PDF Português - Revista Adolescência e Saúde

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ARTIGO ORIGINAL
Michel Wassersten1
José Antônio Caldas
Teixeira2
33
Morte súbita: avaliação pré-esportiva
das principais causas cardíacas nãotraumáticas em adolescentes e jovens
adultos
Sudden death: pre-sportive evaluation of the main non-traumatic cardiac
causes in adolescents and young adults
RESUMO
A avaliação pré-participação cardiológica é recomendada para todos os indivíduos que praticam exercícios físicos e visa detectar
possíveis atletas cardiopatas propensos a desenvolverem episódio de morte súbita. Por sua vez, o treinamento desportivo produz
adaptações fisiológicas no atleta que necessitam de correta interpretação durante o exame físico. Uma avaliação pré-participação
detalhada, realizada por profissionais especializados, com enfoque no sistema cardiovascular, garante a integridade do atleta. O artigo
aborda os pontos mais relevantes da anamnese e do exame físico do atleta, enfatizando os principais sinais e sintomas que levantam
suspeita para doença cardíaca estrutural. Buscamos pesquisar, nas principais diretrizes e publicações, as recomendações atuais para o
screening de cardiopatias, assim como as manifestações clínicas mais importantes de cada doença. Identificamos e relatamos os achados mais importantes das principais causas cardíacas estruturais não-traumáticas de morte súbita em atletas jovens: cardiomiopatia
hipertrófica, origem anômala de coronárias, miocardite, síndrome de Marfan, displasia arritmogênica de ventrículo direito, estenose
aórtica e prolapso de valva mitral.
UNITERMOS
Avaliação pré-participação; morte súbita cardíaca; atletas jovens; semiologia cardiovascular
ABSTRACT
The pre-participation cardiovascular screening evaluation is recommended for all individuals who practice physical exercises and aims to
detect possible cardiac pathology associated with sudden death. Competitive sports training produces physiologic adaptations in the athlete
which necessitate correct interpretation during physical examination. A detailed pre-participation evaluation, performed by specialized
professionals focusing on the cardiovascular system, guarantees the integrity of the athlete. This article focuses on the main points of the
patient history and the physical examination of the athlete, emphasizing the primary signs and symptoms, which may raise suspicion of
structural cardiac disease. We searched the principal directives and publications and the current screening recommendations for cardiac
pathologies, as well as the primary clinical manifestations of each disease. We identified and related the most important findings related to
the non-traumatic cardiac structural causes of sudden death in young athletes: hypertrophic cardiomyopathy, congenital coronary artery
disease, myocarditis, Marfan’s syndrome, arrhythmogenic right ventricular displasia, aortic stenosis and mitral valve prolapse.
KEY WORDS
Pre-participation screening evaluation; sudden cardiac death; young athletes, cardiovascular semiology
Médico especialista em Medicina do Exercício e do Esporte.
Mestre em Cardiologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF); mestre em
Educação Física pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); professor da
disciplina de Semiologia Médica na UFF; coordenador da Disciplina de Medicina do
Exercício e do Esporte na UFF; presidente da Sociedade de Medicina do Exercício do Rio
de Janeiro (SMERJ); diretor científico do Departamento de Ergometria, Reabilitação
Cardíaca e Cardiologia Desportiva da Sociedade de Cardiologia do Estado do Rio de
Janeiro (DERCAD/SOCERJ).
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Adolescência & Saúde
volume 5 ■ nº 3 ■ outubro 2008
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Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
INTRODUÇÃO
nesse princípio, realizamos este estudo com o objetivo de discutir a abordagem semiótica (anamnese e exame físico) da avaliação pré-participação
em jovens atletas, enfatizando o exame do sistema
cardiovascular e as principais causas cardíacas estruturais não-traumáticas de MS.
A morte súbita (MS) em atletas é um evento
relativamente raro(27), sendo sua real incidência ainda desconhecida. Segundo Pérez e Fernández(18),
a MS foi estimada em 1/333 mil homens/ano.
Maron(13), por sua vez, estabeleceu uma incidência
de 1/200 mil por ano em jovens atletas.
Um importante passo para prevenir MS relacionada com a prática de atividades físicas começa
com uma boa avaliação pré-participação. A avaliação pré-participação é recomendada para todos os
indivíduos que praticam exercícios físicos (competitivo ou não) e tem como principal objetivo detectar
condições que possam ter no exercício físico um gatilho para o desencadeamento de eventos graves(14,
15, 21)
.
A maioria das vítimas de MS no esporte é
portadora de cardiopatia conhecida ou não-diagnosticada, que pode ser detectada na avaliação
pré-participação. Dessa forma, observa-se a importância de rever os aspectos semiológicos das
principais causas de MS não-traumática. Com base
CONCEITO E MECANISMOS
DE MORTE SÚBITA
A MS relacionada com o exercício pode ser definida como a morte que ocorre de modo inesperado,
instantaneamente ou não. Outra definição utilizada
seria a da morte que ocorre de seis a 24 horas após
a prática de atividades físico-desportivas(21). Já Zipes
e Wellens(28) definem MS como aquela que ocorre
menos de uma hora após o aparecimento do primeiro sintoma em indivíduo previamente saudável.
