PROCESSAMENTO AUDITIVO NA ESCOLA: COMO TRABALHAR PEDAGOGICAMENTE O ALUNO Anhanguera Educacional S.A. Correspondência/Contato Alameda Maria Tereza, 2000 Valinhos, São Paulo - 13.278-181 [email protected] [email protected] Coordenação Instituto de Pesquisas Aplicadas e Desenvolvimento Educacional - IPADE Publicação: 09 de março de 2009 ANUÁRIO DA PRODUÇÃO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DISCENTE Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 Priscilla Livorati Salgado de Medeiros Profº Ms. Antônio Rodolfo de Siqueira (orientador) Profª Antônia Lucineire de Almeida (co-orientador) Pedagogia FACULDADE ANHANGUERA DE JACAREÍ ANHANGUERA EDUCACIONAL S.A. Trabalho apresentado no 8º. Congresso Nacional de Iniciação Científica – CONIC – SEMESP em novembro de 2008. RESUMO Este artigo visa promover uma reflexão sobre o conhecimento do Processamento Auditivo (PA) pelo professor no âmbito escolar, no processo de formação dos professores e suas conseqüências na aprendizagem do alunado. Pretende-se por meio de investigação saber o grau de conhecimento dos professores atuantes em relação à desordem do PA e ainda como o educador pode atuar pedagogicamente com o aluno que apresenta esta disfunção. O estudo será pautado em um levantamento bibliográfico com o objetivo de conceituar o PA, mostrar suas habilidades, desordens, sua semelhança e diferença com distúrbios de aprendizagem. Além de mostrar como o educador pode atuar na identificação precoce de uma alteração auditiva, a partir do conhecimento sobre as características apresentadas por um indivíduo com possível alteração e ainda colaborar no processo terapêutico, haja vista que o professor mantém contato diário com o aluno. Por fim, pretende-se traçar uma análise com dados coletados na pesquisa de campo e mostrar que há necessidade de maior conhecimento sobre o assunto no meio docente e no âmbito escolar. Palavras-chaves: processamento auditivo, aprendizagem e interdisciplinaridade. Trabalho realizado com o incentivo e fomento da Anhanguera Educacional S.A. dificuldade de 464 Processamento auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno 1. INTRODUÇÃO O Projeto de Iniciação Científica “Processamento Auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno” tem como objetivo principal abordar a complexidade deste assunto no processo de formação dos professores. Pensa-se na ampliação do tema para o âmbito educacional com o objetivo de inovar e engrandecer o conhecimento dos profissionais de educação visando o esclarecimento e a divulgação do assunto na busca pela qualidade do ensino e aprendizagem dos alunos com a Desordem do Processamento Auditivo. Este assunto iniciou-se na disciplina de Metodologia de Pesquisa, em que um grupo de alunos desenvolveu um Projeto de Trabalho de Conclusão de Curso sobre o Processamento Auditivo. Ocorre que no desenvolvimento deste projeto pôde-se perceber a importância e necessidade de maior divulgação a respeito do tema, haja vista que este é pouco abordado e conhecido pela comunidade docente, mas presente no cotidiano escolar e muitas vezes confundido com outros distúrbios de aprendizagem. Há necessidade de se realizar um estudo aprofundado sobre o Processamento Auditivo no processo de formação do professor, a fim de possibilitar que o docente tenha conhecimento da Desordem do PA e suas conseqüências para o processo de aprendizagem do aluno. Sabe-se que com o conhecimento do assunto o professor poderá atuar pedagogicamente na intenção de propiciar ao aluno com Desordem do PA um processo de ensino-aprendizagem com qualidade. Dessa forma, esse artigo visa apresentar um levantamento bibliográfico para melhor compreender a definição do assunto, a importância de tratá-lo no curso de formação de professores, como o profissional pode identificar casos e atuar pedagogicamente em sala de aula e ainda desvelar o grau de conhecimento do professor por meio de uma pesquisa de campo, cujo resultado será descrito no decorrer deste trabalho. 