Explanação do Sutra do Coração da Grande Sabedoria Completa

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SAN ZEN DOJO – CENTRO ZEN BUDISTA DO RIO DE JANEIRO
Explanação do Sutra do Coração da Grande Sabedoria Completa
Sensei Getulio Taigen
Inicialmente, antes de entrar no mérito propriamente dito do Sutra do Coração da Sabedoria,
creio ser necessário entendermos claramente os princípios subjacentes ao texto. Para tal, fazse necessário termos uma idéia de como era o pensamento filosófico da Índia àquela época, O
que era a Escola Madhyamaka, bem como seu fundador, o célebre metafísico e filósofo
Nagarjuna, após o que efetuarei considerações pessoais sobre o teor do Sutra.
Na antiga Índia, os filósofos deterministas (ajivaka), os hedonistas (charkava) e os
materialistas ou mundanos (lokayata) subestimavam a natureza da realidade e acreditavam
apenas na existência do mundo material. Segundo eles, os seres são compostos por cinco
elementos (terra, água, fogo, ar e espaço) que se dissolvem na hora da morte, sem deixar
qualquer continuidade de consciência. Por isso, rejeitavam a teoria da causa e efeito (carma),
não possuiam qualquer tipo de moral e se entregavam a todos os tipos de atos repudiados por
qualquer sociedade civilizada. Possuíam uma das duas visões errôneas ou extremas. O niilismo
(ucchedanta) que nega a causalidade e a interdependência (ao se apegarem aos prazeres
temporários, os niilistas não conseguem encontrar um estado de liberação duradoura). A outra
visão errônea ou extrema é o eternalismo (shasvadanta), sustentada pelos textos hindus
chamados Upanishads. Os eternalistas superestimam a realidade e acreditam na existência
intrínseca de um Atman ou “eu superior”, que seria permanente, inalterável, imutável e
eterno, idêntico à natureza pura de todas as coisas do universo, o Brahman ou o Absoluto. Em
algumas escolas hindus, o Atman é descrito de forma pessoal, enquanto em outras o
consideram algo impessoal. De forma semelhante, alguns filósofos hindus postulam o Brahman
de forma teísta, enquanto outros o consideram um princípio abstrato, metafísico.
Neste contexto de história e pensamento da Índia que nasceu Nagarjuna. Dizem que seu
aparecimento foi profetizado em vários textos antigos, tais como: Lankavatara Sutra,
Manjushri Mulakalpa Sutra, Mahamegha Sutra e o Mahabheri Sutra.
“Alguém destinado a manter os caminhos, após o Nirvana do Sugata. Aparecerá depois de
transcorrido algum tempo. Sabei que ele será dotado de grande sabedoria. Na região sulina,
na terra das palmeiras. Há de surgir o monge Shriman, de grande renome. Ele será
cognominado o Naga, e destruirá os extremos da existência e da não-existência”- Lankavatara
Sutra.
A história da vida e morte de Nagarjuna é rodeada de lendas e mistérios. Consta que seu pai
um dia teve um sonho, em que dava de comer a cem pessoas famintas e que depois disso, sua
esposa ficava grávida. Supersticioso, assim procedeu e ela engravidou. Após o nascimento de
um menino, um adivinho Brâmane profetizou ser ele possuidor de uma enfermidade que lhe
daria apenas sete dias de vida, porém se seus pais dessem de comer a cem monges o menino
teria sete anos de vida. Assim fez seu pai e o menino salvou-se.
Quando estava para completar oito anos ele foi enviado em uma longa viagem, pois seus pais
não queriam vê-lo morrer. No decorrer da viagem, quando o grupo passava em frente ao
Monastério de Nalanda, um brâmane de nome Sahara ficou muito impressionado com aquele
menino que recitava de cor vários Sutras. Após conhecer a história do menino, ele que era um
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brâmane adivinho profetizou que se o menino abandonasse a vida mundana e fizesse o voto
de renúncia poderia evitar sua morte eminente. O menino foi então inicialmente iniciado na
recitação do Nembutsu.
Posteriormente foi instruído na recitação dos longos Mantras (Daranis). Na véspera do seu de
seu aniversário de sete anos passou a noite inteira recitando Sutras, superando dessa maneira
a morte, como previra o brâmane. Aos oito anos iniciou o estudo regular tradicional, pari passu
também passou a estudar os princípios filosóficos de cada uma das escolas budistas e
filosóficas da época. Tempo depois, após solicitação formal, recebeu a ordenação monástica do
Abade do Monastério de Nalanda, recebendo o nome budista de Shrimata.
O Monge Shrimata, ao longo de seus exaustivos estudos, passou a demonstrar ser um homem
dotado de vários poderes mágicos. Tanto que certa vez uma grande escassez de alimentos
penalizou duramente a região de Magadha e, conseqüentemente, os monges do Monastério de
Nalanda que viviam de esmolas e donativos. Embora essa dificuldade durasse cerca de 12
anos, o Monge Shrimata, valendo-se de seus poderes mágicos, conseguiu através da alquimia
transformar ferro em ouro de modo a alimentar a todos. Quando ele já era Abade do
Monastério Universidade de Nalanda, expulsou centenas monges e noviços que eram
moralmente corruptos. Durante este mesmo período refutou através da lógica uma
argumentação contra o Budismo Mahayana que havia sido escrito em doze mil versos por um
outro monge de nome Shamkara. Também em Jatasamghata, suplantou quinhentos
intelectuais não budistas em um debate aberto, convertendo-os ao Darma de Buda ao rebelar
suas erradas visões filosóficas.
Nagarjuna fundou a Escola Madhyamaka ou Madhyamika com o objetivo de sistematizar os
ensinamentos dos Sutras do Prajnaparamita. O axioma central do ensinamento da Escola
Madhyamaka proclama que todas as coisas são vazias de substância inerente (sunya). A
Escola Madhyamaka não tinha como propósito a formulação de qualquer sistema filosófico ou
religioso. O próprio Nagarjuna insistia que não tinha nenhuma tese a defender. Tudo o que se
propunha era analisar criticamente as afirmações efetuadas por outras escolas acerca da
existência última e permanente. A Escola Madhyamaka não aceitava nem apresentava como o
faziam as outras escolas, qualquer princípio ou teoria em qualquer dos quatro modos,
conhecidos como as quatro alternativas da existência: 1ª (é), 2ª (não é), 3ª tanto (é) quanto
(não é), 4ª não (é) nem (não é), pois partia do princípio de que tomar uma posição ou
apresentar uma teoria que caia sobre algum dos quatro modos é comprometer-se e apegar-se
a algum princípio ou teoria. Nagajurna ensinava que na natureza última, não existe divisão
entre a verdade relativa e a verdade absoluta, e que essa divisão é somente efetuada no nível
relativo ou convencional. No nível absoluto não existem duas verdades, sendo que essa
“verdade absoluta” somente pode ser vivenciada por uma pessoa “iluminada”, onde os
conceitos e dualidades inexistem. A escola simplesmente rejeitava e demolia todas as teorias
filosóficas existentes. Sendo que as principais eram aquelas que mantinham uma ou outra das
visões extremas do eternalismo (filosofia que aceita a existência de uma entidade universal
que gera os fenômenos) ou do niilismo (filosofia que nega a existência de qualquer coisa
subjacente). Nagarjuna argumentou que nada existia independentemente de condições
externas. Ele não considerava este ensinamento como niilista nem eternalista. Pelo contrário,
situava-o no meio, uma vez que reconhecia a existência convencional de objetos que surgem
no fluxo contínuo de “origem dependente de condições”. Defendia que embora nada tenha
“uma existência inerente”, o mundo no qual vivemos é produto de condições passageiras.