O exercício produz modificações hemodinâmicas e eletrofisiológicas no sistema cardiovascular
(Figura). Em situações de hipertrofia significativa,
Estresse agudo do exercício
Pós-exercício imediato
Interrupção abrupta do
exercício
Wassersten & Teixeira
↑ Atividade simpática
Vasodilatação arterial
Distúrbio
Na+ / k+
↑ Catecolaminas
↓ Estimulação vagal
↓ Retorno venoso
↑ FC e PAS
↓ Débito cardíaco
↑ MVO2
↓ Pressão arterial
↓ Perfusão coronariana
Isquemia
↑ Irritabilidade miocárdica
Alteração da velocidade de
condução
Alteração/despolarização/repolarização
Aumento da atividade ectópica
ventricular
Figura 1 – Respostas fisiológicas e mecanismos prováveis de morte súbita(10)
FC: freqüência cardíaca; PAS: pressão arterial sistólica; MVO2: consumo de oxigênio pelo miocárdio.
volume 5 ■ nº 3 ■ outubro 2008
Adolescência & Saúde
Wassersten & Teixeira anomalias estruturais ou coronariopatia, o atleta
corre o risco de sofrer isquemia miocárdica, infarto
e arritmias. Além disso, o exercício promove modificações elétricas, por meio de atividade simpática,
mediante descargas adrenérgicas. A arritmia mais
comum é a fibrilação ventricular(19, 27, 28).
Outros mecanismos envolvidos são as obstruções do fluxo anterógrado do ventrículo esquerdo,
acarretando síncope e MS, e o menor fluxo coronariano em decorrência de ruptura aórtica(19) .
EPIDEMIOLOGIA DA MORTE SÚBITA
A maioria dos estudos aponta a cardiomiopatia hipertrófica (CMH) como a principal causa de
MS em atletas adolescentes e jovens adultos com
menos de 35 anos de idade, seguida por concussão
cardíaca, origem anômala de artérias coronárias,
hipertrofia ventricular esquerda (HVE) idiopática,
miocardite e síndrome de Marfan (ruptura de aneurisma aórtico). Outras causas menos prevalentes são
apresentadas na Tabela 1(8, 14, 27). Em nosso país, o
traço falcêmico e a doença de Chagas são prevalentes e representam potenciais causas de MS(3, 21).
Também podemos citar cardiopatias não-estruturais responsáveis por arritmias, como taquicardia ventricular catecolaminérgica polimórfica
(TVPC) e as síndromes do QT longo (SQTL), de
Brugada e de Wolff-Parkinson-White(14, 21, 28).
CONCEITO DE AVALIAÇÃO PRÉPARTICIPAÇÃO
O exame médico do atleta tem como base a
necessidade de se estabelecer a capacidade cardiovascular de tolerar um determinado exercício físico.
Isso depende da presença ou não de cardiopatia ou
da natureza do esporte praticado. A desqualificação (temporária ou permanente) deve ser fundamentada nas recomendações da 36ª Conferência
de Bethesda (2005)(1, 8, 15).
Segundo recomendações da Diretriz da Socie–
dade Brasileira de Medicina do Esporte (SBME)(21)
sobre MS no exercício e no esporte, a avaliação
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Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
Tabela 1
CAUSAS DE MORTE SÚBITA EM ATLETAS JOVENS(13)
n
%
CMH
102
26,4
Concussão cardíaca
77
19,9
Origem anômala de artéria
coronariana
53
13,7
HVE Idiopática
29
7,5
Miocardite
20
5,2
Síndrome de Marfan
12
3,1
Displasia arritmogênica de VD
11
2,8
Ponte miocárdica
11
2,8
Estenose aórtica
10
2,6
DAC
10
2,6
Cardiomiopatia dilatada
9
2,3
PVM
9
2,3
Asma (ou outra condição
pulmonar)
8
2,1
Hipertermia
6
1,6
Drogas
4
1
Outras causas
cardiovasculares
4
1
SQTL
3
0,8
Sarcoidose cardíaca
3
0,8
AVC
3
0,8
CMH: cardiomiopatia hipertrófica; HVE: hipertrofia ventricular esquerda; VD: ventrículo
direito; DAC: doença arterial coronariana; PVM: prolapso da valva mitral; SQTL: síndrome
do QT longo; AVC: acidente vascular cerebral.
pré-participação sistemática e periódica é a estratégia mais eficiente para prevenir a MS. Em seu
nível mais básico (anamnese e exame físico), deve
ser realizada, por médico com experiência na área,
em todos os indivíduos que praticam exercício e
esportes(21). Pelliccia(17) relata redução considerável
da incidência de MS em atletas jovens submetidos
à avaliação pré-participação.