2. OBJETIVO Este projeto tem como objetivo investigar a influência da Desordem do Processamento Auditivo no âmbito escolar e a necessidade do conhecimento para um melhor andamento no processo de ensino-aprendizagem. Pretende-se ainda, como objetivo específico, saber o grau de conhecimento de profissionais da educação sobre o assunto. Promover o conhecimento do conceito de Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 Priscilla Livorati Salgado de Medeiros, Antônio Rodolfo de Siqueira, Antônia Lucineire de Almeida 465 Processamento Auditivo Central, fornecer subsídios para que os profissionais de educação possam identificar casos em sala de aula e ainda colaborar com o encaminhamento e tratamento de uma criança com diagnóstico de Desordem do Processamento Auditivo Central. 3. METODOLOGIA Na intenção de coletar dados para a pesquisa foi realizado levantamento e estudo bibliográfico para entendimento do assunto. Para complementar a pesquisa bibliográfica foram realizadas entrevistas com professores que atuam em diversos níveis da educação, na intenção de coletar dados para embasamento dos estudos. Os dados coletados na pesquisa de campo foram analisados de forma quantitativa e qualitativa, relacionados com o embasamento teórico deste estudo e relatados a seguir, a fim de desvelar os resultados e possibilitar que sejam lidos e entendidos por outros leitores. 4. CONTEXTUALIZAÇÃO DO PROCESSAMENTO AUDITIVO (PA) Na atualidade observa-se a necessidade de uma formação voltada a atender todos os aspectos da diversidade no ambiente escolar e dentro deste contexto pode-se incluir a questão do Processamento Auditivo como um fator de dificuldade de aprendizagem. Torna-se importante conhecer e entender o PA e sua desordem pelo fato deste distúrbio ser confundido com Hiperatividade, Transtorno do Déficit de Atenção e outras dificuldades de aprendizagem. Para isso é necessário percorrer o caminho conceitual no decorrer da história com o desenvolvimento das descobertas científicas. 4.1. Conceito Histórico do PA e sua Importância no Ambiente Escolar O embasamento teórico acerca do PA é concentrado em estudos e pesquisas na área da fonoaudiologia visando o campo da saúde. Este fator dificulta a correlação do assunto com outras áreas científicas, inclusive a educação, e com isto distancia o distúrbio do âmbito escolar, embora o mesmo tenha grande influência no rendimento do alunado. Estudos a cerca do Processamento Auditivo iniciaram-se na intenção de explicar problemas auditivos em indivíduos adultos que apresentavam lesões no Sistema Nervoso Auditivo Central (SNAC). Neste contexto, de acordo com Simon e Rossi (2006), é possível afirmar que: Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 466 Processamento auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno [...] a avaliação central da audição também é muito útil e sensível para avaliar a integridade funcional do SNAC, dando aos clínicos mais subsídios no diagnóstico diferencial como também intervenção das dificuldades de linguagem e transtornos de aprendizagem. Trata-se, portanto, de um assunto importante, porém pouco difundido e pesquisado no Brasil. Das poucas publicações encontradas inclui-se um manual de avaliação, publicado em 1997, que possibilitou conhecimento sobre este assunto. Pereira (2005) comenta que o material publicado disponibilizou vários procedimentos para serem aplicados na prática e nos centros de pesquisa. Faz-se necessário então, antes de discorrer sobre o assunto em pesquisa e suas conseqüências no ambiente escolar, traçar um esclarecimento sobre o Processamento Auditivo, incluindo sua desordem, fator que envolve a priori um entendimento sobre a audição. Portanto, é necessário compreender o conceito de audição e sua importância no desenvolvimento dos aspectos físicos, emocionais e sociais de um indivíduo. De acordo com Gielow (2001), "a audição é uma das vias de integração do indivíduo com seu mundo, sendo assim responsável por inúmeros processos no seu desenvolvimento em sua existência". A importância que a audição tem no sentido de ligar o indivíduo com o mundo é complementada por outros autores. Gordo (In Sacaloski, Alavarsi e Guerra, 2000) afirma que “algumas funções básicas da audição são: localização, alerta, socialização, intelectual e comunicação". Na compreensão da audição ainda há necessidade de se entender o caminho que o som percorre até chegar ao cérebro e quais são as estruturas que ele deve provocar para que se possa compreender o som que se ouve, no sentido de ativar as funções básicas da audição. Segundo Sacaloski et al. (2000), para que uma pessoa possa ouvir, o som deve percorrer um trajeto que vai deste o pavilhão auricular (orelha) até o cérebro, conforme especificado: [...] quando um estimulo sonoro chega ao pavilhão auricular ou orelha, esse som é captado, passando pelo conduto auditivo externo chegando à membrana timpânica. A membrana timpânica vibra. Essa vibração faz com que o martelo, que está preso a ela, se movimente e conseqüentemente mova a bigorna e o estribo, como numa engrenagem. O estribo provoca a movimentação da membrana da janela oval, que liga a orelha média à interna. Esse movimento faz com que haja também um deslocamento nos líquidos que se encontram dentro da cóclea, estimulando assim o órgão de Corti. Ocorre, então, a transmissão do impulso nervoso através do nervo auditivo. Esse impulso é processado por meio de diversas estruturas do sistema nervoso central, até chegar ao córtex cerebral, para que possamos compreender o significado dos sons que ouvimos. Esse trajeto pode ser exemplificado na Figura 1. Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 Priscilla Livorati Salgado de Medeiros, Antônio Rodolfo de Siqueira, Antônia Lucineire de Almeida 467 Figura 1. Trajeto do som. Os entendimentos sobre o percurso do som demonstram um importante processo de transmissão dos impulsos nervosos, ao qual se dá o nome de Processamento Auditivo Central. Esses impulsos nervosos são explicados por Gielow (2001): O Processamento Auditivo Central é como o sistema auditivo periférico e central recebe, analisa e organiza aquilo que ouvimos. O som, ou estímulo sonoro percorre um longo caminho pelo sistema nervoso, desde a orelha até o córtex cerebral, passando por várias “estações” do chamado tronco cerebral. Cada “estação” é responsável por diferentes habilidades como a atenção a um som, a detecção de onde ele vem e a identificação do seu significado, entre outras funções. Essa conceituação de PA é complementada por Katz e Wilde (apud SIMON; ROSSI, 2006), como “a construção que se faz acerca do sinal auditivo para tornar a informação funcionalmente útil”. E ainda por Siegler (apud BECK et al., 1996), “como o conjunto das habilidades envolvidas na organização da informação auditiva que depende da capacidade inata do indivíduo e de suas experiências no meio ambiente". É necessário ainda entender em que aspectos o Processamento Auditivo pode influenciar na vida do ser humano. De acordo com uma publicação do ASHA - American Speech-Language-Hearing Association (apud SIMON; ROSSI, 2006), o PA é responsável por: [...] fenômenos comportamentais de localização e lateralização sonora; discriminação auditiva; reconhecimento de padrões auditivos; aspectos temporais da audição, incluindo resolução, mascaramento, integração e ordenação temporal; e desempenho auditivo na presença de sinais acústicos degradados ou competitivos. Na pesquisa, até o momento, é possível entender que o Processamento Auditivo Central é o conjunto das habilidades específicas que um ser humano precisa para interpretar o que ouve. Estas habilidades são governadas pelos centros auditivos do tronco cerebral e do cérebro, e podem ser agrupadas em cinco áreas gerais, descritas a seguir: Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 468 Processamento auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno Tabela 1. Descrição e Definição das Habilidades Auditivas. Habilidades Atenção Discriminação Associação Integração Organização Definição Está relacionado a como a criança presta atenção à fala e aos sons de seu ambiente. São importantes quando ela precisa se concentrar em um estímulo determinado, ignorando o ruído de fundo. Trata-se da capacidade do cérebro em “ouvir” as diferenças entre os sons falados, tal como perceber a diferença entre os sons b e g ou t e