Avaliação logística e econômica para o uso de gás natural liquefeito em duas plantas industriais Felipe Santos Araújo (PUC-Rio) Silvio Hamacher (PUC-Rio) [email protected] Ana Beatriz Esteves Teixeira Quadros (PUC-Rio) [email protected] Resumo: Este artigo apresenta dois estudos de caso de Plantas Industriais que utilizam Óleo Combustível e/ou Carvão como fontes de energia para seus processos. Dada a grande relevância destes combustíveis em seus custos de manufatura e seu caráter estratégico para a estabilidade das operações, torna-se pertinente a busca por alternativas mais econômicas, com garantia de oferta no longo prazo e atendimento aos requisitos ambientais. As duas plantas estão localizadas em regiões brasileiras sem oferta de Gás Natural (GN) canalizado. Neste contexto, o Gás Natural Liquefeito (GNL) é a alternativa logística estudada neste trabalho. Por ser uma alternativa recente para o mercado brasileiro, busca-se conhecer suas características logísticas e avaliar a viabilidade econômica de sua implementação. Palavras-chave: Gás Natural Liquefeito; Matriz Energética; Logística; Gestão de Estoque. 1. Introdução O problema da segurança energética em âmbito mundial constitui-se há algum tempo em um dos principais desafios de empreendedores, governos e sociedade em geral. Tal desafio apresenta-se cada vez mais complexo à medida que restrições de oferta, problemas geopolíticos e constantes evoluções tecnológicas alteram os cenários energéticos mundiais. Em nível industrial, a globalização dos mercados também faz com que mesmo empreendimentos ditos consolidados e estáveis ao longo de muitos anos tenham absoluta necessidade de buscar alternativas mais eficientes, mais econômicas e menos poluentes. A penalidade para a acomodação pode ir desde a perda significativa de acesso a novos mercados até a própria sobrevivência do empreendimento. O objetivo deste artigo é a apresentação de dois estudos de caso de análise de viabilidade logística e econômica de investimentos em infra-estrutura e fluxo de processos adequados à substituição do Óleo Combustível pelo Gás Natural Liquefeito em plantas industriais localizadas no Brasil em regiões com ausência de disponibilidade de Gás Natural canalizado ou projeto com estimativa de operação em curto prazo. Através de refrigeração a -161 °C, o GN pode ser liquefeito e seu volume reduzido em 600 vezes em relação ao seu estado em condições ambiente. A partir da viabilização em larga escala desse processo, o GNL transportado em condições criogênicas pode ser levado desde uma planta de liquefação até qualquer destino que possua facilidade de regaseificação, onde o gás retorna ao seu estado original e torna-se apto para consumo. Os custos (planta de liquefação, regaseificação e transporte) são significantes, porém há espaço para retorno. 2. Revisão Bibliográfica Conforme Yergin (2006), o termo segurança energética surgiu na década de 1970 com mais de um sentido. Para os países predominantemente consumidores, a expressão possui a 1 conotação de garantia de suprimento de fontes energéticas necessárias à sua demanda; naturalmente a mesma expressão para países exportadores possui o sentido inverso, ou seja, segurança da demanda e acesso aos mercados e consumidores garantindo suas receitas. O trabalho detalha a importância da segurança energética para diversas regiões realçando a importância crescente do Gás Natural no contexto energético em relação ao petróleo. O autor indica que em 15 anos o volume de petróleo comercializado por oceanos deve aumentar em 75% e o volume de GNL transportado no mesmo período deve triplicar e alerta para eventuais gargalos para este aumento de demanda logística. Foss (2005) compara a histórica globalidade do mercado de óleo versus o regional mercado de GN. A autora alerta para a necessidade de investimento em tecnologia tanto na ponta de consumo quanto na produção e destaca a importância do GNL como potencial agente desta integração. Stoppard (2006) apresentou a importância a ser desempenhada pelo GNL no contexto da segurança energética. O autor reportou que após quarenta anos de existência, o mercado de GNL passa por um período de crescimento drástico, conduzindo a um inédito mercado interligado global de gás. O paradigma que se quebra dizia que o custo para transporte de GN por longas distâncias seria sempre alto demais. Há algum tempo este custo chegava a sete vezes o custo de transporte de quantidade equivalente de petróleo. Segundo o mesmo autor, as estatísticas de comércio internacional mostram que, em 2004, 48% de todo comércio de óleos ocorreu por transporte oceânico enquanto, apenas 7% do de GN ocorreu desta forma. 