ANAMNESE DO ATLETA
A avaliação pré-participação deve ser iniciada
com história clínica (anamnese) a mais completa
possível. É claro que, em razão dos propósitos mais
específicos da nossa avaliação pré-participação, vavolume 5 ■ nº 3 ■ outubro 2008
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Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
lorizaremos os antecedentes pessoais de MS, bem
como os antecedentes desportivos e a história cardíaca do atleta(1, 16, 20).
Os atletas mais novos, devido às dificuldades
de se obter informações precisas e, sobretudo, considerando o aspecto legal, devem ser acompanhados, sempre que possível, pelos seus responsáveis
durante a avaliação(10).
Os antecedentes pessoais são investigados
por meio da história patológica pregressa minuciosa. Perguntaremos sobre as principais doenças
comuns na infância, especialmente a difteria, devido à possível associação com miocardite, assim
como sobre faringites de repetição e sua potencial
evolução com febre reumática. Surdez congênita
e possíveis malformações ósseas e renais também
devem ser investigadas, pela associação com SQTL.
É necessário indagar se o paciente é portador de hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes mellitus
(DM) e, principalmente, asma (passada ou presente) devido à alta prevalência na população.
Devemos ainda perguntar sobre a ocorrência
de cefaléia, internações prévias, transfusões, infecções graves, infecção viral recente (possível associação com miocardite), cirurgias prévias, traumas,
acidentes, fraturas, doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), hérnias, medicamentos em uso (atentar para o doping ou o uso de anabolizantes), alergias (remédios, insetos e alimentos) e imunizações.
Relatos de sopro cardíaco e convulsões também
devem ser valorizados(10, 16, 20).
Todo atleta deve ser questionado quanto à
presença de traço falcêmico ou anemia falciforme
na família. Essas mesmas recomendações estendem-se para doença de Chagas de qualquer indivíduo com história epidemiológica positiva(3, 21).
Fatores de risco para eventos cardiovasculares como tabagismo e dislipidemia são abordados,
assim como hábitos e vícios (etilismo, esteróides
anabolizantes, suplementos nutricionais e drogas
ilícitas)(1, 4, 10, 16). O uso de esteróides anabolizantes
e cocaína estão associados a HAS, infarto agudo do
miocárdio (IAM) e MS(13, 14, 21).
Hábitos sexuais são de suma importância na
presença de queixas ou sinais de DST ao exame
físico. A presença de sífilis (que pode gerar o apavolume 5 ■ nº 3 ■ outubro 2008
Wassersten & Teixeira
recimento de lesões da valva aorta ou da própria
aorta, ocasionando MS durante o exercício)(21) tem
sido negligenciada e subnotificada.
A pesquisa de MS familial em atletas jovens
é fundamental e talvez represente o ponto mais
importante dessa etapa. Deve-se questionar sobre a existência de MS precoce em familiares
próximos (menos de 50 anos), as circunstâncias
desencadeantes, a relação com esforço físico e a
idade em que o evento ocorreu(1, 17, 21, 27). A história
familiar de síndrome de Marfan é de suma importância em casos de suspeita dessa síndrome, o mesmo podendo ser dito em relação à CMH(10, 21, 27).
O atleta queixa-se pouco, portanto uma consulta motivada por um sintoma relacionado com
a atividade esportiva sempre deve ser considerada
relevante(1).
A anamnese deve visar, sobretudo, identificar
atletas sintomáticos e aqueles com história familiar
de cardiopatia congênita.
Os sintomas que sugerem problemas cardíacos
no atleta são:
• síncope,
• dor torácica
• palpitação
• dispnéia
• fadiga desproporcional ao esforço realizado ou aos
seus pares de treino(19).
SINAIS E SINTOMAS MAIS
FREQÜENTES
No atleta, a síncope ou pré-síncope pode ser
sugestiva de cardiopatia. Assim, o médico responsável tem a obrigação de excluir qualquer etiologia
cardíaca(10, 12, 13). Quando a síncope é identificada
como de causa cardíaca, o risco de MS aumenta
muito, com uma curva de sobrevida menor em
relação às outras causas de síncope(23). Durante a
investigação da síncope, o atleta deve ser afastado
das competições(10).
Para dor torácica relacionada com esforço físico, em princípio, deve-se suspeitar de origem cardíaca. Nesse caso, pergunte sobre o tipo da dor, se
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Wassersten & Teixeira Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
ocorre após ou durante a atividade física(1). Na maioria das vezes, a dor torácica no atleta é benigna e é
conseqüência de um desconforto na parede torácica
ou de uma costocondrite(19). Em alguns casos pode
ser manifestação de asma induzida pelo esforço(10).
