O gesto de empreender No contexto da globalização, é muito natural e até mesmo inevitável o ingresso crescente de capitais estrangeiros, num processo amplo, geral e irrestrito de fusões/aquisições de empresas nacionais. Assiste-se a esse fenômeno, que muitos consideram negativo, em todos os setores de atividades. Antes de lamentar a transferência do controle de empresas brasileiras a grupos multinacionais, é necessário analisar a questão com mais cuidado, verificando também os aspectos positivos dessas transações. O Brasil não é a única nação, incluindo-se os países ricos, cujas empresas são adquiridas por companhias de padrão e atuação mundiais. A internacionalização das empresas e o caráter cosmopolita das corporações é uma das principais marcas da nova ordem econômica mundial. Além disso, o capital investido na compra de uma empresa não é especulativo, é produtivo, estando diretamente ligado à criação de empregos, desenvolvimento e aporte de tecnologia e abertura de mercados. Assim, não há nada condenável na atitude de quem compra e de quem vende uma empresa. O que não se pode, como às vezes parece transparecer no inconsciente coletivo, é permitir que esse fenômeno da globalização massacre a auto-estima do brasileiro. As empresas multinacionais nem sempre são mais eficientes do que as que adquirem e nem conhecem tanto o seu mercado. Caso contrário, em vez de comprá-las, entrariam no País e se tornariam poderosos concorrentes. Quando adquirem uma empresa nacional, esses grandes grupos, na verdade, estão tornando expresso o seu imenso respeito à companhia. Por outro lado, não se deve prejulgar, como ocorre invariavelmente, que os empresários que vendem o seu negócio almejem simplesmente uma apreciável fortuna em dólares, para se entregar a uma justa aposentadoria. Muitos - a despeito da absoluta lisura e ética da opção de se aposentar, vivendo do resultado da venda de uma empresa de sucesso, construída com seu talento e persistência empreendem novamente, reinvestindo os recursos na abertura e desenvolvimento de um novo negócio. O empresariado brasileiro deve valorizar e cultivar a auto-estima, lembrando que teve competência para atravessar, com sucesso, períodos muito adversos da história econômica recente. Isso equivale a entender com mais clareza e menos preconceito que o capital estrangeiro descobriu definitivamente o Brasil e estará, cada vez mais, procurando, aqui, oportunidades de negócios e investimentos. Depois da China, somos o segundo país emergente que mais recebe capital produtivo internacional. Sucumbir a esse processo, jamais, pois o empresário nacional, com competência, criatividade e coragem, pode continuar empreendendo, mesmo após a venda de uma empresa. O gesto de empreender é sempre muito positivo, pois o investimento produtivo cria empregos, aumenta a arrecadação de tributos, agrega valor à economia e estabelece novos conhecimentos e aporte de know how e tecnologia. Tudo isso é potencializado quando o risco do investimento é menor. E é menor o risco de investimentos realizados a partir de recursos que ingressaram no País por meio da venda de uma empresa, pois isso não tem vínculo com dívidas externas em dólar. Tampouco o novo empreendimento é financiado com todo o ônus dos créditos internos, que pagam os juros mais altos do mundo. Existem numerosos empresários que não vêem a empresa somente como meio de satisfação de seus objetivos materiais, mas também como instrumento de realização pessoal e humana. A esse tipo de pessoa não interessa market share, destruição dos concorrentes e espoliação pelo lucro. Trata-se de gente que, por 1 valores pessoais, conceitos éticos e visão humanística, quer ver o seu mercado mais forte, o consumidor atendido e os brasileiros que ainda subsistem abaixo da linha da miséria incluídos nos benefícios da economia. Por isso, está sempre disposta ao gesto de empreender, independentemente de, um dia, ter vendido uma empresa construída com muito trabalho. Fonte FILHO, Milton Mira Assumpção. O gesto de empreender. Disponível em: http://carreiras.empregos.com.br/comunidades/mid/artigos/101002 -empreender_milton.shtm. Acesso em: 21 fev. 2005. 2