INDUSTRIALIZAÇÃO BRASILEIRA III A ditadura militar (1964-1985) Em 12 de abril de 1964, quando se iniciou o regime militar, o Brasil possuía o 43º PIB do planeta e uma dívida externa de 3,7 bilhões de dólares. Em 1985, ao término da ditadura, o Brasil apresentava o 8° PIB do mundo capitalista e sua dívida externa era de aproximadamente 95 bilhões de dólares. O parque industrial havia crescido de forma bastante significativa e a infra-estrutura nos setores de energia, transportes e comunicações tinha se modernizado. Porém, embora os indicadores econômicos tenham evoluído positivamente, a qualidade de vida de grande parte da população piorou bastante nesse período. Em 1960, os 50% mais pobres da população brasileira detinham 17,7% da renda nacional; em 1970 esse valor diminui para apenas 11,8%. No mesmo período, os 20% mais ricos, que dispunham de 54% da renda nacional, passaram a contar com 62% dela. O texto a seguir nos mostra uma conseqüência imediata do modelo econômico que levou a essas mudanças. “As distorções do “Milagre Brasileiro” Concomitante ao "paraíso de consumo" que se abria para a classe média dos grandes centros urbanos, onde proliferavam supermercados, shoppings e os outdoors de construtoras oferecendo inúmeros lançamentos de apartamentos de luxo, crescia também a população marginalizada e miserável. A população favelada de Porto Alegre elevou-se de 30 mil pessoas em 1968 para 300 mil em 1980; a do Rio de Janeiro, de 450 mil em 1965 para 1,8 milhão em 1980; e a de São Paulo, de 42 mil em 1972 para mais de um milhão em 1980.” Basicamente, a política econômica esteve voltada, como em períodos anteriores, ao crescimento do PIB e à obtenção de um maior superávit no saldo da balança comercial, ou seja, um saldo positivo, em que o valor das exportações supera o das importações. “Brasil: AME-O OU DEIXE-O Esta frase, de apelo nacionalista, foi utilizada pelos militares para intimidar os opositores ao regime ditatorial. Note que ela permite a seguinte interpretação: ame o país do jeito que está,sem críticas ou questionamentos, ou deixe-o.” a economia do país durante a ditadura foi caracterizada por grande concentração da renda, a fim de compreendermos por que a economia crescia, mas a população de baixa renda não usufruía os benefícios que esse crescimento proporcionava. Leia o texto a seguir, no qual a autora caracteriza as diferentes fases do processo de industrialização desse período. “Depois da tempestade, vem o "Milagre" Do ponto de vista da industrialização brasileira propriamente dita, o golpe de 1964 não trouxe nenhuma mudança nos rumos por ela tomada desde 1955. Muito pelo contrário, o papel da ditadura militar foi o de consolidar o modelo econômico implantado nos anos 1950, aperfeiçoando-o. Logo, a primeira característica da industrialização brasileira dessa época foi a permanência das diretrizes estabelecidas pelo Plano de Metas, mantendo-se o tripé inaugurado nos anos 1950 a pleno vapor. A história da economia e da industrialização brasileiras do pós-64 pode ser dividida em três períodos: a) 1962-67 - fase caracterizada como de crise e recessão; b) 1968-74 - fase de retomada do crescimento industrial vulgarmente conhecida como "milagre econômico brasileiro”, em virtude das elevadas taxas de crescimento de nossa economia; c) de 1974 até o presente [1992] - fase em que o "milagre” entrou em total e completo declínio, sem que as várias saídas tentadas tenham conseguido grande sucesso.” Entre 1968 e 1973, período conhecido como "milagre econômico", a economia brasileira desenvolveu-se em ritmo acelerado. Esse ritmo de crescimento foi sustentado por grandes investimentos estatais em obras faraônicas, de necessidade, rentabilidade ou eficiência questionáveis, como as rodovias Transamazônica e Perimetral Norte e o acordo nuclear entre Brasil e Alemanha. O setor de comunicações também foi beneficiado nesse período. Os investimentos foram feitos graças à grande captação de recursos no exterior, o que elevou a dívida externa nacional, pois boa parte desse capital foi investido em setores não-rentáveis da economia. Como pagar a parcela da dívida contraída com a construção de rodovias na Amazônia? A taxa de lucro dos empresários foi ampliada por intermédio da diminuição dos salários reais, ou seja, pela redução do poder aquisitivo dos trabalhadores. Aumentava-se, assim, a taxa de reinvestimento dos lucros no aumento da produção, dando continuidade ao processo histórico de concentração de rendas. Ficou famosa a frase do ministro Delfim Netto, em resposta à inquietação dos trabalhadores ao verem seus salários arrochados: “É necessário fazer o bolo (a economia) crescer para depois reparti-lo". O bolo cresceu, nossa economia chegou a ser a 8ª maior do mundo capitalista e, até hoje, a fatia que cabe aos trabalhadores diminui sistematicamente. Outro aspecto importante na questão do crescimento econômico no período militar foi o dos investimentos externos. O capital estrangeiro penetrou em vários setores da economia, principalmente na extração de minerais metálicos (projetos Carajás, Trombetas e Jari), na expansão das áreas agrícolas (monoculturas de exportação), nas indústrias química e farmacêutica e na fabricação de bens de capital (máquinas e equipamentos) utilizados pelas indústrias de bens de consumo. Nesse contexto, a classe média viu seu poder de compra ampliado, quer pela elevação dos salários em cargos que exigiam qualificação técnica, quer pela ampliação do sistema de