A palpitação é queixa freqüente, sendo geralmente um sintoma benigno originário de um distúrbio de ritmo supraventricular(1, 11). O tabagismo
e o consumo de café, álcool, suplementos e drogas
ilícitas podem causar palpitações(10).
A dispnéia de esforço pode ser de origem cardíaca, mas também é causada por diversos fatores.
Portanto requer investigação complementar, pois
pode ser causada por asma induzida pelo exercício,
rinite alérgica e até por um condicionamento físico
abaixo do ideal(19).
A fadiga pode ser manifestação de inúmeras
causas de MS, mas geralmente está associada a
distúrbios tireoidianos, anemia, doenças sistêmicas, febre e treinamento excessivo (overtraining)
não percebido ou omitido(1, 27, 19). Astenia, cansaço e fadiga são sinônimos. Portanto representam
a mesma sintomatologia: sensação de debilidade
física e falta de energia(11).
As cefaléias de esforço são relacionadas com a
enxaqueca simples, mas devemos excluir a possibilidade de hipertensão arterial de esforço sintomática. Malformações vasculares cerebrais geralmente
não apresentam sintomas, entretanto cefaléias e/
ou enxaquecas importantes, com relato familiar de
malformações desse tipo, indicam risco maior de
ruptura de aneurisma congênito(1).
Sabemos que a boa investigação de um sintoma-guia abre caminho para um bom exame físico.
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EXAME FÍSICO DO ATLETA
O exame físico deve ser detalhado e, evidentemente, com ênfase no sistema cardiovascular e
na identificação de cardiopatias. Dessa maneira,
devemos atentar para as quatro etapas a seguir:
• aferição da pressão arterial (PA);
• avaliação dos pulsos radiais e femorais;
• ausculta cardíaca;
• pesquisa dos estigmas da síndrome de Marfan(10).
A medida da PA em repouso deve ser obrigatória em qualquer avaliação física, e as recomendações podem ser encontradas no The Seventh Report
of the Joint National Committee on Prevention,
Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood
Pressure (JNC 7)(25) ou na V Diretriz Brasileira de
HAS(22). Deve-se ressaltar a importância da medida
da PA em crianças e adolescentes, que deve ser analisada por meio do percentil correspondente para
idade, sexo e altura. O tamanho e a largura do manguito também devem ser adaptados à idade(22, 25).
O pulso radial é utilizado convenientemente para determinar a freqüência, o ritmo cardíaco
e as morfologias típicas. A palpação simultânea
dos pulsos radial e femoral é fundamental para
afastar coarctação da aorta. A redução da amplitude ou o atraso entre esses dois pulsos desperta
atenção para essa entidade, bem como a aferição da PA, devendo ser sempre suspeitada em
crianças e adolescentes com níveis pressóricos
elevados(10, 16, 19, 20).
Pulsos irregulares podem significar arritmias
ou distúrbios de condução(10, 16, 19, 20, 27). As principais alterações de pulso arterial estão apresentadas
na Tabela 2.
Segundo Rich(19), as seguintes questões são consideradas obrigatórias na anamnese:
• Você já desmaiou durante ou após o exercício?
• Já teve vertigem (tonteira) durante ou após o
exercício?
• Já teve dor torácica durante ou após o exercício?
• Se cansa mais rapidamente do que seus companheiros durante o exercício?
• Tem ou teve pressão alta (PA)?
• Já lhe disseram que você tem sopro cardíaco?
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• Já teve palpitações?
• Alguém na sua família morreu devido a problemas cardíacos ou MS antes dos 50 anos?
• Teve alguma infecção viral recente?
• Atualmente usa ou já usou medicamentos?
• Algum médico já proibiu sua participação nos
esportes por alguma razão cardíaca?
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Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
Wassersten & Teixeira
Tabela 2
PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DO PULSO ARTERIAL E SIGNIFICADOS CLÍNICOS(10)
Pulso arterial
Característica
Condições clínicas
Pulso em “martelo d’água” ou pulso de
Corrigan
Grande amplitude e rápidas ascensão e
queda
CMH
Insuficiência aórtica
Insuficiência mitral grave
Ducto arterioso patente
Pulso parvus e tardus
Baixa amplitude e lenta ascensão
Estenose aórtica
Insuficiência cardíaca (baixo débito
cardíaco)
Pulso alternans (alternante)
Alternância entre baixa e grande amplitude
Disfunção sistólica de VE (miocardite)
Pulso bisferiens (bífido)
Dois picos sistólicos
Insuficiência aórtica (com ou sem estenose
aórtica)
CMH
Pulso dicrótico
Pico sistólico e um pico menor diastólico
CMH (difícil palpação)
Pulso fino (filiforme)
Baixa amplitude associada a hipotensão
arterial com pressão convergente
Estenose aórtica grave
VE: ventrículo esquerdo; CMH: cardiomiopatia hipertrófica.