2.1 Gás Natural Os eventos que mais contribuem para o ganho de importância do GN são: novas exigências ambientais (o GN é um combustível mais limpo que OC e carvões); e descoberta de novos campos abundantes em GN tornando seu preço mais competitivo. Em um primeiro momento o GN era um combustível viável apenas para consumidores instalados próximo a campos de produção deste combustível. Alguns gasodutos de grandes distâncias chegaram a ser construídos, mas estes servem a uma quantidade limitada de mercados consumidores que apresentem volume de demanda que viabilize tal investimento. Neste contexto, a tecnologia de GNL vem atender mercados não supridos por gasodutos e que apresentem escala suficiente para investimento na liquefação, transporte e regaseificação. Os Estados Unidos, alguns países Europeus e, destacadamente, o Japão construíram boa parte de sua matriz enérgica usando desta tecnologia. Seus principais fornecedores são Indonésia, Líbia, Argélia, Trinidad & Tobago e Nigéria. Nos próximos anos diversos países aumentarão suas capacidades de liquefação de GN estendendo significativamente as opções de fornecedores (Real, 2005). Jensen (2003) discorre sobre o movimento de transformação do mercado de GNL do modelo altamente estruturado, com contratos de longo prazo com baixo risco para o típico mercado de commodity. Contratos de longo prazo, porém, devem continuar prevalecendo, especialmente para os compradores do pacífico onde a dependência do GNL é grande. Conforme apresenta o autor, o maior investimento na cadeia de suprimentos do GNL concentra-se na exploração e liquefação do Gás. Os principais meios de transporte do Gás Natural de seu ponto de origem até seu local de consumo são: gasodutos (em seu estado natural), navios criogênicos (sob forma liquefeita) e derivados (sob a forma de compostos derivados líquidos ou sólidos) (CTGÁS, 2006). Comparações sobre a eficiência no transporte de Gás Natural estão disponíveis em 2 bibliografia acadêmica. Lee (1999) propôs uma metodologia de alcance internacional para comparação no transporte de Gás Natural. A pesquisa considerou transporte através de GNL e por gasodutos e contou com fatores políticos, de mercado e regulatórios conforme vigência em cada país estudado. No Brasil, a oferta por Gás Natural nos últimos anos não acompanha sua demanda refletindo-se no aumento de importação do gás boliviano. Além disso, há uma concentração de oferta em apenas alguns estados do litoral brasileiro e um ponto de produção na floresta amazônica. Recentemente, novas descobertas de GN na Bacia de Campos e na Bacia de Santos mostram cenários de importante aumento da oferta deste gás produzido no Brasil. De uma maneira geral, pode-se dizer que a indústria do Sul e Sudeste do país possui um razoável equilíbrio de oferta e demanda no que se refere ao fornecimento de GN. No Nordeste, o GN está disponível abastecendo os estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Ceará. No Norte, o GN está disponível em Urucu (AM) e é levado por gasoduto até Manaus. Em 2007 a Petrobras deu início a investimentos em GNL, através da construção de dois terminais de regaseificação. A intenção é que o GNL seja usado, quando necessário, nas usinas termelétricas do país em caso de escassez de água para suprir a demanda energética. Os terminais estão localizados no Ceará (Porto de Pecém) e no Rio de Janeiro (Baía de Guanabara) e utilizam navios adaptados para realizar tanto o armazenamento quanto a regaseificação do produto a bordo. O terminal de Pecém entrou em operação em janeiro de 2009 e já recebeu duas cargas de