PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA DOS FUTUROS PEDAGOGOS DA UEM Claudia Cristiane Teixeira dos Santos Gusso – UEM – [email protected] Leonor Dias Paini – UEM – [email protected] Sheila Maria Rosin – UEM – [email protected] Introdução A disciplina escolar advém das perspectivas sociológicas e filosóficas. Na perspectiva sociológica, segundo Musgrove (Goodson, 1990), os pesquisadores deveriam examinar as disciplinas escolares conforme a sua ressonância fora da escola, na sociedade; como sistemas sociais sustentados por ideologias, recursos materiais e redes de comunicação, com o intuito de lhes conferir identidade; e dentro da escola como resposta ao sistema educacional. Marx e Gramsci consideram que a educação, numa na sociedade capitalista, é um instrumento de dominação; de modo parecido, Bernstein ( Goodson, 1990) argumenta que “a forma pela qual a sociedade seleciona, classifica, distribui, transmite e avalia o conhecimento educacional que ela considera público, reflete tanto a distribuição de poder quanto os princípios de controle social”. Young, (Goodson, 1990) considera a necessidade de abordagens históricas para comprovar as teorias de conhecimento; segundo ele, precisamos ver como os limites do regime escolar são produzidos historicamente por meio de ações conflitantes e interesses dos homens; e ataca a perspectiva filosófica que segundo ele se baseia numa concepção absolutista de conhecimento, que corresponde estritamente às áreas tradicionais do currículo acadêmico, justificando, ao invés de possibilitar uma análise crítica dos constructos sócio-históricos de uma determinada época. A perspectiva filosófica, que pode ser chamada de visão oficial, tem como principais defensores Hirst e Peters (Goodson, 1990) sob o argumento de que, “os objetivos centrais da educação estão relacionadas ao desenvolvimento da mente” . Desse modo, a disciplina intelectual é criada e definida, sistematicamente por pesquisadores O projeto aqui em análise instaura-se como PIBIC/CNPq-FA-UEM, e tem como agência financiadora a Fundação Araucária. 2 sem contato imediato com a realidade escolar; e, posteriormente trazida para o uso da realidade da escola; e tal disposição acaba aceita governamentais, e sustentada por determinações agências educacionais, associações docentes e até divulgada pela mídia. Analisando mais atentamente as matérias escolares, encontramos alguns paradoxos. Primeiro, o fato de o contexto escolar ser muito diferente do universitário; segundo, falta de consideração a problemas como a diversidade de motivação, de capacidade e de controle dos alunos; terceiro, a necessidade de contextualizar a disciplina para matéria escolar, o que exige adaptações: muitas matérias escolares não podem ser chamadas de disciplina e muito menos de formas de pensamento. Freqüentemente as matérias escolares são separadas de sua disciplina-base, e por vezes nem possuem disciplina-base, representando comunidades autônomas. Analisando a autonomia das matérias escolares percebemos que muitas delas precedem cronológica e contextualmente, suas disciplinas-mãe; dessa forma, a matéria escolar em desenvolvimento presente provoca a criação de uma base universitárias na seqüência. Por isso cresce entre os docentes a necessidade da compreensão da história de sua própria disciplina, uma vez que a noção de disciplina não foi objeto anterior de reflexão das ciências da educação até aqui consideradas. É esta uma razão deste estudo: procurar compreender o papel da Psicologia da Educação na formação do educador: nesse momento, tem-se em mente o educador que atuará no ensino fundamental; por outro lado toma-se como base a perspectiva dos acadêmicos do 4º ano do Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Maringá, na intenção de dar vez e voz ao aluno nesse processo. Construção de um Campo Disciplinar Segundo Goodson (1990), e Chervel (1990) a compreensão de campo disciplinar implica na exegese do termo “disciplina”. Até o final do século XIX, a palavra designava “vigilância dos alunos nos estabelecimentos escolares, e a repressão de condutas prejudiciais à boa ordem”.Somente a partir das primeiras décadas do século XX surge o novo sentido para o termo disciplina, que passa a significar “conteúdo de ensino”. 