A ausculta do coração deve ser feita com o
atleta em posições supina, sentada, em pé e/ou em
decúbito lateral esquerdo. É fundamental diferenciar os sopros patológicos dos benignos(1, 10, 19, 27).
Thompson (2004)(27) sugere ausculta sistemática no
atleta: primeira bulha cardíaca (B1), segunda bulha
cardíaca (B2), sons extras na sístole e na diástole,
sopros diastólicos e, por último, os sopros sistólicos.
O desdobramento de B1 deve ser diferenciado
dos ruídos de ejeção sistólicos, do clique sistólico do
prolapso da valva mitral (PVM) e da quarta bulha
cardíaca (B4)(11). A intensidade de B1 é diretamente
relacionada com o grau de separação dos folhetos
valvares no início da sístole. Ou seja, quanto maior
for a distância entre os folhetos, mais brusca será
a desaceleração da coluna de sangue nos folhetos
e mais intensa será B1 (hiperfonese de B1). Se os
folhetos estiverem próximos no início da sístole,
ocorrerá hipofonese de B1(11, 27).
A intensidade de B1 pode variar entres
os batimentos cardíacos quando há bloqueio
atrioventricular de segundo grau do tipo I (BAV
2° grau tipo I), em que ocorre o fenômeno de
Wenckebach, caracterizado por aumento progressivo do intervalo PR, até o momento do bloqueio,
e posterior normalização(11).
Outros fatores que podem influenciar a hipovolume 5 ■ nº 3 ■ outubro 2008
fonese de B1 são: contratilidade e volume ventricular esquerdo (VE), espessamento valvar, encurtamento de cordoalha e retração dos músculos
papilares, fibrose e calcificação valvar, e hiperestimulação adrenérgica(11).
A segunda bulha cardíaca (B2) é mais bem
audível nos focos da base. Normalmente o som é
único na expiração, podendo sofrer desdobramento na inspiração. Esse fenômeno, quando desaparece na pausa inspiratória, é denominado desdobramento fisiológico de B2(11, 16, 19, 20, 27).
Em algumas situações, o desdobramento
persiste na fase inspiratória, indicando atraso do
fechamento pulmonar, e recebe o nome de desdobramento amplo ou fixo de B2. Podemos observá-lo
no bloqueio de ramo direito (BRD), na comunicação
interatrial (CIA) e na estenose pulmonar(11, 16, 19, 20, 27).
O desdobramento paradoxal de B2 ocorre
na presença de desdobramento na expiração e
desaparecimento do mesmo na inspiração. Assim,
estamos diante de um retardo do tempo de ejeção
de VE, que pode ser encontrado em condições de
bloqueio de ramo esquerdo (BRE), estenose aórtica
grave e na CMH(11, 16, 20).
Os principais sons a serem procurados na sístole são o clique sistólico do PVM e os ruídos de
ejeção dos focos aórtico e pulmonar.
Adolescência & Saúde
Wassersten & Teixeira Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
O clique do PVM é mesossistólico, causado
pela redundância dos folhetos, e se altera com a realização de manobras, podendo-se afastar ou aproximar de B1, conforme o aumento ou a diminuição, respectivamente, do volume intraventricular.
Os ruídos de ejeção são sons protossistólicos,
mais bem audíveis nos focos de base e não variam
com a respiração. Podem-se confundir com o desdobramento de B1 e B4. Ruídos de ejeção do foco
aórtico (valva aórtica bicúspide, estenose aórtica e
dilatações da aorta ascendente) podem-se irradiar
para a carótida, e os ruídos de ejeção pulmonar
(estenose pulmonar e dilatações da artéria pulmonar) para a borda esternal esquerda baixa(11, 19).
Os principais sons a serem procurados na
diástole são a terceira bulha cardíaca (B3), a B4,
e os estalidos de abertura das estenoses mitral e
tricúspide.
A B3 pode ser normal em crianças, adolescentes e adultos jovens, mas representa condição
patológica na presença de sobrecarga volumétrica
ou diminuição da complacência de VE, podendo
ocorrer em quadros hiperdinâmicos (exercício, febre e hipertireoidismo).
A B4 decorre da contração atrial. É muito freqüente nos processos isquêmicos e naqueles com
diminuição da complacência ventricular. Poderá
ser observada nas hipertrofias importantes de VE,
na HAS, na hipertensão pulmonar (B4 de ventrículo direito [VD]) e na estenose aórtica.
Os estalidos de abertura ocorrem em condições
patológicas de estenose valvar, em que a abertura
restrita da valva termina de forma brusca, gerando
um som de alta freqüência. Devem ser diferenciados
de B3 e desdobramento de B2(10, 11, 16, 19, 20).
Os sopros cardíacos devem ser classificados
de acordo com localização no ciclo, formato, irradiação, timbre e freqüência, intensidade e efeito de
manobras. Os sopros diastólicos, sistodiastólicos e
contínuos são geralmente significativos para cardiopatia. Sopros diastólicos são fortes indicadores
de cardiopatia (estenose mitral e insuficiência aórtica)(10, 11, 16, 19, 20).
