CONTRIBUIÇÕES DAS TEORIAS PSICOGENÉTICAS À CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE INFÂNCIA: IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS CONTRIBUTION OF THE PSYCHOGENETIC THEORIES TO THE CHILDHOOD BUILING PROCESS: PEDAGOGICAL IMPLICATIONS Rita Melissa Lepre* Resumo O artigo tem como objetivo principal apresentar sumariamente as teorias psicogenéticas de Jean Piaget (18961980), Lev S. Vygotsky (1896-1934) e Henri Wallon (1879-1962) focando suas influências na construção da concepção atual de infância e de criança. Por meio de um resgate histórico busca situar estas teorias psicogenéticas no desenvolvimento da Psicologia enquanto ciência independente. Pretende, ainda, refletir sobre as implicações de tais concepções ao ato pedagógico voltado à infância. Por fim, apresenta e discute a posição de Neil Postman (1999) em relação ao desaparecimento da infância e suas repercussões na prática docente. Palavras-chave: ação docente; criança; infância; teorias psicogenéticas. Abstract This paper aims to present the psychogenetic theories of Jean Piaget (1896-1980), Lev S. Vygotsky and Henri Wallon (1879-1962) focusing on their influence on the current childhood and children’s construction conception. By a historical rescue, it tries to find the following psychogenetic into the Psychology development as an independent science. It still intends to reflect on the implication of such conceptions in the pedagogical process focused on the childhood. Finally, it still presents and discusses the position of Neil Postman (1999) considering the disappearance of the childhood and its reflection on the teaching practice. Key words: teaching practice; children; childhood; psychogenetic theories. CONTRIBUIÇÕES DAS TEORIAS PSICOGENÉTICAS À CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE INFÂNCIA: IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: trouxeste a chave? (DRUMMOND) A Psicologia surge como ciência no século XX. Uma visão abreviada de seu nascimento nos remete ao primeiro laboratório de psicofisiologia criado por Wilhem Wundt (1832-1920), na Universidade de Leipizig (Alemanha). No entanto, se essa foi a condição científica para que a Psicologia recebesse * o status de ciência, tal feito não explicita questões muito mais amplas e decisivas à emergência dessa nova área do conhecimento. Segundo Figueiredo (1991) várias foram as précondições sócio-culturais para o aparecimento da Psicologia como ciência no século XX. A primeira condição foi a construção de uma experiência da subjetividade privatizada na época moderna. Com o colapso da tradição medieval e feudal, seus valores normas e costumes coletivos passaram a ser questionados e o homem foi obrigado a recorrer à sua consciência individual e à reflexão pessoal para tomar decisões. Surge, dessa forma, o início de uma construção social, política e científica do ser humano enquanto indivíduo, possuidor de um psiquismo único, original e autônomo. A segunda condição foi o desenvolvimento do sistema mercantil. O modo de produção capitalista Psicóloga, Mestre e Doutora em Educação/UNESP. Professora Assistente do Departamento de Educação - Faculdade de Ciências – Unesp (Bauru). Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. promoveu intensas modificações nas relações sociais e econômicas. Nas sociedades tradicionais pré-capitalistas a produção era sempre diretamente social, pautada em vínculos estreitos e no comunitarismo. Segundo Figueiredo (1991), Além dos vínculos com os meios de produção e da interdependência comunitária, havia relações entre senhores e servos ou escravos que, se por um lado, continham um elemento de exploração de uns pelos outros, por outro lado estabeleciam obrigações de proteção, defesa e apoio dos fortes em relação aos fracos (p.24-25). Com a possibilidade do trabalho “livre”, desapareceram as relações feudais anteriores, marcadas pela solidariedade grupal e pelo sistema de exploração/proteção. A liberdade dada ao homem para que esse pudesse vender sua força de trabalho deixou, no entanto, o sujeito entregue à própria sorte. A terceira condição foi a crise dessa subjetividade privatizada. Quando o homem descobre que não é tão único e original e nem tão livre quanto acreditava, ele entra em crise. Essa crise representa o cenário ideal para o nascimento de uma Psicologia científica que busque compreender e explicar a experiência imediata e consciente. Inicialmente, um dos principais objetivos da Psicologia como ciência foram os projetos voltados para a previsão e controle científico do comportamento individual. Com uma concepção positivista, a recém ciência psicológica independente envolve-se com a “ortopedia científica”. Em todas estas questões se expressa o reconhecimento de que existe um sujeito individual e a esperança de que é possível padronizá-lo segundo uma disciplina, normatizá-lo, colocá-lo, enfim, a serviço da ordem social. Surge, deste modo, a demanda por uma psicologia aplicada, principalmente nos campos da educação e do trabalho (FIGUEIREDO, 1991, p. 31). Essa primeira Psicologia, pautada na perspectiva liberal construída no decorrer do