GNL provenientes de Trinidad e Tobago. Nenhum artigo com a mesma estruturação proposta por este foi encontrado. Entretanto alguns autores abordaram o tema com objetivos que contribuem para o entendimento do assunto e suas condições de contorno, conforme apresentado abaixo. Neto e Sauer (2006) reportaram a viabilidade de investimento em infra-estrutura de GNL como meio de interligar o potencial excedente de oferta de GN na região Sudeste brasileira à carência do gás nas regiões Norte e Nordeste e, eventualmente, exportar GNL para outros consumidores no Atlântico. Após uma análise do mercado mundial de GNL, os autores fizeram uma análise do investimento que incluiria plantas de liquefação no Estado do Rio de Janeiro, estrutura portuária adequada, afretamento de navios metaneiros, plantas de regaseificação no Nordeste e todos os custos operacionais associados. Neste cenário, devido à vulnerabilidade do preço do Gás Natural no mercado internacional, o estudo concluiu que o investimento na interligação via gasodutos teria menores riscos associados. Chan et al. (2004) avaliaram as diferentes alternativas na implementação de um terminal de recebimento e regaseificação do GN na Califórnia. O trabalho teve grande ênfase em questões ambientais e impactos à comunidade no que diz respeito aos aspectos socioeconômicos e de segurança. A partir de três soluções propostas, cada cenário foi avaliado com relação aos aspectos mais relevantes identificados pelos autores. Finalmente, foi apresentada a solução mais adequada com relação a cada uma das condições de contorno do problema, sem contudo, indicar afirmativamente a melhor solução. Morais (2002) reportou o impacto ambiental da substituição do OC pelo GN pelos consumidores da região de Paulínea no interior de São Paulo. Através de dados e projeções sobre os impactos na qualidade do ar pela queima de cada um dos combustíveis, o autor mostrou que, no que se refere à emissão de dióxido de enxofre, a diferença de concentração do poluente no ar é bastante relevante, porém é pouco relevante para o dióxido de nitrogênio. Possivelmente o trabalho encontrado com mais sinergia com este artigo tenha sido o 3 artigo de Maculan e Silva Jr. (2006). Neste trabalho, os autores fizeram uma análise do balanço de oferta e demanda de Gás Natural na região nordeste do Brasil, comprovando seu efetivo déficit e, portanto, recomendando o investimento em infra-estrutura para importação de GNL. Na argumentação utilizada pelos autores, destaca-se a projeção de redução drástica de disponibilidade em todos os estados nordestinos até 2015. O artigo demonstra ainda que, até este mesmo ano, a demanda terá crescido em mais de 50% e a oferta sofrerá importante diminuição devido a curta vida de alguns campos e declínio de produção de outros. Analogamente ao objeto deste estudo, Real (2005) reportou o cenário e condições para instalação de plantas de produção de GNL na região do Cone Sul (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai). Através de uma análise de oferta e consumo de gás nestes países e observação sobre os movimentos globais de GNL, o autor demonstrou quais são os fatores necessários para a viabilização de projetos de liquefação na região. 3. Metodologia A utilização de Estudo de Caso é recomendada principalmente quando deseja-se responder “como” e “por que” um processo ocorre. Um estudo de caso passa basicamente pelo planejamento e execução dos componentes: (1) formulação do problema, (2) coleta de dados e (3) análise de dados. 3.1. Formulação do Problema A formulação do problema consiste em definir as perguntas a serem apresentadas pelo problema, as propostas de respostas, a(s) unidade(s) de estudo, a conexão dos dados com a proposta e o critério para interpretação dos dados. As perguntas estão relacionadas à tomada de decisão sobre a matriz energética de duas plantas intensivas em energia. A proposta de resposta surge a partir da crescente importância do GNL como estratégia de suprimento de energia no cenário mundial. As unidades de análise foram escolhidas por suas características de relevância de volume de demanda (somadas, as demandas de energia representam mais de 1% da demanda brasileira de energia através de combustíveis fósseis) e disponibilidade de dados. A conexão dos dados com a proposta apresentada deve garantir que os dados obtidos serão capazes de responder às perguntas do projeto. Neste projeto, os indicadores de análise de investimento serão os responsáveis por ilustrar as diferenças quantitativas entre as soluções atuais e propostas. 