3 Uma larga corrente do pensamento pedagógico se manifestou na segunda metade do século XIX, buscando a renovação das finalidades do ensino primário e secundário; a década de 1850 é marcada pelo inicio da crise dos estudos clássicos. Defensores do estudo das línguas clássicas sustentam a idéia de que, na falta do conhecimento da cultura, o estudo do latim traz, ao menos, uma ginástica intelectual indispensável ao homem culto. Paralelamente, uma confusão dos objetivos de ensino, na década de 1870 leva a repensar a natureza da formação do aluno; até então, inculcava-se e, de agora em diante deseja-se disciplinar, a inteligência das crianças, ou seja, desenvolver a razão, a faculdade de combinação e de invenção. Por outras palavras, disciplinar o espírito, passa a significar dar-lhe os métodos e as regras para abordar os diferentes domínios do pensamento, do conhecimento e da arte, sendo a pedagogia o elemento responsável por transformar o ensino em aprendizagem. As disciplinas, então, transmitem cultura aos alunos, sua existência é responsável por traçar limites entre o ensino e as diversas fases do ensino: fundamental, secundário e superior. Cada época atribui à instituição escolar um complexo de objetivos que se constroem numa delicada arquitetura. E aqui intervém a oposição entre educação e instrução, finalidades que deveriam complementar-se, na escola, na função educativa. Entretanto, constata-se freqüentemente que a escola obriga-se a fornecer apenas a instrução, supondo essa instrução como integrada ao esquema educacional que governa o sistema escolar, ou à matéria estudada, estando as disciplinas no centro desse dispositivo. A transformação dos conteúdos de ensino a partir das necessidades do público escolar é assunto de grande importância na história da educação, encontra-se na origem da constituição das disciplinas, visto que a criação e a transformação das disciplinas têm, unicamente, a finalidade de tornar o ensino cabível. No processo de elaboração das disciplinas cabe à escola construir o ensinável, desempenhando um papel ativo e criativo, que somente a história das disciplinas escolares poderá contar. Entretanto, o campo disciplinar é determinado, entre todos os povos, pelas mesmas injunções: compreenderá os conhecimentos que possam ser repassados, com mais eficácia, pelas lições dos mestres, do que pela vida. Por isso as disciplinas escolares intervêm na história cultural da sociedade, sendo função sua preparar a aculturação dos 4 alunos em conformidade com finalidades contextuais do tempo e do espaço. É isso enfim que explica sua gênese e constitui a razão social da disciplina. Contextualização da Psicologia da Educação Para Salvador (1999) a psicologia da educação tem como finalidade utilizar e aplicar os conhecimentos, princípios e métodos da psicologia na análise e estudo dos fenômenos educativos. Por essa razão, sua origem e evolução são inseparáveis, tanto da origem e da evolução da psicologia cientifica, como da evolução das práticas educativas. Assim situa-se num espaço intermediário entre as exigências epistemológicas da psicologia científica, com suas coordenadas teóricas, conceituais e metodológicas, e às exigências da ação prática, inserida em algumas coordenadas culturais (sociais, políticas, econômicas) que lhe dão sentido. O processo tem base na convicção de que a educação e o ensino podem melhorar como conseqüência da utilização correta dos conhecimentos psicológicos. A psicologia da educação é o resultado da seleção entre o conjunto de princípios e explicações que as diferentes áreas da psicologia (do desenvolvimentos, da aprendizagem, social, da personalidade, das diferenças individuais, etc...) proporcionam e os aspectos especialmente relevantes e pertinentes à formação do indivíduo e para o ensino, entendido como transmissão de conhecimentos. Por isso mesmo, a psicologia da educação tem relação básica com a aplicação da psicologia geral aos processos educativos, tendo como principal finalidade criar conhecimento específico em relação a tais processos, utilizando princípios e explicações da psicologia geral como instrumentos de indagação, de análise e de aperfeiçoamento. A história da psicologia da educação confunde-se, em sua origem, com a história da psicologia científica e com a evolução do pensamento educativo. Até o final do século XIX as relações entre a psicologia e a educação eram mediadas pela filosofia. Explica-se isto porque, por um lado, a psicologia é componente essencial das visões mais ou menos globais de mundo proporcionados pela filosofia; e por outro lado, as propostas educativas embasam seu fundamento nos princípios básicos dos grandes sistemas filosóficos. 