desenvolvimento do capitalismo, caracterizou-se por pensar o homem a partir da idéia de natureza humana e de igualdade natural. Dessa forma, os 310 fenômenos psicológicos eram pensados por meio de idéias naturalizadoras, sem grandes considerações ao meio social e cultural. Por ser natural, próprio do ser humano, o fenômeno psicológico era visto como inato. “Algo que lá está como possibilidade quando nascemos; algo que deverá ser fertilizado por afeto, estimulações adequadas e boas condições de vida, mas que lá está pronto para desabrochar” (BOCK, 2002, p. 22). Assim como o fenômeno psicológico, questões referentes ao desenvolvimento e à aprendizagem humanos foram pensados, inicialmente, pela Psicologia, por meio dessa concepção inatista, por conseqüência, naturalizadora. Aliada aos interesses das elites, essa visão permitia à Psicologia, como ciência e profissão, determinar padrões de normalidade e saúde, transformando em anormal o diferente, o “fora do padrão dominante” (BOCK, 2002). Para a Educação, a Psicologia pôde oferecer inicialmente conhecimentos sobre a natureza humana e os padrões evolutivos normais de desenvolvimento e aprendizagem, contribuindo para o planejamento e execução de programas de recuperação e assistência àqueles que se distanciavam dessa pretensa “normalidade”. Focada no indivíduo e no desenvolvimento natural de suas capacidades, a Psicologia aplicada à Educação buscava normatizar comportamentos e ações, culpabilizando aqueles que, por algum motivo, não se desenvolviam ou aprendiam dentro do esperado. Bock (2002) afirma que o positivismo contribuiu para a construção de uma Psicologia que não se envolvia com as tramas sociais, desconsiderando aspectos culturais e históricos. Se inicialmente a Psicologia precisou aderir aos princípios positivistas de objetividade científica para se firmar como ciência, com o desenvolvimento da sua história novas formas de se pensar o fenômeno psicológico, o desenvolvimento e a aprendizagem, entre outras questões, foram sendo possíveis. Entre os diversos projetos da psicologia científica como ciência, podemos citar as primeiras escolas psicológicas representadas pelo pioneirismo de Wundt (1832-1920), pelo funcionalismo de William James (1842-1910), pelo estruturalismo de Edward Titchner (1867-1927) e pelo associacionismo de Edward Thorndike (18741949). Durante o século XX outras importantes teorias foram desenvolvidas pela psicologia científica como o Behaviorismo (Skinner), a Gestalt (Koffka e Kohler), a Psicanálise (Freud) e as teorias Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 311 LEPRE psicogenéticas de Jean Piaget (1896-1980), Lev Semonovich Vygotsky (1896-1934) e Henri Wallon (1879-1962). Neste artigo focaremos as contribuições das teorias psicogenéticas à construção da concepção atual de infância e suas implicações educacionais e pedagógicas. As teorias de Piaget, Vygotsky e Wallon apresentam afinidades e divergências sobre determinados temas, mas comungam, ao nosso ver, de uma visão interacionista de desenvolvimento humano e aprendizagem. O interacionismo entende que o desenvolvimento e a aprendizagem humanos acontecem por meio da interação entre o indivíduo (questões internas) e o meio (dados externos) onde está inserido. Dessa forma, o ser humano é visto como um ser ativo que ao interagir com o mundo se desenvolve e aprende. A cultura e o momento histórico nos quais o sujeito está situado também influenciam o desenvolvimento das possibilidades cognoscentes. Essa concepção se opõe às visões inatista (racionalista) e ambientalista (empirista) no que se refere ao desenvolvimento e à aprendizagem humana. A visão inatista, representada pelo racionalismo, considera a razão e o pensamento (questões internas) como as únicas fontes do conhecimento por serem inatos. Baseia-se na hereditariedade, nos dons, na transmissão e acredita que a capacidade de conhecer é dada a priori, nascendo com o indivíduo e limitando suas possibilidades. Já a visão ambientalista, representada pelo empirismo, considera que os objetos (dados externos) e as experiências sensoriais são as únicas fontes do conhecimento. Baseia-se nos estímulos externos que imprimem no homem, considerado uma folha em branco, determinadas aprendizagens controladas. Em ambas as concepções o homem é visto como um ser passivo, seja pelo pré-formismo espontaneísta, seja pelo associacionismo mecanicista. O interacionismo, proposto inicialmente por Kant no século XVIII, busca acabar com a exacerbação do sujeito (racionalismo) ou do objeto (empirismo), propondo uma relação entre ambos. As teorias psicogenéticas enfocam essa relação homem ativo/mundo ativo nas suas pesquisas acerca da construção do conhecimento. Por meio do pressuposto interacionista, a psicogenética pode ser definida como o estudo da origem e do desenvolvimento da mente e do conhecimento. Portanto, as teorias psicogenéticas coincidem em seu objeto de estudo: definir a maneira como se origina e se desenvolve o conhecimento no ser humano. Como vimos, os estudos de Jean Piaget (1896-1980), L.S. Vygotsky (1896-1934) e Henri Wallon (1879-1962) situam-se nesse grupo de teorias. Apesar