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Nagarjuna não concordava com a idéia de existência inerente, mas com a de existência
convencional. Acreditava que a base da nossa concepção convencional de mundo é que é real.
Se o mundo convencional fosse real, então também a percepção das coisas e dos seres como
existentes em si e por si seria real e não ilusória, então a ignorância e a sabedoria não seriam
distintas, mas idênticas.
Nagarjuna demonstra que quando procurados todos os objetos do mundo convencional
simplesmente se dissolvem ao serem reduzidos às suas partes constituintes e, essas mesmas
partes constituintes também são dependentes entre si, não possuindo nenhuma existência
permanente. Ao nível de ausência de uma existência última, a vida corrente não existe, logo
carece de essência. Ela existe convencionalmente e é neste plano convencional que os
ensinamentos do Budismo são extremamente relevantes e eficazes. De fato, a iluminação só é
possível por que os fenômenos não possuem uma existência individual e permanente, caso
contrário seria um mundo frio e imutável. Desde que algo é considerado como tendo uma
essência permanente e imutável, qualquer mudança radical se torna impossível e impraticável.
A Escola Madhyamaka efetuava uma clara distinção sobre conceitos ou idéias de existência
inerente “inata” e existência inerente “adquirida”. As idéias adquiridas de uma existência
permanente e individual são aquelas que foram aprendidas através do estudo, da sociedade,
do convívio com os pais, professores etc, idéias ou conceitos tais como a existência de um
Deus ou de uma alma. Uma vez que esses conhecimentos são aprendidos intelectualmente ou
por condicionamento social, também podem ser refutados através da discussão e da
argumentação. Conceitos inatos de uma existência permanente e individual por outro lado são
aqueles que determinam o comportamento a um nível fundamental (comportamento cotidiano)
no qual continuamos a tratar os objetos do mundo convencional como entidades realmente
existentes. Esta concepção, segundo Nagarjuna, é um reflexo do estado não iluminado da
nossa mente. Declarava ainda que a única cura para essa errada conceituação, não se
encontra na argumentação, mas na prática constante da meditação sobre a vacuidade de
todas as coisas condicionadas.
Conforme os ensinamentos do Budismo Mahayana o Sutra Prajnaparamita foi ensinado
inicialmente no Pico dos Abutres por Sakhyamuni Buda, no que ficou sendo conhecido como o
“Segundo Giro na Roda do Darma”. Consta que após dar os ensinamentos relacionados as
“Quatro Nobres Verdades” o Buda ensinou o significado último do Darma que é a vacuidade da
existência inerente de todos os fenômenos, conforme se encontra de forma clara e concisa no
Sutra do Coração.
Alguns séculos depois da morte de Buda, muitos textos com seus discursos (Sutras) acabaram
sendo reeditados, fazendo surgir diferentes versões de um mesmo texto. Inicialmente, os
ensinamentos de Buda eram memorizados pelos recitadores (bhanaka) e posteriormente
foram transcritos. Os textos de grupos diferentes e distantes são muito semelhantes. Além
disso, surgiram muitos Sutras novos, atribuídos a Budas transcendentes (Dhyani-Buda), seres
da iluminação (Bodisatva) ou ao próprio Buda Shakyamuni.
Por volta dos séculos I e II, esses novos Sutras deram impulso ao movimento que passaria a
se autodenominar o Grande Veículo ou Mahayana. Segundo este movimento, que se propunha
levar muitas pessoas para a outra margem (da iluminação), esses Sutras conteriam os
ensinamentos mais profundos de Buda e teriam sido preservados no reino dos Nagas, espécie
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de dragões aquáticos com corpo de serpente e cabeça humana até que os verdadeiros
discípulos se tornassem aptos a recebê-los. No nome Nagarjuna o início do nome “Naga” é em
referência a esses Nagas, que conforme relata a história, foi Nagarjuna (que ainda se chamava
Shirimata) que foi ao Reino dos Nagas e recebeu das mãos do Rei os manuscritos contendo a
coleção dos Sutras da Prajnaparamita, depois de ter pregado o Darma para todos os
habitantes daquele reino, daí o nome Naga. Quanto ao restante do nome (Arjuna) foi em
homenagem ao grande arqueiro do épico Mahabarata, personagem central da filosofia Védica.
Esse arqueiro que se chamava Arjuna era o mais rápido, penetrante e certeiro dos arqueiros,
por isso Nagarjuna recebeu seu nome pela sua rapidez e destreza na propagação do Darma de
Buda.
Em termos históricos, os Sutras Ratnaguna Samcharya Gatha e o Ashtahasrika Prajnaparamita
Sutra (Discurso da Perfeição da Sabedoria em 8.000 Linhas) apareceram entre os séculos I
a.C. e I d.C. Entre os séculos I e III, surgiram os Sutras mais longos e elaborados, como os de
18.000, 25.000 e 100.000 linhas. Foi nesta época que surgiu o Vajracchedika Prajnaparamita
Sutra (Sutra do Diamante). Entre os séculos III e V, surgiram textos mais concisos, entre eles
o Sutra do Coração ou Prajnaparamita Hridaya Sutra. Entre os séculos V e X, surgiram outros
Sutras com influência Tântricas.
Segundo a classificação tradicional, existem três “textos mãe” (os discursos em 100.000,
25.000 e 8.000 linhas) e os “textos filho” (são ao todo dezessete Sutras incluindo os Sutras do
Coração e do Diamante).
Uma das ênfases dos textos dos Sutras Mahayana é o ideal do “ser da iluminação” ou
Bodisatva. Os Bodisatvas possuem a mente da iluminação (bodhichitta), que possui duas
qualidades: A Grande Sabedoria (Mahaprajna), que transcende a existência cíclica (Samsara) e
percebe a verdadeira natureza da realidade, ou vacuidade (shunyata); e a grande compaixão
(Karuna), que transcende o estado de libertação ou Nirvana com a intenção de ajudar todos os
seres sencientes a atingir a iluminação.
No enunciado do Prajna Paramita Hridaya Sutra (sânscrito) a palavra Hridaya significa coração,
essência, de modo que normalmente se conhece esse Sutra pelo nome de Sutra da Essência
(ou do Coração) da Perfeição do Conhecimento, em alguns textos também é traduzido como
Sutra do Coração da Sabedoria além da Sabedoria ou Sutra do Coração da Grande Sabedoria
Completa. Este Sutra tem uma particularidade interessante que o diferencia dos demais, não é
o Buda quem faz a preleção, ele somente pronuncia uma frase no fim do discurso, ele apenas
diz “Bem dito, bem dito”, e sorri. Com essa inteligente atitude o Buda criou uma situação em
que deixa perfeitamente claro que a compreensão do Sutra pode ocorrer com qualquer pessoa,
através da lógica e insight obtido pela meditação.
A recitação do Sutra em questão faz referência a Kanzeon, o Bodisatva que representa a
manifestação da compaixão e a Shariputra que representa a sabedoria. O Sutra afirma que
Kanzeon foi compelido a despertar para a vacuidade de todas as coisas pela força avassaladora
da sabedoria. Em seguida, Kanzeon falou com Shariputra, que representa a pessoa de espírito
científico ou de conhecimento preciso. Os ensinamentos de Buda neste Sutra foram colocados
sob o microscópio da inteligência e saber acadêmico de Shariputra, demonstrando que os
ensinamentos não foram aceitos com uma fé cega, despropositada e fanática, mas sim, foram
examinados, praticados, compreendidos, experienciados e postos à prova.