5 John Locke, em 1690, (Salvador, 1990) expõe e amplia a idéia de Aristóteles de que as sensações são a fonte de todo conhecimento. Segundo Locke “a mente é um mapa plano que recebe as impressões que chegam dos sentidos e geram, com ajuda de uma atividade interna de reflexão, todo o conhecimento” . Dessa teoria desenvolvem-se novas formulações e controvérsias durante o século XVIII; e somente no final desse século chega-se a um certo consenso sobre o tipo de faculdades que dão forma ao psiquismo humano: a inteligência, as emoções e a vontade. Apenas no século XIX, com o pensamento filosófico de Herbart (1776 – 1841) – apontado pela crítica como o autor mais influente da teoria educativa define-se a educação como uma aplicação prática da filosofia, atribuindo-se à filosofia moral a responsabilidade de estabelecer os objetivos da educação e do ensino; e à psicologia, proporcionar os meios necessários para chegar a esses objetivos. Nos últimos quarenta anos do século XIX, a psicologia começa a distanciarse da filosofia, o que culminará com o surgimento da psicologia cientifica nos primeiros anos do século XX, desligada da filosofia, a psicologia transforma-se em uma disciplina autônoma, que se utiliza de métodos experimentais, das ciências físicas e naturais. Essa nova concepção de psicologia resultará, então, em diferentes procedimentos educativos. Entre os precursores da nova psicologia da educação segundo Salvador (1990), podemos citar: J.M. Cattell (1860 – 1944), que dedicou parte de seus esforços a explorar as possíveis aplicações da psicologia às mais diversas áreas da atividade humana, entre elas a educação; William James (1842 – 1910) médico, com grandes contribuições no campo filosófico e psicológico, cujas idéias influenciaram decisivamente na psicologia e na teoria da educação, conseguindo importante difusão entre os professores; G. Stanley Hall (1844 – 1924), que se destacou por suas pesquisas sobre a psicologia da criança, mostrando-se como defensor da idéia de que o desenvolvimento pessoal constitui uma recapitulação da evolução biológica, insistindo no fato de que é conveniente considerar o nível de desenvolvimento infantil e as características e necessidades das crianças como ponto de partida. A psicologia da educação, portanto, nasce nas primeiras décadas do século XX, separando-se da filosofia, tendo sobre si todos os olhares; nela são depositadas 6 expectativas como fonte de informação e de idéias para elaboração de uma teoria educativa de fundamentos científicos que permitam melhorar o ensino e intervir sobre os problemas de escolarização da criança. A disciplina de psicologia da educação nasce com ênfase em estudos de pesquisa sobre aprendizagem, testes mentais, medida do comportamento, psicologia da criança e clínica infantil, tudo direta ou indiretamente referido à problemática educativa e escolar. Segundo publicação da primeira revista especializada em psicologia da educação – Journal of Educational Psychology – 1910, a psicologia educacional, em sentido amplo, cobre todas as fases de estudos da vida mental relacionados à educação. Inclui, pois, o estudo das sensações, do instinto, da atenção, dos hábitos, da memória, das técnicas, da economia de aprendizagem, dos processos conceituais; e supõe, também, os seguintes aspectos: problemas de desenvolvimento mental (a herança, a adolescência e o inesgotável campo do estudo da criança); o estudo das diferenças individuais, do “retardo e da precocidade” no desenvolvimento; a psicologia da “classe especial”; a natureza dos dotes mentais; a medida da capacidade mental; a criação e aplicação dos testes mentais; a correlação dos hábitos mentais; o emprego dos métodos especiais nas diversas etapas escolares e os importantes problemas da higiene mental. Todos esses elementos, seja do ponto de vista experimental, estatístico ou literário – são temas e problemas a serem tratados pela psicologia educacional. Porém, existem três campos de pesquisas ou áreas que se sobressaem por seu interesse