de terem partido de questões diferentes, a partir de contextos diversos, os três pesquisadores compartilhavam de algumas preocupações: como se dá o conhecimento humano? Qual a sua origem? Como se desenvolve? Quais os seus determinantes? O que é importante no percurso do seu desenvolvimento? É importante lembrar que Piaget, Vygotsky e Wallon realizaram suas pesquisas no campo da Psicologia, mas que seus nomes foram difundidos, sobretudo, nos meios educacionais, haja vista a colaboração de seus estudos para a Educação. Discutir as contribuições dessas teorias foi o objetivo do livro Piaget, Vygotsky e Wallon, no qual Yves de LaTaille, Marta Kohl de Oliveira e Heloysa Dantas, professores da Universidade de São Paulo (USP), discutiram os fatores biológicos e sociais do desenvolvimento psicológico, assim como as questões da cognição e da afetividade nesses três autores. Nessa obra os professores pesquisadores explanaram os conceitos das teorias e discutiram suas possibilidades e limites num exercício de reflexão e respeito àquele que delas buscam se beneficiar seja ele um professor, um psicólogo ou outro profissional que se interesse pelo desenvolvimento humano. AS VICISSITUDES NA CONCEPÇÃO DE INFÂNCIA E CRIANÇA “A infância é um artefato social e histórico, e não uma simples entidade biológica.” (STEINBERG e KINCHELOE, 2001, p. 11). Essa afirmação nos possibilita refletir sobre a infância como uma fase da vida construída socialmente, assim como o é a adolescência. Acreditar que a infância seja um período natural do crescimento é o mesmo que tentar naturalizar um fenômeno psicológico, sem considerar influências sociais, culturais e históricas. “Na realidade, o que nos últimos anos do século XX foi rotulado como “uma infância tradicionalmente ocidental” tem apenas cerca de 150 anos.” (STEINBERG e KINCHELOE, 2001, p. 11). Segundo Áries (1981), até meados do século XI não havia lugar para a infância na sociedade ocidental. É comum notar, nas pinturas da época, que as crianças eram retratadas como adultos em miniatura. Não há nada nesses quadros que represente bem as crianças, a não ser o seu tamanho Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. diminuto. É somente por volta do século XIII que os sentimentos para com as crianças começam a surgir e a arte mostra alguns tipos de crianças um pouco mais próximas da realidade. No entanto, esses sentimentos eram muito relativos e expressos por certa afeição, mas não por uma consciência das particularidades infantis. Na sociedade medieval o sentimento de infância era inexistente, o que não significa dizer que as crianças eram negligenciadas, abandonadas ou desprezadas. A afeição pelas crianças estava presente, o que não existia era a consciência das particularidades infantis, ou seja, a idéia de que a criança é qualitativamente diferente do adulto. Assim, tão logo a criança não precisasse mais dos cuidados básicos de sua mãe para garantir-lhe a sobrevivência “ela ingressava na sociedade dos adultos e não se distinguia mais destes.” (ARIÉS, 1981, p.156). Durante a Idade Média, as crianças participavam efetivamente do mundo adulto, ganhando conhecimentos profissionais e experiência de vida. “O conceito de criança como uma classificação específica de seres humanos que requerem um tratamento especial, diferente daquele aplicado ao adulto, ainda não havia desenvolvido na Idade Média” (STEINBERG e KINCHELOE, 2001, p. 11). A partir do século XIV, contudo, surge uma nova concepção, a qual acreditava existir uma personalidade própria nas crianças. Essa tendência representou, com certeza, um grande avanço no entendimento da infância, refletido nas produções artísticas dos séculos XVI e XVII, nas quais as crianças passam a trajar vestimentas que as diferenciavam dos adultos. Surge, então, o primeiro sentimento da infância, caracterizado pela paparicação: as crianças eram vistas como seres graciosos e que podiam causar prazeres com seus atos ingênuos e doces. O sentimento de paparicação começou no século XVII, no entanto, a receber muitas críticas. Educadores e moralistas argumentavam que esse sentimento gerava crianças mal educadas, sem limites e com pouca preparação para viver em sociedade. Essas críticas levaram a construção de um novo sentimento em relação à criança: o de exasperação. Ele se caracterizava pelo interesse psicológico pela criança e por sua formação moral, condenando pais que tratavam seus filhos como “bonequinhos”, feitos para distração e brincadeiras. No entanto, se o primeiro surgiu no meio familiar, o segundo foi derivado das idéias de educadores e moralistas do século XVII, 312 preocupados com a disciplina e a formação moral das crianças. Kant é um deles. Em Sobre a pedagogia (1996), ele afirma que a educação é o que retira o homem de sua condição de selvageria. “O homem tem necessidades de cuidados e de formação. A formação compreende a disciplina e a instrução.” (KANT, 1996, p. 14). Segundo esse autor, a disciplina é necessária, pois transforma a animalidade em humanidade. Uma das funções da educação, nesse caso, é disciplinar: restringir no homem suas vontades individuais e impulsos