12 E STA D O D E M I N A S ● D O M I N G O , 1 0 D E J A N E I R O ECONOMIA D E 2 0 1 0 EDITORA: Renata Neves E D I TO RA - A S S I STE N TE : Ve ra S c h m i t z E-MAIL: [email protected] TELEFONE: (31) 3263-5103 NOVO BRASIL ESTUDOS MOSTRAM QUE ATÉ 2015 OU 2016 O PAÍS JÁ PODERÁ TER ERRADICADO A POBREZA EXTREMA, ENCERRANDO UM CICLO DESIGUALDADE COM OS DIAS CONTADOS PAOLA CARVALHO E ZULMIRA FURBINO Aos14anos,eladeixouafamílianaslavouras de Monte Azul (Norte de Minas) para estudar na capital mineira. Chegou a Belo Horizonte com uma única mala para trabalhar como empregada doméstica. As patroas que teve não permitiramqueestudasse.LindalvaFernandesdeSouza Silvanãoconseguiurealizarseusonho.Masaquele era o primeiro de muitos. Casou, comprou uma casa no Novo Riacho, Nova Contagem (GrandeBH),ecomodinheirodafaxina,queaindafaz,pagouafaculdadedefisioterapiaedenormal superior (ex-magistério) para suas duas filhas,RobertaeRenata,egressasdoensinopúblico. Destavez,osonhodemudararealidadedafamília e garantir um futuro melhor para todos foi conquistado. “Tenho muito orgulho da minha trajetória”,disseatrabalhadora,hojecom54anos. A garra de Lindalva é um exemplo que começa a se repetir nos lares brasileiros – e esses vencedores também podem mudar a história do país. O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), Márcio Pochmann, acredita que a pobreza extrema no Brasil terá praticamente desaparecido em 2016. Ele adiantou ao Estado de Minas suas impressões sobre um estudo da evolução da pobreza no país e no mundo que será divulgado pelo órgão depois de amanhã. De acordo com ele, o levantamento mostra que não existe convergência no decréscimo, no aumento ou na estagnação da vulnerabilidade financeira. "Há países desenvolvidos nos quais a desigualdade está crescendo e outros menores e mais pobres que continuam reduzindo as diferenças sociais. É difícil traçar um paradigma”, explica. O economista Ricardo Amorim calculou que, daqui a 12 anos, a desigualdade social do Brasil será menor que a dos Estados Unidos, tendo como base a trajetória de evolução dos últimos 15 anos até 2007. “Estou sendo conservador. Pode ser até antes”, disse. O pesquisador do Ipea Sergei Soares concorda e é até mais otimista. Acredita que a inversão pode ocorrer em menos de 10 anos. Para traçar essa projeção, eles usaram o coeficiente de Gini, parâmetro internacional para medir a concentração de renda. O índice varia de zero a um. Zero significaria, hipoteticamente, que todos os indivíduos teriam a mesma renda e 1 mostraria que apenas um indivíduo teria toda a renda de uma sociedade. Os dados indicam, conforme explica Soares, que o ritmo de queda da desigualdade no Brasil de 0,7 ponto de Gini ao ano, desde 2001, é superior ao ritmo que todos os países anali- sados (Espanha, Estados Unidos, França, Noruega, Países Baixos, Reino Unido e Suécia) seguiram enquanto construíam seus “Estados de bem-estar social”, salvo a Espanha, cujo ritmo foi um pouco superior (0,9 ponto ao ano). O último dado divulgado oficialmente é de 2007, quando o Gini apurado para o Brasil foi de 0,554. Então, as distâncias que nos separariam de países referência, contando a partir de 2010, seriam dois anos para o México, chegando a 0,51, oito anos para os Estados Unidos (0,469) e 20 anos para o Canadá (0,393). “Olhar pelo retrovisor não é uma boa maneira para dirigir. O ritmo de queda na desigualdade é adequado, mas o desafio é mantê-lo por várias décadas para alcançar o nível do Canadá”, afirmou. METADE De acordo com levantamento do di- retor do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), Marcelo Neri, nos próximos cinco anos o Brasil deve reduzir o número de miseráveis em mais da metade. Conforme ele, os pobres serão apenas 8% dos brasileiros no início de 2015. Em 1993, somavam 33%. Será um contigente de 16,1 milhões em uma população total de 222 milhões. A linha de pobreza corresponde a uma renda per capita familiar de R$ 137 na média do Brasil. “Há um fortalecimento do mercado interno, o que desencadeia um ciclo positivo de aumento da renda, consumo, produção industrial e emprego”, disse. Neri projeta um crescimento médio anual de 5,26% da renda total familiar per capita no quinquênio 2010-2014. Soares destacou ainda que, no Brasil, a renda dos 10% mais pobres cresce a uma média chinesa (9% per capita ao ano), enquanto a dos 10% mais ricos cresce a uma taxa alemã (1% per capita ao ano). Com uma diferença: a renda per capita alemã é quatro vezes maior do que a chinesa e 40 vezes a renda per capita dos pobres brasileiros. Enquanto isso, Lindalva mostra que o futuro pode ser agora. Depois que as filhas concluíram o ensino superior, ela conseguiu economizar o suficiente para comprar um lote em Ribeirão das Neves (Grande BH). “Quero investir nisso para depois descansar”, diz. Erguer a casa e ter uma horta para resgatar a memória da infância no Norte de Minas, mesmo que dura, será mais um dever cumprido, mais um sonho realizado. ❚ LEIA MAIS SOBRE RENDA PÁGINA 13 ❚ FOTOS: BETO MAGALHÃES/EM/D. A PRESS TENHO MUITO ORGULHO DA MINHA TRAJETÓRIA. AGORA, QUERO CONSTRUIR MINHA CASA ■ Lindalva Fernandes (ao centro), com as filhas, Renata e Roberta