3.2. Coleta de Dados Estabelecido com antecedência um protocolo de coleta de dados contendo procedimentos e regras, a coleta dos dados iniciou-se com a elaboração das planilhas para representação dos cenários atuais e propostos. A partir dos campos de entrada das planilhas, identificaram-se as prováveis fontes de informação e planejou-se a abordagem de coleta. Realizou-se uma pesquisa prévia, visando maximizar conhecimento, com material disponível em internet e mídias periódicas. Por meio de networking profissional e acadêmico, identificaram-se os interlocutores adequados em cada organização. Tabelas foram entregues para mais fácil compreensão e menor esforço no preenchimento por parte dos entrevistados. Ao todo foram realizadas 9 entrevistas com gerentes e analistas de logística, projetos, vendas e suprimentos de empresas fornecedoras das soluções atuais e propostas e das plantas alvo dos estudos de caso. Algumas categorias de dados não disponíveis com os interlocutores mencionados foram obtidas a partir de pesquisa em trabalhos acadêmicos e periódicos. 4 3.3. Análise de Dados Com o objetivo de garantir a integridade dos dados utilizados, primeiramente buscouse mecanismos que possibilitassem validações de valores dentro de cada contexto. Os principais mecanismos utilizados foram (1) a comparação com dados públicos obtidos através de internet e material acadêmico e (2) o confronto direto de informações entre diferentes fontes argüidas. Além disso, o acesso direto aos indivíduos das empresas entrevistadas produziu imersão tal no assunto que possibilitou a conceituação de ordens de grandeza dos principais valores envolvidos. 3.4. Estudo das Configurações de Referência De forma a contemplar todas as parcelas relevantes de custo associadas à aquisição dos combustíveis atualmente empregados, buscou-se calcular os valores em unidade monetária por unidade de energia dos seguintes itens: • Custo de aquisição do Combustível. • Custo logístico: custo de embarque no porto de origem, frete relativo ao transporte marítimo da origem ao destino, custo de desembarque no porto de destino, manuseio interno do produto no terminal de recebimento, custo de armazenagem e de estoque. 3.5. Estudo das Configurações Propostas Para a apresentação dos cenários propostos faz-se necessário representar os dados indicados para uma eventual implementação destes projetos. Para tanto, utilizaram-se dados colhidos em entrevistas e artigos acadêmicos e profissionais que ora descrevem processos em operação e outras vezes projetam situações futuras. Os dados capturados refletem as características técnicas e comerciais de toda a cadeia de suprimentos do GNL: Extração, processamento e transporte; Processo de Liquefação; Armazenagem; Carregamento de Navio no porto de origem; Frete Marítimo; Descarga de Navio no porto de destino; Armazenagem; Processo de Regaseificação; Consumo. 4. Configuração de Referência Com o objetivo de contextualização do problema, as soluções atualmente implementadas para as duas plantas industriais alvo do estudo estão descritas abaixo. 4.1 Planta 1 A unidade industrial na região Norte do Brasil consome aproximadamente 750 mil toneladas de Óleo Combustível (OC) e 1,25 milhões de toneladas de carvão por ano como fonte de energia para suas operações. Somados, o custo do OC e do carvão representam 31% do custo total do produto. Projetos de expansão em andamento poderão conduzir a um aumento de produção de até 100%. A unidade está localizada próxima a um terminal marítimo. O OC é proveniente de refinarias do Sudeste do Brasil. O OC é transportado de terminais próximos às refinarias até terminais das regiões Nordeste e Norte através de navegação por