na educação escolar: a psicologia da criança; a análise dos processos de aprendizagem; e o estudo e a medida das diferenças individuais e a elaboração de testes. Num outro núcleo constitutivo da psicologia da educação, relacionado à análise dos processos de aprendizagem, devemos destacar autores que são considerados os primeiros psicólogos da educação, em sentido restrito: Edward L. Thorndike e Charles H. Judd. A Thorndike devemos a primeira sistematização consistente do estudo da aprendizagem, em 1903, ele publica Educational psychology, sendo uma das primeiras tentativas de definição e aproximação educação; e do campo do trabalho e da psicologia da em 1905, com a publicação de Elements of Psychology, formula uma 7 seqüência de leis da aprendizagem, resultado de investigações realizadas em laboratório, com animais e com seres humanos. De maior repercussão no desenvolvimento posterior da psicologia da aprendizagem foi a lei do efeito, também formulada por Thorndike; segundo essa lei, as condutas posteriores são responsáveis pela satisfação de determinados impulsos, positivo ou negativo (ou seja, satisfazendo uma necessidade ou evitando um perigo). A obra de Charles H. Judd tem um enfoque muito diferente de Thorndike. Judd tem toda sua obra voltada à preocupação em conseguir que o conhecimento psicológico seja útil na educação escolar. Para ele a experimentação com animais e a elaboração de uma teoria geral de aprendizagem não são relevantes à psicologia da educação; ensina que a prioridade dessa disciplina deve estar focada na melhoria das condições humanas, direcionando assim seus trabalhos e pesquisas a dois grandes temas: o currículo e a organização escolar . Segundo Judd, os conteúdos escolares são elaborados por conhecimentos acumulados pela sociedade no curso da história, devendo o currículo conter tudo o que a sociedade exija que uma criança conheça. Estabelecendo que a verdadeira finalidade da psicologia da educação é analisar os processos mentais por meio dos quais a criança assimila o sistema de experiência social acumulada, processos que não podem ser entendidos sob forma de uma seqüência de associações de estímulos e de respostas, mas, sim, que intervêm na capacidade de organizar, sintetizar e transformar a experiência. Nesse período (início do séc. XX), educadores e teóricos da educação consideraram indispensável conhecer melhor o aluno para melhor educá-lo, o que torna a psicologia da criança núcleo constituinte da psicologia da educação. Um dos defensores mais obstinados e entusiastas da renovação pedagógica, na Europa, segundo Salvador (1990), foi o suíço Edouard Claparède (1873 – 1940). Seus trabalhos e pesquisas, desenvolvidos em laboratório experimental de Genebra, conduziram-no à concepção de uma psicologia funcional, que tenta entender os fenômenos psíquicos a partir de sua função para a vida . 8 Em 1906, Claparère organizou um seminário de Psicologia Pedagógica, com a finalidade de iniciar futuros docentes nos métodos da psicologia experimental e da psicologia da criança. Em 1912, Claparède iniciou, com um grupo de amigos, um instituto de psicologia aplicada à educação, que recebeu o nome de Jean-Jaques Rouseeau, considerado por Claparède como precursor da psicologia funcional. O instituto se tornou um marco; nele trabalharam, anos depois, psicólogos como André Rey, Jean Piaget e Barbel Inhelder. Suas obras fundamentam e justificam o movimento renovador da educação das primeiras décadas do séculos XX, na Europa. Denominado Escola Nova, o movimento se expandiu para os Estados Unidos, trazendo mudanças importantes na maneira de entender a educação escolar. A concepção funcional inrrompe na psicologia e na teoria educativa sob o impulso de William James e de G. Stanley Hall, chegando à sua expressão máxima com a obra de Jhon Dewey (1859 – 1952). Estabelecida entre a filosofia, a educação e a psicologia, a filosofia de Dewey é uma variante do pragmatismo; segundo ele, o valor de uma teoria psicológica só pode ser julgado mediante suas aplicações práticas. Claparède qualificou o pensamento educativo de Dewey de genético, funcional e social. Genético, pois segundo Dewey a finalidade da educação é assegurar o desenvolvimento humano favorecendo sua realização plena com auxílio de sua reserva inesgotável de atividade; funcional, porque