d. É a capacidade do cérebro em associar ou “ligar” um som que chega à outra informação, de acordo com as regras da linguagem. Por exemplo, saber que a letra C por vezes soa como /k/, e outras vezes, como /s/. Outro exemplo seria saber que os sons /g-a-t-o/ podem se unir de acordo com certas regras e significar “uma criatura peluda com bigodes que faz miau”. As habilidades de associação refletem a capacidade da criança para receber partes de informação auditiva, analisá-las, e dar-lhes um sentido, um significado. Está relaciona-se com a capacidade da criança ouvir conjuntos de sons e “unilos” com outras informações sensoriais, para dar significado a uma mensagem ou tarefa. A integração também requer o uso das regras da linguagem, mas o foco maior é a “captação da idéia geral”. As habilidades de integração refletem os quão bem conectados entre si estão os centros sensoriais da criança. Boas habilidades de integração permitem que o sistema auditivo use a informação rápida e eficientemente. Refere-se ao fato de demonstram o quanto um indivíduo é capaz de seguir a seqüência, organizar e recordar aquilo que ouve. Ou seja, a definição “o que fazemos com o que ouvimos” é correta, mas muito simples. Uma definição melhor poderia ser “o quanto conseguimos prestar atenção, discriminar, associar, integrar e organizar o que ouvimos”. O ser humano precisa ter boas habilidades de processamento auditivo para ser capaz de se comunicar com outros, para aprender uma nova informação e para realizar tarefas em sua vida diária. Dessa forma passa-se a compreender que o PA precisa percorrer um caminho sem desvios, a fim passar ao longo de todo o sistema auditivo sem nenhuma interrupção. Gielow (2001), afirma que “existem uma enorme rede de neurônios que se ligam neste caminho, que é muito complexo. Às vezes ocorrem alguns desvios, talvez por imaturidade destes neurônios, ou por outros motivos”. Esses desvios podem acarretar uma desordem no PA, que de acordo com Keith (apud SIMON; ROSSI, 2006) possui as seguintes características: [...] alterações na atenção dirigida, fadiga em tarefas complexas ou prolongadas, distração, sensibilidade exagerada frente a sons intensos, dificuldades em seguir ordens verbais, necessidade de repetição freqüente de estímulos verbais, alterações amnésicas, aprendizado lento das relações grafofonêmicas além de dificuldades em compreender piadas e linguagem figurada. A Desordem no Processamento Auditivo (DPA), além de ocasionar problemas físicos ainda interfere no desenvolvimento da aprendizagem, conforme Katz e Wilde (apud Simon e Rossi, 2006), que: [...] relatam que os transtornos de aprendizagem, especialmente os problemas de leitura e as dificuldades com fonemas, com a compreensão leitora e os Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 Priscilla Livorati Salgado de Medeiros, Antônio Rodolfo de Siqueira, Antônia Lucineire de Almeida 469 comprometimentos de ortografia e de habilidades com línguas estrangeiras estão associadas as DPA. Essas desordens afetam diretamente o rendimento do aprendizado e conseqüentemente o desenvolvimento integral dos alunos. Por isso torna-se importante, no contexto educacional, que o profissional possa identificar prováveis deficiências do sentido auditivo, a fim de poder compreender e interferir positivamente no desenvolvimento da aprendizagem efetiva do alunado. Neste caso, o professor precisa saber identifica qual ou quais déficits auditivos o aluno apresenta e assim poder trabalhar com as habilidades auditivas contidas em cada um desses déficits. Os déficits são classificados da seguinte forma: Tabela 2. Déficit de Decodificação Auditiva (DCA) Definição Trata-se de dificuldades em analisar diferenças entre sons da fala, especialmente nas tarefas que exigem discriminação ou análise de sons. Conseqüência Uma criança com DDA tende a “ouvir mal” as palavras, seja nos testes ou na vida diária. Por exemplo, ela pode entender fala como sala, ou apagou como pagou. Crianças com DDA são freqüentemente descritas por seus pais e professores como pessoas com dificuldades para ouvir, mesmo que os testes de audição