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A coleção dos textos desse Sutra é em número de trinta e oito, alguns bastante extensos.
Contém uma série de doutrinas de caráter filosófico, baseadas na vacuidade de todas as
coisas, ou seja, na carência total de um ser próprio, de um ego e, por conseguinte, irreal, da
mesma natureza de um sonho. Este Sutra é muito importante em razão de toda a disciplina
moral e intelectual budista ter como meta capacitar ao homem chegar a ter posse desse
conhecimento, auge maior do conhecimento humano e garantia da definitiva liberação da
cadeia de renascimentos e da obtenção do Nirvana.
O Sutra do Coração da Sabedoria é um dos menores dentre os Sutras da Prajnaparamita.
Trata-se de uma resumida exposição da doutrina central de toda a coleção. Este Sutra é
recitado sistemática e diariamente em todos os locais de prática Budista da Escola Mahayana.
Tanto o texto do Sutra em Chinês, e em Sânscrito já foram traduzidos em quase todas as
línguas civilizadas do mundo.
O texto:
Bhagavati Prajnaparamita Hridaya Sutram (sânscrito)
Pan-jo Po-lüo-mi-to Hsin-ching (chinês)
Ma-ha Ban-nya Ba-ra-mil-ta Shim-gyong (coreano)
Chomdendema Sherabkyi P’haröltuchinpe Nyingpo (tibetano)
■ MAKA HANNYA HARAMITA SHINGYO (japonês)
■ Sutra do Coração da Grande Sabedoria Completa (português)
■ KAN-JI ZAI BO-SATSU GYO JIN
■ Quando Kanzeon Bodisatva praticava em
HAN-NYA HA-RA-MI-TA JI SHO KEN GO
profunda sabedoria completa, claramente observou
■ ON KAI KU DO IS-SAI KU YAKU
■ o vazio dos cinco agregados, assim se libertando de todas as tristezas e sofrimentos.
SHA-RI-SHI SHIKI FU I KU KU FU I SHIKI
Ó Sariputra! Forma não é mais que vazio. Vazio não é mais que forma.
SHIKI SOKU ZE KU KU SOKU ZE SHIKI
Forma é exatamente vazio. Vazio é exatamente forma.
JU SO GYO SHIKI YAKU BU NYO ZE
Sensação, conceituação, diferenciação e conhecimento assim também o são.
SHA-RI-SHI ZE SHO HO KU SO FU-SHO FU-METSU
Ó Sariputra! Todos os fenômenos são vazio-forma, não nascidos, não mortos,
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FU-KU FU-JO FU-ZO FU-GUEN
não puros, não impuros, não perdidos, não encontrados.
ZE-KO KU CHU MU-SHIKI MU JU SO GYO SHIKI
Assim é tudo dentro do vazio. Sem forma, sem sensação, conceituação, diferenciação,
conhecimento;
MU-GUEN NI BI ZES-SHIN NI
sem olhos, ouvidos, nariz, língua, corpo, mente;
MU-SHIKI SHO KO MI SOKU HO
sem cor, som, cheiro, sabor, tato, fenômeno.
MU-GUEN KAI NAI-SHI MU-I-SHIKI-KAI
Sem mundo de visão, sem mundo de consciência,
MU MU-MYO YAKU MU MU-MYO JIN
sem ignorância, sem fim à ignorância,
NA-SHI MU-RO-SHI YAKU MU-RO-SHI JIN
sem velhice e morte, sem fim à velhice e morte.
MU-KU SHU METSU DO
Sem sofrimento, sem causa, sem extinção e sem caminho.
MU-CHI YAKU MU-TOKU I MU-SHO-TOK-KO
Sem sabedoria e sem ganho. Sem nenhum ganho.
BO-DAI SA-TA E HAN-NYA HA-RA-MI-TA
Bodisatva devido à compreensão da sabedoria completa.
■ KO SHIN MU KEI-GUE MU-KEI-GUE KO MU U KU-FU
■ Coração-mente sem obstáculos. Sem obstáculos, logo, sem medo.
ON-RI IS-SAI TEN-DO MU-SO KU-GYO NE-HAN
Distante de todas delusões, isto é Nirvana.
SAN-ZE SHO-BUTSU E HAN-NYA HA-RA-MI-TA
Todos os Budas dos três mundos devido à sabedoria completa
■ KO TOKU A-NOKU TA-RA-SAN-MYAKU-SAN-BO-DAI
■ obtêm iluminação insuperável, completa e perfeita.
KO CHI HAN-NYA HA-RA-MI-TA
Saiba que sabedoria completa
ZE DAI-JIN-SHU ZE DAI-MYO-SHU
é expressão de grande divindade, expressão de grande claridade,
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ZE MU JO-SHU ZE MU TO-DO-SHU
expressão insuperável, expressão inigualável,
NO-JO IS-SAI-KU SHIN JITSU FU-KO
com capacidade de remover todo o sofrimento. Isto é verdade não é mentira!
KO SETSU HAN-NYA HA-RA-MI-TA SHU
Assim, invoque e expresse a sabedoria completa,
SOKU SETSU SHU WATSU
invoque e repita:
GYA-TEI GYA-TEI
vá, vá,
■ HA-RA GYA-TEI HARA SO GYA-TEI
■ vá além, vá além do além,
■ BO-JI SOWA-KA
■ para a outra margem da iluminação.
HAN-NYA SHIN-GYO ■
Sutra do Coração da Grande Sabedoria Completa. ■
Comentários pessoais:
“Quando Kanzeon Bodisatva praticava em profunda sabedoria completa”
O prólogo do Sutra completo da Prajnaparamita inicia com Shariputra perguntando ao Buda
como fazer para praticar a Perfeição da Sabedoria e o Buda, por sua vez, solicita a
Avalokitesvara para explicar detalhadamente a Shariputra. “Assim ouvi. Certa vez, o
Abençoado, juntamente com vários dos maiores Bodisatvas e um grande número de monges,
se encontrava em Rajagaha, no monte Gridhrakuta. O Abençoado estava absorvido no
Samadhi e o nobre Avalokitesvara Kanzeon meditava sobre o profundo Prajaparamita e, sendo
perguntado, responde...”
No início do Sutra um observador atento poderá perceber que quando (Kwan Yin - em chinês,
Quan Am em coreano e Kannon ou Kanzeon em japonês) uma manifestação do amor infinito e
da insuperável compaixão de Buda se encontra praticando Prajnaparamita, ele não somente se
encontra sentado em meditação, ele na verdade é a personificação da meditação, ele e a
meditação são um, não há diferença entre ele o estado meditativo.
“claramente observou o vazio dos cinco agregados, assim se libertando de todas as tristezas e
sofrimentos”
Os cinco agregados ou Skandas são:
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1º - A matéria: Designam sob esse termo os quatro elementos tradicionais que simbolizam a
terra, a água, o fogo e o ar, com seus respectivos estados: sólido, fluido, calórico e de
movimento. Os derivados desses quatro elementos correspondem, em nosso ser, aos nossos
órgãos dos sentidos, com suas respectivas faculdades: visual, auditiva, olfativa, gustativa, tátil
e mental, sendo que os objetos do mundo exterior correspondentes são as formas visíveis, os
sons, os odores, as coisas tateáveis e os pensamentos, idéias e concepções.
2º - As sensações: São todas as sensações agradáveis, desagradáveis ou neutras que
sentimos mediante o contato dos nossos órgãos físico e mental em relação ao mundo exterior.