cabotagem. Para recebimento de óleo combustível o terminal conta com tancagem para recebimento e armazenagem. Destes tanques partem dutos que interligam o terminal até a planta, que por sua vez possui tanques capazes de armazenar volume correspondente a 10 dias de estoque. Um conjunto de 7 calcinadores e 4 caldeiras são os responsáveis por, a partir do óleo, gerar a energia demandada pelo processo. Já o carvão é usualmente importado da Austrália, China, Rússia, Ucrânia, Colômbia 5 ou África do Sul. É carregado em navios de transporte de granel sólido. O pátio do porto de recebimento é capaz de estocar o produto que é então transferido para a planta através de correias transportadoras. A capacidade de estocagem de carvão na planta é de aproximadamente 9 dias de estoque. Já no pátio da planta, o carvão alimenta duas caldeiras que geram o restante da energia demandada pela operação. 4.2 Planta 2 A unidade industrial localizada na região Nordeste do Brasil, em local distante aproximadamente 1000 km do gasoduto mais próximo, consome aproximadamente 105 mil toneladas de Óleo Combustível, o que corresponde a 5% do custo total do produto acabado. A planta industrial está localizada nas proximidades de terminal marítimo. O OC tem como origem as mesmas refinarias do Sudeste, a navegação de cabotagem é o modal utilizado para transporte até o terminal marítimo próximo à planta de consumo. Tancagem para recebimento e armazenagem está instalada no porto. Dutos ligam o terminal até a planta. Após cada descarga de recebimento de OC no terminal bombeia-se para o parque de tanques da planta o volume que correspondente ao seu pedido de compra. Na planta, a capacidade de armazenagem é de 40 dias de estoque. O OC alimenta conjuntos de 60 queimadores que fornecem energia direta ao processo industrial. 4.3 Custos das Configurações de Referência A tabela 1 apresenta os principais custos das configurações de referência. TABELA 1 - Custos com Fornecimento de Combustíveis para Plantas 1 e 2. Planta 1 Custos OC USD/Kg Produto na Refinaria Operação de Embarque Frete até Porto de Consumo Operação de Recebimento Custo de Estoque Armazenagem Transferência Dutoviária do Terminal Marítmo até Planta Custo TOTAL = USD/(Btu x 6 Custos Carvão USD/Kg USD/(Btu x 6 0,06 0,01 0,04 0,01 0,00 0,02 10 ) 2,52 0,50 1,68 0,50 0,04 0,84 0,27 0,01 19,60 0,15 0,62 0,03 0,05 0,02 0,00 0,02 10 ) 16,35 0,66 1,33 0,43 0,04 0,53 0,01 0,74 Planta 2 Custo Total (51,28% Carvão e 48,72% OC) USD/Kg USD/(Btu x 6 0,33 0,02 0,04 0,01 0,00 0,02 10 ) 9,26 0,58 1,51 0,47 0,04 0,69 0,34 0,01 6,43 0,44 Custos OC USD/Kg USD/(Btu x 6 0,62 0,03 0,05 0,02 0,00 0,02 10 ) 16,35 0,66 1,19 0,43 0,07 0,53 0,31 0,01 0,27 12,85 0,74 19,51 Araújo (2007) apresenta a memória de cálculo dos custos acima mencionados. 5. Configuração Proposta 5.1 Configuração para as Plantas 1 e 2 A configuração proposta para ambas as plantas é semelhante. O GN deverá ser proveniente dos atuais produtores de GN no Atlântico com oferta de GNL. Pela proximidade, Trinidad e Tobago é o principal candidato, seguido de países da costa oeste africana, como Argélia, Nigéria e, em breve, Angola. Após a extração e processamento em Trinidad o Tobago, o GN é transportado para o complexo de liquefação, que além das plantas de liquefação abriga tanques criogênicos e terminais de carregamento marítimo. O primeiro investimento necessário seria nos terminais marítimos de recebimento. Dutos com revestimento, válvulas e bombas especiais deveriam ser instalados para descarga 6 do líquido em condições criogênicas. Também seria necessária a compra de tanques criogênicos ideais para este armazenamento de GNL. As plantas de regaseificação seriam instaladas ao lado dos tanques. O processo de regaseificação seria utilizado apenas no instante anterior à transferência do produto para consumo. Gasodutos seriam construídos para o transporte do GN das plantas de regaseificação diretamente para terminais de distribuição nas plantas, que teriam como função direcionar o gás para cada um dos equipamentos que os consumiria. Em cada um dos equipamentos, seriam necessários investimentos para conversão de tecnologia de queima que permita a queima do GN para a geração da energia requerida. Sempre que tecnicamente possível, deve-se optar pela implementação das conversões de forma a permitir o consumo o GN sem impedir a utilização do combustível anteriormente utilizado. 