as suas propostas pedagógicas tomam como ponto de partida o interesse e a necessidade dos alunos; e social, porque concebe a escola como um meio social, com a missão de preparar os alunos para que possam cumprir uma função útil na sociedade. As colocações de Dewey e Claparède, com a Escola Nova, resultam na origem do movimento renovador da educação progressiva nos Estados Unidos, exercendo grande influência nas escolas públicas norte-americanas, nas primeiras décadas do século XX. Segundo Salvador (1990), a psicologia da educação mostrou-se como a “rainha das ciências da educação”, conforme o pensamento de Wall (1979), principalmente em três âmbitos de estudo e de pesquisa; a medida das diferenças individuais e do rendimento escolar, a psicologia da aprendizagem e a psicologia do 9 desenvolvimento infantil. Desse modo a formação de professores da época teve sua base na história da educação e da psicologia (Húsen, 1979). E as pesquisas educativas adotaram, de maneira generalizada, a metodologia própria da psicologia experimental. Um fato significativo sobre esse tema, foi a polêmica que surgiu entre os psicólogos da educação, os que estudavam os processos de aprendizagem em laboratório, e os que por outro lado, estudavam os processos de aprendizagem em sala de aula. Os primeiros propunham uma transposição à prática escolar dos resultados obtidos em laboratório; já os segundos defendiam a idéia de que somente os resultados obtidos diretamente do estudo dos processos de aprendizagem em situações reais da sala de aula poderiam ser generalizados na prática educativa. Na metade do séc. XX, mais ou menos 30 anos após seu nascimento, o panorama apresentado pela psicologia da educação é complexo e um pouco contraditório. De um lado encontra-se preparada para tarefa de abordar todos os aspectos, todas as dimensões e todos os fatores presentes no processo educativo, vendose obrigada a ampliar seus conteúdos e seu foco de atenção para além das três áreas de trabalho e pesquisa (as diferenças individuais, os processos de aprendizagem e o desenvolvimento infantil), que inicialmente formaram seu núcleo de atuação; de outro lado, como conseqüência da ampliação dos conteúdos e das temáticas que estudam seus limites, perfilam-se, progressivamente, outras áreas da psicologia e outras ciências da educação, tornando-se cada vez mais difícil precisar a especificidade de umas em relação às outras. Com a finalidade de contribuir para criação de uma teoria educativa de base científica e para qualificação da educação e do ensino, a psicologia da educação alimentou-se de colocações vindas, praticamente, de todas as áreas da psicologia. O problema evidenciado neste período, mas que condicionou o futuro da psicologia da educação nas décadas posteriores, foi a debilidade epistemológica - encontrada na base da vontade de aplicação e de utilização do conhecimento psicológico - para uma melhor compreensão, explicação, planejamento e desenvolvimento dos processos educativos. A discussão não era a respeito do valor do caráter aplicativo da psicologia da educação; mas sobre ou em que consistia essa aplicação, e quais eram as condições necessárias para se alcançar o objetivo. 10 Nos anos que se seguiram, na década de 50 ocorreram uma série de fatos que modificaram substancialmente o panorama descrito anteriormente, fatos determinantes no futuro das relações entre o conhecimento psicológico e a teoria prática educativa, e logicamente no futuro da psicologia da educação. Em primeiro lugar, estabeleceu-se uma conscientização cada vez mais crítica das dificuldades implicadas na integração dos resultados das pesquisas que nutrem a psicologia da educação. Tais dificuldades têm raiz tanto na diversidade de temas e de aspectos investigados, como nas teorias diferenciadas das escolas de pensamento em psicologia, que apresentam explicações alternativas, freqüentemente afrontadas por resultados empíricos. Em segundo lugar, nos anos de 50 e 60 (do séc. XX), começaram a nascer uma série de disciplinas que também têm como finalidade estudar os fenômenos educativos, por exemplo: a educação comparada, a economia da educação, a sociologia da educação, a tecnologia educativa, e o planejamento educativo. O desenvolvimento e a aparição dessas disciplinas questionam definitivamente o protagonismo exercido