Na verdade as sensações não são nem boas nem más, a atitude mental de cada pessoa,
condicionada pela família, sociedade, escola, costumes etc. é que assim as condiciona.
3º - As percepções: São as impressões causadas pelos órgãos dos sentidos reconhecendo os
objetos físicos e mentais, tanto nas suas características físicas, como pelas impressões
mentais. Esta percepção, que é o conjunto das características de forma, odor, sabor, volume e
peso, é que nos permite reconhecemos os objetos do mundo.
4º - As formações mentais: Proporcionam as condições necessárias através das quais o
conhecimento ou consciência possam “enxergar” a existência. Os elementos básicos são: a
vontade (voluntária ou involuntária), a atenção e o contato. A vontade com a presença da
atenção, coloca o corpo e o objeto numa determinada direção para que possa haver o contato,
isto é, se existe algo para ser visto, luz suficiente, olhos para ver, estabelece-se o contato
visual produzindo uma formação visual, o mesmo se dá com os outros órgãos dos sentidos.
5º - A consciência: Ou conhecimento é uma reação ou resposta às seis faculdades (visual,
auditiva, olfativa, gustativa, tátil e mental) que tem por objeto os fenômenos exteriores
correspondentes (formas visíveis, sons, odores etc.). Sempre que se estabelece um contato
com o corpo e o mundo exterior, vêm à existência os elementos imateriais, isto é, a sensação,
a percepção, as formações mentais e a consciência correspondentes.
O Buda na sua incomparável sapiência comparou o universo a uma vasta rede composta por
uma infinita variedade de jóias brilhantes, cada uma delas com um número incontável de
facetas, sendo que cada jóia reflete em si mesma o brilho de todas as outras. Tomemos um
exemplo prático que nos ajudará na compreensão da frase do texto. Vamos imaginar uma
onda no mar. Essa onda vista de uma certa maneira, parece ter uma identidade distinta, um
começo e um fim, um nascimento e uma morte. Vista de outro modo (prajna - sabedoria),
essa onda não existe. É apenas o comportamento da água. A onda é “vazia” de uma
identidade separada, mas “cheia” de água. Assim, quando pensamos a respeito de uma onda,
através da lógica percebemos que se trata de algo que se tornou temporariamente possível
por fatos e circunstâncias permanentemente mutáveis. Também é fácil perceber que cada
onda está relacionada com todas as outras ondas. Observando com a mente desprovida de
prévios conceitos, podemos notar que a onda não possui qualquer existência própria, e essa
ausência de existência independente é o que o Sutra chama de “vacuidade”.
Se alguém segurar um copo cheio de água até a borda e perguntar, “Este copo está vazio?”,
todos dirão “Não, ele está cheio de água”. Se esse alguém jogar fora toda a água e perguntar
novamente, todos responderão “Sim, ele está vazio”. Mas, vazio de quê?... Essa é a principal
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questão enfocada no Sutra. Vazio significa “vazio de alguma coisa”. O copo não pode estar
“vazio de nada”. “Vazio” não tem significado a não ser que você saiba do que ele está vazio.
Meu copo está vazio de água, mas não está vazio de ar. Estar vazio é estar “vazio de alguma
coisa”. Quando Kanzeon declara que os cinco agregados são vazios, ele o faz para nos ajudar a
compreender o texto.
Quando Kanzeon olhou profundamente, sem conceitos, nem pré-conceitos, dentro da natureza
dos agregados, de repente, percebeu que todos eles eram vazios. E, antes que alguém
perguntasse “Vazios de quê?”, ele responde: “Eles são vazios de um self separado, de uma
existência inerente de um ego”. Isto quer dizer que nenhum dos cinco agregados pode existir
sozinho, por si mesmo. Cada um dos agregados tem de ser produzido pelos outros quatro. Eles
têm de coexistir, eles têm que se interrelacionar.
Quando Kanzeon, o Bodisatva que escuta os sons do mundo, seus lamentos, suas dores, seus
sofrimentos e suas preces, tudo observou de forma clara, sem conceitos, sem dualidade.
Quando ele se identificou com o mundo, quando se situou além do pensar e do não pensar,
quando se integrou ao todo, percebeu que esses agregados ou Skandas são totalmente vazios
de substância inerente, de personalidade, de individualidade. De posse de todo esse
conhecimento se libertou de todos os sofrimentos, pois conseguiu ver as coisas como elas são,
e ver as coisas como elas são é acabar com o sofrimento. Não que não exista o sofrimento,
simplesmente não existe mais o sofredor. Não existe mais a diferenciação de bom, ruim ou
indiferente. Todas as coisas são como são, e são completamente perfeitas da maneira que são.
Quando Kanzeon diz que não existe sofrimento, ele quer dizer que o sofrimento é composto
inteiramente por coisas que não são sofrimento. Se você está sofrendo ou não, isso depende
de muitas coisas. O frio pode doer quando não estamos aquecidos, mas com roupas
adequadas e em frente a uma lareira comendo “fondue”, o frio pode ser muito gostoso. O calor
dependendo das condições pode ser um tormento e até perigoso, mas na praia se divertindo
com os amigos e família é uma maravilha. O sofrimento não é algo objetivo. Ele depende da
forma como percebemos as coisas. Existem coisas que causam sofrimento a uma pessoa, mas
não a outras, assim como existem coisas que causam alegria a alguns e não a outros.
“Ó Sariputra! Forma não é mais que vazio. Vazio não é mais que forma. Forma é exatamente
vazio. Vazio é exatamente forma. Sensação, conceituação, diferenciação e conhecimento assim
também o são”
Sariputra era um dos discípulos mais brilhantes de Buda, seu nome derivava de “Shari” que
designa uma espécie de pássaro com olhos muito brilhantes e penetrantes e “Putra” que quer
dizer “filho de”. A mãe de Shariputra também possuía os mesmos olhos brilhantes e
penetrantes. Ele então foi chamado de Shariputra ou o filho da mulher que tinha olhos
penetrantes e brilhantes iguais ao do pássaro “shari”.
O texto do Sutra acontece através de um dialogo entre Avalokitesvara e Shariputra sentados
em frente ao Buda. Quanto à frase do texto em epígrafe, nota-se que primeiramente foi dado
ênfase à forma, pois ela caracteriza o principal motivo do sofrimento humano que é a errônea
idéia de um ego, de uma personalidade imutável e eterna. Porém em razão das “coisas” não
serem reais, de terem uma realidade apenas temporária ou convencional é que elas podem
surgir por originação dependente, ou seja, o vazio é que da a possibilidade do surgimento de
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uma miríade de coisas. Desse modo, somente pelo fato de “não existir” esse texto (de forma
absoluta e sim de forma convencional, ou seja, ele não é, ele está sendo) é que é possível
“existir” o texto ou como diz a frase do Sutra. O vazio é forma e a forma é vazio.
Segundo os físicos, o vácuo contém muitos materiais capazes de produzir efeitos. Na teoria
geral da relatividade, cada ponto do espaço tem certas propriedades, que variam de um ponto
a outro quando existe um campo gravitacional. A velocidade da luz, por exemplo, pode ter
valores distintos em diversas regiões do espaço vazio, como se o vácuo tivesse um índice de
refração variável. Mas como dois “vazios” poderiam ser diferentes? É claro que um lugar onde
há um campo gravitacional não é uma região absolutamente vazia e sim um espaço cheio de
“alguma coisa” que produz efeitos físicos. O vácuo da teoria quântica também não é um
espaço vazio. De acordo com essa teoria, em qualquer região do espaço aparentemente vazia,
estão continuamente surgindo e desaparecendo “partículas virtuais”, que podem ser elétrons,
fótons e mésons. Essas partículas surgem, existem durante um tempo muito curto (princípio
de Heisenberg) e depois desaparecem. O turbilhão de fótons virtuais que preenche todo o
espaço constitui a “flutuação do ponto zero” (ZPF), que é estudada pela eletrodinâmica
quântica. Quando duas placas metálicas, sem carga elétrica, são colocadas muito próximas
uma da outra, ocorre uma redução da densidade desses fótons entre elas, e os fótons externos
as empurram uma em direção à outra, com força inversamente proporcional à quarta potência
da distância, demonstrando que, na física atual, o espaço “vazio” está “cheio” de “entes”
físicos.
