvador”: quando não se
tivesse certeza da grafia de determinada palavra opta-se em pesquisá-la. Muitos alunos
mencionaram que nunca haviam manuseado dicionário antes, o interesse em folhá-lo nos
intervalos entre um trabalho e outro me deixou realizada. “Você começa ver um trabalho dar
resultado; eu plantei uma semente e já estou colhendo os frutos!” A interação com o uso do
dicionário
resultou
em
escritas
elaboradas
oportunizando
registros,
discussões,
questionamentos e elaboração de alguns princípios em relação às normas ortográficas, durante
as produções textuais.
Durante o último estágio do Curso de Pedagogia realizei um trabalho diferente:
introduzi no estágio o portfólio. No portfólio, utilizado nesse trabalho como um instrumento
individual, o aluno menciona todos conhecimentos adquiridos naquele dia. É como se fosse
um diário, podendo conter relatos de fatos que chamaram atenção ou informações que de certa
forma, vem contrapor com o que aprendeu. O registro em portfólio auxilia na própria autoavaliação, com a vantagem de ajudar o aluno a desenvolver sua autocrítica, a ampliação da
consciência do seu trabalho, de suas dificuldades e das possibilidades de seu
desenvolvimento.
A idéia de usar o portfólio como instrumento de avaliação veio do pressuposto que todas as
áreas do conhecimento devem estar interligadas, isto é, conectadas. A partir do momento, em
que o aluno conseguir ligar um fato a outro, ele torna o conhecimento significativo e
duradouro. Para Jean Piaget é por meio da construção do conhecimento significativo que o
aluno constrói o autoconhecimento.
Nos dias atuais o que se ouve, lê e de certa forma se preconiza é a interdisciplinaridade, a qual
deve sustentar uma conexão entre todas as disciplinas, porém, o que se pode ver como diz
Silvio Gallo (1995) é uma organização curricular de disciplinas desconectadas cada uma com
um caderno, troca de períodos, encerramento do assunto, pois trocou o horário da matéria.
Essas rotinas evidenciam um paradoxo na caracterização de processos que tem como base o
princípio da interdisciplinaridade. Esta que tenta ajudar os alunos na construção de um saber
acaba por dificultar a compreensão do conhecimento como um todo integrado, a construção
de conceitos que abrangem e permitem a percepção da realidade como um todo interrelacionado. O aluno acaba por criar em sua memória um arquivo com várias gavetas cada
uma com o seu nome deixando de fazer ligações, de relacionar os conhecimentos. Desta
forma, o conhecimento do aluno fica hierarquizado e não é esta a proposta e nem o objetivo
que se tem.
ENSINAR E APRENDER: O PAPEL DO EDUCADOR NO
PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO
Retomando a proposta inicial do artigo reafirmo que não tenho a pretensão de responder
todas as questões suscitadas no início. Restringi-me a refletir sobre como o erro ortográfico
era e é trabalhado na escola, a necessidade da leitura para compreender a norma ortográfica e
a importância de estimular a curiosidade, o uso do dicionário e o portfólio como registro do
processo desenvolvido. E também foi minha intenção refletir sobre o papel do professor
perante essa construção de conhecimento, na qual o educador “ensina”, e enquanto ensina
aprende.
Nesta perspectiva da construção do conhecimento o papel do professor não pode ser nem de
um “expositor”, nem de um “facilitador”, mas sim de um PROBLEMATIZADOR. O
professor tem a função de organizar as interações do aluno com o meio e problematizar as
situações de modo a fazer o aluno, ele próprio, construir o conhecimento sobre o objeto de
pesquisa.
Como menciona Sérgio R. Kieling Franco (1998,56) a verdadeira construção do saber se dá
coletivamente. Essa conclusão reafirma o pensamento de Jean Piaget quando ele expressa
“Não há operação sem cooperação.” Nesse sentido também podemos lembrar Paulo Freire
quando cita “ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em
comunhão”.
Para efetivar um processo de aprendizagem coletiva muita concepções precisam ser revistas,
para que os objetivos sejam alcançados. Uma forma é partir das teorias e pensar como se pode
trabalhar para conhecer o aluno, ampliar suas habilidades, competências, conhecimento e
buscar dados para planejar, aprender, ensinar de forma contextualizada.
A teoria penetra como fonte de contribuição para que o professor conheça as hipóteses que a
criança traz consigo e suas experiências. Um dos livros que muito nos auxilia a compreender
a construção de hipóteses é o da Emília Ferreiro – Psicogênese da Língua Escrita (1991) – Ele
auxilia o professor a ver o erro como fonte de um processo em construção. A tarefa a ser
assumida neste contexto, é a que o professor deve ser um investigador, deve estar em conflito
com o ser saber, sempre buscando aprimoramento e dialogando com as transformações
tecnológicas e sociais do mundo contemporâneo.
Neste sentido, Paulo Freire (2000,157) explica ainda que “o mundo encurta, o tempo se dilui:
o ontem vira agora; o amanhã já está feito. Tudo muito rápido. Debater o que se diz e o que se
mostra e como se mostra na televisão me parece algo cada vez mais importante”.
Isto é, quanto mais ciente estiver o professor de como se dá o processo de aquisição do
conhecimento, de como a criança age emocionalmente, de como interage com os colegas,
mais condições ele terá para encaminhar de forma agradável e produtiva o processo de
aprendizagem. Luiz Carlos Cagliari (1997) sugere que os professores que atuam nas escolas
“procurem aprofundar seus conhecimentos teóricos, desenvolvam o hábito de refletir sobre
seu trabalho, deixem de ser menos aplicadores de pacotes educacionais”. Nessa visão terão
possibilidade de ser “de fato educadores, agentes transformadores e facilitadores da aquisição
de conhecimentos por parte do educando’. (p. 14)”.
Por conseguinte, quando o professor se coloca como alguém que também aprende com seus
alunos, compreendendo seus modos de construção, ambos constroem juntos o chamado
“aprender a aprender”. Enfim, o educador “ensina”, e enquanto ensina aprende. Quando
menciono a palavra ensinar significa acompanhar e instrumentalizar com intervenções,
devoluções e encaminhamentos nesse processo de construção do conhecimento. Assim,
professor e aluno constroem um rizoma de informações, isto é, todo o conhecimento
adquirido por meio de investigação e pesquisa se conecta com as “diferentes” áreas do
conhecimento. O rizoma comprova então que não há conhecimento fragmentado e sim,
interligado. E que a construção do conhecimento depende de cada indivíduo porque,
felizmente, não somos todos iguais.
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Erro? Estudante do 8ª Semestre do curso de Pedagogia da Faculdade de Ciências e
Letras de Osório/RS. Artigo Internet......
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