5.2 Configuração de Logística de GNL integrada para Plantas 1 e 2 Outra configuração proposta consiste em uma alternativa logística de fornecimento integrado para as Plantas 1 e 2. Desta forma, possibilita-se uma alternativa com menores tamanhos de lote por unidade, aumento de freqüência de recebimentos e diminuição dos estoques. Para determinação da distribuição de volumes para cada navio por Planta foram construídos cenários com indicação de diferentes números de navios por ano para cada destino. A Tabela 2 apresenta o resumo dos resultados obtidos para cada cenário. TABELA 2 - Cenários de Logística de GNL integrada para Plantas 1 e 2. (navios por ano) Navios apenas Navios apenas Navios para Cenários para Planta 1 para Planta 2 Planta 1 e 2 19,55 1,33 A 18,88 2,00 B 14,88 6,00 C 9,88 11,00 D 3,88 17,00 E 20,88 F 3 Custo Total GNL (MM USD) m de GNL Volume por Navio Volume por Navio para Planta 1 para Planta 2 Planta 1 Planta 2 Total 629,50 43,75 673,24 48.351,16 96.656,98 629,42 43,32 672,74 112.783,72 32.218,99 629,42 43,70 673,12 127.427,48 17.574,00 629,42 45,21 674,64 133.629,55 11.371,41 629,42 47,21 676,64 135.742,45 9.258,33 629,42 48,53 677,96 O cenário A corresponde ao proposto no item 5.1, ou seja, nenhum navio fazendo entrega nas duas Plantas. O cenário F corresponde à logística de entrega em que todos os navios sempre passam pelos dois destinos. Os cenários B, C, D e E são intermediários, alguns navios entregando apenas para a Planta 1 e outros fazendo parada nos dois portos. Conforme demonstra a Figura 1, o cenário ótimo foi obtido pelo menor valor de custo total com aquisição de GNL obtido na curva que mostra sua variação de acordo com o número de navios compartilhados. 7 FIGURA 1 – Cenários de Logística de GNL integrada para Plantas 1 e 2. Conclui-se com esta análise que os ganhos com a sinergia na logística de entrega de GNL para as Plantas 1 e 2 seriam marginais para a Planta 1 (0,012% de redução de custos) e pouco expressivos para a Planta 2 (1,34% de redução de custos). Este pequeno ganho demonstra que, nos casos estudados, o aumento dos custos de descarga compensa fortemente a redução de custos de armazenagem e estoque. 5.3 Custos das Configurações Propostas A tabela 3 apresenta os principais custos das configurações propostas. TABELA 3 - Custos com Fornecimento de GNL para as Plantas 1 e 2 com e sem integração logística. Custos GNL sem Integração Logística Custos GNL com Integração Logística Planta 1 Planta 2 Planta 1 Planta 2 USD/(Btu x USD/(Btu x USD/(Btu x USD/(Btu x USD/Kg USD/Kg USD/Kg USD/Kg 6 6 6 6 10 ) 10 ) 10 ) 10 ) Produto na Planta de Liquefação Frete Marítmo (inclui Seguro e taxas portuárias) Operação de Recebimento Custo de Estoque Armazenagem (inclusive energia) 0,2389 7,00 0,2389 7,00 0,2389 7,00 0,2389 7,00 0,0067 0,20 0,0067 0,20 0,0067 0,20 0,0078 0,23 0,0200 0,0020 0,59 0,06 0,0200 0,0130 0,59 0,38 0,0203 0,0019 0,59 0,06 0,0249 0,0065 0,73 0,19 0,0100 0,29 0,0100 0,29 0,0097 0,29 0,0049 0,14 Custo de Transporte do Porto 0,0010 à Planta de Regaseificação 0,03 0,0010 0,03 0,0010 0,03 0,0010 0,03 0,0800 2,34 0,0800 2,34 0,0800 2,34 0,0800 2,34 0,0050 0,15 0,0050 0,15 0,0050 0,15 0,0050 0,15 0,0026 0,3662 0,08 10,74 0,0026 0,3772 0,08 11,06 0,0026 0,3661 0,08 10,74 0,0031 0,3721 0,09 10,90 Operação de Regaseificação Transporte Planta de Regaseificação ao Pto de Consumo Perdas no Transporte Custo TOTAL do GNL= Para todos os cenários estudados, demonstra-se que as soluções propostas são viáveis e tendem a trazer benefícios econômicos. A solução que otimiza a logística de entrega de GNL apresenta menores custos que as soluções de carga dedicada. Entretanto, os benefícios econômicos são relativamente pequenos para um aumento de complexidade logística significativo. Por exemplo, em situações comuns de variação de consumo em qualquer das 8 plantas, a reprogramação de cargas se limitaria a alteração de datas de carregamento dos navios na origem. Com a logística integrada, estas decisões teriam que considerar também as necessidades da outra Planta podendo gerar requisições conflituosas e custos não planejados. Araújo (2007) apresenta a memória de cálculo dos custos acima mencionados. 