Quando afirmamos que este texto é vazio, queremos dizer que ele é vazio de uma existência
separada, independente, que o texto não pode simplesmente existir por si mesmo. Ela precisa
coexistir com a tinta, com o computador, com o oxigênio existente no ar, com o calor e luz do
sol, com aquele que vê e com tudo o mais. O texto é vazio de uma individualidade separada.
Mas, justamente por ser vazio tem a possibilidade de ser repleto de todas as coisas.
Quando kanzeon olhou profundamente no interior dos cinco agregados percebeu que nenhum
deles pode existir sozinho, por si mesmo. Cada um só pode existir em interdependência com
todos os outros. Assim, ele nos diz que a forma é vazia. A forma é vazia de uma entidade
separada de um ego, mas é cheia, completa de todas as coisas existentes no universo. Por
analogia, o mesmo é verdadeiro para os sentimentos, percepções, formações mentais e
consciência, que são os agregados.
A concepção do texto do Sutra utiliza-se do princípio da negação para demonstrar a verdade
para Shariputra. Alguns estudiosos afirmam que a forma desse raciocínio apresenta certas
características análogas à tradição escolástica da teologia negativa do cristianismo oriental.
“Ó Sariputra! Todos os fenômenos são vazio-forma, não nascidos, não mortos, não puros, não
impuros, não perdidos, não encontrados. Assim é tudo dentro do vazio”
Os fenômenos só podem surgir em dependência de causas e condições, a isso o Budismo dá o
nome de causa e efeito (carma). Só podem surgir na dependência de suas partes, sem
“partes” não há “um todo”, e sem “um todo” não há nenhum sentido no conceito de “partes”.
Os fenômenos são mutuamente exclusivos; eles são simplesmente designados por rótulos e
conceitos em razão da dependência de suas bases, mas os fenômenos em si não são
encontrados quando procurados nestas bases. Podemos citar o exemplo contido no livro “As
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perguntas do Rei Milinda Panha” (coleção de diálogos entre o Monge Nagasena e o Rei grego
Menander, que reinou no Noroeste da Índia de 125 a 95 a.C.). O que é a carruagem através
da qual o Rei conseguiu chegar até este lugar? Pergunta o Monge Nagasena (quando
perguntado pelo Rei sobre o não-eu). É possível apontar os cavalos, os arreios, os bancos, as
rodas, o banco, as partes metálicas etc., mas, não a carruagem em si. É possível analisar cada
uma destas partes em separado até se chegar ao espaço ocupado pelas partículas da matéria,
mas sem encontrar qualquer coisa que, sozinha, possa ser chamada de carruagem. Até mesmo
as partículas da carruagem dependem de uma série de fatores interdependentes.
Afirmar que essa carruagem “existe por si mesma” seria incorreto, mas afirmar que ela “nãoexiste” também seria um erro. Dizer que a carruagem “existe e não-existe” ou que “não existe
nem não-existe” seria apenas uma ilógica ou como preferem os advogados o estabelecimento
do contraditório. Estas posições errôneas são conhecidas como as quatro argumentações que
não conduzem à sabedoria, ou seja: 1º Afirmar que os fenômenos existem, 2º Afirmar que os
fenômenos não-existem, 3º Afirmar ambas as coisas (os fenômenos existem e não-existem) e
4º Afirmar que os fenômenos não existem nem não-existem. Essas afirmações não estão
corretas porque caem nos extremos do eternalismo e do niilismo. Portanto, a carruagem só
pode existir em dependência de causas e condições. A carruagem só pode existir na
dependência de suas partes, como o cavalo, o banco, o arreio, as rodas, as partes metálicas e
assim por diante. A carruagem, quando observada com sabedoria (prajna), é apenas um
nome, um conceito, e quando procurada em suas bases, ou seja, o cavalo, os bancos, o arreio
etc., não pode ser encontrada, pois seus elementos (suas partes constituintes),
separadamente, não são a carruagem, são apenas o banco, o arreio etc. Aqui, a verdade no
nível relativo é a de que “a carruagem existe” convencionalmente, existe apenas em
dependência das causas, condições e das partes constituintes. A verdade no nível absoluto é a
impossibilidade de se fazer qualquer afirmação ou negação definitiva a respeito da carruagem,
pois ela não existe por si mesma, é destituída de existência inerente de um ego, não é nada
mais que vacuidade (shunyata) surgindo como um fenômeno através do conjunto harmônico
de suas partes.
Como sei que esta lista é formada por pessoas inteligentes e eruditas, consideremos alguns
outros exemplos mais científicos. O que é um objeto branco? É um comprimento de onda?
Uma temperatura? Uma cor? Serão partículas em movimento? Essas partículas serão energia,
massa? Observemos apuradamente, nenhum desses atributos pertence intrinsecamente ao
objeto, eles são simplesmente o resultado da sua exposição a modos de investigação
particulares. Nos textos budistas, existe a história de dois cegos a quem explicavam as cores.
A um, disse-se que o branco era a cor da neve. Quando o cego pegou num pouco de neve,
concluiu que a cor branca era fria. Ao outro, disse-se que o branco era a cor dos cisnes, e ao
ouvir o som das asas de um cisne que voava, conclui que a cor branca fazia barulho e era
difícil de pegar. Em resumo, o mundo não pode se determinar sozinho. Se o fizesse, todos nós
o perceberíamos da mesma maneira. Não se trata aqui, nem se encontra em questão, negar a
realidade observável ou afirmar que não há realidade fora da mente, mas simplesmente que
não há “realidade em si”, ou como diz Ziraldo, a cor do mundo é flict (espécie de cor não
constante no arco-íris).
O mundo começou a entender melhor o tempo depois que Einstein formulou sua teoria da
relatividade. Antes do aparecimento dessa teoria, considerava-se o tempo como absoluto e
universal. O tempo era igual para todos, mesmo que as circunstâncias físicas fossem
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diferentes. Na teoria da relatividade, Einstein postula que o intervalo entre duas etapas
depende da maneira como o observador se desloca. Quando dois observadores se movem de
maneiras diferentes, experimentam durações de tempo diferentes. A velocidade é uma
maneira de saltar no tempo. Na teoria da relatividade geral, Einstein declarou que a
alternância da gravidade faz com que o tempo escoe mais devagar. Os relógios andam um
pouco mais depressa quando estão localizados em áreas mais baixas, mais próximas do centro
da Terra e, portanto, mais no interior do seu campo gravitacional. De acordo com o mesmo
princípio, os relógios andam mais depressa nas áreas mais distantes do centro da terra, mais
longe do campo gravitacional. O efeito é pequeno, mas não pode ser desprezado e já foi objeto
de testes conclusivos, com o uso de relógios de altíssima precisão.