convencionais indiquem audição normal. Tabela 3. Déficit de Associação Auditiva (DAA) Definição Trata-se de dificuldades em aplicar as regras da língua aos sons que se ouve. Conseqüência A criança com DAA pode apresentar dificuldades específicas na compreensão da linguagem (pobres habilidades de linguagem receptiva). O vocabulário pode ser inferior ao esperado para a faixa etária. A compreensão de frases e sentenças mais complexas são comprometidas pelo DAA. Tabela 4. Déficit de Organização Auditiva (DOA) Definição Uma criança que tem o DOA tem dificuldades em organizar, seqüencializar, evocar e/ou expressar uma resposta. Conseqüência A criança tende a apresentar baixos escores nos testes com ruído de fundo, ou em testes que requerem respostas em uma ordem específica. Tabela 5. Déficit de Integração Auditiva (DIA) Definição O déficit de integração auditiva (DIA) resulta de uma pobre comunicação entre os lados direito e esquerdo do cérebro, ou entre os vários centros sensoriais do cérebro. Conseqüência Uma criança com DIA também terá dificuldades em testes que tenha que reconhecer padrões sonoros. Para os testes em que a criança é solicitada a identificar o padrão de uma série de tons (por exemplo, fino-fino-grosso, grosso-fino-grosso ou finogrosso-fino), os dois lados do cérebro devem trabalhar juntos para a criança acertar. Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 470 Processamento auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno Com o conhecimento dos déficits o educador tem uma ferramenta importante na identificação de alterações auditivas no ambiente da sala de aula e assim poder auxiliar seu alunado no desenvolvimento do aprendizado com atitudes pedagógicas apropriadas para suas dificuldades, além de poder encaminhar esse aluno, juntamente com a equipe escolar, para uma avaliação multidisciplinar que possa diagnosticar o DPAC. 4.2. PA e Atuação Pedagógica Até o momento, com os estudos realizados, evidencia a importância da necessidade de esclarecer o PA e sua importância na vida de um indivíduo, além disso, mostrar que as desordens neste processamento interferem no contexto educacional, haja vista que o ser humano necessita de todas as habilidades auditivas íntegras para que possa decodificar uma informação de forma correta e completa. Segundo Muniz et al. (2007), [...] o processo de aprendizado sonoro envolve, entre outras coisas, o conhecimento das propriedades do som: altura, intensidade, duração e timbre, além do conceito de pulsação, melodia, ritmo, harmonia e forma. A percepção auditiva, parte do processamento auditivo, precisa ser estimulada, pois o desenvolvimento auditivo depende de estímulos constantes e progressivos, favorecendo a compreensão de qualquer som verbal, bem como dos sons não-verbais e das informações suprasegmentais presentes na fala. Para compreensão do que é dito faz-se necessário o perfeito funcionamento do sistema auditivo central. Sabe-se que a questão da aprendizagem dentro do contexto escolar também pode ser prejudicada por uma Desordem no Processamento Auditivo (DPA) e por se tratar de um assunto pouco difundido no meio escolar faz-se necessário, além de entender como o DPA acontece, aprender como lidar com esse tipo de desordem, ou ainda como atuar pedagogicamente, a fim de possibilitar que alunos com DPA tenham aproveitamento efetivo na aprendizagem. As dificuldades de aprendizado da linguagem oral parecem ser atribuídas a uma inabilidade em processar rapidamente mudanças nas pistas acústicas da fala fluente, bem como a dificuldades na discriminação fonológica que é uma função do sistema do processamento central e que se desenvolve muito cedo. Em conseqüência desta dificuldade pode surgir, mais tarde, dificuldade de leitura, escrita e na habilidade de soletrar. A percepção auditiva tem sido relatada como uma das fontes de variação individual das habilidades fonológicas, que tem papel fundamental no aprendizado (MUNIZ et al., 2007) Ao conceituar o PA discorre-se sobre as principais habilidades auditivas, são elas: atenção, discriminação, associação, integração e organização, e a partir disso, descobre-se também que ao diagnosticar uma desordem sabe-se que, como conseqüência, haverá alteração nas habilidades. Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 Priscilla Livorati Salgado de Medeiros, Antônio Rodolfo de Siqueira, Antônia Lucineire de Almeida 471 De acordo com estudos há como identificar Desordens no Processamento Auditivo (DPA), especialmente no contexto da sala de aula. Há características que identificam o DPA e o professor precisa estar atento. Gielow (2001), em palestra ministrada apresenta algumas características: • Dificuldade de atenção e audição em ambiente ruidoso; • Apresenta agitação excessiva; • Parece não escutar e ao mesmo tempo se mostra ligada a todos os sons do ambiente (caneta que cai, carro que buzina, etc); • Apresenta esquecimento; • Dificuldade de entender ordens e regras; • Demonstra confusão ao relatar um fato ou história e apresenta dificuldade de expressão; • Apresenta erros gramaticais; • Dificuldade de entender piada e palavras com duplo sentido; • Não consegue entender bem o que lê; • Inverte de letras ao escrever (b, d, p, q) e apresenta disgrafia; • Alteração de alguns sons da fala (principalmente R e L); • Baixo rendimento escolar. Com a identificação das características que acusam uma Desordem no Processamento Auditivo, o profissional de educação pode juntamente com a equipe gestora da instituição, encaminhar o aluno para uma avaliação multiprofissional, a fim de descobrir exatamente quais habilidades auditivas encontram-se alteradas. Nos casos de DPA, após diagnóstico, o aluno deverá ser submetido a uma terapia, que por vez pode ser complementada com atitudes pedagógicas eficientes dentro do ambiente escolar, aplicadas pelo docente, na intenção de colaborar com o tratamento indicado. A colaboração em ênfase está relacionada a estímulos que tem o objetivo de melhorar o desempenho da criança, fortalecer as habilidades e facilitar as estratégias que a criança utiliza para compensar as dificuldades. O docente pode estimular um aluno com DPA a “aprender a ouvir”, ou seja, a desenvolver as habilidades auditivas envolvidas no processamento dos estímulos acústicos, especialmente os verbais, paralelamente às habilidades de linguagem, por meio de boa interação e comunicação professor/aluno, além de condições de escuta favorável no ambiente escolar. A intenção é fazer com que o aluno aprenda a usar sua audição para compreender a fala dos outros, monitorar a própria fala e monitorar os sons do ambiente. É evidente que todas essas recomendações devem ser acompanhadas por profissionais (fonoaudiólogos), haja vista que podem ocorrer vários casos, com diferentes Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 472 Processamento auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno terapias para cada um. Por isso há necessidade de seguir algumas recomendações que podem ajudar no aprendizado do aluno, são elas: • Reduzir o barulho concentração; • Posicionar a criança em sala de aula de modo a ficar próximo ao professor, sem ficar ao lado de paredes; • Falar sempre próximo à criança e voltada para ela, com o passar do tempo e com sua melhora, a distância poderá ser aumentada; • Falar alto e bem articulado, em ambiente o mais silencioso possível; • Ao explicar algum assunto, fale em frases curtas, devagar, com entonação rica, pausas nítidas e contexto significativo; • Forneça pistas contextuais para facilitar a compreensão, ou seja, esteja segura que a criança sabe sobre o que está sendo falado; • Acompanhe a leitura da criança, de preferência oral, correndo o dedo sob as letras e dando “dicas” mediante suas dificuldades; • Lembre-se de que seu aluno provavelmente tem dificuldade em sequencialização. Portanto, em tarefas de elaboração oral ou gráfica, assegure-se de que ele tenha bem organizada a noção de início, do meio e do fim, de sua história, nem que para isso você tenha que repetir várias vezes a seqüência; • Trabalhe reforçando a relação dos fonemas com as letras, mesmo que seu método de alfabetização não siga esta linha, pois estas pistas são importantes para tais crianças. ambiental durante atividades que requerem Essas recomendações facilitam a atuação do educador e auxiliam sua atuação pedagógica no desenvolvimento do aluno com alteração auditiva central. 