LER a partir dos 6 anos GUIA DE LEITURA MANUELA LAPA Guilherme, o Tagarela, e as suas amigas MARTA FERNÁNDEZ - RAÑADA Ilustrações de Micaela Cabral Apresentação da obra Guilherme, Lua e Estrela… O que liga estas três personagens? «Gostam de guardar histórias das que chegam ao coração.» Para elas, as histórias contam-se para serem vividas: rindo, gritando, chorando, sonhando… e, sobretudo, partilhando emoções. Entre aquele que conta e aquele que escuta, algo pode acontecer, fazendo-lhes sentir que se encontram juntos numa aliciante aventura de descoberta. Daí o pedido: «Conta outra vez esse conto.» Leitura da obra Objectivos da leitura Tratando-se de uma narrativa que se constrói em torno da questão do desejo de contar e de ouvir contar histórias, importará criar uma situação que induza o leitor a problematizar: Porque será que tanto necessitamos de histórias? E o que fazemos com elas? Quem as inventa?, etc. Assim, criar-se-ão condições para se atingirem os objectivos seguintes: 1. Interrogar-(se): Porquê o desejo de contar e de ouvir contar histórias? Como se inventa uma história? Que histórias despertam a minha curiosidade? 2. Participar em experiências que estimulem o gosto de ouvir, ler e inventar histórias. 3. Manifestar preferências sobre vários processos de se contar uma história: utilização da palavra falada ou escrita, dos gestos, da imagem, dos sons… Previsão do tempo e de sequências-tipo para as sessões de leitura1 Atendendo a que as sessões de leitura podem ocorrer em situação escolar ou para/extra-escolar, com objectivos, participantes e formato de natureza diversa, dever-se-ão ponderar diferentes opções. 1 O tema central da narrativa sugere uma leitura em colectivo e em voz alta, de modo a criar-se a situação típica do contador de histórias a interagir com um público. 2 EXEMPLOS: 1. Em situação de aula Uma sessão de 45 minutos para a leitura integral da narrativa e duas sessões de 45 minutos para as propostas de trabalho após a leitura integral. 2. Em situação para/extra-escolar A título de exemplo, pode prever-se que a narrativa seja apresentada por um contador de histórias em clubes de leitura, bibliotecas, livrarias, em contexto familiar… Assim, sugere-se uma sessão de 45 minutos para leitura integral, acompanhada de comentários que ajudem a manter a curiosidade das crianças pelo desenvolvimento dos acontecimentos. 1. Antes da leitura A interpretação desta narrativa requer que o leitor mobilize certos conhecimentos sobre o estatuto simbólico que, a partir das suas características enquanto astros, tem sido atribuído às duas entidades – Lua e Estrela. Assim, dever-se-á proporcionar aos leitores um percurso que lhes permita apropriarem-se dessa chave interpretativa. EXEMPLO: • Pedir aos leitores que indiquem características dos dois astros, Lua e Estrela. • A partir das respostas obtidas, produzir uma síntese do tipo: enquanto a Estrela tem luz própria e não se move, a Lua reflecte a luz de uma estrela – o Sol –, move-se e atravessa várias fases. • Informar os leitores que, pelas características que estes astros apresentam, tanto a Lua como a Estrela são utilizadas em muitas histórias como símbolos. A Estrela simboliza o brilho permanente, o poder de dar luz. A Lua simboliza algo que depende de um poder mais forte – o Sol – e que ora aparece, ora desaparece. Por isso, em certas histórias, a personagem Lua é apresentada como sendo «a filha do rei» – a princesa cuja mão é concedida pelo rei ao herói como recompensa pela sua coragem. • Prevenir os leitores de que deverão descobrir, na história que vão ouvir, as características destas duas personagens. 3 2. Durante a leitura Considerando o teor da narrativa e os objectivos a atingir, julgam-se pertinentes breves interrupções que permitam aos leitores esclarecer significados de vocábulos ou expressões desconhecidos, alertar para o ritmo de elocução que o formato do texto sugere e chamar a atenção para a função de determinadas palavras-chave na produção do sentido global da narrativa. 3. Após a leitura a) Pedir reacções à história lida. • Mobilizando a informação prestada sobre o estatuto simbólico de Lua e Estrela, propor a análise das relações entre as três personagens: a relação de Lua consigo própria; a relação de Lua com Estrela; a relação de Guilherme com Lua e Estrela. • Com base no texto da canção, pedir a explicitação do modo como as três personagens encaram o acto de contar/ouvir contar histórias. Propor uma leitura ritmada do texto da canção: a solo, em coro (a uma ou várias vozes), em cadeia… b) Propor aos leitores que estabeleçam relações entre o auto-retrato de Guilherme e o texto de uma composição musical: «Lunetas do Faz-de-Conta». LUNETAS DO FAZ-DE-CONTA R E F R Ã O Quando acordo chateado Quando as pinto de castanho Sem ter nada que fazer E fico muito vermelho Peço as lunetas ao avô Canto uma modinha antiga E lá vou