egoísticos. Essa educação deveria começar em casa e continuar na escola. Esse novo sentimento mostrava o crescente interesse pelas crianças, reconhecendo nelas particularidades outrora negligenciadas, e preocupando-se com sua formação. Essa nova concepção é também interiorizada pelas famílias que passam a se preocupar com a educação de seus filhos. Resgatando as idéias que expusemos até aqui, podemos dizer que da ausência de um sentimento ligado à infância, surge o de paparicação que deriva para o de formação moral. A figura do preceptor é substituída pela do professor. Surge, então, a escola como instituição, preocupada com a formação intelectual e moral das crianças. Teorias como as de Montaigne, Locke e Rousseau surgem a partir dessa nova concepção de infância, cada uma trazendo suas particularidades, é claro. Explica Ghiraldelli (1996), [...] o século XVIII, em que um novo sentimento dos adultos em relação às crianças já caracteriza a presença social da noção de infância, o que proporciona o advento de uma pedagogia que advoga uma disciplina autônoma, e não mais heterônoma. Se Locke trabalha com o objetivo de estabelecer as condições da liberdade dos homens, Montaigne, antes dele, quer que os adultos façam da criança um homem – o que já significa considerar que ela não é um “adulto em miniatura” – e Rousseau, depois dele, quer que os adultos deixem a criança ser criança, de modo que a infância aconteça, pois ela é o que há de melhor nos homens (GHIRALDELLI, 1996, p. 15). Enfim, a infância estava diferenciada. As crianças passaram a ser vistas como seres peculiares, portadoras de uma personalidade própria Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 313 LEPRE e de um pensamento e inteligência qualitativamente diferente dos adultos. No entanto, é com o advento das teorias psicogenéticas, no século XX, que essas idéias ganham força. A partir de Piaget, Vygotsky e Wallon o olhar para a criança não foi mais o mesmo. Essa passou a ser vista como qualitativamente diferente do adulto, com características próprias nos campos da cognição, afetividade e moralidade. Enfim, um ser integral, ativo e interativo. Vejamos como cada um desses autores contribuiu para a construção dessa concepção de criança e, conseqüentemente, de infância e quais as implicações pedagógicas de suas teorias psicogenéticas. A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA DE JEAN PIAGET Jean Piaget (1896-1980), epistemólogo suíço, descobre por meio de suas investigações que a criança tem uma lógica própria, diferente da do adulto, e que há um caminho psicogenético a ser seguido na sua evolução. É Piaget, ainda, que inicialmente divulga o chamado princípio da atividade2, concebendo a criança como um ser ativo, construtora do seu próprio saber, onde a ação é regida pela necessidade e pelo interesse. Como ressalta Vasconcelos (1996), Piaget difundiu a idéia de que o processo que leva a criança a conhecer o mundo é um processo de criação ativa, em que toda a aprendizagem se dá a partir da ação do sujeito sobre os objetos. Um sujeito intelectualmente ativo, que constrói seu conhecimento sobre a ação, não é um sujeito que tem apenas uma atividade observável, mas um sujeito que compara, exclui, categoriza, coopera, formula hipóteses e as reorganiza, também em ação interiorizada (VASCONCELOS, 1996, p. 21). A teoria de Piaget é a matriz do Construtivismo, linha teórica proposta pelo Ministério da Educação 2 O russo Alexei Nikolaievich Leontiev (1904-1979), um dos colaboradores mais próximos de Vygotsky, também desenvolveu uma teoria da atividade. Numa visão sóciohistórica, Leontiev define as atividades humanas como formas de relação do homem com o mundo, dirigidas por motivos e por fins a serem alcançados. A estrutura da atividade humana é analisada em três níveis de funcionamento: a atividade propriamente dita, as ações e as operações. e Cultura (MEC) para o planejamento, execução e avaliação das atividades pedagógicas nas escolas brasileiras. No entanto, é importante ressaltarmos que Piaget não teve uma preocupação eminentemente pedagógica e sim epistemológica, ou seja, esse autor teve como centro de suas investigações o sujeito epistêmico. Dessa forma, não propôs um método de ensino ou elaborou materiais pedagógicos, mas ofereceu à Educação esclarecimentos sobre o modo peculiar de raciocinar que as crianças apresentam em diferentes estádios da vida. “Normalmente, Piaget pouco falava em “construtivismo”, prefereindo a expressão “autoregulação” que, segundo ele, é o fenômeno que explica a novidade (construção de novas estruturas e de novos esquemas).” (LIMA, 1997, p. 104). No entanto, embora o termo construtivismo não seja freqüente nos textos piagetianos, esse autor chega a declarar-se como adepto desse tipo de explicação epistemológica que ultrapassa o apriorismo e o empirismo. Segundo esse autor alguns fatores são fundamentais para o desenvolvimento das estruturas cognitivas, são eles: a maturação do Sistema Nervoso Central; a interação com objetos físicos (abstração empírica e abstração reflexiva); a interação social e a equilibração. Este último considerado o mais importante e