Diferenciar sopros patológicos dos sopros
fisiológicos requer experiência do examinador.
Giese et al.(10) fornecem as principais características
Adolescência & Saúde
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necessárias para diferenciar os sopros patológicos
dos fisiológicos (Tabela 3).
Os sopros inocentes ou funcionais são freqüentes em atletas, adolescentes, indivíduos magros e
principalmente em crianças. Em geral, são mesossistólicos, de curta duração, aumentam de intensidade
na posição supina e diminuem ao sentar e/ou com
manobras que reduzem o retorno venoso.
Thompson(27) orienta iniciar a ausculta com
o atleta sentado para descartar sopros funcionais
não-relevantes, que desaparecem nessa posição. O
sopro funcional, cuja intensidade varia do grau 1
ao 3, não está associado a sons de ejeção, desdobramento de B2 e irradiação. No diagnóstico diferencial inclui os sopros da insuficiência mitral e da
comunicação interventricular (CIV), que são sopros
holossistólicos, mais intensos, apresentam irradiação e não desaparecem com manobras(10).
Existe ainda o sopro mesossistólico hiperdinâmico, muito comum em crianças e adolescentes.
Tabela 3
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL entre SOPROS PATOLÓGICOS E
FUNCIONAIS(10)
Sopros patológicos
Sopros funcionais
Associação com sintomas
Ausência de sintomas
História familiar de doença
cardíaca ou morte súbita
precoce
Ausência de história familiar
Alterações do pulso arterial
PA, pulsos arteriais e
eletrocardiograma normal
Associação com hiperfonese,
bulhas, clique mesossistólico,
desdobramento fixo ou
paradoxal de B2
B2 normal ou desdobramento
fisiológico de B2
Sopro tele ou holossístólico
Proto ou mesossistólico
Acima do grau 3
Grau 1 ou 2 na classificação de
Levine
Sopro diastólico
Ausência de cliques e ruídos
Associação com arritmias
Caráter musical e vibratório
Alteração com manobras que
reduzem o retorno venoso
Mais bem audível no foco
pulmonar ou borda esternal
esquerda média
Irradiação para carótida ou
axila
Formato em diamante
B2: segunda bulha cardíaca; PA: pressão arterial
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Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
É mais bem audível nos focos pulmonar e aórtico
acessório e deve ser diferenciado do sopro da CIA e
da estenose mitral. O primeiro cursa com desdobramento fixo de B2. O sopro da estenose mitral cursa
com ruído de ejeção e desdobramento fixo de B2(19).
Rich(19) propõe em sua diretriz os seguintes
passos para ausculta cardíaca do atleta: B1 normal
afasta sopro holossístólico e, dessa forma, afastamos
insuficiência mitral e defeito no septo ventricular.
B2 normal exclui defeito no septo atrial. Se não há
clique de ejeção, excluímos estenoses aórtica (EA) e
pulmonar (EP). Se não há sopro contínuo diastólico, excluímos ducto arterioso permeável. Se não há
sopro decrescente no início da diástole, excluímos
insuficiência aórtica (IA).
Thompson(27), conforme mencionado, orienta
para que a ausculta inicie com o atleta sentado,
não só para minimizar os sopros inocentes, mas
para detectar mais facilmente os sopros de CMH
e IA. Este autor enfatiza a importância da ausculta
dinâmica, destacando a necessidade de realizar a
ausculta do atleta na posição supina e em decúbito
lateral esquerdo (investigar infarto do miocárdio
[IM] e endomiocardite [EM]) e manobras como
agachamento e ortostatismo na detecção de sopros da CMH e PVM.
CORAÇÃO DO ATLETA
O treinamento desportivo produz respostas e
adaptações fisiológicas no sistema cardiovascular,
que recebem o nome de síndrome do coração de
atleta, e pode ser definida como uma adaptação
funcional, estrutural e reversível do miocárdio capaz produzir modificações eletrocardiográficas e
no exame físico(5, 6, 7, 19).
A PA de atletas costuma ser normal, mas podemos encontrar hipertensão arterial secundária à
freqüência cardíaca baixa. A bradicardia sinusal, com
freqüência entre 40 e 60 batimentos por minutos,
é decorrente do aumento do tônus vagal. Arritmia
sinusal e extra-sístoles isoladas que desaparecem no
exercício também são comuns(5, 10, 19, 24, 27).
O ictus cordis, geralmente localizado entre o
quarto e quinto espaço intercostal na linha hemivolume 5 ■ nº 3 ■ outubro 2008
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clavicular esquerda pode estar desviado látero-inferiormente(19).