eu brincar ao «ser» Sou a imitação de um velho Se as ponho bem juntinho Quando as ponho na cabeça À pontinha do nariz E faço um ar espantado Faço voz bem tremidinha Fico igualzinho ao avô Sou o senhor doutor juiz A procurá-las por todo o lado. REFRÃO in A Casa do Silêncio, Edições Afrontamento Autor: Pedro Branco; compositor: Ricardo Fonseca 4 c) Contar, ouvir, ler… e inventar histórias. • As propostas de actividades já apresentadas poderão induzir os leitores a tentar fazer a experiência de inventarem as suas histórias. Algumas das técnicas da autoria de Gianni Rodari1, já do domínio público, poderão inspirar experiências diversas. EXEMPLO: «A pedra no charco» – lançar uma palavra, pedindo que a ela sejam imediatamente associadas outras palavras. A partir de uma constelação de sentidos, imaginar um universo ficcional e inventar uma história. • Apresentar títulos de histórias e pedir aos leitores que imaginem personagens, situações, episódios que esses títulos lhes sugiram: A Girafa Que Comia Estrelas; O Sorriso do Boneco de Neve; A Princesa da Chuva; O Sapo Apaixonado; Lua do Mar; A Nuvem Cor-de-Rosa; Estrela à Chuva. • Dar a conhecer uma personagem, o Inventão, que, pela sua fantástica capacidade de imaginar, inspirou histórias muito divertidas, reunidas num livro, O Inventão, da autoria de Manuel António Pina (Edições Afrontamento). O Inventão passa a vida a imaginar o mundo às avessas, a criar situações extravagantes, a divertir-se com as palavras. Por isso, os Meninos gostam de o ouvir contar histórias. – Apresentar um excerto de uma das histórias: «Anão Anão & Assim Assim». ANÃO ANÃO & ASSIM ASSIM Os Meninos Inventão, conta uma história, inventa uma aventura qualquer. – A verdade é tão ilusória! – Só em histórias se pode crer! Conta a do Rei Ninguém, a da Rainha Nenhuma, a do Capitão, a do Ladrão, qualquer uma! Os Meninos sentam-se no chão, à volta do Inventão. 1 Gianni Rodari, Gramática da Fantasia, Editorial Caminho. 5 Inventão Era uma vez um Rei… (A do Rei era bonita mas não a sei!) Era uma vez uma Rainha… (A da Rainha é tão pequenina!) Era uma vez um Gigante… (A do Gigante é tão grande!) Era uma vez um Português & um [Chinês… (Não me façam contar a do Chinês [outra vez!) Era uma vez uma Cabra… (A da Cabra nunca mais acaba!) Era uma vez um Animal… (A do Animal acaba tão mal!) – Que história contarei? […] Os Meninos Conta a do Bicho Carpinteiro, conta a da Lua & do Marinheiro, a das Três Meninas, a dos Sete Anões, a de Ali Ladrão & dos Quarenta [Babões, conta aquela que começa pelo fim, aquela que se conta com a boca [fechada, a do Faz-Tudo que não fazia nada, a do Anão Anão & do Assim Assim… Conta uma qualquer, inventa uma se não te lembrares de nenhuma! Inventão puxa pela cabeça: Inventão Era uma vez um menino que não queria sopa de letras, podiam lá estar coisas bonitas escritas 6 mas para ele era tudo tretas… Podia lá estar escrito COMER, podia lá estar GOIABADA, como ele não sabia ler a sopa não lhe sabia a nada! Tinha no prato uma FLOR, um NAVIO na colher, comia coisas lindíssimas sem saber, mas ele queria lá sabor! Até que um amigo com todas as letras lhe ensinou a soletrar a sopa. E ele passou a ler a sopa toda, o peixe, a carne, a sobremesa, etc. (Inventei mesmo agora esta, mas não é grande coisa realmente… É muito literária, falando literalmente, uma história supina e indigesta…) Inventão puxa ainda mais pela cabeça. Inventão Hoje estou sem imaginação e a imaginação está sem mim! O melhor é voltar a contar a do Anão [Anão e do irmão gémeo dele Assim Assim… O Anão Anão era muito pequeno, o Assim Assim era assim assim… Não eram bem irmãos, mas eram [mais ou menos, não eram bem gémeos, mas enfim… O Anão Anão dizia sempre que não, nem que a sobremesa fosse pudim. O Assim Assim dizia sempre que sim, até para apanhar uma injecção. […] – Seguindo o exemplo do Inventão, sempre pronto a improvisar histórias, propor aos leitores que arrisquem alguns ensaios. Como forma de estimular os improvisos, apresentar exemplos da tradição popular: Era uma vez um gato maltês. Queres que te conte outra vez? Era uma vez uma menina chamada Vitória. Morreu a menina acabou-se a história. […] – Pedir aos leitores que seleccionem uma das histórias lidas ou inventadas e proponham formas diferentes de a contar: utilizando a palavra falada ou escrita, imagens, gestos, sons… 7 É importante que a criança seja estimulada a guardar as suas memórias de leitura: comentários a personagens, episódios, lugares…; textos inspirados nas histórias lidas; descobertas motivadas pelas actividades realizadas; ilustrações… A organização, pela criança, de uma sequência de registos e de documentos que considere interessantes permitir-lhe-á construir um memorando de acontecimentos significativos na sua aventura pelo mundo da ficção. Guias de leitura também disponíveis on-line, em www.junior.te.pt/guiasdeleitura. 9 781111 118358