central na obra piagetiana. A inteligência, para Piaget, que tem sua formação inicial em Biologia, é um mecanismo de busca de equilíbrio com o meio. Para tanto, o ser humano dispõe de mecanismos cognitivos para entender as situações de aprendizagem e construir o conhecimento. Esses mecanismos recebem o nome de assimilação e acomodação e são os responsáveis pela equilibração cognitiva. Ser inteligente é, com efeito, ser capaz de se construir esquemas de pensamento, com os quais poder-se-á chegar autonomamente a conhecimentos, a respostas certas, cujo valor cognitivo depende fundamentalmente dos esquemas que foram capazes de gerálos, por conta de uma subjetividade engajada na sua trajetória, que é uma aventura plena de desafios e de surpresas, a qual exige muita criatividade e arrojo (GROSSI, 1997, p.130). Piaget definiu quatro estágios do desenvolvimento cognitivo: o sensório-motor (0-2 anos), o pré-operatório (2-7 anos), o operatórioconcreto (7-12 anos) e o operatório-formal (12 anos Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. em diante). Em cada estágio define a maneira que a criança raciocina e que busca resolver os desafios propostos pelo meio. Diferencia o pensamento infantil do pensamento adulto, atribuindo peculiaridades, não pensadas anteriormente, ao raciocínio das crianças. A teoria de Piaget encontra-se no grupo das teorias cognitivo-evolucionistas, tendo como base os seguintes pressupostos: a) o desenvolvimento inclui transformações básicas das estruturas cognitivas, que não podem ser explicadas por meio dos parâmetros da aprendizagem associacionista (reforço, repetição, punição, etc.), mas por parâmetros de totalidades organizativas ou sistemas de relações internas; b) o desenvolvimento das estruturas cognitivas resulta de processos de interação entre o organismo e o meio em que a pessoa está inserida (interacionismo); c) as estruturas cognitivas são sempre estruturas de ação sobre objetos que evoluem de esquemas sensório-motores para esquemas simbólicos; d) o desenvolvimento das estruturas cognitivas leva a formas superiores de equilíbrio, o que otimiza a interação e a reciprocidade entre a ação do organismo sobre o objeto (ou situações) e a ação do objeto percebido sobre o organismo. questionou os pressupostos da psicologia enquanto ciência natural (positivista) que entendia o fenômeno psicológico como a-histórico. Para esse autor o fenômeno psicológico não pertence à natureza humana e nem é pré-existente ao homem. “O fenômeno psicológico deve ser entendido como construção no nível individual do mundo simbólico que é social.” (BOCK, 2002, p. 22). Dessa forma, o fenômeno psicológico reflete a condição social, econômica e cultural em que vivem os homens. Os pilares básicos do pensamento Vygotskyano4 são os seguintes: - as funções psicológicas têm um suporte biológico, pois são produtos da atividade cerebral; - o funcionamento psicológico fundamenta-se nas relações sociais entre os indivíduos e o mundo exterior, que se desenvolvem num processo histórico e cultural, - a relação homem-mundo não é uma relação direta, mas mediada por sistemas simbólicos, sendo a linguagem o mais importante. Segundo Oliveira (1992), Falar da perspectiva de Vygotsky é falar da dimensão social do desenvolvimento humano. Interessado fundamentalmente no que chamamos de funções psicológicas superiores, e tendo produzido seus trabalhos dentro das concepções materialistas predominantes na União Soviética pós-revolução de 1917, Vygotsky tem como um de seus pressupostos básicos a idéia de que o ser humano constitui-se enquanto tal na sua relação com o outro social (p. 24). Em resumo, o desenvolvimento humano, para Piaget, consiste em se alcançar o máximo de operacionalidade em suas atividades motoras, mentais, verbais e sociais e a aprendizagem está intimamente relacionada a tal operacionalidade. A PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA DE VYGOTSKY O russo Lev Semenovich Vygotsky (18961934) teve sua formação inicial em Direito. No entanto, aprofundou seus estudos em história, filosofia e psicologia e seu interesse em compreender os problemas neurológicos como meios para desvendar o funcionamento do aparelho psíquico, o levou a formar-se, ainda, em Medicina. Vygotsky, em pareceria com Luria e Leontiev3, foi o fundador da Psicologia Sócio-histórica, que 3 Vygotsky, Luria e Leontiev faziam parte de um grupo de jovens intelectuais da Rússia pós-revolução que se autointitulava Troika. “Baseados na crença da emergência de uma nova sociedade, seu objetivo mais amplo era a busca do “novo” (...) Mais especificamente, busacavam a construção de uma “nova psicologia”. (OLIVEIRA, 1993, p. 22) 314 O conceito de mediação é central no pensamento vygotskyano. A linguagem humana é considerada o sistema simbólico (formada por signos) fundamental na mediação entre o sujeito e o objeto de conhecimento. Outro grupo de mediadores, citado por Vygotsky, são os instrumentos, que são elementos externos ao sujeito e visam mudanças na natureza. A relação entre pensamento e linguagem também ocupa lugar de destaque nos estudos desse autor. Para Vygotsky existe uma fase