A mesma lógica, o mesmo princípio, também pode ser usado para explicar a impessoalidade, o
não-eu, a inexistência de um ego. O conceito de “eu” é vazio, pois surge apenas em
dependência dos nossos cinco agregados. A verdade relativa está relacionada ao Samsara
(ciclo de renascimentos e mortes) e aos cinco agregados (matéria, sensação, percepção,
formação mental e consciência). Neste contexto, os Sutras sobre a Perfeição da Sabedoria
apresentam a inexistência do sofrimento, da causa, da cessação e do caminho. Apesar de em
termos relativos, haver a experiência de Samsara e do Nirvana, no nível da verdade absoluta
não há essa dualidade ou separação.
Nas palavras de Nagarjuna. “Os fenômenos não surgem de si mesmos, nem dos outros, nem
de ambos, nem do nada. E então, de nenhum lugar as realidades compostas emergem. Não
existe qualquer coisa que não seja originada interdependentemente, portanto nada existe que
não seja vazio de auto-entidade. Afirmar os fenômenos de maneira eternalista é considerá-los
eternos, negá-los é vê-los de maneira niilista como sendo o nada. Os praticantes budistas não
devem nem afirmar, nem negar”. (Nagarjuna, Mulamadhyamikakarika)
Buda em nenhum momento afirmou: “Você não existe”. Ele apenas disse: “Você não tem um
eu”. Sua natureza é “não-eu”. Uma das maiores dificuldades de compreensão do porque da
infelicidade e do sofrimento vem do fato de pensarmos que Buda declarou que não existimos.
Com esse pensamento incorreto saímos de um extremo e caímos em outro, mas ambos os
extremos são apenas conceitos. Não nos permitimos experimentar a realidade. Apenas
detemos conceitos sobre ela, e sofremos por isso. Temos a perfeita noção de que “pessoa” é
distinto de “não-pessoa”, como as árvores, um boi, um gato ou um cavalo. Mas “pessoa”
também é uma noção a ser transcendida. Ela é feita somente de elementos “não-pessoa”. Se
você crê que Deus (segundo o princípio judaico-cristão) fez primeiro o homem a sua imagem e
semelhança e depois criou o mundo, com as árvores, frutas, água, céu, sol etc. você está em
desacordo com o princípio do Sutra. O Sutra ensina que um homem é feito de elementos “nãohomem”. Sem a totalidade do mundo, com suas árvores, frutas, água, céu, sol e tudo o mais,
o homem não pode existir, aliás, nem o homem, nem os animais... nada.
O Sutra tem o propósito de nos fazer enxergar profundamente a realidade da vida, de nos
liberarmos dos dogmas, de não insultarmos nossa inteligência com princípios inaceitáveis. Com
o entendimento desse Sutra, passamos a “viver a vida” como uma experiência libertadora e
única e não como uma simples noção ou percepção.
“Ó Sariputra! Todos os fenômenos são vazio-forma, não nascidos, não mortos, não puros, não
impuros, não perdidos, não encontrados. Assim é tudo dentro do vazio. Sem forma, sem
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sensação, conceituação, diferenciação, conhecimento; sem olhos, ouvidos, nariz, língua, corpo,
mente; sem cor, som, cheiro, sabor, tato, fenômeno. Sem mundo de visão, sem mundo de
consciência, sem ignorância, sem fim à ignorância, sem velhice e morte, sem fim à velhice e
morte. Sem sofrimento, sem causa, sem extinção e sem caminho. Sem sabedoria e sem
ganho. Sem nenhum ganho”
Iniciando o parágrafo com uma interjeição de espanto e admiração, Kanzeon fala para
Sariputra de forma repetida, talvez para que ficasse claro e não restasse nenhuma dúvida
quanto ao teor da resposta, talvez porque naqueles tempos de antanho, onde ainda não havia
a preocupação da preservação em forma escrita, fosse uma “práxis” acadêmica os discursos
serem preservados em forma oral e repetitiva. Talvez ainda, Kanzeon tivesse ficado tão
maravilhado com esse “vislumbre” que queria ter a certeza de que Sariputra o entendia.
Muitos são os relatos de monges que uma vez iluminados ficaram tão entusiasmados que mal
conseguiam balbuciar algumas palavras, ou ainda repetiam incessantemente, frases
aparentemente desconexas.
Creio que Kanzeon por todos esses motivos e por outros tantos, fora do meu entendimento,
insiste com vários exemplos, onde declara que os fenômenos são vazio-forma, isto é, são
vazios de uma “forma”, de uma substância inerente de um ego. Não são nascidos, nem
mortos. Como pode ser nascida, uma coisa que é subproduto de outra e se encontra em
processo initerrupto de transformação durante todo o tempo de sua “não vida”. Naturalmente
que se eles não tiveram nascimento não poderiam ter morte, pois não há na verdade o que
nascer, nem o que morrer. Não podem ser puros nem impuros, pois essas são conceituações
pessoais de cada indivíduo, de cada cidade, de cada sociedade, não tendo nada a ver com os
fenômenos que surgem por originação dependente. Assim é tudo dentro do vazio, continua o
texto, sem forma (que forma pode ter alguma coisa em permanente mudança), sem sensação
(sensação, conceituação, diferenciação e conhecimento são impressões erroneamente sentidas
através do contato com qualquer dos sentidos ou agregados, também vazios por natureza.)
O texto continua até uma parte interessante que cabe uma interpretação. Sem velhice e morte
e sem fim à velhice e morte. Como pode uma coisa envelhecer se a cada momento ela é nova,
a cada segundo se modifica, se transforma em outra coisa. A idéia de velhice é uma concepção
incorreta, um rótulo que damos as coisas em certo tempo, em um certo momento da
transformação initerrupta, oriunda de nossas mentes não iluminadas. Obviamente se nada fica
velho, e sim, se altera, como pode morrer? Sem fim a velhice e morte, ou seja, através do
conhecimento e da sabedoria (prajna), quando afinal conseguimos compreender que todas as
coisas visíveis e invisíveis, todas as coisas criadas e por criar carecem de uma substancia
inerente, damos fim ao ilusório pensamento de início e de fim.
Quando por fim, paramos de conceituar, de pré-conceituar, de vivermos em função de nossos
desejos condicionados, de nossas vontades arraigadas. Quando compreendermos que não
existem leis escritas nem doutrinas rigorosas acerca do certo e do errado, pois as únicas leis
são as que governam os fenômenos impermanentes da vida. Quando entendermos que o
discernimento racional vê os extremos como separados, uma verdadeira dicotomia na qual os
opostos estão em conflito. As ilusões dessa inverdade precisam ser desmascaradas para que a
espontaneidade da verdade possa se manifestar. Os extremos de felicidade e desventura,
amor e ódio, moralidade e imoralidade, ignorância e fim da ignorância, velhice e morte e fim
da velhice e morte só tem significado em relação uns com os outros, e suas determinações só
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são válidas com respeito ao observador. Não se conhece uma coisa independentemente da
outra, separada do seu oposto. Ver o “um” em “tudo” implica a constatação dos opostos, mas
exclui o julgamento, e os opostos surgem unicamente como a unidade dinâmica da mudança.
Tudo é “processo”, um ciclo de vir-a-ser, um movimento dinâmico entre os extremos opostos
da lei universal. A única constante no universo é o fato dele não ser constante. Nada
permanece o mesmo por um único dia, uma hora ou mesmo um segundo. O mesmo homem
não pode entrar no mesmo rio duas vezes. A água que o banhou não é mais a mesma e o
homem que foi lavado pela água também não é mais o mesmo. A noite se transforma em dia,
as neves do inverno trazem as flores da primavera. A mudança é vida. Compreender “com os
ossos” o parágrafo do texto significa chegar ao Satori, significa transpor o abismo, derrubar a
muralha da dualidade que existe entre nós e o mundo conceitual, porém é necessário lembrar
que o verdadeiro Satori consiste em esquecer o Satori, esquecer o ontem, esquecer o amanhã.