4.3. Análise do Conhecimento de Professores sobre o PA Com a intenção de complementar a pesquisa discutida até o momento, relata-se a seguir, de forma qualitativa e quantitativa, os dados coletados com as entrevistas realizadas com professores dos diversos níveis de ensino, a partir do embasamento teórico levantando e discutido até o momento, a fim de desvelar o grau de conhecimento dos profissionais entrevistados sobre a Desordem do PA, suas conseqüências no âmbito escolar e a atuação docente. A pesquisa realizada teve a participação de 12 (doze) docentes que atuam em média a 13 (treze) anos como profissionais de educação. Esses profissionais trabalham ou já trabalharam nas diversas esferas educacionais (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Superior), da rede pública e particular de ensino e agora alguns trabalham com o ensino superior. Entre os entrevistados o grau de formação é o seguinte: Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 Priscilla Livorati Salgado de Medeiros, Antônio Rodolfo de Siqueira, Antônia Lucineire de Almeida 473 Formação Acadêmica Mestrado; 2 Magistério; 3 PósGraduação; 3 Curso Superior; 4 Gráfico 2. Formação acadêmica dos entrevistados. Pela amostragem do nível de formação é possível perceber que os docentes entrevistados, na sua maioria, têm um preparo continuado, ou seja, extrapolaram o nível de graduação superior e/ou buscam aprendizagem contínua, fator que possibilita maior conhecimento da esfera educacional e suas particularidades. Após conhecer um pouco sobre o tempo, os níveis de atuação e o grau de formação desses professores, passa-se a uma parte da análise dos dados coletados que subsidiarão este trabalho daqui a diante porque está relacionado ao grau de conhecimento do professor em relação ao assunto pesquisado, cujos resultados poderão ou não confirmar o objeto de estudo desta pesquisa. Em relação ao conhecimento dos professores sobre o assunto pesquisado, constatou-se que: Processamento Auditivo 25% 25% 50% Conhecem o Processamento Auditivo Já ouviram falar, mas não tem muita informação Não conhecem nada sobre o tema Gráfico 2. Conhecimento sobre Processamento Auditivo. Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 474 Processamento auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno É possível afirmar que os profissionais que mostraram conhecimento a respeito do assunto são capazes de identificar quando seu aluno apresenta indícios de uma Desordem do Processamento Aditivo Central (DPAC) pelas respostas fornecidas, quando na entrevista foi solicitado que estes profissionais conceituassem o PA. Obtiveram-se as seguintes respostas: • A pessoa (criança) ouve, mas não organiza (processa) a informação. • Alterações na audição que causam desordem no entendimento do que se está ouvindo. • Distúrbio do sistema auditivo que acarreta desatenção, dificuldade em compreender em local ruidoso, a criança pede para repetir a informação, baixo rendimento escolar, desajuste. Salienta-se ainda que dos profissionais que mostraram conhecimento sobre o PA e suas desordens, apenas 02 (33,33%) deles tiveram alunos com o diagnóstico. Já no caso dos profissionais que ouviram falar ou que não conhecem o tema faz-se necessário um aprendizado sobre o assunto, a fim de possibilitar a intervenção pedagógica correta e efetiva, porque nenhum soube conceituar o DPAC, nem mesmo os profissionais que alegaram ter ouvido falar no assunto. Na última pergunta os entrevistados foram questionados quanto a maneira de trabalhar o aluno com PA no contexto pedagógico e para a análise desta questão houve necessidade de considerar as docentes que já haviam se defrontado com alunos que possuíam o diagnóstico e estavam em processo terapêutico. Conforme resultado anterior, apenas 02 docentes puderam responder à questão com embasamento de causa e as respostas podem ser verificadas a seguir: • Atividades diferenciadas adequadas às dificuldades que a criança apresentava. • Aluno