B1 costuma ser normal em atletas, mas B2
pode estar desdobrada durante a inspiração. B3 é
comum, principalmente na posição de decúbito lateral esquerdo, devido à maior velocidade de enchimento ventricular esquerdo decorrente da hipertrofia. B4 pode ser ouvida com freqüência, porém seu
significado em atletas permanece incerto. Ela pode
ser observada em atletas que apresentam parede
torácica fina, na presença de contração atrial vigorosa e naqueles com hipertrofia ventricular esquerda concêntrica de leve a moderada. A B4 fisiológica
é menos comum que a B3 fisiológica(13, 19, 24, 27).
Em relação à ausculta, podemos encontrar
sopros de ejeção sistólica em base em 30% a 50%
dos atletas de endurance. Sopros sistólicos inocentes também são muito comuns(19, 27).
RESUMO DAS CARACTERÍSTICAS
ESPECÍFICAS DAS PRINCIPAIS CAUSAS
DE MORTE SÚBITA EM ATLETAS
JOVENS
CARDIOMIOPATIA HIPERTRÓFICA
Esses pacientes podem ser totalmente assintomáticos ou apresentar história de tonteiras, síncope relacionada com exercícios, dispnéia, palpitações e dor torácica(21, 27). É fundamental a pesquisa
familial de MS cardíaca(13, 17, 19, 27).
O sopro sistólico entre a borda esternal esquerda inferior e o ápice, cuja intensidade diminui
com o aumento do retorno venoso e aumenta com
manobras que reduzem o volume de VE, é característico da CMH(19).
O aumento do retorno venoso ou manobras que aumentam o volume intracavitário de VE
(posição de cócoras ou agachamento, handgrip e
decúbito dorsal), causam afastamento do septo hipertrofiado da valva mitral, reduzindo a obstrução
do fluxo. Com isso temos diminuição da intensidade do sopro. Já manobras que reduzem o retorno
venoso (Valsalva e posição ortostática), e como
conseqüência aproximam o septo hipertrofiado da
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não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
valva mitral, causam aumento da obstrução, intensificando o sopro(10, 19).
Podemos encontrar pulsos bisférico (bisferiens), martelo d´água e dicrótico, B4 decorrente da
hipertrofia ventricular assimétrica e desproporcional,
assim como desdobramento paradoxal de B2(10, 19).
Por vezes fica difícil diferenciar as adaptações
desencadeadas pelo treinamento intenso daquelas causadas pela CMH, ficando na chamada zona
cinzenta (gray area), o que necessita de um período de treinamento para observar a regressão das
adaptações(13).
ORIGEM ANÔMALA DE CORONÁRIAS
A principal anomalia encontrada da artéria
coronariana é o tronco da coronária esquerda originando do seio de Valsalva direito(10, 13, 15, 21, 27).
A identificação da doença é muito difícil, já
que a maioria dos portadores apresenta-se assintomática e, muitas vezes, o diagnóstico só é feito por
necropsia(21). Devemos suspeitar de origem anômala de coronárias quando há história de fadiga
precoce, dor torácica, arritmias sintomáticas e síncope induzida por exercícios(19). Histórico familial
de MS precoce e de origem anômala de coronárias
deve ser questionado(10, 13, 21, 27).
MIOCARDITE
A miocardite é um processo inflamatório do
músculo cardíaco causado principalmente por
agentes virais. O vírus coxsackie B (enterovírus) é
responsável por mais de 50% dos casos, porém
13% apresentam evolução para cardiomiopatia
dilatada(9). Drogas como cocaína também podem
causar miocardite(8, 14, 28).
O quadro clínico de apresentação pode incluir dispnéia, ortopnéia, fadiga e taquicardia sem
febre, mas pode ser mascarado por alguns sinais
sistêmicos de infecção viral, como náuseas, vômitos, diarréia, mal-estar, mialgias e tosse produtiva,
ocultando as queixas cardiológicas(19) .
É possível identificar sopro macio em ápice,
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extra-sístoles, B3 e B4 audíveis, bem como sinais e
sintomas de insuficiência cardíaca. Alguns autores
aconselham investigar a presença de pulso alternante, isto é, amplitudes diferentes que podem
indicar descompensação cardíaca inicial(10, 19).
É razoável afastar a participação de um atleta com base exclusivamente em febre baixa(19). O
exercício físico é deletério e perigoso para o indivíduo que apresenta miocardite na fase aguda(1).
SÍNDROME DE MARFAN
Thompson(27) descreve os principais critérios
clínicos para o diagnóstico da síndrome de Marfan.
Temos os critérios maiores, que são história familiar, peito escavado (pectus excavatum), índice envergadura/estatura > 1,05, escoliose > 20 ou espondilolistese, pé plano, luxação de cristalino e dilatação da aorta ascendente. Os critérios menores
são hipermotilidade articular, dolicocefalia, córnea
plana (íris hipoplástica), PVM, dilatação da artéria
pulmonar, dilatação da aorta abdominal, estrias
atróficas cutâneas e hérnias recorrentes.