6. Resultados As figuras 2 e 3 ilustram o resumo dos custos totais calculados para os cenários apresentados. Observa-se que a principal diferença de custos entre os combustíveis está no custo de produto. Nota-se também a competitividade do custo de transporte de GNL versus o custo de transporte dos demais combustíveis estudados. FIGURA 2 – Abertura de custos por combustível – Planta 1. FIGURA 3 – Abertura de custos por combustível – Planta 2. 6.1. Análise de Investimento Utilizando-se as premissas de custos apresentadas anteriormente, nos “cenários base” de análise obtem-se os indicadores de análise de investimento conforme apresentado na Tabela 4. Os indicadores de análise de investimento apresentados demonstram que para ambas as plantas a configuração proposta tende a ser viável e gerar retorno em prazo relativamente curto. Nota-se que a Planta 1 apresenta melhores indicadores que a Planta 2. O principal fator para esta maior viabilidade na Planta 1 é sua elevada escala que proporciona rápido retorno por redução de custos com OC. TABELA 4 - Análise de Investimento. 9 Sem Logística Integrada Com Logística Integrada Planta 1 Planta 2 Planta 1 Planta 2 Redução de Custo Operacional (R$ MM/ano) 226,13 65,25 226,27 66,39 Payback Simples (anos) 2,18 3,77 2,18 3,7 Payback Descontado (anos) 2,69 5,32 2,69 5,19 Taxa de Retorno após 10 anos 44,74% 23,27% 44,77% 23,82% Na Planta 1, ainda que o Carvão tenha menor custo que o GNL, os benefícios do GNL em relação ao OC são tão pronunciados que compensam esta diferença. Na Planta 2, uma vez que o OC é o único combustível atual, 100% da conversão é positiva. Entretanto, a demanda é relativamente pequena o que faz com que o retorno sobre o investimento ocorra em mais tempo (se a demanda fosse da ordem de grandeza da Planta 1 o retorno ocorreria com maior rapidez). Para a solução de logística integrada, nota-se que o benefício para a Planta 2 é proporcionalmente maior do que para a Planta 1. Isto se deve principalmente ao efeito de aumento de escala ser relevante para aquela Planta com menor demanda em valores absolutos. 6.2. Análise de Sensibilidade Para verificar a validade das comparações acima em diferentes cenários, apresentamse análises de sensibilidade considerando variação das seguintes premissas: investimento na planta de regaseificação, demanda de óleo combustível, tamanho de lote de GNL, taxa de câmbio, preço do GNL, preço do OC, preço do carvão e custo de capital. As variáveis escolhidas para a análise de sensibilidade foram definidas pelos critérios de relevância na contextualização do cenário total, incerteza no médio-longo prazo, efetivamente maior variância entre possíveis projetos e ilustração do efeito de escala de consumo ou lote. Os valores de cada grandeza foram variados para valores maiores e menores do que aqueles representados nos “cenários base”. Os valores limites de cada análise foram definidos sempre com base em um dos seguintes critérios: maior valor de referência encontrado na coleta de dados, menor valor de referência encontrado na coleta de dados, 130% do maior valor de referência encontrado na coleta de dados, 70% do menor valor de referência encontrado na coleta de dados. Cumpre comentar que, devido aos diferentes níveis de incerteza de cada variável, não foi adotado um critério único de variação de forma a se evitar apresentação de cenários por demais distantes da realidade. A tabela 5 apresenta o resumo dos resultados: TABELA 5 - Análise de Sensibilidade – Plantas 1 e 2. 