pela psicologia da educação até esse momento, evidenciando as limitações da analise psicológica na compreensão global dos fenômenos educativos. A par destes fatos, uma série de acontecimentos políticos, econômicos e culturais ocorridos no final da década de 50(do séc. XX), alteram radicalmente as coordenadas da educação escolar nas sociedades desenvolvidas da Europa, com repercussões claras no desenvolvimento da psicologia da educação. Entre esses acontecimentos, podemos citar: o inicio de uma prosperidade econômica sem precedentes; o principio de um período de distensão na guerra fria, que mantinha de um lado os Estados Unidos e os países capitalistas e de outro a URSS e os países comunistas; o desenvolvimento científico e tecnológico; o impacto da doutrina igualitária em educação; a convicção, cada vez mais generalizada, de que a educação é um instrumento eficaz de mudança e progresso social; a ativação de políticas voltadas para escolarização de toda população infantil; a extensão da escolaridade obrigatória até aos 14, 15 e inclusive 16 anos; e o funcionamento de reformas educativas profundas, praticamente em todos os países avançados. 11 O contexto de bem-estar econômico e o otimismo com relação à função social da educação, nos países ocidentais, provocam um incremento nos investimentos destinados à promoção e ao suporte da pesquisa educativa e dos processos de reforma e inovação nesse campo da psicologia da educação. Por certo, a posição privilegiada que a psicologia da educação ocupa, nesse momento da história, na ordem das disciplinas dedicadas ao estudo dos fenômenos educativos, beneficiou-se da contribuição dos recursos econômicos e humanos; houve aumento considerável da participação dos psicólogos educacionais em projetos de pesquisa educativa, em processos de formação de futuros professores, em seus serviços de psicologia e de orientação escolar; e, ainda, criaram-se novas associações profissionais e centros de pesquisa em departamentos de psicologia da educação em muitas universidades. Concepções Contemporâneas da Psicologia da Educação Ainda segundo Salvador (1999), as diferentes concepções da psicologia da educação que coexistem, atualmente, expressam a importância relativa atribuída por cada uma aos componentes psicológicos no esforço de explicar e compreender os fenômenos educativos. Essas concepções oscilam de proposições claramente reducionistas, que consideram o estudo das variáveis e dos processos psicológicos como a única via capaz de proporcionar uma base científica à teoria e à prática educativa, propondo o questionamento da função e da importância dos componentes psicológicos, a uma série de proposições intermediárias: primeiro, o posicionamento de que o conhecimento psicológico é o único que permite abordar as questões educativas de uma maneira científica e racional; segundo, o postulado de que o comportamento humano responde a uma série de leis gerais, estabelecidas por pesquisa psicológica, que podem ser utilizadas para compreensão e interpretação de qualquer âmbito da atividade das pessoas; terceiro, a conseqüência do ponto de vista anterior, a assertiva de que a caracterização da psicologia da educação advém não do tipo ou natureza do conhecimento que manipula, mas do campo de aplicação desse conhecimento, nesse caso a educação; e, finalmente, uma quarta afirmação, o entendimento de que a missão da psicologia da educação é selecionar, entre os conhecimentos oferecidos pela 12 psicologia científica, num determinado momento da história, os que podem ser úteis para entender e explicar o comportamento das pessoas em situações educativas. Precisamos ressaltar que, mesmo compartilhando os mesmos princípios e propósitos, essas concepções, estão longe de constituírem uma orientação homogênea e compacta no panorama da psicologia da educação. Existem diferenças significativas em relação às dimensões ou aos aspectos do comportamento humano valorizados como úteis e relevantes à educação. Assim, de acordo com a dimensão escolhida, nos deparamos com: uma psicologia do desenvolvimento aplicada à educação; uma psicologia de aprendizagem aplicada à educação; uma psicologia social aplicada à educação; uma psicologia das diferenças individuais aplicadas à educação; ou, mesmo, uma psicologia geral aplicada à educação. O que reflete a