Se um homem se encontra com sede, dê-lhe água, se um homem está com fome dê-lhe
comida, é simples, apenas faça o que deve ser feito, sem considerar, sem esperar nada. O
vazio é forma a forma é vazio.
“Bodisatva devido à compreensão da sabedoria completa. Coração-mente sem obstáculos.
Sem obstáculos, logo, sem medo. Distante de todas delusões, isto é Nirvana”
O universo não nasceu através de um movimento físico, ou da vontade de algum ser
sobrenatural. No tempo sem início, não havia forma, mas apenas o vazio, e dentro desse
vazio, uma imensa nuvem de gás e poeira em suspensão. Às vezes uma troca aleatória ocorria
entre os átomos. A força que obrigou próton a colidir com próton, num choque suficientemente
violento (big-bang) para fundi-los em átomos de elementos novos, começou com uma
vibração. Uma onda de energia criativa, na forma de luz, riscou as trevas dando início a um
processo ininterrupto e infinito de mudanças. Bastou certas condições estarem organizadas de
uma certa maneira, que o estopim se acendeu. No começo era somente a sutileza, depois
lançou-se no caos o movimento sem objetivo das partículas subatômicas e da matéria. Numa
febre de reações atômicas, uma onda inestancável de poder gerou enorme calor, e esse calor,
essa energia, essa ação dinâmica universal deu nascimento às estrelas e galáxias. No começo
ou ainda antes do começo, toda matéria, toda radiação, todo o espaço concentrava-se num
vazio celestial no qual a radiação e a matéria podiam coexistir. A temperatura do universo era
tão elevada que as forças nucleares e eletromagnéticas revelavam-se incapazes de soldar as
partículas básicas numa estrutura nuclear e atômica. Era um pretenso e sutil estado de
equilíbrio térmico onde a força dominante que mantinha unida a matéria era a gravidade.
Então a bola primordial de fogo, condensada, explodiu, carregando os abismos de energia e
radiação. À medida que a bola de luz começava a expandir-se, a matéria ia se dissolvendo
como sal na chuva.
Partículas elementares eram constantemente criadas e destruidas, criando e aniquilando
nêutrons, prótons e elétrons na proporção da expansão do universo. Com a energia do calor
intenso promovendo a expansão, a temperatura do universo caiu e a velocidade do processo
criativo começou a decrescer pouco a pouco. A quantidade de energia com relação a
quantidade de matéria também decresceu, e os nêutrons começaram a fundir-se com os
prótons numa verdadeira pantomima de reações nucleares. A radiação estava uniformemente
dispersa no espaço, mas, à medida que uma quantidade maior de energia passava a ser
contida na matéria, esta iniciava passava a exercer poder de atração que faz com que a
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matéria se agregue. Centenas de milhões de anos depois da explosão, o universo se tornara
bem mais brilhante, iluminado por incontáveis estrelas e nebulosas. Embora se alterando
sempre em forma e função, parece que o universo é o mesmo de sempre. Entretanto, uma
estrela nunca permanece a mesma, ela evolui constantemente ao longo dos ciclos mutáveis de
desenvolvimento, enquanto vai processando a matéria prima da construção universal.
Todas as miríades de coisas existentes no cosmos foram adaptações, transformações,
verdadeiras mutações de outras coisas. Todas as coisas começaram como tudo começa, da
pureza física da “não-forma”, do “não tempo”, do “não espaço”, do vazio, originando-se da
percepção da vibração ou como preferem os budistas do “vir-a-ser”. Não há tempo nem
espaço, somente o universo tal como é.
Nós vivemos neste universo, somos o universo, entretanto cegos pela ilusão e ignorância,
enxergamos uma vasta expansão exânime na qual a esfera dos organismos vivos mantém
uma existência separada. Não temos sabedoria, não compreendemos nem aceitamos a
impermanência e a impessoalidade da vida (ausência de um ego). Desgraçadamente, o
coração e a mente não se encontram sem obstáculos, por isso damos como verdadeiros os
relatos que constituíam exercícios elementares de intelecto e criatividade. O relato bíblico da
criação tem raizes em antigos mitos egípcios e babilônicos, segundo os historiadores a palavra
“Adão” é proveniente de “Adam” que significa terra ou barro. Conforme o Gênesis, Deus
moldou o pó da terra numa figura de barro e com seu sopro, encheu-o de vida. Este primeiro
homem, segundo a Bíblia, foi Adão. Esse homem na verdade foi criado pela imaginação do
próprio homem, preocupado em colocar a espécie humana num pedestal que nunca esteve
nem estará. Ao dizer que o homem foi criado por uma divindade superior e personificada,
proporcionamos condições para que as mentes desprovidas de sabedoria e necessitadas de
algum alento possam mais facilmente compreender a vida. Histórias assemelhadas que
pregam uma imortalidade e descendência divina era a maneira de se tentar descobrir
explicações para um mundo que não era compreendido e se mostrava incontrolável, sempre
sujeito a mudanças e transformações, indiferente as vontades dos que nele habitavam. Esses
mitos e lendas são simbolismos e devem ser encarados como sendo o conhecimento poético e
artesanal de povos antigos na sua débil tentativa de provar que o homem é um ser especial.
Infelizmente as gerações posteriores tomaram essas histórias como fatos literais. Afinal, as
histórias eram fáceis e forneciam uma fórmula, uma regra para seguir, livravam-nos das
responsabilidades e apresentavam sempre a possibilidade de resolução graças a uma
intervenção divina e miraculosa.
Um homem sobe a encosta íngreme de uma montanha, uma pedra se desprende, o pé falseia,
acontece o desequilíbrio, ele rola ribanceira abaixo. Os segundos finais de sua vida são gastos
em rezar desesperadamente para que a mão de Deus se estenda e o salve da morte certa que
o aguarda lá embaixo. Para longe a lei da gravidade, o indivíduo quer um milagre pessoal.
Apega-se insensatamente ao conceito de que é “direito” de Deus governar o universo pelo
milagre, pela sua onipotente vontade e não pelas leis naturais.
Subconscientemente quer crer que acreditando em Deus, imediatamente passa a ser diferente
dos outros pobres mortais, afinal, agora é íntimo do “Todo Poderoso”, foi elevado à categoria
de filho do “big boss”, se encontra à margem das leis que governam a natureza.
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Acredito que todos queiram escutar a palavra de Deus, mas ninguém está disposto a morrer
para isso, a fazer qualquer espécie de sacrifício, ou perder seja lá o que for por ele. Ninguém
pode vê-lo ou escutá-lo com esses olhos e esses ouvidos. A palavra do Inominável é sem som,
a sua visão não pode ser enxergada com os olhos. É necessário abandonar corpo e mente.
Eckart, um místico cristão, também falava a mesma coisa: “É preciso abandonar a si próprio,
ao abandonar-se damos espaço para o aparecimento de Deus”. É preciso pintar a primavera
como dizia Mestre Dogen, não pintar as flores de cerejeiras ou as flores de ameixeira. Elas não
são a primavera, são apenas flores. “Quando eu estava em silêncio, ouvi de Deus a palavra
secreta” (Eckart).