10 Cenários de Variação Valores Unidade 100 175 250 325 400 570000 660000 Demanda de OC 750000 840000 930000 80000 110000 Tamanho de Lote GNL 125000 145000 170000 1,5 1,75 Câmbio 1,95 2,05 2,2 5,21 6,3 Preço do GNL 7 7,5 7,85 0,95 1,03 Preço do OC 1,1 1,18 1,25 30 45 Preço do Carvão 60 70 80 6% 9% Custo de Capital 12% 15% 18% Investimento na Planta de Regaseificação MM USD ton/ano m3 R$ / USD USD / 6) (Btux10 R$/Kg USD/ton % aa Planta 1 Payback Taxa de Descontado Retorno em 10 anos (%) (anos) 0,99 112,8% 1,8 64,8% 2,69 44,7% 3,67 33,4% 4,77 25,9% 6,8 18,1% 3,83 32,0% 2,69 44,7% 2,05 57,0% 1,69 69,0% 2,94 41,1% 2,78 43,4% 2,73 44,1% 2,69 44,7% 2,65 45,4% 1,11 102,2% 1,74 67,0% 2,69 44,7% 3,51 34,9% 5,94 20,8% 1,31 87,6% 1,9 61,7% 2,69 44,7% 3,82 32,1% 5,47 22,6% 7,55 16,3% 3,93 31,2% 2,69 44,7% 2,03 57,8% 1,65 70,5% 4,35 28,4% 3,32 36,7% 2,69 44,7% 2,39 50,0% 2,14 55,2% 2,4 45,0% 2,54 44,9% 2,69 44,7% 2,85 44,6% 3,03 44,5% Valores Unidade 65 95 125 MM USD 155 185 75000 90000 105000 ton/ano 120000 135000 80000 110000 m3 125000 145000 170000 1,5 1,75 1,95 R$ / USD 2,05 2,2 5,21 6,3 USD / 7 6) (Btux10 7,5 7,85 0,94 1 R$/Kg 1,1 1,2 1,3 6% 9% % aa 12% 15% 18% Planta 2 Payback Taxa de Descontado Retorno em 10 (anos) anos (%) 2,4 49,8% 3,74 32,8% 5,32 23,3% 7,25 17,0% 9,72 12,4% 9,06 13,4% 6,68 18,5% 5,32 23,3% 4,43 27,9% 3,8 32,3% 5,33 23,2% 5,3 23,3% 5,31 23,3% 5,32 23,3% 5,35 23,2% 2,94 41,1% 4,05 30,3% 5,32 23,3% 6,14 20,1% 7,76 15,8% 4,07 30,2% 4,75 26,0% 5,32 23,3% 5,82 21,3% 6,23 19,8% 8,78 13,8% 7,03 17,5% 5,32 23,3% 4,29 28,7% 3,6 34,0% 4,31 23,8% 4,76 23,6% 5,32 23,3% 6,05 23,0% 7,09 22,7% 7. Considerações Finais Conforme descrito no início deste artigo, a apresentação dos estudos de caso teve por objetivo verificar a viabilidade de alteração na matriz energética de plantas industriais. O estudo demonstrou que em cenários base o projeto poderia ser viável. A apresentação dos cenários propostos indicou que todos os recursos para sua implementação são disponíveis e apresentam grau relativamente elevado de difusão na indústria fornecedora. Portanto, em termos de infra-estrutura e engenharia não há qualquer restrição de natureza tecnológica. Cabe ressaltar apenas a observação de queda de custos impulsionada pelo ganho de escala e desenvolvimento de novas tecnologias. Espera-se a manutenção desta tendência de redução de custos nos próximos anos. A avaliação dos indicadores de análise de investimento indica viabilidade para o cenário base estudado. Utilizou-se metodologia convencional para esta análise e buscou-se resposta ao problema mesmo com variáveis diferentes das mais freqüentemente encontradas nas referências bibliográficas. A análise de sensibilidade agrega importante facilidade de visualização do impacto da variação de inputs ao cenário estudado. Desta forma, a análise de 11 sensibilidade proporciona ao leitor referências que o ajudariam em extrapolações básicas para diferentes problemas. Comparando os resultados obtidos nas duas plantas, nota-se que o principal fator que torna os indicadores da Planta 1 mais atrativos que os da Planta 2 é a maior escala da primeira em relação à segunda. O estudo mostra que a escala da Planta 1 e o retorno sobre a substituição do Óleo Combustível são tão relevantes que ainda que o GNL tenha maior custo que o Carvão, a substituição integral da matriz energética é viável com retorno em curto prazo. A solução de logística integrada no fornecimento de GNL para as Plantas 1 e 2 apresentou os esperados efeitos de redução de custos para ambas as plantas. Uma conclusão bastante preliminar do trabalho também indica que atualmente o Carvão seria a solução energética mais econômica e apontaria para um estudo de viabilidade de conversão de toda a Planta 1 para este combustível. Entretanto, a proposta deste ensaio desde seu início foi avaliar a viabilidade de utilização do GNL enquanto uma fonte de crescente importância (disponibilidade no cenário mundial) e baixo nível de emissão de poluentes. O Carvão, ao contrário, embora continue a ser bastante importante na matriz energética mundial nas próximas décadas, não se encontra em cenário de pronunciado aumento de oferta nem apresenta os atributos ambientais característicos da queima do GN. Referências ARAÚJO, F. S. Avaliação Logística e Econômica para o Uso de Gás Natural Liquefeito em duas Plantas Industriais. 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