sentado no meio/frente da sala. • Professora explicava falando bem na frente da criança. • Seguiam sugestões da fonoaudióloga. Como se pode ver, o conhecimento do PA no ambiente escolar é pouco difundido. Pelos dados coletados na pesquisa de campo, confirma-se a importância do PA na escola e ao mesmo tempo, a falta de conhecimento sobre ele. Este último fato pode ocasionar uma observação incorreta sobre a dificuldade de aprendizado do aluno, sendo confundida com outras disfunções que afetam diretamente o aprendizado, como a Hiperatividade e o Transtorno de Déficit de Atenção. Observa-se que o PA é um assunto que precisa ser aprofundado de maneira mais intensa, especialmente no contexto docente para que o profissional da educação possa atuar efetivamente, a fim de que os alunos que apresentem dificuldades de aprendizagem Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 Priscilla Livorati Salgado de Medeiros, Antônio Rodolfo de Siqueira, Antônia Lucineire de Almeida 475 sejam encaminhados para outros profissionais para investigar a causa e identificar os casos de DPAC. 5. RESULTADOS O resultado da pesquisa realizada no projeto “Processamento Auditivo na escola como trabalhar pedagogicamente o aluno” demonstra que os profissionais da educação podem atuar em conjunto com a área da saúde e dessa forma, auxiliar no desenvolvimento de seu alunado que apresenta algum tipo de dificuldade na escola. Nas dimensões propostas para estudo os resultados evidenciam ainda a necessidade de conhecimento do Processamento Auditivo, incluindo no currículo de instituições de graduação e especialização, uma disciplina que visa divulgar quais são as alterações que uma criança pode apresentar em todo seu processo de aprendizagem, e como o educador deve atuar para que o diagnóstico e a intervenção terapêutica possam iniciar o quanto antes, para que a criança não apresente prejuízos em seu futuro acadêmico. Além disso, há necessidade de estudo por parte dos educadores, em uma busca contínua de conhecer mais os aspectos da diversidade que compõe a sala de aula, e assim poder contribuir, no diagnóstico e na terapia no ambiente escolar. A obtenção desses resultados oferece entendimento em relação ao assunto e direcionamento de futuras atitudes para continuidade do estudo. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Pode-se afirmar que há muito a conhecer sobre o campo de atuação do educador, haja vista que com um maior conhecimento sobre as dificuldades que seus alunos podem apresentar e que alterações eles podem ter, o encaminhamento e o auxílio terapêutico ocorrem antecipadamente e possibilitam assim, que o aluno tenha um acompanhamento mais apropriado que facilita o processo de aprendizagem. A pesquisa ainda aponta que há necessidade de divulgação do Processamento Auditivo e suas desordens para os educadores, a fim de que os profissionais possam observar e desempenhar no ambiente escolar, além da sua função de mediar o conhecimento, uma atitude preventiva e terapêutica que favoreça o reconhecimento de alunos com dificuldades que mereçam ser investigadas. O conhecimento do PA e suas possíveis desordens podem favorecer o docente no momento de identificar qual disfunção prejudica o aluno e evita que o educador possa Anuário da Produção de Iniciação Científica Discente • Vol. XI, Nº. 12, Ano 2008 • p. 463-476 476 Processamento auditivo na escola: como trabalhar pedagogicamente o aluno confundir o DPA com outros distúrbios de aprendizagem. E ainda, após diagnóstico e início de tratamento, o docente que conhece o PA pode auxiliar no processo terapêutico do aluno, diagnosticado e conduzido por especialistas, com atuação pedagógica eficaz e eficiente. Diante do exposto, esta pesquisa continua e o projeto passa a ter a intenção de promover a divulgação do Processamento Auditivo, junto aos profissionais que atuam no âmbito escolar por meio da inclusão deste assunto como disciplina no currículo dos cursos de formação e aprendizagem continuada de educadores, palestras e encontros dentro e fora da dependência da faculdade. 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