persistência das escolas de psicologia em proporcionar explicações globais diferentes e até contrapostas ao comportamento humano. Nos últimos trinta anos, por vezes, a psicologia da educação é, erroneamente, assimilada ao mero reducionismo psicológico; e, então, surgem duras críticas, colocando em dúvida o sentido da psicologia da educação. Argumenta-se que não há sentido em se estudar os componentes psicológicos sem estudar, ao mesmo tempo, os componentes sociológicos, institucionais, políticos, econômicos, e didáticos. Entretanto, a feição moderna da psicologia da educação tem renunciado a uma boa parte dos postulados e princípios que definiam as proposições de psicologia aplicada à educação, apresentando uma série de proposições alternativas que se transcrevem como uma concepção diferente do psicologismo reducionista. Hoje, a tendência é considerar a psicologia da educação como uma disciplina-ponte entre a psicologia e a educação, com um objeto de estudo próprio, e com fins próprios, a saber, gerar um novo conhecimento sobre o seu objeto de estudo. Trabalhos dirigidos por Hunt e Sullivan, em 1974, lançaram as primeiras formulações originais da psicologia da educação como disciplina-ponte.Tomando como ponto de partida a crítica ao reducionismo psicológico, Hunt e Sullivan opinam que a psicologia somente formula prescrições de como se deve atuar na educação, sem considerar as variáveis e características especificas do ato de educar; como 13 conseqüência desse modo de orientar o trabalho educativo, freqüentemente essas prescrições não atendem à prática docente, e, por isso, são ignoradas pelos profissionais da educação, que as consideram pouco realistas, ou irrelevantes. David P. Ausubel, psicólogo americano da segunda metade do século XX, influente em psicologia da educação, argumenta, de forma contundente, contra a aplicação de princípios genéricos da psicologia à educação e a favor da psicologia da educação como uma disciplina-ponte, sustentando que a psicologia da educação é uma disciplina aplicada autônoma. Ausubel é um dos psicólogos que mais contribuiu para se estabelecer uma distinção clara do que significa definir a psicologia da educação como uma disciplina aplicada, e o que representa caracterizá-la como uma simples aplicação da psicologia aos problemas educativos: Concluiremos, então, que a psicologia educacional é, sem a menor dúvida, uma disciplina aplicada, porém não é psicologia geral aplicada aos problemas educativos, da mesma maneira que a engenharia mecânica não é física geral aplicada aos problemas de projetar máquinas, ou a medicina não é a biologia geral aplicada aos problemas da diagnose, da cura e da prevenção das doenças humanas. Nessas últimas disciplinas, as leis gerais que se originaram a partir das disciplinas-mãe não se aplicam no terreno dos problemas práticos; de fato existem alguns fundamentos separados da teoria aplicada que são tão básicos como a teoria que sustenta as disciplinas-mãe, porém, são formuladas em nível mais baixo de generalização e têm pertinência mais direta quanto à aplicabilidade a problemas em seus respectivos campos. (Salvador, 1999, p. 42). Outros autores se posicionaram favoravelmente à psicologia da educação como uma disciplina-ponte, como os franceses Mialaret, Leon e Gilly, que manifestaram propostas que coincidem com as já comentadas, de Hunt e de Ausubel. Para Mialaret, a psicologia da educação é uma disciplina diferente tanto da psicologia quanto da educação, tendo como finalidade estudar o comportamento e os processos psicológicos 14 gerados nos alunos como resultado de sua participação em atividades educativas, podendo contribuir quer para o desenvolvimento do conhecimento psicológico, quer para a melhoria da educação. Considerações Metodológicas sobre a pesquisa empírica. O objetivo geral deste estudo consiste em buscar compreender o papel da Psicologia da Educação na formação do educador que irá atuar no ensino básico, na perspectiva dos acadêmicos do 4º ano do curso de Pedagogia da UEM, na intenção de dar vez e voz ao aluno nesse processo. Mais especificamente, nesta pesquisa empírica, pretendemos tratar da formação do futuro educador, que atuará no ensino básico, com o objetivo de conhecer suas concepções acerca da Psicologia da Educação, refletindo sobre os conhecimentos que essa disciplina