pré-linguística do pensamento (inteligência prática) e uma fase préintelectual da linguagem (linguagem ainda não tem a função de signo) antes do pensamento e da 4 Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. Optamos por utilizar o termo pensamento vygotskyano ao invés de teoria vygotskyana pois “sua produção escrita não chega a constituir um sistema explicativo completo, articulado, do qual pudéssemos extrais uma “teoria vygotskyana” bem estruturada. (OLIVEIRA, 1993, p. 21) 315 LEPRE linguagem se associarem. Por volta dos dois anos de idade, o percurso do pensamento encontra-se com o da linguagem construindo-se, por meio das interações sociais, o pensamento verbal e a linguagem racional. Nesse momento, Vygotsky afirma que ocorre a transformação do ser biológico no ser sócio-histórico. No que diz respeito às relações entre aprendizado e desenvolvimento, podemos afirmar que o pensamento vygotskyano é o que oferece mais dados e possibilidades para uma intervenção pedagógica. O conceito de zona de desenvolvimento proximal oferece à pedagogia subsídios para pensar o papel do professor e de colegas mais experientes como mediadores no desenvolvimento das crianças. A zona de desenvolvimento proximal (ZDP) é formada pela distância entre o nível de desenvolvimento real, definido por aquilo que o sujeito já consegue fazer sem a ajuda de ninguém, e o nível de desenvolvimento potencial, definido pela capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de um membro mais experiente da cultura. Ao intervir na ZDP, o professor auxilia o aluno, por meio de novas aprendizagens, a trazer aquilo que estava no nível potencial para o nível real. A implicação dessa concepção de Vygotsky para o ensino escolar é imediata. Se o aprendizado impulsiona o desenvolvimento, então a escola tem um papel essencial na construção do ser psicológico adulto dos indivíduos que vivem em sociedades escolarizadas (OLIVEIRA, 1993, p. 61). Dessa forma, o desenvolvimento na perspectiva sócio-histórica é entendido como algo que se torna possível porque “o homem está imerso em uma sociedade na qual atividades instrumentais e relações sociais direcionam o desenvolvimento humano” (BOCK, 2002, p. 30). A cultura torna-se parte da natureza humana e o homem se desenvolve à sua própria imagem e semelhança. No que se refere à conceituação de infância, Vygotsky afirma que é um período culturalmente construído e que a construção de conceitos científicos pela criança, depende de um trabalho intencional do professor e/ou de outros membros mais maduros da cultura na Zona de Desenvolvimento Proximal. A PSICOGENÉTICA DE HENRI WALLON O francês Henri Wallon (1879-1962) tem a sua psicogenética marcada pela filosofia e pela medicina, daí os grandes questionamentos filosóficos acerca da psicologia na corrente do pensamento ocidental e a preocupação constante em reafirmar a base orgânica das funções psíquicas. Esse autor buscou elaborar uma teoria do desenvolvimento cognitivo que estivesse centrada na psicogênese da pessoa completa. Ao definir a inteligência, Wallon a concebe como genética e organicamente social, ou seja, o ser humano tem a sua estrutura orgânica intimamente ligada aos fatores sociais e culturais para se atualizar. Nas crianças, no entanto, o pensamento está inicialmente submetido às questões fisiológicas. “Os limites da criança são de origem fisiológica, enquanto que, em cada época, os do adulto dependem das condições históricas e culturais” (WALLON, 1989, p. XI). Buscando compreender o psiquismo humano, Wallon volta sua atenção para a criança, pois através dela é possível ter acesso à gênese dos processos psíquicos. De uma perspectiva abrangente e global, investiga a criança nos vários campos de sua atividade e nos vários momentos de sua evolução psíquica. Enfoca o desenvolvimento em seus domínios afetivo, cognitivo e motor, procurando mostrar quais são, nas diferentes etapas, os vínculos entre cada campo e suas implicações com o todo representado pela personalidade (Galvão, 1995, p. 11). Movimento, emoção, inteligência e personalidade foram os grandes temas pesquisados por Wallon. “Mas o grande eixo é a questão da motricidade; os outros surgem porque Wallon não consegue dissocia-lo do conjunto do funcionamento da pessoa” (DANTAS, 1992, p. 37). Segundo Wallon, o desenvolvimento da inteligência vai do ato motor ao ato mental, por meio de processos de internalização ativa da criança, que é concebida como um ser inicialmente fisiológico que com as interferências do social e da cultura passará a ter seu desenvolvimento biológico e psíquico intimamente ligado à interação com o meio. “Construindo-se mutuamente, sujeito e objeto, afetividade e inteligência, alternam-se na preponderância do consumo da energia psicogenética” (DANTAS, 1992, p. 42). A partir dessa constatação, Wallon define fases da inteligência nas quais há predominância ora de Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. fatores afetivos/emocionais, ora de fatores cognitivos. O desenvolvimento infantil é descontínuo e marcado por contradições e conflitos, gerados pela maturação fisiológica e pelas condições ambientais, o