crédito bancário, permitindo maior financiamento do consumo. Enquanto isso, os trabalhadores sem qualificação tiveram seu poder de compra diminuído e ainda foram prejudicados com a degradação dos serviços públicos, sobretudo os de educação e saúde. No final da década de 1970, os Estados Unidos promoveram a elevação das taxas de juros no mercado internacional, reduzindo os investimentos destinados aos países subdesenvolvidos. Além de assistir a essa redução, a economia brasileira teve de arcar com o pagamento crescente dos juros da dívida externa, que havia sido contraída com as taxas flutuantes. Diante dessa nova realidade, a saída imposta pelo governo se resumiu na frase: "Exportar é o que importa". Era urgente voltar a produção econômica para o mercado externo, a fim de aumentar o superávit na balança comercial. Porém, como tornar internacionalmente competitivas, tanto em qualidade como em preço, as mercadorias produzidas em um país subdesenvolvido, que quase não investia em tecnologia? As soluções encontradas foram desastrosas para o mercado interno de consumo: arrocho salarial, subsídios fiscais para exportação (cobrava-se menos imposto por um produto exportado que por um similar vendido no mercado interno), negligência com o meio ambiente, desvalorização cambial (a valorização do dólar em relação ao cruzeiro, moeda da época, facilitava as exportações e dificultava as importações), combate à inflação por meio da diminuição do poder aquisitivo. Essas medidas, adotadas em conjunto, favoreceram a colocação de produtos no mercado externo, mas prejudicaram o mercado interno, reduzindo o poder de compra do brasileiro. Assim se explica o aparente paradoxo: a economia cresce, mas o povo empobrece. Na busca de um maior superávit na balança comercial, o governo impôs pesados encargos às importações, tanto de bens de consumo quanto de bens de capital e de produção. A conseqüência dessa medida foi o sucateamento do parque industrial brasileiro ao longo dos anos 1980. Os industriais não tinham capacidade financeira para importar novas máquinas e, por causa da falta de competição com produtos importados, não havia incentivos à busca de maior produtividade e qual idade dos produtos. Com isso, as indústrias, com raras exceções, foram perdendo a competitividade no mercado internacional e as mercadorias comercializadas internamente tornaram-se caras e tecnologicamente defasadas em relação às estrangeiras. As conseqüências sociais dessa política econômica se agravaram com a segunda crise do petróleo, que se iniciou em 1979. As taxas de juros da dívida externa atingiram, em 1982, o recorde histórico de 14% ao ano. A partir de então, a economia brasileira passou por um período de recessão que castigou o país durante a década de 1980 e início da de 1990, período que se caracterizou pela chamada ciranda financeira: o governo emitia títulos públicos para captar o dinheiro depositado pela população nos bancos. Como as taxas de juros oferecidas eram muito altas, muitos empresários deixavam de investir no setor produtivo - o que aumentaria o PIB, geraria empregos e ativaria a economia - para investir no mercado financeiro. Na época, essa "ciranda" criava a necessidade de emissão de moeda sem lastro, o que elevou os índices de inflação. Outro aspecto negativo da política econômica do período militar merece destaque: se as medidas adotadas tinham como objetivo o crescimento do PIB a qualquer custo, o que fazer com as empresas ineficientes, à beira da falência? A solução encontrada para esse problema foi a estatização. O Estado brasileiro adquiriu empresas em quase todos os setores da economia utilizando recursos públicos, em parte acumulados com o pagamento de impostos por toda a população. O inchamento da administração de instituições públicas, de 1964 a 1985, foi preocupante. Em 1985, cerca de 20% do PIS era obtido em empresas estatais, enquanto os serviços tradicionalmente públicos, como saúde e educação, estavam se deteriorando por causa da falta de recursos, que eram desviados dos setores sociais para os produtivos. O período dos governos militares no Brasil caracterizou-se pela apropriação do poder público por agentes que desviaram os interesses do Estado para as necessidades empresariais. As carências da população foram desprezadas; as prioridades foram o crescimento do PIB e o aumento do superávit na balança comercial. O objetivo de qualquer governo é o de aumentar a produção econômica. O problema é saber como atingi-lo sem comprometer os investimentos em serviços públicos. Apesar do exposto, durante o período da ditadura militar, o processo de industrialização e, conseqüentemente, de urbanização continuou avançando, resultando em significativa melhora nos índices de natalidade e mortalidade, que registraram queda, além do aumento da expectativa de vida. A interpretação desse fato deve levar em conta o intenso êxodo rural, já que nas cidades aumenta o acesso a saneamento básico e atendimento médico-hospitalar, bem como a remédios e programas de vacinação em postos de saúde. O fim do período militar ocorreria em 1985, depois de várias manifestações populares a favor das eleições diretas para presidente. Os problemas econômicos herdados da ditadura militar foram agravados no governo que se seguiu, de José Sarney, e só foram enfrentados efetivamente nos anos 1990. Atividades 1. Explique resumidamente o que foi o "milagre econômico" e a política industrial efetivada pelo regime ditatorial militar.