oferece aos cursos que cuidam da formação do professor. Para realizar esta etapa da pesquisa, nos valemos do procedimento metodológico de pesquisa qualiquantitativa de caráter teórico-prática, com a aplicação de um questionário (semi-estruturado) com questões abertas e fechadas. Onde analisamos o perfil do aluno, quanto a idade e gênero, e temáticas pertinentes a disciplina de Psicologia da Educação no curso de Pedagogia. As temáticas analisadas foram: a)- o desenvolvimento da disciplina de Psicologia da Educação durante o período do curso; b)- as abordagens teóricas estudas e a formação profissional; c)- a adequação da bibliografia aos conteúdos propostos; d)- o relacionamento professor/aluno; e)-a eficácia (ou não) da metodologia utilizada nas aulas; f)- sugestões para enriquecimento da metodologia; g)- dificuldades do ensino da Psicologia da Educação. Síntese dos dados pesquisados No universo de 120 entrevistados, 96% eram do sexo feminino, 57% de solteiros, 60% na faixa etária de 21 a 25 anos. Em relação às questões pedagógicas 77% dos entrevistados entenderam que a bibliografia indicada estava adequada aos conteúdos programáticos propostos; 32% apontaram problemas em relação à metodologia de trabalho; 37% dos entrevistados solicitaram maior vivência (oficinas) 15 da prática didático-pedagógica; em relação às dificuldades encontradas: 47% indicaram a necessidade de aumento da carga horária em função da importância do conteúdo. Na perspectiva dos acadêmicos-formandos do curso de Pedagogia da UEM, a disciplina de Psicologia da Educação no curso de Pedagogia da UEM, tem a finalidade de levar esse novo educador à compreender o processo de aprendizagem no contexto escolar. CONCLUSÃO A mudança da concepção de psicologia aplicada à educação, para a concepção de psicologia da educação como disciplina-ponte, leva-nos a reorganizar o próprio conceito de aplicação do conhecimento psicológico. Não se trata somente da aplicação e da utilização dos conhecimentos que uma disciplina básica proporciona para a solução dos problemas genéricos que se apresentam em toda atividade humana. Trata-se, segundo, Mialaret do estudo e da análise - com a utilização dos instrumentos conceituais e metodológicos próprios da psicologia - no contexto específico da atividade humana que é a educação. Desse modo, estrutura-se uma disciplina aplicada diferenciada, que tem como fim gerar conhecimento novo, direcionado para aplicação. Atente-se, portanto, que o conceito de aplicação, nesse caso, não é mais o mesmo da concepção tradicional de psicologia aplicada à educação. Nessa perspectiva a psicologia da educação passa a ser uma disciplina plena, constituindo-se das mesmas preocupações e explicações que servem à pesquisa psicológica, em geral existirá sempre uma inter-relação da psicologia da educação com as leis, princípios, conceitos, explicações, métodos, e resultados originados da pesquisa psicológica básica. Entretanto, por sua vez, a psicologia da educação, considerada em sentido específico e restrito, contribuirá no enriquecimento da pesquisa com informações e dados próprios dos fenômenos educativos, mais precisamente com suas interpretações sobre o comportamento humano nas situações educativas específicas. De acordo com Salvador (1990), para Pérez Gómes, (1978), é necessário separar as 16 disciplinas que têm a finalidade especifica de estudar os processos educativos, das que, de forma genérica, contribuem para uma melhor compreensão e explicação dos fenômenos educativos. Interagindo, todas concorrem para um tríplice objetivo: primeiro, contribuir na elaboração de teoria(s) que permita(m) uma melhor compreensão e explicação dos processos educacionais; segundo, ajudar na elaboração de procedimentos, estratégias e modelos de planejamento e intervenção educativos; e finalmente, facilitar a instituição de práticas educativas eficazes á formação dos educandos e à melhor capacitação dos educadores. Referências GOODSON, I. (1990) – Teoria e Educação, 2– Tornando-se uma matéria acadêmica: padrões de explicação e evolução, p.231-252. CHERVEL, A.(1990) – Teoria e Educação, 2– História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa, p.177-229. SALVADOR, C. C. (org.) (1999) - Psicologia da Educação; trad. Cristina Maria de Oliveira. – Porto Alegre: Artes Médicas Sul. p. 17-48.