O enfraquecimento intrínseco da parede aórtica, também conhecido como necrose cística da média, é a principal causa de dilatação da aorta ascendente, dissecção aórtica e MS durante o exercício.
Outras complicações cardíacas presentes são PVM,
insuficiências aórtica e mitral e arritmia(13, 14, 19, 27).
Como nem sempre as manifestações da
doença são clássicas, devem-se investigar a
presença de síndrome de Marfan e MS precoce na história familiar do atleta. Alguns atletas
podem apresentar histórico de palpitações(27).
Recomenda-se a avaliação em todos os atletas
que apresentam estatura elevada (homens: >
183 cm; mulheres: > 178 cm) associada à presença de duas manifestações da doença(10).
DISPLASIA ARRITMOGÊNICA DE
VENTRÍCULO DIREITO
Doença genética caracterizada por fibrose
e áreas de infiltração de gordura que acometem
principalmente o VD. É freqüentemente associada
volume 5 ■ nº 3 ■ outubro 2008
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Morte súbita: avaliação pré-esportiva das principais causas cardíacas
não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
à miocardite e considerada a principal causa de MS
na região de Veneto, Itália(14, 17, 27).
O atleta pode ser totalmente assintomático,
sendo o eletrocardiograma de repouso uma ferramenta importante de suspeição. O exame físico é
inocente, cabendo ao examinador perguntar sobre
história familial de MS precoce e queixas de palpitações ou síncopes recorrentes(10).
AVALIAÇÃO CLÍNICA DA ESTENOSE
AÓRTICA
A EA é causa freqüente de MS em atletas
jovens(13, 14, 21, 27). A principal etiologia em jovens
atletas é a congênita, mas ela pode ser de origem
reumática ou calcificação/degenerativa(14, 27).
Sintomas como dispnéia, síncope ou angina
podem ocorrer ao longo do curso da doença, aumentando de forma significativa o risco de MS(14).
A MS também pode ocorrer sem qualquer sintoma
anterior, mas é rara(27). Ao exame físico observamos sopro áspero de ejeção sistólica, que aumenta ao agachamento e diminui com a manobra de
Valsalva. O sopro da EA aumenta com o aumento
do volume ventricular, ao contrário do sopro da
CMH(19). A intensidade do sopro é geralmente alta
(3+ ou superior), sendo mais bem audível na borda
esternal direita alta(10).
A palpação do pulso carotídeo pode levantar a suspeita de EA, principalmente quando
apresenta baixo volume e elevação lenta (parvus
et tardus) ou difícil palpação(27). O pulso bisferiens pode estar presente em alguns casos. O
desdobramento paradoxal de B2 também pode
ser encontrado em casos de estenose aórtica
grave(10).
PROLAPSO DA VALVA MITRAL
O PVM acomete 5% da população geral, sendo provavelmente a alteração valvar mais comum.
O surgimento das manifestações pode não ser evidente até a vida adulta(14, 19).
A maioria dos indivíduos é assintomática,
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porém podemos encontrar história positiva de dor
torácica (geralmente atípica), fadiga, dispnéia, síncope ou palpitações e história familial de MS. Esses
pacientes apresentam maior incidência de complicações(19).
Podemos encontrar na ausculta cardíaca
um clique meso ou telessistólico e/ou sopros de
regurgitação mitral, que variam com manobras.
Manobras que reduzem o volume intracavitário antecipam o clique e o sopro, enquanto as manobras
que aumentam o volume ventricular retardam tais
achados(10, 14, 27).
Como o PVM é comum na síndrome na
Marfan, o exame físico dos pacientes com PVM
deve incluir a busca de estigmas dessa doença(27).
CONCLUSÃO
As adaptações cardiovasculares decorrentes
de prática regular de esporte competitivo acarretam a síndrome do coração de atleta. Essas modificações possuem apresentações clínicas variáveis
e em alguns atletas podem se assemelhar a condições patológicas, gerando falsos diagnósticos de
cardiopatia(4, 5, 10, 13, 14, 17, 24, 27).
Podemos evitar essa situação mediante avaliação pré-participação completa e focada nas principais
causas de MS nessa população. A facilidade de obter
uma história clínica e realizar um bom exame físico
faz com que essas possibilidades sejam a etapa inicial
numa avaliação pré-participação de baixo custo(19).
Devemos considerar ainda que os atletas de
nível competitivo nem sempre representam verdadeiros modelos de saúde. A busca constante por
resultados e a necessidade de atender as cobranças
de patrocinadores e empresários provocam elevadas cargas de treinamento e uso de substâncias
consideradas doping, que podem comprometer a
saúde física e mental.
Não é difícil encontrar hábitos de vida insalubres
que comprometem suas performances. Daí a importância da educação e da conscientização dos jovens
no período de formação nas categorias de base.
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não-traumáticas em adolescentes e jovens adultos
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