que gera alterações qualitativas no comportamento da criança. Um dos pontos em que as psicogenéticas de Wallon e de Piaget se confrontam é justamente esse: o modo como ocorre o processo de desenvolvimento. Para Piaget, que pretendia a gênese da inteligência, o desenvolvimento é um processo contínuo, sem retrocessos, em que estruturas anteriores servem de base para construções posteriores. Para Wallon, que pretendia a gênese da pessoa completa, o desenvolvimento é um processo descontínuo, não linear, e a passagem de um estágio para o outro é marcada por crises que afetam a conduta da criança. Essas crises, ora têm predominância de fatores afetivos, ora de fatores cognitivos. Wallon propõe cinco estágios no desenvolvimento do ser humano: O impulsivo-emocional (1o. ano), com predominância dos aspectos afetivos, em que o bebê apresentará sua primeiras reações à pessoas, às quais são consideradas mediadoras da sua relação com o mundo físico. É um estágio de construção do sujeito, onde o trabalho cognitivo está latente e indiferenciado da atividade afetiva. Conflito de natureza endógena. o • O sensório-motor e projetivo (até por volta do 3 . ano), em que surge a inteligência prática e que a criança poderá dedicar-se à construção da realidade. Por meio da aquisição da marcha, a criança ganha maior autonomia para explorar objetos físicos e espaços. Também nesse estágio ocorre o desenvolvimento da linguagem, possibilitado pela construção da função simbólica que, inicialmente, projeta-se em atos, por isso a denominação de projetiva. Predominância funcional cognitiva. Conflito de natureza exógena. • O personalismo (dos 3 aos 6 anos), que se refere à formação da personalidade. Neste estágio desenvolve-se a consciência de si mesmo, mediante as interações sociais com os outros. Exploração de si mesmo. Início do emprego do pronome Eu. Predominância afetiva. Conflito de natureza endógena. • O categorial (dos 6 aos 11 anos), no qual a diferenciação da personalidade, conquistada no estágio anterior, possibilita grandes progressos intelectuais. Cresce o interesse pelo conhecimento. Construção das capacidades de seriação, classificação e categorização. Predominância das relações cognitivas. Os sentimentos são elaborados no plano mental. Conflito de natureza exógena. • 316 O da puberdade e adolescência (a partir dos 11 anos), que é um estágio fecundo em conflitos. Retomada do conflito eu-outro, próprio do personalismo, agora desencadeado pela crise pubertária. Exploração de si mesmo com uma identidade autônoma, mediante atividades de confronto, auto-afirmação e questionamentos. Predominância afetiva. Conflito de natureza endógena. • Apesar da proposição de estágios de desenvolvimento, Wallon afirma que há extrema dependência e estreita relação entre eles e que a criança é um ser integral. Para esse autor, estudar a criança, além de trazer compreensões sobre o psiquismo humano, contribui de forma significativa para a Educação. Ao contrário de Piaget, a preocupação pedagógica é presença forte na psicologia de Wallon. O DESAPARECIMENTO DA INFÂNCIA? IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS As teorias psicogenéticas de Piaget, Vygotsky e Wallon são interacionistas. Isso quer dizer que consideram a ação do meio e suas peculiaridades no desenvolvimento e na aprendizagem humana, pressupondo trocas ativas entre o organismo e o ambiente. Portanto, pensar o desenvolvimento e a aprendizagem humana nesse início de século XXI, sob a ótica desses três autores, solicita levarmos em conta as evoluções (ou involuções?) culturais e socias presentes na contemporaneidade. Como vimos anteriormente, a infância é um constructo social que recebeu diferentes sentidos ao longo da história social dos seres humanos. “Assim, a infância é uma criação da sociedade sujeita a mudar sempre que surgem transformações sociais mais amplas.” (STEINBERG e KINCHELOE, 2001, p. 12). Neil Postman (1999) afirma em seu livro O desaparecimento da infância que o conceito de infância como uma fase de construções peculiares, em que a criança é vista como um ser qualitativamente diferente do adulto, está em fase de extinção. Segundo o autor, o avanço das novas tecnologias de comunicação vem redefinindo as relações entre adultos e crianças ao longo da história. A grande massa de informações disponíveis eletronicamente para adultos e crianças, indefinidamente, seria a responsável, segundo esse autor, pela destruição das fronteiras que demarcam essas duas fases da vida. As evidências podem ser notadas pela homogeneização de hábitos infantis e adultos no Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. 