Este silêncio de Eckart é o Nirvana Budista. Esse silêncio é encontrado em todas as religiões. É
a preparação para a experiência religiosa mística, é treinamento para o despertar, para o
Satori. Entretanto, essa prática não é das mais fáceis. Manter silêncio pode ser muito difícil
para não dizer traumatizante. Numa corrida de maratona, em certo momento chega-se a um
ponto que parece impossível prosseguir, não se consegue mais respirar, o corpo todo dói, o
cansaço é descomunal. Parece que não conseguiremos dar mais nenhum passo, que dirá
chegar até o final da corrida. Isto é chamado pelos especialistas de “dead point”, é o ponto da
morte, o ponto que poucos conseguem ultrapassar. Tem que haver muita força de vontade,
muito sacrifício, muita determinação para consegui-lo. Depois de ultrapassado esse limite,
tudo fica mais fácil. Num Sesshin (retiro de meditação intensiva) acontece a mesma coisa. O
tempo todo são dores nos joelhos, nas costas, a cabeça girando com todos aqueles
pensamentos desordenados. Os poucos que conseguem suportar, que conseguem manter o
sagrado silêncio, que conseguem “estar” com as dores e com o cansaço, que não desejam
estar em nenhum outro lugar, que conseguem abandonar corpo e mente. Os poucos
escolhidos, que conseguem transcender a inércia e a apatia comportamental experimentam
uma beatitude indescritível. Escutam a voz daquele que não pode ser denominado e vêem a
sua imagem.
Quando Copérnico advogou pela primeira vez a teoria de que a terra gira em torno do sol,
abalou os fundamentos da religião vigente e tornou-se uma figura malvista nas cortes
eclesiásticas. Os religiosos supunham que ele ameaçava a idéia de que um Deus todo poderoso
criara a natureza e abalava a sua firme convicção de que as glórias celestes, rodeadas de
asexuados anjos gordinhos, semi-nús com cabelos louros e encaracolados bailavam em volta
da terra, com o homem entronizado no centro do universo. Galileu Galilei, com sua luneta e os
seus métodos científicos, acabou se tornando a maior vítima do preconceito existente. Em “O
Mensageiro Estrelado” publicação de 1610 ele publica suas observações astronômicas,
provando que Copérnico estava certo. Foi perseguido, ameaçado e proibido de falar em
público. Somente trezentos e setenta anos depois a igreja o absolveu oficialmente da culpa.
O tratado de Darwin da origem das espécies pela seleção natural foi acolhido com zombaria e
ódio. As pessoas mais uma vez supunham que ele ameaçava a onipotência de Deus,
desafiando a própria existência da divindade e suas criações. Num certo programa da rádio de
1950, da BBC, o ministro Alglicano C. E. Raven explicava: “A idéia de que a criação tenha sido
um processo e não um ato, contínuo e não intermitente, operando conforme a sequência
ordenada de eventos naturais, revoluciona toda a noção de um Deus fora do mundo, de um
Deus que o põe em movimento, intervindo em certas ocasiões para alterar milagrosamente o
seu curso. Hoje, percebemos que semelhança idéia jamais foi satisfatória; e de fato, esta não
era a crença de São Paulo ou dos primeiros grandes teólogos cristãos”.
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O universo inteiro está vivo, cada átomo está vivo com a sua própria forma de consciência, a
teoria de Opari, da geração espontânea da vida a surgir da matéria inorgânica, tem sido
amplamente sustentada, a ciência atualmente explica muitos dos processos vitais como
resultado de ações anteriores ou reações químicas resultantes.
Quando se compreende a “idéia” do Sutra, quando percebemos que a noção de certo e errado,
puro e impuro, agradável e desagradável, quando compreendemos que tudo depende de nosso
ponto de vista, de nossos conceitos, da distância que nos encontramos do objeto ou fato
observado, do dia, da hora, de nossas necessidades momentâneas etc, temos a Sabedoria
Completa, recebemos o “Shobogenzo - O Verdadeiro Olho do Darma”. Deste dia em diante
olhamos as coisas, fatos e fenômenos como eles realmente são (impermanentes, impessoais e
insatisfatórios), não mais através das lentes sujas e opacas da ignorância e da ilusão. O
coração e a mente não possuem mais obstáculos, sejam eles conceituais, filosóficos,
teológicos, morais ou emocionais. Se não possuem mais obstáculos não sabem mais o que
significa o medo, continuamos a conhecer a palavra medo, mas não sabemos mais o que ela
significa. Isto é o Nirvana.
“Todos os Budas dos três mundos devido à sabedoria completa obtêm iluminação insuperável,
completa e perfeita. Saiba que sabedoria completa é expressão de grande divindade,
expressão de grande claridade, expressão insuperável, expressão inigualável, com capacidade
de remover todo o sofrimento. Isto é verdade não é mentira! Assim, invoque e expresse a
sabedoria completa, invoque e repita: vá, vá, vá além, vá além do além, para a outra margem
da iluminação. Sutra do Coração da Grande Sabedoria Completa”
A perfeita compreensão e a paciente aceitação do Sutra são a mais alta e perfeita sabedoria.
Todos os Budas dos três mundos, isto é, todos os Budas do passado do presente e do futuro,
obtiveram e obterão essa sabedoria, esse Samadhi que é o mais elevado, esse Satori que é o
mais completo e duradouro (Anokutara San Myaku San Bodai).
O Sutra demonstra claramente que através do seu entendimento pode-se exorcizar os
monstros da ilusão e da ignorância, do sofrimento e do ciclo de mortes e renascimentos,
alcançando a paz profunda e derradeira, por isso ele é um Mantra (palavra sagrada) de grande
divindade. É expressão de grande claridade, pois pode iluminar o obscurecimento mental,
clarear as trevas do fanatismo e o obscurantismo do misticismo. A “grande sabedoria” é
chamada de Mantra para demonstrar a velocidade de sua eficiência quase que sobrenatural.
Esse Mantra é como uma senha que desvenda todos os segredos do mundo, como uma chave
que abre todos os cadeados, como uma palavra secreta que assegura a vitória em todos os
campos do conhecimento. Esse Mantra é chamado de expressão insuperável, expressão
inigualável porque não existe nada em qualquer dos níveis de existência que possam superala, que tenham a capacidade de remover todos os obstáculos.
Quando o Sutra diz: “Isto é verdade não é mentira”, o faz porque tem a mais absoluta certeza
de não estar enganado, de que as palavras constantes do Sutra são verdadeiras, de modo que
todos devem acreditar e confiar totalmente nelas. Não devem, nem precisam cultivar nenhum
suspeita, mas sim pratica-las diariamente. A repetição sistemática desse Sutra assegura com
eficácia comprovada que seu praticante ultrapasse a margem da ilusão e da ignorância para a
da perfeição da sabedoria, para paz mental e de espírito, para o Nirvana, através do descarte
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de todo o sofrimento, de toda discriminação, de toda a conceituação e de toda interpretação
incorreta acerca dos fenômenos. O Sutra deixa claro que não há necessidade de se recorrer a
nenhum outro método, a nenhum outro sistema, a nenhuma outra prática, que a repetição e o
entendimento do Sutra é o suficiente para nos levar para a outra margem. A margem da
sabedoria.
O Sutra é como a luz de uma lamparina que nos guia pela noite escura cheia de buracos e
perigos. Repita o Mantra que diz: Vá, vá em segurança para a outra margem, que é a
Perfeição da Sabedoria Completa. Que assim seja.
Assim termina o Sutra do Coração da Grande Sabedoria Completa. E também minhas
considerações.
Com a débil esperança de que este ensaio possa aumentar o conhecimento sobre o Sutra Maka
Hanya Haramita Shingyo.
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