317 LEPRE que se refere às vestimentas, linguagem, alimentação, profissionalização e, principalmente, o acesso a informações que antes eram restritas aos adultos. As conseqüências de tal indiferenciação apontam para uma erotização precoce e até para o aumento de crimes cometidos por crianças. A televisão, para o autor, é um dos principais mecanismos que vêm diluindo a fronteira entre o que é ser adulto e o que é ser criança. O acesso à informação televisiva é simples, pois só requer algumas aptidões como ouvir e enxergar e o entendimento da fala, que é adquirido pelas crianças já no primeiro ano de vida. E o que poderíamos pensar sobre a internet? A rede mundial de computadores trocando informações entre internautas de seis, sete anos? O acesso também é simples, desde que a leitura e um mínimo de conhecimentos eletrônicos que fazem parte da vida das crianças desde a mais tenra idade permitam. Considerados os aspectos sociais contemporâneos e suas influências na construção de um novo entendimento de infância, vejamos como as psicogenéticas expostas neste trabalho, que contribuíram para a construção da imagem de infância como uma etapa no ciclo de vida e de criança como um ser ativo e qualitativamente diferente do adulto, implicaram numa forma peculiar de se entender algumas questões educacionais. Segundo Galvão (1995), Ao fornecer informações e explicações acerca das características da atividade da criança nas várias fases de seu desenvolvimento, a psicologia genética constitui-se numa valiosa ferramenta para a educação. Possibilita uma maior adequação dos objetivos e métodos pedagógicos às possibilidades e necessidades infantis, favorecendo uma prática de melhor qualidade, tanto em seus resultados como em seu processo (p.97). As transformações do pensamento e da inteligência infantil sincrética, pré-formal e préconceitual para um pensamento e inteligência adulto conceitual e formal estão presentes nas três propostas. As implicações educacionais e pedagógicas são imediatas, pois ao compreender como a criança pensa, o professor pode planejar como trabalhar para que o conhecimento seja compartilhado e construído pelos alunos. A metodologia adotada pelo professor deverá proporcionar situações de ensino que sejam coerentes com o desenvolvimento da inteligência do aluno e não com a idade cronológica dos indivíduos. O trabalho em equipes é um recurso metodológico que recebe atenção especial do construtivismo e das teorias psicogenéticas. Em 1935, Piaget escreveu o artigo “Observações psicológicas sobre o trabalho em grupo”, no qual aponta as vantagens do trabalho em equipes na escola e afirma que este método está fundado nos mecanismos essenciais da psicologia da criança. Segundo esse autor, É, portanto, possível, a título de conclusão, sublinhar as vantagens do trabalho em grupo do ponto de vista da própria formação do pensamento. Todos nossos colaboradores concordam em ver nessa técnica uma fonte de iniciativa. Quase todos admitem igualmente (...) que o grupo desenvolve a independência intelectual de seus membros. Os frutos específicos do método são, pois, o espírito experimental, por um lado, e, por outro, a objetividade e o progresso do raciocínio (PIAGET, 1998, p. 150). Uma outra implicação educacional-pedagógica das teorias psicogenéticas que ora apresentamos é a questão do movimento do pensamento e suas repercussões na organização do trabalho do professor. Os três autores que abordamos nesse artigo têm como suporte filosófico a dialética (seja ela apresentada nos moldes Kantianos ou Marxistas), ou seja, consideram o movimento do pensamento dialético, passando da ação para a conceituação, na construção de conhecimentos. Reconhecer tal afirmação significa considerar que as atividades realizadas em sala de aula devem partir da própria atividade do aluno, da interação com o objeto de aprendizagem para posteriormente poder se concretizar no nível da reflexão metacognitiva, ou seja, da conceituação. Para finalizar, pensamos que as teorias psicogenéticas de Piaget, Vygotsky e Wallon contribuíram de forma decisiva para a construção da conceituação de infância como uma etapa específica do ciclo de vida e de criança como um ser ativo e integral, dotado de uma forma peculiar de raciocinar, qualitativamente diferente do adulto. Quanto às possibilidades apresentadas por Postman, preferimos o equilíbrio do meio termo: a Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008. Contribuições das teorias psicogenéticas à construção do conceito de infância: implicações pedagógicas. infância não está desaparecendo, mas sim se transformando. Ora, o mundo está se transformando, a vida transforma-se cotidianamente, o planeta transforma-se, os homens transformam e são transformados. Tais mudanças e transformações, nem sempre positivas, representam o próprio movimento do estar vivo e, ao nosso ver, a complexidade desses processos não pode ser explicada pela adoção de uma tecnofobia, posição insinuada pelo autor. A Psicologia é, sem dúvida, uma ciência que apresenta grandes possibilidades de pensar e significar tais transformações, incluindo, àquelas pertinentes à Educação! REFERÊNCIAS ARIÈS, P. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro: LTC, 1981. BOCK, A. M. B. A psicologia sócio-histórica: uma perspectiva crítica em psicologia. In. BOCK, A. M. B.; GONÇALVES, M. G.; FURTADO, O. 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Recebido: 01/11/2007 Aceito: 01/03/2008 Endereço para correspondência: Rua Oliciar de Oliveira Guimarães 11-61 - Jardim América – Bauru – SP - [email protected] Rev. Teoria e Prática da Educação, v.11, n.3, p.309-318, set./dez. 2008.